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Conflito internacional no Guarujá

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Atualizado às 07:38

O local era e é paradisíaco. Situado no morro da Guaiuba no Guarujá, o Edifício Farol Branco tem uma vista deslumbrante. Talvez seja o prédio melhor situado de toda a ilha. Fica em uma península de onde se descortina o mar com horizontes determinados pelo alcance da vista. À época o edifício era isolado, não havia nenhuma construção ao seu redor. Ademais, e esta era uma característica muito peculiar em se tratando de prédios do litoral: ele só era habitado por dois casais, ocupantes dos dois únicos apartamentos existentes. Um de nacionalidade alemã e outro de origem suíça. As funções de síndico eram exercidas alternadamente, ora por um ora por outro condômino, o alemão e o suíço.

É óbvio que para construírem em conjunto e habitarem o mesmo prédio, deveria haver entre eles fortes laços de afinidade e de amizade. Durante algum tempo após a construção do prédio, o convívio foi fraterno e harmonioso. No entanto, não demorou e o relacionamento entre as duas famílias passou a sofrer abalos, em razão de provocações constantes e recíprocas das mais variadas espécies.

Os atritos ocorriam em regra nas áreas comuns do edifício, compostas por uma piscina, um terraço coberto, uma churrasqueira e uma sauna. Os motivos das desavenças eram em regra banais e baseadas em pretextos, os mais insignificantes. Eram implicâncias recíprocas que conduziam a ofensas verbais e até o início de agressão física.

Ações penais e civis recíprocas foram propostas. Recursos e habeas corpus movimentaram os Tribunais que decidiram questões pertinentes à honra, indenizações, e exercício arbitrário das próprias razões.


Também agressão física fez parte das desavenças entre os casais. No deck da piscina, o suíço varão deu um tapa no rosto germânico, chamando-o de canalha, vagabundo e sem vergonha. Em seguida, passou a pular e a bater no peito, imitando um gorila. Essa grotesca imitação provocou pronta reação por parte daquele que servira como modelo para a literal macaquice.

A revolta do casal alemão também era de ordem estética, direcionada à senhora suíça, que segundo o casal exibia a sua acintosa feiura quando se apresentava com um biquíni sumário, no deck.

No entanto, os litígios encobriam na realidade, além de profundas divergências, magoas e ressentimentos, a honra e a dignidade das Nações por eles representadas. Como pano de fundo, pois, de todas as altercações, estava verdadeiramente o orgulho nacional de cada um deles.

O problema assumiu foros de questão internacional, envolvendo as duas Nações, Alemanha e Suíça, quando o casal suíço preparou uma recepção para diplomatas e representantes da marinha de seu país.

Como ensaio para a recepção houve o hasteamento da bandeira suíça, assim como foi tocado o respectivo hino nacional. O hino foi executado várias vezes, e a bandeira ocupava considerável área que seria comum.

Como previsível, os preparativos para a festa cívica irritaram o casal alemão. Primeira providência adotada foi hastear a bandeira germânica, posta em altura superior ao estandarte suíço. Claro que o hino alemão foi tocado e o foi, em alto e bom som. Mas a provocação mais agressiva veio quando o senhor alemão arrancou a bandeira suíça do mastro e nela pisou e sapateou.

Depois de encerradas as demandas na área penal, eu não tive mais notícias dos protagonistas de uma verdadeira questão internacional ocorrida em terras ou melhor em praias brasileiras, envolvendo representantes, embora não oficiais, mas aguerridos e patrióticos representantes de duas Nações que quase tiveram suas relações estremecidas pelo patriotismo quase fundamentalista de ambos.