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Air France terá que pagar cerca de R$ 1,2 milhão a família de quatro vítimas do acidente com o voo 447

A Air France terá que pagar R$ 1.224.000,00 de indenização por dano moral a família de quatro vítimas do acidente com o voo 447, que ia do Rio para Paris e caiu no Oceano Atlântico, causando a morte de 228 pessoas, no dia 31 de maio de 2009. A decisão é do juiz Alberto Republicano de Macedo, da 1ª Vara Cível do Fórum da Região Oceânica de Niterói.

Da Redação

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Atualizado às 09:22


Dano moral

Air France terá que pagar cerca de R$ 1,2 milhão a família de quatro vítimas do acidente com o voo 447

A Air France terá que pagar R$ 1.224.000,00 de indenização por dano moral a família de quatro vítimas do acidente com o voo 447, que ia do Rio para Paris e caiu no Oceano Atlântico, causando a morte de 228 pessoas, no dia 31/5/09. A decisão é do juiz Alberto Republicano de Macedo, da 1ª vara Cível do fórum da Região Oceânica de Niterói.

A ação foi proposta pelos pais e avós de Luciana Clarkson Seba, de 31 anos, que viajava com seu marido Paulo Valle Mesquita Valle, de 33 anos, e seus sogros Maria de Fátima e Francisco Eudes Mesquita Valle. Osvaldo Bulos Seba e Laís Clarkson Seba, pais de Luciana, receberão R$ 510 mil cada um e Yolanda Bulos Seba e Nicia Beatriz Kuhnert Clarkson, avós da vítima, receberão R$ 102 mil cada uma. A companhia aérea também terá que pagar pensão à mãe de Luciana no valor de R$ 5 mil devidos desde a data do óbito até a data em que a vítima completaria 70 anos de idade.

Para o juiz Alberto Republicano de Macedo, o profundo sofrimento com a perda de um ente familiar é suficiente para justificar a compensação por dano moral. "Torna-se evidente a existência do nexo de causalidade entre o acidente ocorrido no curso do contrato de transporte e o dano advindo do mesmo, com a perda inesperada e trágica do ente familiar, tendo sido violada a cláusula de incolumidade inerente aos contratos de transporte de pessoas", destacou.

O magistrado ainda ressalta a natureza objetiva da responsabilidade da empresa ré. "O evento em si poderia até ser considerado evento imprevisível, mas o acidente nunca poderia ser considerado inevitável. Note-se que a atividade fim da ré é, justamente, promover o transporte aéreo de seus passageiros e, para isso, deve possuir aeronaves que trafeguem em condições normais, mas também que seja capaz de suportar eventuais intempéries", completou.

  • Confira abaixo a íntegra da sentença :

______________

COMARCA DE NITERÓI JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CÍVEL DA REGIÃO OCEÂNICA

Processo nº 2009.212.006920-3

Ação: Indenização

Autores: Osvaldo Bulos Seba, Laís Clarkson Seba, Yolanda Bulos Seba e Nicia Beatriz Kuhnert Clarkson

Ré: Societé Air France

SENTENÇA

I - RELATÓRIO

Trata-se de ação de reparação de danos materiais e morais proposta por Osvaldo Bulos Seba, Laís Clarkson Seba, Yolanda Bulos Seba e Nicia Beatriz Kuhnert Clarkson em face de Société Air France alegando, em síntese, que: 1) no dia 31/05/09, Luciana Clarkson Seba, com 31 anos de idade, filha e neta dos autores, seu marido Paulo Valle Mesquita Valle, com 33 anos, e seus pais Maria de Fátima e Francisco Eudes Mesquita Valle, desapareceram juntamente com outras 224 vítimas do acidente envolvendo uma aeronave que realizava o vôo AF 447 (Rio-Paris) da empresa Société Air France; 2) tal acidente, que culminou com o desaparecimento em meio ao atlântico no último dia 31, foi, e ainda está sendo, amplamente divulgado pela imprensa e a notoriedade do acidente é demonstrada por meio da juntada dos periódicos acostados aos autos; 3) alguns corpos, do total de 228 passageiros e tripulantes da aeronave, foram localizados, não se podendo afirmar a existência, dentre estes, dos corpos de Luciana, Paulo, Maria de Fátima e Francisco; 4) as vítimas encontram-se insepultas, vez que, ao que tudo indica, seus corpos estão no interior da soçobrada aeronave que jaz no fundo do oceano; 5) é cabal a comprovação das presenças dos desaparecidos naquela aeronave, consoante a farta documentação acostada, em especial o último comunicado o qual estampa os nomes das vítimas, estando, dentre estas, a pranteada filha e neta dos autores, seu marido e seus pais; 6) já decorridos 38 dias do evento poucos foram os corpos encontrados e, todos, sem exceção, não são mais identificáveis visualmente tendo, inclusive, sido encerradas as buscas e 6) estes os fatos, em sua totalidade públicos e notórios, dispensando, pois, a produção de provas, nos termos do artigo 334 do Código de Processo Civil. Diante dos argumentos expendidos requereram a procedência dos pedidos com a condenação da parte ré ao pagamento das seguintes verbas: a) pensões mensais, vencidas, com base nos ganhos da vítima e sua natural possibilidade de ascensão profissional e indexadas pelo salário mínimo, a contar da data do evento e pagas nos termos da Súmula 490 do STF; b) pensões mensais vincendas calculadas nos mesmos moldes das vencidas a serem pagas pela sobrevida provável da vítima segundo a tabela do IBGE e nos termos do inciso II do artigo 948 do Código Civil; c) pagamento da diferença entre a pensão mensal paga pela previdência social e o valor a que teriam direito em razão do limite imposto pelo Decreto 6.765/09; d) 13º salário, gratificação de 1/3 de férias e FGTS; e) devolução do valor das despesas efetivadas para a realização da viagem (passagens, traslados, hospedagens, etc); f) dano moral em valor a ser fixado por este Juízo; g) reembolso de todas as despesas pagas até o momento, mais pagamento das que forem despendidas no curso do processo; h) tratamento psicológico e/ou psiquiátrico (consultas e medicamentos); i) luto funeral e sepultura perpétua (para o caso de localização dos corpos); j) todo e qualquer seguro decorrente do evento; k) aplicação de juros e correção monetária em todas as verbas fixas que integrarem a indenização e l) constituição de um capital garantidor das prestações vincendas. Inicial e documentos às fls. 02/109. Petição da ré com documentos às fls. 114/140 pugnando pelo indeferimento do pedido de antecipação da tutela e requerendo o depósito judicial de R$48.428,00 para custeio de assistência emergencial aos familiares das vítimas. Decisão de deferimento de tutela às fls. 141/142. Petição dos autores às fls. 144 juntando a certidão de óbito de fls. 145. Embargos de Declaração interpostos pelos autores às fls. 148/152. Audiência de Conciliação realizada às fls. 157/160 quando o feito foi saneado pelo juízo. Contestação com documentos às fls. 161/419 aduzindo, em resumo, que: I) o único propósito da AIR FRANCE é demonstrar que, não obstante se solidarize com os familiares das vítimas, compartilhando do seu sofrimento, as indenizações pretendidas não podem ter seu valor fixado aleatoriamente, devendo obedecer às disposições da legislação aplicável à hipótese e também aos parâmetros e critérios já consolidados pela jurisprudência dos Tribunais Pátrios, até mesmo para que haja igualdade de tratamento dispensado aos interessados; II) necessária a conversão para o rito ordinário, ante a necessidade de dilação probatória; III) no mérito, há regulamentação da matéria pela Convenção de Montreal e pelo Regulamento Comunidade Européia nº 889/2002 do Parlamento e do Conselho Europeus, sendo que a responsabilidade civil da AIR FRANCE, no presente caso, decorre de contrato de transporte aéreo internacional e pela Convenção de Montreal, da qual o Brasil é signatário, a responsabilidade objetiva do transportador aéreo nos casos de morte ou lesão a passageiros estabelece que essa responsabilidade corresponde aos danos comprovados até 100.000 Direitos Especiais de Saque (DES), significando que caso os danos reclamados superem a marca correspondente a 100.000 DES, a responsabilização do transportador, quanto ao pagamento do valor suplementar, exige, necessariamente, a apuração de sua culpa no que diz respeito às efetivas causas do infortúnio; IV) a respeito da indenização por danos materiais deve ser destacado que somente a segunda autora, Srª Laís Clarkson Seba, foi indicada como credora do pensionamento mensal, não havendo um único documento que demonstre os valores auferidos mensalmente pela vítima, nem qualquer demonstração de que parte do dinheiro percebido era destinada ao sustento de sua genitora, razão pela qual o arbitramento da indenização a título de danos materiais dependerá, inicialmente, da demonstração de dependência econômica da Srª Laís Clarkson Seba em relação à sua filha e, provada a dependência, deverá ser observada a proporção de 1/3 do salário líquido mensal da vítima no momento do acidente (que deverá, também, ser devidamente comprovado), até que completasse 65 anos de idade, não devendo ser consideradas participações nos resultados, promoções ou evoluções salariais, tampouco benefícios exclusivos do trabalhador; V) a respeito da indenização por danos morais e custeio de tratamento psicológico/psiquiátrico deve ser esclarecido que muito embora não se negue a dor e o sofrimento suportado pelos autores, é imprescindível manter em mente que, em se tratando de indenização por danos morais, a fixação do quantum deve ser feita do modo mais razoável possível, a fim de que não sirva como fonte de enriquecimento sem causa, devendo o quantum indenizatório arbitrado em favor dos autores ser fixado também se levando em consideração a relação existente entre cada um deles e a vítima, motivo pelo qual a verba concedida aos pais da vítima não poderá, por exemplo, ser idêntica àquela fixada em favor das avós; VI) no que diz respeito ao custeio do tratamento psicológico/psiquiátrico dos autores, é preciso observar, em primeiro lugar, que não há amparo legal que o suporte, já que a tristeza e o luto serão reparáveis quando da fixação de indenização por danos morais e, por enquanto, o único aspecto que é possível adiantar é que os familiares das vítimas, inevitavelmente, ultrapassarão um período de tristeza, reação psicológica que não significa patologia e para a qual tratamentos psiquiátricos ou psicológicos são de pouco ou nenhuma valia, já que só o tempo poderá amenizar os seus efeitos. Desta forma, a ré postulou: a) que seja convertido o procedimento sumário em ordinário; b) que seja reconhecida a limitação à responsabilização objetiva imputável à AIR FRANCE, bem como a indispensabilidade da prova de sua culpa para as causas do acidente para a concessão de benefícios em patamar superior ao equivalente a 100.000 DES; c) que sejam os benefícios arbitrados em favor dos autores fixados de acordo com o que determina a legislação aplicável à matéria, e, sobretudo, com as orientações da jurisprudência sedimentada sobre o tema; d) que sejam eventuais quantias indenizatórias adiantadas no curso da demanda, corrigidas monetariamente e descontadas do valor da indenização final devida aos autores, sejam os juros de mora contados a partir da citação e correção monetária somente a partir da fixação do valor devido a título de indenização; e) em qualquer hipótese, pede a AIR FRANCE que a indenização final seja trazida a valor presente para desembolso em uma única parcela e que seja dispensada da constituição de capital requerida na petição inicial, dadas as suas notórias solvabilidade e solidez financeira. Petição da ré às fls. 421/437 noticiando a interposição de agravo de instrumento. Petição da ré às fls. 443/464 noticiando a interposição de agravo de instrumento. Petição da ré às fls. 471 juntando a tradução dos documentos que instruíram a contestação às fls. 472/704. Decisão homologatória dos honorários periciais às fls. 720. Laudo pericial às fls. 763/779. Parecer psiquiátrico forense do assistente técnico da empresa demandada às fls. 782/791. Petição da parte ré às fls. 792/793 requerendo a intimação dos autores para apresentarem prestação de constas quanto às verbas pagas pela ré em cumprimento à decisão de antecipação de tutela. Petição dos autores às fls. 796/801 acerca do laudo pericial e juntando o parecer técnico de seu assistente às fls. 802/816. Audiência de instrução e julgamento realizada às fls. 838/839 quando foi colhido o depoimento de uma testemunha, conforme termo de fls. 840/843. Alegações finais sob a forma de memoriais apresentadas pela ré às fls. 852/870 e pelos autores às fls. 871/885.

É O RELATÓRIO. PASSO A DECIDIR.

II - FUNDAMENTAÇÃO

Inicialmente, deve ser destacada a natureza da responsabilidade da ré, eis que várias normas foram invocadas pela demandada em sede de contestação. E nesse aspecto cabe trazer à colação estudo da lavra da eminente Professora e Advogada Maria Stella Gregori que afirma que 'Em vista da expansão das rotas aéreas, além dos limites territoriais dos países e, no intuito de uniformizar regras no âmbito internacional, em 1929, foi criado um regime concernente à legislação aeronáutica, através da Convenção de Varsóvia, que foi ratificada pelo Brasil, através do Decreto nº 20.704, de 24 de novembro de 1931, que estipulou o regime da responsabilidade limitada, como forma de atenuar a responsabilidade e os efeitos de indenização do transportador aéreo. Ao longo dos anos, a Convenção sofreu várias emendas, culminando na Convenção de Montreal, de 28 de maio de 1999, que a modernizou, consolidando-a em um só texto. No âmbito nacional, a responsabilidade civil pelos danos oriundos do transporte aéreo era regulada pelo Código Civil, por força do art. 84 do Decreto nº 16.983, de 1925, que aprovou o primeiro Regulamento para os Serviços Civis de Navegação Aérea. Depois, veio o Código Brasileiro do Ar de 1938 (Decreto-Lei nº 483, de 08.06.1938), sobreveio o novo Código Brasileiro do Ar de 1967 (Decreto-Lei nº 32, de 18.11.1966), culminando com o Código Brasileiro de Aeronáutica de 1986 (Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986), que possui disciplina igual à da Convenção de Varsóvia, limitando a responsabilidade. Conforme a classificação que se encaixe o serviço de transporte aéreo internacional ou nacional será regido pela Convenção de Varsóvia ou pelo Código Brasileiro de Aeronáutica, quando não se tratar de relação de consumo. Para as relações de consumo, a contratação de transporte aéreo, firmadas no Brasil será aplicado o Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990'. Desta forma, a Constituição Federal, em seu art. 21, XII, 'c', dispôs que o transporte aéreo é uma concessão de serviço público, enquanto o artigo 178 do mesmo diploma legal diz que lei disporá do transporte aéreo e o transporte internacional observará o disposto em acordos firmados pela União. A Constituição tratou da questão da responsabilidade civil do Estado, determinando expressamente em seu artigo 37, parágrafo 6º2, que a sua responsabilidade será objetiva, não cabendo argüir culpa ou dolo para ensejá-la. Tratou, também, de outra questão fundamental que é a do dano moral, além do material ou à imagem, em seu artigo 5º, incisos V e X. É, pois, imperioso reconhecer que desde o advento do CDC, o transporte aéreo, internacional ou nacional, contratado no Brasil, quando inserido numa relação de consumo é regido por ele, não se aplicando a responsabilidade do transportador aéreo contida nas legislações aeronáuticas, na presunção de culpa, mas sim a responsabilidade civil objetiva, conforme estabelecido nos artigos 6º, inciso VI, 149, 2010, 2511 e 51, inciso I, do CDC. Assim, não há de se falar em limites da responsabilidade do transportador aéreo, pois o Código de Defesa do Consumidor adota o princípio da reparação integral, na proporção do dano sofrido, não comportando limitações, indenizando os danos materiais e imateriais. Ultrapassada a questão da natureza da responsabilidade da demandada e as legislações aplicáveis à espécie, passa-se ao exame do meritum causae. No caso sob comento, como já ressaltado pela decisão de fls. 141/142, torna-se relevante consignar que os fatos narrados na presente são de inteiro conhecimento de toda população, uma vez que exaustivamente noticiados pela imprensa falada, escrita e televisiva, como também, a presença de Luciana Clarkson Seba, filha e neta dos autores, entre as vítimas do acidente aéreo envolvendo aeronave da ré o que, aliás, foi corroborado tanto pela farta prova documental acostada aos autos às fls. 36, 58, 60 3 63 como pelo atestado de presença de vôo de fls. 90, emitido pela empresa aérea. Em sendo assim, torna-se evidente a existência do nexo de causalidade entre o acidente ocorrido no curso do contrato de transporte e o dano advindo do mesmo, com a perda inesperada e trágica do ente familiar, tendo sido violada a cláusula de incolumidade inerente aos contratos de transporte de pessoas. Não há nos autos qualquer indício de prova quanto a eventual incidência de uma das causas de exclusão de responsabilidade da demandada, sendo certo que a tese defensiva exposta na contestação se limita a invocar ausência de culpa pelo evento, o que já foi exaustivamente apreciado pelo juízo na presente decisão que reconheceu a natureza objetiva da responsabilidade da parte ré. Note-se que a demandada sequer alegou a incidência de eventual excludente de sua responsabilidade a ainda que tivesse alegado melhor sorte não lhe socorreria. Isso porque não obstante a parte final do artigo 734 do Código Civil estabelecer que a força maior é excludente da responsabilidade do transportador de pessoas, é certo que não houve a incidência de tal excludente no dia dos fatos. Com efeito, o parágrafo único do artigo 393, do Código Civil, dispõe que 'O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir'. Pela lição acima transcrita, estaremos em face do caso fortuito quando se tratar de evento imprevisível e, por isso, inevitável. O evento em si poderia até ser considerado evento imprevisível, mas o acidente nunca poderia ser considerado inevitável. Note-se que a atividade fim da ré é, justamente, promover o transporte aéreo de seus passageiros e, para isso, deve possuir aeronaves que trafeguem em condições normais, mas também que seja capaz de suportar eventuais intempéries. Entendimento contrário ensejaria o reconhecimento de que se um catamarã que faz a travessia Rio x Niterói enfrentar uma séria tempestade na Baia de Guanabara, desconhecida até então para aquela rota, e viesse a naufragar teria ocorrido o caso fortuito ou força maior. Não há, pois, qualquer possibilidade de reconhecimento da força maior ou caso fortuito, conforme destacado. Ainda que assim não fosse, a maioria esmagadora das reportagens e dos noticiários acerca do acidente traz a informação de que o infortúnio teria decorrido de falha dos tubos pitots da aeronave que servem, no linguajar leigo, para medir a velocidade do ar no exterior do avião e são essenciais para que a aeronave voe em situação controlada e ideal. Desta forma, resta ao juízo apreciar as verbas indenizáveis devidas pela ré. No que tange aos danos morais, os mesmos decorrem in re ipsa, ou seja, exsurgem diretamente da perda do ente familiar próximo. A ocorrência de dor moral em razão da morte prematura de filha e neta, de forma a causar tristeza e profundo sofrimento com a perda do ente familiar, é suficiente para justificar a compensação pelo dano moral, conforme entendimento já sedimentado na jurisprudência do nosso Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, valendo transcrever o acórdão a seguir: 'Discussão acerca da mecânica do fato, de suas conseqüências e do nexo de causalidade, que não foram contestadas, inexistindo qualquer situação capaz de eximir a responsabilidade da ré. Admissibilidade de que irmãos possuam legitimidade para postular reparação por dano moral decorrente da morte de irmão. Indenização por dano moral de natureza extrapatrimonial e origem, em caso de morte, na dor, no sofrimento e no trauma dos familiares próximos das vítimas, sendo irrelevante a dependência econômica da vítima. Desnecessidade da demonstração de tais danos, que se presume, por se tratar de menor de tenra idade, que vivia sob o mesmo teto do de cujus. Inexistência de solidariedade entre os parentes, sendo desinfluente que os pais da vítima já tenham sido ressarcidos em razão da perda do filho. Dano moral in re ipsa'. (Apelação Cível nº 49537/2006; Rel. Des. Ismenio Pereira de Castro; 7a. Câmara Cível; j. 07.11.2006). Não há critério rígido para a fixação do dano moral, razão pela qual a doutrina e a jurisprudência são uniformes no sentido de deixar ao prudente arbítrio do Magistrado a decisão em cada caso, observando-se a gravidade do dano, a sua repercussão, as condições sociais e econômicas do ofendido, o grau de culpa e a notoriedade do lesado, além de revestir-se do caráter punitivo, para que o seu ofensor não mais pratique o mesmo ato lesivo sem, contudo, dar ensejo ao enriquecimento ilícito. Cabe, pois, ao Julgador no caso concreto, valendo-se dos poderes que lhe são conferidos nos artigos 125 e seguintes do Código de Processo Civil e diante dos elementos destacados acima, fixar o quantum compensatório, proporcionando à vítima satisfação na justa medida do abalo sofrido. Em sendo assim, seguindo-se a trilha da lógica do razoável e o fato de que a morte de Luciana Seba afrontou os caminhos naturais da vida, onde os pais e avós se vão antes dos filhos e netos, o que aumenta sobremaneira a dor daqueles que aqui ficaram, somado ao fato de que a ré em momento algum buscou apresentar reais esclarecimento acerca do ocorrido, o que aumenta a dor o e sofrimento dos familiares, entendo por bem fixar a verba compensatória pelo dano moral experimentado em quantia equivalente a 1.000 salários mínimos para cada um dos dois primeiros autores - pais da vítima - e 200 salários mínimos para cada uma das demais autoras - avós da vítima (fls. 91), entendendo que caracteriza a justa compensação e acompanha outras diversas decisões já proferidas acerca do caso sob comento. Quanto ao pedido de pensionamento, verifica-se da leitura da inicial que o mesmo foi formulado apenas em favor da segunda autora (fls. 14) que estaria recebendo ajuda financeira da vítima. A prova oral colhida às fls. 840/843 se revelou firme no sentido de atestar que a vítima realmente ajudava sua mãe no custeio de suas despesas. Tal prova se apresentava extremamente relevante, porquanto a vítima não mais residia com sua genitora e estava morando na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro. E nesse sentido a testemunha Rosemery de Almeida Pontes Perorazio Tavares auxiliou o juízo a se convencer da verossimilhança das alegações autorais ao afirmar expressamente às fls. 841 que: '... Luciana ajudava financeiramente sua mãe porque esta possui uma deficiência visual, cuidado que redobrou após Luciana se casar e mudar para a Barra da Tijuca; que Luciana ajudava sua mãe permanentemente...' Desta forma, torna-se imperioso reconhecer que a ré deve pagar à segunda autora pensionamento correspondente a 1/3 dos ganhos da vítima quando de seu falecimento, quantia que se considera adequada para que a vítima pudesse se manter e à sua família, ou seja, com os outros 2/3 de seus rendimentos, o que também acompanha a sedimentada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Sobre tais verbas deverão ser acrescidas as férias e o 13º salário, por serem direitos constitucionais de todo trabalhador. Por outro lado, não se pode fixar o pensionamento em supostos valores que a vítima receberia posteriormente em sua carreira profissional por ser mera tentativa de 'futurologia'. A prova testemunhal trouxe a informação de que a vítima Luciana percebia mensalmente não mais de R$15.000,00, devendo ser utilizada tal quantia como base para a fixação do pensionamento devido pela ré à segunda autora, limitada a idade de sobrevida provável da vítima que ora fixo em 70 anos com base na última tabela divulgada pelo IBGE. No tocante ao pedido de custeio do tratamento psicológico dos autores em decorrência do infortúnio, deve ser levado em conta e apreciação o laudo pericial do Ilustre Perito do Juízo de fls. 763/779 que atestou às fls. 766 que o primeiro autor apresenta quadro compatível com estado de estresse pós traumático, concluindo pelo mesmo quadro com relação à segunda autora (fls. 769). Já com relação à terceira autora o expert afirmou às fls. 742 que a mesma apresenta um quadro compatível com um episódio depressivo reativo moderado e com relação à quarta autora (fls. 745) que a mesma apresenta quadro compatível com transtorno depressivo moderado. Tais conclusões levam imperiosamente o juízo a reconhecer que o tratamento médico-psiquiátrico-psicoterápico que vinha custeado pela ré aos autores por força da decisão que antecipou os efeitos realmente deveria ser concedido aos demandantes. Entretanto, os referidos tratamentos não podem subsistir. Isso porque o perito do juízo afirmou peremptoriamente às fls. 778 que o primeiro autor necessitaria de tratamento por aproximadamente um ano e mio, a segunda autora pelo período de um ano, a terceira autora por período indeterminado e a quarta autora pelo período aproximado de seis meses. Não obstante o expert ter ressalvado que tais períodos deveriam ser objeto de reavaliação, é certo que não pode o juízo obrigar a ré a custear ad aeternum tratamentos para cura do trauma pela perda da filha e neta. A douta Juíza Simone Ramalho Novaes, a quem rendo minhas profundas homenagens, destacou em sentença acerca do mesmo tema debatido na presente, uma manifestação da Dra. Catarina Riviero, Psicóloga e Terapeuta Familiar que, descrevendo sobre 'Luto - Lidar com a Dor do Adeus', assim se manifestou: 'A morte de alguém que nos é querido traz uma dor profunda e cada um de nós reage e vive esta dor de um modo e num tempo específicos. Lidar com a perda e adaptarmo-nos a uma ausência é o que se chama o processo de luto. Considerando a proposta de Kübler-Ross, no processo de luto passamos por uma fase inicial de negação em que de algum modo continuamos a aguardar um telefonema e cuidamos dos seus bens ('Não é verdade! Não pode ter acontecido¿'), não raras vezes passamos por um período de raiva e revolta com a situação ('porquê a mim?! Porque levaram esta pessoa que me é tão querida?!'). Outra fase considerada pela autora é a negociação, em que tendemos a fazer promessas de nos tornarmos 'melhores pessoas' se nos derem de volta a pessoa (ou situação) perdida. Geralmente passamos para a fase de depressão em que vivenciamos a tristeza - esta pode ser reactiva e passageira ou pode tomar proporções de maior gravidade. Um 'luto normal' pode levar até cerca de 2 anos e termina na fase da aceitação, em que conseguimos voltar a criar laços e a dedicar-nos à Vida, lembrando-nos de quem partiu com tristeza, mas sem nos devastar emocionalmente.' (grifei). Desta forma, torna-se relevante destacar que não se pode condenar o réu por presunção ou deixar de fixar o tempo remanescente do tratamento. Deve, assim, o Julgador se ater a critérios bem definidos e por isso, valendo-se do referido laudo pericial, entendo que já transcorreu tempo mais do que razoável para duração do tratamento, já que transcorridos quase 18 meses a contar do acidente. Eventual necessidade de tratamento posterior a esse prazo deverá ser custeada pelos próprios autores, pois fora da órbita natural.

III - DISPOSITIVO

Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE O PEDIDO para condenar a ré, Societé Air France, ao pagamento de compensação por danos morais no valor de R$510.000,00 para cada um dos dois primeiros autores, acrescida de juros de 1% ao mês a contar de 31.05.2009, data do evento, por ser a relação extracontratual, e correção monetária a contar desta data, bem como ao pagamento da quantia de R$102.000,00 para cada uma da terceira e quarta autoras, a contar de 31.05.2009, data do evento, por ser a relação extracontratual, e correção monetária a contar desta data. Condeno, ainda, a parte ré ao pagamento de pensão à segunda autora no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), devidos desde a data do óbito e até a data em que a vítima completaria 70 anos de idade ou em caso de falecimento da alimentanda, situação em que cessará o pensionamento, devendo tal verba recair sobre férias e o 13º salário, por serem direitos constitucionais de todo trabalhador. A pensão deverá ser reajustada toda vez que houver aumento do valor do salário mínimo e pelo mesmo índice percentual. Torno definitiva a decisão de fls. 141/142, cujos efeitos faço cessar nesta data. Condeno a ré, também, ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da condenação, inclusive sobre 12 parcelas vincendas do pensionamento. Considerando que dentre as proposições para a Reforma do Código de Processo Civil está a que estabelece que 'O cumprimento da sentença por quantia certa é auto-executável, dispensando a intimação do executado após o transcurso do prazo referido no art. 475-J, incidindo os consectários referidos transcorrido o prazo legal, após o trânsito em julgado da decisão', mantenho meu posicionamento anterior, razão pela qual, acompanhando a melhor orientação do egrégio Superior Tribunal de Justiça (precedente: REsp. nº 954.859-RS - Min. Humberto Gomes de Barros - 3ª Turma - j. 16.08.2007; p. 27.08.2007), fica desde já intimado o vencido de que deverá cumprir a obrigação espontaneamente no prazo de 15 dias a contar do trânsito em julgado, independentemente de nova intimação, sob pena de incidência da multa prevista no artigo 475-J, do CPC. Faculto à parte ré a constituição de capital garantidor, com a indicação de bem ou depósito em caderneta de poupança do valor integral ou, ainda, inclusão da segunda autora em folha de pagamento. Outrossim, JULGO IMPROCEDENTES OS DEMAIS PEDIDOS. P.R.I. Com o trânsito em julgado, o cumprimento das obrigações ora impostas e certificado o integral recolhimento das custas, dê-se baixa e arquivem-se.

Niterói, 14 de dezembro de 2010.

ALBERTO REPUBLICANO DE MACEDO JR.

Juiz de Direito

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