Justa causa

5/10/2017
André Beretta

"É estranho como os fatos são narrados e a decisão proferida (Migalhas 4.210 - 5/10/17 - "Justa causa" - clique aqui). Pela decisão fica identificado que o produto passou pelo caixa e não foi pago. Pela decisão verifica-se que o problema foi com 1, uma!, unidade de iogurte, sem que seja possível identificar quantos itens compunham a transação (5 itens, 10 itens, 100 itens)? Não há qualquer indício que a demitida tivesse qualquer antecedente de problemas, ao contrário, trabalhava no local há dois anos na função e pela testemunha da reclamada nada foi a ela imputado exceto esse único e exclusivo mau procedimento. A decisão deixa evidente que quem comprou e não pagou foi outra funcionária da empresa, mas que não foi punida. Disto surgem questões: (a) não foi punida porque seu erro foi escusável?; (b) não foi punida porque o erro não poderia ter sido por ela percebido no momento? Mas por que o erro da caixa não é escusável, afinal, entende-se que não se considerou que tenha havido conluio entre as duas, até porque o conluio seria para não pagar um iogurte e consumi-lo em 2 pessoas, algo que foge ao razoável. Mas se assim é, porque a MM. juíza aponta que o produto passou pelo caixa de modo sorrateiro, esse movimento não teria que indicar dupla intenção, da caixa e da compradora? Por que a confissão explícita de que o conferente não conferiu não indicou também má conduta, levando à aplicação da mesma pena (afinal, o problema é o mesmo!). No caso da caixa, quantos clientes ela já havia atendido naquele dia e por quanto tempo? No estabelecimento, quantas vezes fato semelhante foi registrado e assim punido de modo tão drástico? Aliás, qual o histórico de sanções que a empresa adota, ou é sempre mandar embora, ainda que o erro seja imaterial? Diante de tudo tenho que: (a) o campo probatório não foi devidamente explorado, inclusive pelo MM. Juízo; (b) a questão do conluio, embora evidenciado pela decisão, foi totalmente negligenciado, assim como a falta de atuação do conferente; (c) a decisão aponta que o comportamento, por ser sorrateiro, não é de má conduta ou procedimento, que permite até arguição de conduta criminal - se é sorrateiro não é apenas mau procedimento, pois o ato sorrateiro é sempre comissivo e intencional, o que já não se pode dizer do mau procedimento -, mas abandona essa motivação para ficar com a tese do 'mau procedimento'; (c) a 1ª instância desconsiderou outros envolvidos e convalidou punição sobre um única pessoa numa situação onde há indícios de que outros poderiam estar envolvidos e, assim, exigindo um tratamento igual contra todos, gerando excesso contra um (como de fato ocorreu); e (d) se a conduta não foi tão grave, a falta de antecedentes desabonadores aliada à imaterialidade do fato (nem sequer potencial) deveria ela ter levado a aplicação de outro tipo de punição, advertência, até mesmo para alertar sobre o que uma reincidência acarretaria. Em suma, decisão que tenho como precária, perigosa e triste."

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