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O capitalismo e as manifestações de rua no Brasil

quinta-feira, 17 de março de 2016

Atualizado em 16 de março de 2016 13:47

As manifestações de rua por cidades de todo o Brasil no último domingo, enormes - as maiores de todas - e pacíficas, mostraram muitas coisas, bem o mal avaliadas pelos blogueiros espalhados nos vários veículos de comunicação e também pela web.

Para não deixar passar em branco, quero fazer um curto comentário, mostrando a forte presença do capitalismo nos eventos ou, melhor, dos modos de expressão, apresentação e oferta do sistema capitalista.

Como disse mais de uma vez nesta coluna, o capitalismo é uma ideologia "neutra" no sentido de que não se incomoda com nenhum modo de pensamento, desde que sua instrumentalização e/ou utilização possa gerar lucro. Os modelos de produção e oferta capitalistas estão nas igrejas, nas escolas, nos esportes "amadores", etc.. Na política e nas passeatas, faz tempo que aportou.

Vejamos sua atuação na avenida Paulista em São Paulo. Alberto Saraiva, fundador e administrador das redes Habib's e Ragazzo, não só apoiou o movimento como esteve pessoalmente na manifestação, mas anoto um detalhe: ele também comemorou o fato de ter vendido, nada mais, nada menos que 22.500 coxinhas na região! Ele mesmo conta: "O movimento foi incrível na Ragazzo Express da Paulista. Testamos até um modelo novo de venda. Instalamos ali perto uma bicicleta com uma estufa com capacidade para 400 coxinhas. Tínhamos cinco sabores e cada uma custava 1,98 reais. Vendemos tudo. Entre a loja e a bike, vendemos 22.500 coxinhas. Coxinha é comigo mesmo! Rs"1.

O caso do empresário Alberto Saraiva mostra como a inteligência e a estratégia são muito favoráveis ao modelo (e, no caso, também, a ironia). Vê-se aí o senso de oportunidade e o olhar atento para com aquilo que interessa, afeta e atende aos interesses dos consumidores e que fazem bem aos negócios.

Outro ponto evidente foi a venda de camisetas, bonés, máscaras, bandeiras, etc., que já fazem parte das "tradições" em matéria de manifestação popular. Os fabricantes desses produtos são também bons observadores do mercado e pescadores de oportunidades.

Mas, no que diz respeito à camisa da seleção brasileira de futebol, li um artigo dizendo que seu criador, o gaúcho Aldyr Schlee, não gostou de vê-la usada como símbolo. Ao ver seu uniforme pelas ruas do país no domingo, ele lamentou. Disse: "Infelizmente, ela está sendo usada apesar de todas as safadezas da CBF" (...) "O símbolo da corrupção está sendo usado em uma campanha contra a corrupção"2.

Naturalmente, respeitando a opinião do criador do modelo de camisa, eu não vi assim. De fato, ao que consta não só a CBF como também a FIFA são organizações que há muito tempo andam fora da linha e, como está sendo apurado, seus dirigentes estão envolvidos em ações ilegais e corruptas. Mas, não só o Brasil e suas cores são maiores que a CBF, como a seleção de futebol é também um patrimônio nacional imaterial. Os dirigentes da CBF (e também da FIFA) vão passar, mas a seleção brasileira permanecerá com suas cores e inspiração. Não era um ato contra a CBF, daí, parece-me que o que valia mesmo eram as cores do Brasil. E que, obviamente, comprovam o que eu estou aqui tratando: o mercado sabe sim vender o que interessa aos consumidores. No caso, camisas da seleção canarinho e dos ídolos do futebol.

Na realidade, penso que o modelo capitalista está colocado à disposição de qualquer pessoa que dele queira se utilizar. Tanto faz o que a pessoa pense ou qual sua posição ideológica, nem se é a favor ou contra o governo de plantão ou passado. O que importa é produzir, oferecer, vender e faturar. Se os políticos caem, sobem, mudam, renunciam, etc. não é relevante, desde que, claro, o regime econômico (capitalista) permaneça.

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1 Fonte: Veja São Paulo.
 
2 Fonte:  Band Esporte.