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Dia 11 de agosto e dia 13 de agosto

terça-feira, 12 de agosto de 2014

Atualizado em 11 de agosto de 2014 15:52

Ontem, dia 11/8, foi o dia do advogado, amanhã dia 13/8 é o dia do economista. A proximidade das datas, muito embora seja ocasional, acaba por adquirir efeito simbólico que merece reflexão. Sendo a data de hoje a intermediária entre ambas as efemérides vale a pena uma pequena digressão sobre as relações entre o Direito e a Economia.

 

A fundamentação da economia enquanto "ciência" ganhou contornos mais nítidos a partir do século XVIII notadamente após a obra de Adam Smith (1723-1790) The Wealth of Nations (1776). A teoria desenvolvida pelo escocês Smith estava em consonância com a ampliação do desenvolvimento capitalista europeu, sobretudo o inglês, o que motivava os intelectuais de então a criarem uma teoria geral que explicasse as relações entre os agentes econômicos, fossem estes indivíduos, empresas ou nações. Smith desenvolveu a sua teoria além do utilitarismo de Jeremy Bentham (1748-1832) e, nos aspectos mais relacionados com o Direito, baseou-se em pensadores e juristas (todos escoceses como Smith) como David Hume (1711-1776), Francis Hutcheson (1694-1746), Adam Ferguson (1723-1816) e Dugald Stewart (1715-1785).

 

Adam Smith, um estudioso da Moral, ao se debruçar sob o fenômeno econômico, vislumbrou a necessidade de serem ultrapassados os aspectos e princípios emanados do direito natural. A passagem dos esquemas mais utilitaristas que, até então, explicavam o funcionamento econômico evidenciou para Smith a importância do direito positivado como fonte essencial para o funcionamento da economia. Somente o direito positivo, no sentido moderno do termo, poderia garantir a estrutura legal que "enquadrasse" formalmente o indivíduo e as coletividades em estatutos que garantissem os predicados econômicos da eficiência, segurança e disponibilidade nas relações de produção e consumo.

 

De fato, a economia não pode pressupor a existência de direitos não assegurados pelas estruturas políticas de uma sociedade, e por esta determinada em termos de modo e forma. (Neste sentido, a "sociologia do Direito" apresentada por Adam Smith é uma antessala da teoria marxista a respeito do tema). Smith e os economistas que o sucedem no desenvolvimento teórico da Economia, notadamente David Ricardo (1723-1823), abordam questões tipicamente jurídicas como necessárias ao desenvolvimento social e econômico. A questão da "indenização", enquanto previsão legal assecuratória institucional, parece essencial aos fundadores da economia moderna para sanar prejuízos e tensões sociais por meio que seja socialmente pacificador.

 

Interessante notar que Smith, Ricardo e toda a tradição econômica liberal inglesa, preocupavam-se com a proteção dos indivíduos e todo o sistema econômico em relação ao Estado, ente que apesar de garantidor da ordem legal podia se tornar o seu algoz. Intrinsecamente, estes "economistas" reconheciam e incorporavam os ideais constitucionais oriundos da Carta Magna de 1215. O Direito, criação romana que objetivava a pacificação e organização social, também revestia a economia e todo o sistema dela decorrente de segurança para o seu desenvolvimento. Vale notar que para o moralista Smith, o direito positivo, representava igualmente o necessário contrato social que regulava as relações econômicas entre os agentes e entre estes e o Estado. Nesse ponto, o contratualismo vislumbrado pelos liberais ingleses deveria ser condizente com a evolução social e econômica, especialmente nas formas de realização da produção e do comércio. Assim sendo, o contrato social assumia um caráter flexível para ajustar as relações econômicas e para assegurá-las na perspectiva intertemporal. A Lei, considerada ontológica e formalmente, devia atender aos superiores anseios sociais. A economia mercantil e, posteriormente a industrial, exigiram que se evoluísse das formas primárias de asseguração social das relações, para formas mais complexas e compatíveis com a evolução do comércio e do capitalismo. Neste contexto, a administração da Justiça, tema rico e amplamente debatido até os dias de hoje, teria de guardar a devida competência técnica e independência para evitar que as instabilidades oriundas de tais interações recaíssem desordenamente sobre o Estado e a sociedade. Sem isso, nem mesmo as classes abastadas estariam a salvo. (Lembremo-nos neste ponto que a Carta Magna foi uma reação da elite de então, o baronato, contra a realeza a qual ainda não era a representação do Estado, no sentido moderno da palavra).

 

A compreensão da formação da teoria econômica moderna, representada inicialmente por Smith e, posteriormente desenvolvida pelas diversas matrizes de escolas de pensamento econômicas, persiste essencial para o entendimento do Direito nos dias atuais. Dos direitos da personalidade até o direito empresarial moderno, passando pelos direitos reais e todos os ramos do Direito, a Economia permeou e permeia a formação do pensamento jurídico e forja relações que, embora complexas, são essenciais ao desenvolvimento do capitalismo moderno. Os contratos, socialmente balizados e construídos no interesse das partes, puderam evoluir até os dias de hoje como parte integrante de uma sociedade mais civilizada e saneando eventuais empecilhos entre as partes e o todo social. Não há remota possibilidade de que o arcabouço jurídico e a prática das agentes em relação aos temas econômicos possam se separar. A economia e o direito estão intrinsecamente ligados e o entendimento sobre as áreas de conhecimento permite não somente as melhores práticas a ambas, como garante que o progresso social seja construído de forma fundamentada e marcha à frente.

 

Simbolicamente a comemoração do dia do advogado e o dia do economista é separada por um único dia. No campo prático e teórico, o Direito e a Economia estão juntas como faces de uma mesma moeda.