COLUNAS

  1. Home >
  2. Colunas >
  3. ABC do CDC >
  4. Entre a superstição e a incompetência

Entre a superstição e a incompetência

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Atualizado em 28 de novembro de 2012 11:34

Quem já foi aos Estados Unidos da América ou mesmo quem nunca lá esteve, mas prestou atenção nos filmes americanos, sabe que uma parte da população tem problemas com o uso do número 13. Há hotéis que não têm o apartamento com esse número; prédios nos quais do 12º andar passa-se diretamente para o 14º andar (aliás, como consta dos elevadores); em algumas companhias aéreas há aeronaves que não têm a fileira 13: da fileira 12 passa-se para a 14, etc.

Sem querer me alongar nesse tema, do que pude apurar, a explicação mais aceita para essa superstição envolve o cristianismo: Como na última ceia Jesus Cristo estava junto com os seus apóstolos, eram 13 as pessoas presentes. (E a sexta-feira 13 ficou famosa e assustadora porque Jesus morreu em uma sexta-feira - a Sexta-Feira da Paixão). Daí que as pessoas associaram o número 13 a algo ruim, trágico, ligado à morte, algo bastante forte na sexta-feira 13.

A ironia envolvendo o temor dos americanos ligado ao 13 está em que na sua própria formação o número aparece: Os EUA nasceram de 13 Colônias; a bandeira americana tem 13 listras, que representam essas 13 colônias e, gostando ou não do fato, parece que o número 13 persegue os americanos. Na nota de um dólar, por exemplo, há uma série de coincidências envolvendo-o. No verso da nota, a pirâmide tem 13 camadas; na frente da águia, há um escudo com 13 listras verticais; essa águia segura 13 folhas de oliveira na pata direita e 13 flechas na esquerda. Além disso, o círculo sobre sua cabeça é formado por 13 estrelas.

Anoto, ademais, que, para os supersticiosos, deve ser um inferno quando chega o dia 13 do mês, ou quando ele ou seus filhos comemoram o 13º aniversário de vida ou, ainda, o 13º ano do aniversário de casamento, etc. (se fosse no Brasil, alguns supersticiosos teriam dificuldade em receber o décimo terceiro salário...)

A superstição com os números não envolve apenas o 13 (que alguns, a contrário senso, dizem ser número da sorte, como o velho lobo Zagalo faz) e também não somente os Estados Unidos; na Argentina e outros países, há também prédios sem o 13º andar. No Japão, por exemplo, o problema é com o número 4. Por causa de sua pronúncia (shi) ser a mesma da palavra morte (shi), é comum encontrar edificações que não possuem o quarto andar. Outro costume comum é o de não dar lembrancinhas ou presentinhos compostos por quatro unidades ou quatro peças. Além do número quatro, por lá também os números 9, 42 e 420 são discriminados. E como se sabe, o bastante conhecido 666 é evitado por ser considerado o número da besta, etc.

Mas, você leitor deve estar se perguntando por que estou cuidando desse tema. E a resposta é que o faço para contar uma ocorrência - que descobri ser corriqueira - envolvendo o número 13 e as companhias aéreas. Vou narrar um incrível caso que está acontecendo regularmente no Brasil envolvendo a Companhia Aérea Gol.

Dessa vez, a vítima foi uma querida amiga minha e seus dois filhos menores. Eles foram, no último feriado sanduíche, de São Paulo para a Bahia. Ela adquiriu as passagens para o voo das seis horas da manhã do dia 14 de novembro p.p.: Gol G3 1922. Mas, deixarei ela mesma contar o ocorrido.

"Como o voo era às seis da manhã, as crianças e eu praticamente não dormimos. Acordamos às três da madrugada, pegamos as malas e antes das quatro saímos para o aeroporto. Lá chegando enfrentamos as filas de sempre, mas conseguimos fazer o check-in. A atendente me entregou o ticket, avisando que não estávamos, as crianças e eu, juntinhos, mas ficaríamos na mesma fileira, a de número treze".

"Fomos uns dos primeiros a entrar na aeronave. Fomos caminhando para encontrar nossos lugares: fileira dez, onze, doze e de repente, apareceu a fileira quatorze. Olhei de novo e chequei. Não havia a fileira treze. Olhei bem para os tickets: estava escrito treze, mas não existia a fileira. Talvez eu devesse ter sentando com as crianças na fileira quatorze que, logicamente, correspondia a treze. Mas ao invés disso, retornei ao começo do avião para reclamar".

"Passados alguns instantes, apareceu um comissário mal humorado que disse simplesmente o seguinte: 'Olha, nessa aeronave não há a fileira treze e está tudo lotado. A senhora terá de desembarcar'".

"As crianças e eu estávamos muito cansados. Eu havia planejado a viagem há muito tempo e meus filhos a aguardavam com ansiedade. Eu, como consumidora que sou, havia comprado e pago as passagens também há muito tempo. Cumprira todo o procedimento. Os funcionários da companhia aérea do balcão nos haviam embarcado e entregue os tickets. Então, fiquei furiosa. Disse ao comissário: daqui eu não saio. Pode arrumar um lugar para mim neste mesmo avião. Estou com os tickets para ficar nesta aeronave e com meus dois filhos pequenos!".

"Ele, muito grossamente, respondeu: 'Se a senhora não sair vou chamar a polícia'. Daí, eu mais brava ainda - pois estava coberta de razão - disse quase aos berros: Pois chame! Chame já! Meus filhos pequenos e eu acordamos muito cedo. Eu estou aqui com eles prontos para seguir viagem. Nossas malas estão nesta aeronave. Eu vou chamar a imprensa, a rede Globo, a Record e eles virão filmar a polícia prendendo duas crianças e uma mãe com os tickets de embarque na mão com os números de poltronas que não existem!".

"O comissário deu as costas e saiu. Eu comecei a bater palmas para as pessoas olharem para mim e quando consegui a atenção de todos expliquei o que estava acontecendo. Não obtive solidariedade de ninguém, apenas olhares estranhos que ocultavam um pensamento relativo a minha pessoa: eles pareciam pensar que eu era louca".

"Não sei o que eles fizeram. Depois de uns dez minutos, o comissário voltou e ele e a aeromoça nos colocaram em outros três assentos e acabamos voando".

Não é incrível, leitor? Que o dono da companhia aérea ou seus administradores sejam supersticiosos e queiram eliminar a fileira 13 das aeronaves vá lá. Porém, vender os assentos da fileira que não existe é pura e inacreditável incompetência. Por que será que eles não conseguem fazer o link entre a aeronave e o balcão de check in? Como é que pode, nesses nossos dias de alta tecnologia, acontecer uma dessintonia como esta? Chega a assustar que essas pessoas estejam administrando um negócio tão relevante e de risco como o transporte aéreo!

Comentei com nosso amigo comum Outrem Ego, que logo disparou: "É o overbooking da besta". Realmente, se o overbooking é já uma espécie de estelionato porque a companhia aérea vende o mesmo assento para mais de um consumidor, vender assentos que sequer existem por causa de um número é ainda mais tenebroso.

E quer saber mais: a ocorrência com minha amiga não foi única. Veja o que ela contou:

"Quando estávamos no ar, a aeromoça veio conversar comigo. Pediu desculpas pelo ocorrido e confessou que ela e os demais estavam cansados do problema que acontecia quase todo dia por causa das aeronaves sem a fileira treze. Muitos passageiros acabavam sendo colocados para fora".

Estou quase fazendo como minha amiga e gritando: "Alô Anac, cadê você que nada vê?". É caso de se fazer uma campanha para que os consumidores não aceitem no balcão de embarque ou na reserva feita pela agência de viagens um assento na fileira número treze dos voos da Gol. E, claro, que na reserva ou check in que o próprio consumidor faça pela internet que ele tome o mesmo cuidado.

Para terminar, lembro que todas essas pessoas que não puderam embarcar pela falta da fileira treze - comprada, paga, aceita, com malas despachadas, etc. - têm direito a pleitear indenização por danos morais, no qual há de se realçar o aspecto punitivo. Quem sabe assim, um dia, seus administradores consigam somar dois com dois e chegar a quatro (bem, se for no Japão... Não).