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Crise institucional ganha tração quando a economia cai

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Atualizado às 11:09

A crise brasileira está a se agravar. Não temos (ainda) um momento, digamos, "agudo" em suficiência que seja capaz de remeter a crise para uma escalada mais contínua e grave. Todavia, estamos diante de crônica piora do funcionamento da economia e da política. Ademais, aqueles que sempre pregaram a "normalidade institucional" do Brasil agora se defrontam com os fatos: as estruturas estatais do Brasil não estão à altura das necessidades do país. De fato, vê-se que se esvai o controle da própria conjuntura vez que Legislativo, Executivo e Judiciário estão carecendo de renovação normativa e de lideranças. Já passamos em revista às questões prosaicas do tema dos Poderes do Estado: a independência é legal, mas a harmonia é construção diária que depende da qualidade dos líderes. Ademais, o "vazio" do centro político, causa a tentação de que aventureiros postados (ou não) nas cadeiras do Poder possam tomar conta da cena. Mais: a dissociação entre a Política e o Poder ganha contornos cada vez mais visíveis.

O impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff já era sinal de evidente desacerto institucional. A tibieza da mandatária era evidente, fosse na sua capacidade de elaboração econômica, fosse na sua formulação da ação política necessária à superação dos graves problemas do país. Por dentro das instituições elaborou-se o processo de seu afastamento. Ficou esquecido, contudo, que aquelas veias institucionais pelas quais corria a solução política também estavam amplamente esclerosadas. Pregou-se a solidez das instituições, pois que isso era simplesmente necessário ao momento. Ledo engano. A crise institucional pode não ser aguda, como aqui já dissemos, mas é esta é literalmente crônica e vai matar as esperanças do povo e, quiçá, expor que a dissociação entre o poder real e o poder político é hiato mais largo que se podia imaginar.

Nesse sentido, este missivista já discordava, como mostram extratos de artigos anteriores nesse espaço:

"O Brasil está vivendo uma tensão latente e perigosa. O debate aberto sob as luzes da democracia é o melhor meio para se evitar processos de rupturas institucionais. É melhor questionar publicamente sobre a solidez das instituições brasileiras que se defrontar com uma crise, digamos, de verdade." (Migalhas - 27/1/2015)

"No Judiciário, o cenário parece mais robusto, mas é certo que ninguém acredita que as decisões saídas das penas dos juízes sejam eficazes para pacificar a sociedade brasileira". (Migalhas - 1º/12/2015)

Não é apenas a pena do Ministro Marco Aurélio Mello que está a ornar a crise institucional do momento. Há muitas outras questões que estão a ficar evidente.

Na economia, a estabilização decorrente da adoção de uma gestão meramente mais razoável estancou o analfabetismo econômico que reinava sob a batuta da ex-presidente. Muitos estão a reclamar da situação áspera e letárgica que estamos a constatar na economia. Todavia, é bom não esquecermos que o "óbvio" quando adotado no Brasil já é motivo de comemoração. A unidade e consistência da política fiscal com a administração monetária, bem como a correta administração das "expectativas" evitou verdadeiramente que entrássemos num quadro de completa e veloz depressão econômica. A presidente Dilma Rousseff perdeu materialmente as condições de administrar a economia e o seu substituto resgatou as "condições mínimas" de se governar as principais variáveis econômicas. É preciso que se repita isso para não se perder a perspectiva do caminho que estávamos a percorrer e o que agora tracejamos. Não podemos resgatar Dilma Rousseff de sua tumba política por meio da ressureição da ideia de que aquela mandatária estava no caminho correto em matéria econômica. Não estava.

Ocorre que Michel Temer e sua turma econômica ao racionalizarem a administração econômica não conseguiram sequer elaborar os meios para que a atividade econômica ganhasse tração. Os planos de redenção da infraestrutura do país adormecem nas gavetas brasilienses, o crédito público está travado pela inadimplência e pelos balanços travados dos bancos estatais, a burocracia do Estado está no canto do ringue com medo do TCU, a banca privada apenas pensa em garantir seus ativos públicos por meio do "teto de gastos públicos" e a garantia de razoável superávit primário e as empresas estão de joelhos atrás de dinheiro de capital de giro e fregueses em seus balcões.

Se o governo Temer acredita que a "mão invisível" vai funcionar pode tirar o cavalinho da chuva. A economia, nesses termos está maneta. É urgente que o governo corra riscos e assuma a política de destravamento do crédito e do investimento. O BNDES precisa ser capitalizado e ser instrumento de planos para a infraestrutura e os bancos estatais precisam de apoio para sair da sinuca de bico do crédito. O covarde setor privado só sai às ruas com segurança e melhores expectativas. O resto é balela de liberal do século XIX.

No campo monetário, vê-se a face pouco explorada da crise institucional. Ninguém fiscaliza a política de juros, mesmo que essa seja a maior despesa do nosso orçamento! Muitos lutam pela bandeira do "banco central independente". Esquecem-se de que ele já é independente de fato: ninguém o fiscaliza, as nomeações são feitas sem efetivo debate público e a transparência de suas políticas carece de correspondente debate político. A desmoralização do Congresso Nacional implica pouca credibilidade para enfrentar o desafio de colocar a autoridade monetária sob as luzes da política. Assim, ocorre, por exemplo, nos EUA e nos países do capitalismo central. Por aqui seria atentar contra a "estabilidade". Santa paciência!

O certo é que o atual Banco Central calibrou mal a taxa de juros e impôs um custo fiscal acima do necessário (nas despesas de juros) e um peso sobre a atividade econômica superior ao necessário (com spread bancário inaudito). A meta de inflação é importantíssima, mas está longe de ser dogma religioso quando milhões de pessoas estão a pedir um emprego, mesmo que mal remunerado.

Falta ao governo mínima sensibilidade para agregar à política econômica a estabilidade necessária de uma taxa de emprego mais alta com recuperação da atividade econômica na margem. Não nos esqueçamos que os setores econômicos operam com vasta capacidade ociosa. Ou não é verdade?

Estamos em momento perigosíssimo e é preciso reconhecer isso. Do contrário, os riscos aumentam...

A economia capenga, débil e sem caminho de crescimento põe tração na esclerose das instituições brasileiras. Estamos caminhando celeremente para desfechos cada vez mais agudos. O STF pode ser a bengala da hora a açoitar o Congresso do outro lado da Praça dos Três Poderes. Todavia, há outros que hoje silenciosos podem levantar seus rugidos. O Poder Militar não está adormecido, apenas silencioso, como lhe cabe, diga-se. Todavia, aqui e ali já se discutem saídas estranhas ao ordenamento democrático. Ou, não é?

Os partidos políticos enfrentam o Judiciário em tempos de delação da Odebrecht que mostrará as vísceras verdadeiras e podres do Poder: poucos sobrevivem à corrupção e aos benefícios imorais na política brasileira.

As ruas persistem em reuniões sem discursos e sem propostas. Há quem observe e queira em algum momento ocupar a cena do vazio político. Pode ser um ex-STF, pode ser um grupo da Terra de Dalton Trevisan, ou de um aventureiro da caatinga.

A crise é institucional e acabou por derrubar a ideia frágil daqueles que pregam que o Brasil é país de instituições fortes. Estas são fracas como fraca está a economia desta Terra de oportunidades, o que inclui a chance de se perder.