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Conversa Constitucional nº 18

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Atualizado às 07:55

Opinião: O Caso Renan - Segurança para, pelos menos, saber quem comanda nossos Poderes:

Em dezembro de 2008, o STF decidia o "caso Raposa Serra do Sol" (PET 3388) quando, votando a liminar, formou-se um placar de sete votos num sentido. O ministro Marco Aurélio pediu vista. O colega, Carlos Ayres Britto, relator, argumentou que dever-se-ia proclamar o resultado, pois já havia maioria e a questão era delicada. "Excelência, então seria o caso de cassar a vista que pedi do processo. Vossa Excelência propõe a cassação do pedido de vista? Chega a esse ponto, a essa teratologia? Oh, ministro Carlos Ayres Britto", rebateu o ministro Marco Aurélio. Prevaleceu o pedido de vista. Oito anos depois, o ministro Marco Aurélio determinou o afastamento do presidente do Congresso Nacional, apreciando, sozinho, uma antiga cautelar anteriormente prejudicada, na ADPF 402, ajuizada pela Rede, mesmo estando, o julgamento, paralisado por um pedido de vista do colega, ministro Dias Toffoli. A ADPF aparentemente contava com seis votos favoráveis a que réus não presidam nem a Câmara dos Deputados nem o Senado, pois integram a linha sucessória da presidência da República. Um réu pode ser presidente da República sem que a ele se aplique qualquer suspensão de mandato, seja por ter se tornado réu antes de sua diplomação, seja porque, depois de diplomado, se tornou réu quanto a um crime comum dissociado das funções presidenciais (art. 86, § 1º, I e § 4º). Hoje, o senador Renan Calheiros é elegível para o cargo de presidente da República. E não pode presidir o Senado porque talvez substitua o presidente num de seus pernoites no exterior? A ADPF concentra-se nos réus do STF, mas, se potencializarmos o raciocínio, Luiza Erundina (PSOL/SP), condenada numa ação popular, seria "indigna" de presidir a Câmara. O mesmo se diga quanto ao senador Cristovam Buarque (PDT/DF), por uma ação de improbidade. Numa peleja política, o ex-presidente Fernando Henrique tentou, no STF, tornar réu o antecessor Itamar Franco (Inq 2179). Se tivesse conseguido, Itamar seria "indigno" de presidir o Senado? Erundina, Cristovam e o saudoso ex-presidente Itamar Franco são pessoas decentes que gozam de boa reputação em nossa comunidade. Jornalistas de coragem, artistas criativos, escritores talentosos, cartunistas espirituosos, livres pensadores, líderes sociais, ativistas de direitos humanos..., frequentemente se veem como réus. São, eles, "indignos"? Chega-se a supor que o que o Partido almejava era simplesmente afastar Eduardo Cunha e Renan Calheiros das presidências da Câmara e do Senado, respectivamente. Se era isso, ou os justos pagarão pelos pecadores, ou a Corte terá de dar o dito pelo não dito no futuro. Voltando à ADPF 402, em agosto, a procuradoria-Geral da República havia opinado pela sua prejudicialidade, por não ter, a inicial, indicado o ato específico violador de preceito fundamental da Constituição. Além disso, como a ação se voltava para o então presidente da Câmara, depois afastado, alegou-se não haver "mais interesse de agir", devendo, o caso, "ser extinto sem resolução de mérito". Em novembro, contudo, num segundo parecer, a PGR defendeu o afastamento. Um dos argumentos foi o de que um réu teria de ter reuniões com advogados e, isso, "tende a perturbar-lhe a mente". Veio uma ainda mais persuasiva: "Que mensagem e que exemplo esse estado de coisas daria para as crianças...?". Pois é. Dia 1º/12, o senador Renan Calheiros tornou-se réu, por 7 x 3, acusado de irregularidades no uso da verba de gabinete (Inq 2593). Mesmo o Senado podendo sustar o andamento da ação (art. 53, § 3º e § 5º, da CF), dia 5/12, às 11h17, o Partido volta-se à ADPF e apresenta novo pedido sustentando que já havia maioria e que o ministro Marco Aurélio deveria retomar, sozinho, o pedido cautelar anteriormente prejudicado. Falou no "grave desencanto e a frustração com as instituições republicanas". Alegou que "esses são bens e valores de importância transcendental" e invocou o "sentimento constitucional". Vieram, então, duas afirmações: "Como é altamente improvável que o julgamento da presente ADPF venha a ser finalizado antes do término do mandato do senador Renan Calheiros, que se encerra em 1/2/2017", não haveria como "aguardar a finalização do mérito da ação". A ADPF 402 mirava, agora, expressamente, o presidente do Congresso, um chefe de Poder. Foi dito isso no novo pedido, mas o cidadão apontado sequer foi ouvido, como impõe o art. 5º, LV, da Constituição. No mesmo dia, numa feliz iniciativa do ministro Luís Roberto Barroso, o STF recebeu o filósofo Michael Sandel, professor de Harvard, que falou sobre "Ética Pública e Democracia". Todos ouvimos dele que o maior escândalo da história dos Estados Unidos foi o Watergate. Fui checar. Em 1974, após o presidente Richard Nixon ter renunciado, o Congresso, incendiado, aprovou uma lei casuística que previa que Nixon não poderia ter acesso imediato aos seus papéis e fitas na Casa Branca. A Suprema Corte foi acionada (Nixon v. Administrator of General Services, 1977). A prudência veio do voto-vencido do juiz Warren Burger: "Considero muito perturbador que os princípios fundamentais do Direito Constitucional estejam subordinados ao que parecem ser as necessidades de uma situação particular. O fato de os momentos de grande angústia nacional dar origem a paixões nos lembra por que os três Poderes foram criados como separados e iguais, cada um destinado a verificar, por sua vez, possíveis excessos de um ou de ambos. (...) Para 'punir' uma pessoa, o Congresso - e agora o Tribunal - despedaça o tecido do nosso arcabouço constitucional". Nos EUA, a prudência num país em choque veio do voto-vencido. Na ADPF 402, o ministro Marco Aurélio, às 15h, determinou, sozinho, que o presidente do Congresso se afaste da presidência, dentre outras razões, por estar "ensejando manifestações de toda ordem". Vem da Constituição a composição da Mesa do Congresso sendo, o presidente do Senado, o seu necessário presidente (art. 57, § 5º). A liminar reformou materialmente a Constituição quanto ao que se exige para a formação da Mesa do Senado e, consequentemente, do Congresso. Também repercute na formação dos Conselhos da República e de Defesa Nacional (art. 89 e art. 91), órgãos que contam com a presença do presidente do Senado e que deliberam sobre defesa Nacional, guerra e paz. Dia seguinte, num manifesto assinado por toda a Mesa, o Senado anunciou que o certo a fazer seria aguardar a manifestação do pleno da Suprema Corte quanto ao seu recurso. O pleno é o órgão competente para apreciar ações contra o presidente do Senado (art. 5º, I e V do RISTF). Julgando o recurso, a liminar foi revertida por 6 x 3. A democracia não é feita só de representantes do povo. Mas nunca houve uma sem eles. O preâmbulo da Constituição se abre com os "representantes do povo". São eles que assinam o texto ao final. O art. 1º, parágrafo único, reitera que "todo o poder emana do povo", sendo exercido, primeiramente, pelos "representantes eleitos". Esmagar adversários políticos ou líderes indesejados, humilhá-los e persegui-los, é uma deformação da política. Por isso, precisamos da jurisdição constitucional. O STF foi convidado a embarcar numa caçada incompatível com a ADPF, principalmente numa liminar. No julgamento, a presidente, ministra Cármen Lúcia, falou em pacificação. Permitir que as pessoas possam dormir e acordar sabendo, pelo menos, quem comanda os Poderes do país, seria um bom começo. Passa da hora.

Plenário virtual I

Está em votação no Plenário virtual, até dia 22/12, o RE 944.245/SP (min. Edson Fachin), cujo tema 931 da Repercussão Geral trata do "cômputo como horas in itinere do tempo gasto pelo trabalhador para deslocar-se da portaria até o local do registro de sua entrada na empresa". Dois votos entendem que não se trata sequer de questão constitucional. Além do relator, votou nesse sentido o ministro Teori Zavascki.

Plenário virtual II

Também fica em votação no Plenário Virtual até dia 22/12 o RE 937.595/SP (min. Roberto Barroso), cujo tema 930 da repercussão geral trata da readequação de benefício concedido entre 5/12/1988 e 4/2/1991 (buraco negro) e a aplicação imediata dos tetos instituídos pelas EC's 20/1998 e 41/2003. O ministro Luís Roberto Barroso, único a votar, se manifestou no sentido de reafirmar a jurisprudência da Corte.

Amicus curiae

A Cooperativa dos Cafeicultores da Zona de Três Pontas Ltda (COCATREL), pediu ingresso como amicus curiae na ADPF 248 (min. Dias Toffoli), ajuizada pela CNC, que pretende: (i) conferir interpretação conforme a Constituição ao art. 168, I, do CTN, definindo-se que o prazo prescricional para a repetição de tributo declarado inconstitucional deve ser contado a partir da decisão do STF que declara a inconstitucionalidade; ou, por eventualidade, (ii) determinar que a nova orientação do STJ quanto ao prazo prescricional para repetição de tributo declarado inconstitucional - decidida no EREsp 435.835/SC, após 10 anos de entendimento consolidado em sentido diverso - somente pode ser aplicada a demandas iniciadas após 4 de junho de 2007 (data da publicação do referido acórdão pelo STJ) ou, caso assim não se entenda, em 24/3/2004 (data do julgamento do feito pelo STJ).

Reconsideração no ICMS base da Cofins

A Associação Brasileira dos Franqueados do McDonald's pediu a reconsideração, pela ministra Cármen Lúcia, de sua decisão negativa ao pedido de ingresso como amicus curiae no RE 574.706/PR (min. Cármen Lúcia), tema 69 da repercussão geral, sobre a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS.

Rodada tributária

Ontem, dia 7/12, o ministro Dias Toffoli teve audiências com patronos de vários casos tributários, tantos os advogados públicos quanto os privados. Os casos são os seguintes: i) RE 640.905/SP (min. Luiz Fux), tema 573: ofensa aos princípios da isonomia e do livre acesso à Justiça pela Portaria 655/93, do Ministério da Fazenda; ii) RE 605.506/RS (min. Rosa Weber), tema 303: cobrança de IPI na base de cálculo do PIS e da COFINS exigida e recolhida pelas montadoras de veículos em regime de substituição tributária; iii) RE 608.872/MG (min. Dias Toffoli), tema 342: imunidade de ICMS sobre produtos e serviços adquiridos por entidade filantrópica; e RE 570.122/RS (Min. Marco Aurélio), tema 34: ampliação da base de cálculo e majoração da alíquota da COFINS pela lei 10.833/2003, resultante da conversão da MP 135/2003.

Tá na pauta: quarta-feira

Na última semana de trabalho do STF antes do recesso, a pauta está repleta de temas tributários. Na quarta-feira, dia 14/12: i) ADI 4281/SP (Min. Rosa Weber), da ABRACEEL: ICMS. Energia elétrica. Substituição tributária. Ambiente de contratação livre. Decreto 54.177/SP. Saber se os dispositivos atacados ofendem os princípios do equilíbrio federativo, da legalidade, da capacidade contributiva, da legalidade tributária e da livre concorrência. O caso volta com o voto-vista da ministra Cármen Lúcia; ii) RE 605.506/RS (min. Rosa Weber), tema 303: cobrança de IPI na base de cálculo do PIS e da COFINS exigida e recolhida pelas montadoras de veículos em regime de substituição tributária; iii) RE 597.124/PR (min. Edson Fachin), tema 222: extensão do adicional de risco portuário ao trabalhador portuário avulso.

Tá na pauta: quinta-feira

Na quinta-feira, dia 15/12, os temas são os seugintes: i) RE 640.905/SP (min. Luiz Fux), tema 573: ofensa aos princípios da isonomia e do livre acesso à Justiça pela Portaria 655/93, do Ministério da Fazenda; ii) ADI 1055/DF (min. Gilmar Mendes), CNI: Saber se a MP 449/94, convertida na lei Federal 8.866/94, é compatível com a Constituição no que prevê a prisão civil do depositário infiel de valores referentes ao pagamento de obrigações tributárias; iii) ACO 758/SE (min. Marco Aurélio), Estado de Sergipe: Saber se os descontos do PIN e PROTERRA da base de cálculo do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal - FPE caracterizam afronta à Constituição Federal. O caso volta com o voto-vista do ministro Gilmar Mendes.

Global Constitutionalism

A Corte Constitucional da África do Sul, no caso, declarou inconstitucional o dispositivo legal que, regulando a chamada barriga de aluguel, exigia vínculo genético entre o bebê e a contratante da barriga. Pelo dispositivo, ou a contratante daria seus óvulos para a barriga de aluguel ou, pelo menos, seu parceiro doaria o sémen, de modo que houvesse, entre os pais e o bebê, algum vínculo genético. A Corte Constitucional entendeu haver violação a direitos fundamentais, incluindo a igualdade, privacidade, dignidade e integridade física e psicológica. Também o direito à saúde dos pais que não puderam contribuir com gametas ou óvulos. A África do Sul é um dos poucos países da África que regulou a barriga de aluguel. A Suprema Corte do Quênia já reconheceu que o instituto não estava regulamentada por uma lei específica e, portanto, o Judiciário, quando chamado a arbitrar conflitos, deveria decidir caso a caso.

Evento

Ocorreu dia 7/12, o lançamento do livro "Protagonismo Judicial, Segurança Jurídica e Paternalismo Exarcebado: Desafios em tempo de incertezas - Estudos Jurídicos em Homenagem ao Ministro Carlos Mario da Silva Velloso". O ministro Velloso integrou o STF de 1990 a 2006, e exerceu a presidência da Corte no biênio 1999-2001. O lançamento da obra, publicada pela Editora GZ e coordenada por Werson Rêgo, ocorreu no Átrio da Biblioteca Victor Nunes Leal, no STF.

Obiter dictum

O ministro Joaquim Barbosa, aposentado, declarou, em entrevista ao Programa do Jô, que hoje se sente um espírito livre quanto a uma eventual disputa político-partidária. O primeiro corpo-a-corpo já aconteceu. Ao entrar no estúdio do programa, as pessoas da plateia se levantaram e começaram a gritar e aplaudi-lo de pé. À medida que o ministro se aproximava do Jô, mais aplausos e mais gritos eram notados, já competindo com a música do Quarteto. "Olha que recepção, ministro!", disse Jô, atento às pessoas. No que o ministro Joaquim respondeu: "Que maravilha de música, hein, Jô?!". Falava do jazz que tocava. A plateia sentou e calou.