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STF - Peluso defende conciliação como alternativa para a solução de conflitos

Ao abrir o Seminário sobre Mediação e Conciliação de Conflitos Judiciais ontem, 28, em SP, o presidente do STF e do CNJ, ministro Cezar Peluso, afirmou que a noção de acesso à Justiça já não pode limitar-se ao ingresso no sistema oficial da chamada solução adjudicada de conflitos, ou seja, o Poder Judiciário.

Da Redação

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Atualizado às 08:37


Discurso

STF - Peluso defende conciliação como alternativa para a solução de conflitos

Ao abrir o Seminário sobre Mediação e Conciliação de Conflitos Judiciais ontem, 28, em SP, o presidente do STF e do CNJ, ministro Cezar Peluso, afirmou que a noção de acesso à Justiça já não pode limitar-se ao ingresso no sistema oficial da chamada solução adjudicada de conflitos, ou seja, o Poder Judiciário.

De acordo com ele, esse acesso deve significar, para o interessado, a possibilidade de estar diante do juiz, de dialogar com ele e apresentar diretamente os seus argumentos e, com isso, propiciar uma maior integração das partes na solução dos conflitos. "Em outras palavras, é preciso difundir a cultura da conciliação e torná-la, como via alternativa ao jurisdicionado, um instrumento à disposição do Poder Judiciário na indelegável tarefa substantiva de pacificador social", disse.

Nesse sentido, Peluso ressaltou a importância da realização do seminário, que ocorre no auditório da FAAP. "Tenho certeza de que esse evento reforçará minha convicção de que esses mecanismos consensuais de solução de conflitos constituem missão que deve ser conhecida por todos aqueles que se preocupam com o futuro do Poder Judiciário e da democracia do século 21", afirmou.

Judicialização

Ao dar início aos trabalhos do seminário, o ministro destacou que as sociedades contemporâneas compartilham a experiência da expansão crescente da judicialização dos conflitos.

"Em todos os continentes desse nosso mundo, cada vez mais globalizado, tribunais e juízes, independentemente da sua história, tradição jurídica e sistemas normativos particulares, enfrentam no dia a dia, sem perspectiva de resposta pronta e eficiente, um número cada vez mais expansivo de novos processos e ações judiciais", ressaltou o presidente ao lembrar que esse fenômeno enseja duas leituras distintas, sendo uma positiva, pois demonstra a confiança dos cidadãos na Justiça como uma instituição pacificadora de conflitos sociais, e outra negativa, uma vez que o grande volume de processos ameaça a eficácia do funcionamento dessa mesma Justiça e pode levar, a longo prazo, a uma perigosa desconfiança em relação ao Poder Judiciário e, consequentemente, ao próprio Estado de Direito.

Prioridades da gestão

O ministro Peluso lembrou que em seu discurso de posse como presidente do STF e do CNJ, há pouco mais de um ano, assumiu como uma das prioridades de sua gestão a valorização da missão básica da magistratura e do Poder Judiciário. "Ou seja, a defesa dos direitos do cidadão e destinatário último de qualquer prestação jurisdicional digna desse nome. Esse objetivo tem sido perseguido por meio de duas vertentes complementares: a ampliação do acesso da maioria da população brasileira à Justiça e o combate à morosidade dos processos da minoria que hoje recorre ao Judiciário para a solução de conflitos".

Lembrou ainda que a conciliação tem merecido sua atenção ao longo de toda a carreira, pois desde quando assumiu a função de juiz titular da 7ª vara de Família e Sucessões de SP defende, entre outras medidas, a transformação dos métodos alternativos de resolução de conflitos em instrumentos de atuação específica do Poder Judiciário.

"Com esse propósito, integrei grupos de magistrados, psicólogos, psicanalistas, assistentes sociais e advogados, que, a exemplo de experiências levadas a cabo em outros países, deu os primeiros passos na tentativa de criar, sobretudo no âmbito do Judiciário paulista, uma cultura do transcendente valor do uso rotineiro desses métodos de pacificação social", recordou.

Na opinião do ministro Peluso, os mecanismos de mediação e conciliação precisam ser integrados ao trabalho diário dos magistrados como canais alternativos de exercício da função jurisdicional, concebido nos seus mais elevados termos, e não podem ser encarados como ferramentas estranhas à atividade jurisdicional e, muito menos, como atividade profissional subalterna.

"Os magistrados devem entender que conciliar é tarefa tão ou mais essencial e nobre que dirigir processos ou expedir sentenças. É imperioso que o Judiciário coloque à disposição da sociedade outros modos de resolução de disputas além do meio tradicional de produção de sentenças, muitas vezes lento e custoso sob o ponto de vista material e psicológico, e quase sempre de resultados nulos do plano das lides sociológicas subjacentes às lides processuais", defendeu.

Acrescentou também que parece frutífero tentar resolver os conflitos de um modo pacífico mediante consciências que nascem do diálogo e das disposições dos próprios interessados, sujeitos e senhores das disputas.

Resolução 125/11

Foi com base nessa visão do problema, de acordo com Peluso, que o CNJ aprovou no ano passado a resolução 125 (clique aqui), que criou as bases de implantação de uma política nacional de conciliação. São basicamente dois objetivos a serem perseguidos. Em primeiro lugar firmar entre os profissionais do Direito entendimento de que para os agentes sociais é mais importante prevenir e chegar a uma solução rápida para os litígios do que ter de recorrer sempre ao Judiciário, cada vez mais sobrecarregado pelo excesso de processos.

Em segundo lugar, oferecer instrumentos de apoio aos tribunais para instalação de núcleos de mediação e conciliação que, certamente, terão forte impacto sobre a quantidade excessiva de processos apresentados àquelas Cortes.

Para Peluso, esses núcleos devem funcionar como centros para atender cidadãos que buscam as soluções de seus conflitos dirigindo-os para a conciliação e mediação pré-processuais ou em processos já iniciados e, até mesmo, conduzindo-os ao órgão competente se a questão estiver fora da atribuição dos centros ou da própria Justiça da qual façam parte. Para isso, os núcleos deverão ser como órgãos administrativos dos tribunais com a função de supervisão das atividades relacionadas aos métodos consensuais de solução de conflitos.

Programação

No seminário, que termina hoje, magistrados, conselheiros do CNJ, acadêmicos e representantes de diversas entidades vão discutir práticas para a conciliação e mediação de conflitos com o objetivo de estruturar uma política judiciária nacional de pacificação.

Veja abaixo a íntegra do discurso do ministro Cezar Peluso.

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PRONUNCIAMENTO DO MINISTRO CEZAR PELUSO NA ABERTURA DO SEMINÁRIO "MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO"

As sociedades contemporâneas compartilham a experiência da expansão crescente da judicialização dos conflitos. Em todos os continentes do nosso mundo cada vez mais globalizado, tribunais e juízes, independentemente de sua história, tradição jurídica e sistemas normativos particulares, enfrentam, no dia-a-dia, sem perspectiva de resposta pronta e eficiente, um número explosivo de novos processos e ações judiciais.

O fenômeno enseja duas leituras distintas, só aparentemente contraditórias. De um viés positivo, demonstra a confiança dos cidadãos na Justiça como instituição pacificadora dos conflitos sociais.

De um viés negativo, o grande volume de processos ameaça o eficaz funcionamento da Justiça e pode levar, no longo prazo, a perigosa desconfiança em relação ao Poder Judiciário e, conseqüentemente, ao Estado de Direito. A questão da morosidade da Justiça constitui - ou deveria constituir - preocupação fundamental dos verdadeiros defensores da democracia.

Há pouco mais de um ano, em meu discurso de posse na presidência do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, indiquei como uma das prioridades de minha gestão a valorização da missão básica da magistratura e do Poder Judiciário: a defesa dos direitos do cidadão, destinatário último de qualquer prestação jurisdicional digna deste nome.

Esse objetivo tem sido perseguido através de duas vertentes complementares: a ampliação do acesso da maioria da população brasileira à Justiça e o combate à morosidade dos processos da minoria que hoje recorre ao Judiciário para a solução de conflitos.

A primeira dessas veredas concentra esforços de levar a Justiça a segmentos da população que não contam com a efetiva proteção da lei, como, por exemplo, a consolidação dos mutirões carcerários, o esforço de difusão da Lei da Maria da Penha de combate à violência contra mulheres e a campanha nacional contra a prática de "bullying" nas escolas.

Na outra vertente, encontram-se o levantamento dos grandes litigantes que prejudicam o funcionamento eficaz do Judiciário, os planos de investimento na gestão administrativa e na capacitação de cortes e tribunais, a proposta de emenda constitucional para modificar o sistema de recursos do Direito brasileiro - conhecida como "PEC dos Recursos" - e o programa de mediação e conciliação como formas alternativas de resolução de conflitos.

É este um tema que tem merecido minha atenção ao longo de toda a carreira. Desde quando exercia as funções de juiz titular da 7ª Vara de Família e Sucessões de São Paulo, defendo, entre outras medidas, a transformação dos métodos alternativos de resolução de conflitos em instrumentos de atuação específica do Poder Judiciário.

Com esse propósito, integrei grupo de magistrados, psicólogos, psicanalistas, assistentes sociais e advogados, que, ao inteirar-se das experiências levadas a cabo em outros países, deu os primeiros passos na tentativa de criar, sobretudo no âmbito do Judiciário paulista, uma cultura do transcendente valor do uso rotineiro desses métodos de pacificação social.

Os mecanismos de conciliação e mediação precisam ser integrados ao trabalho diário dos magistrados, como canais alternativos de exercício da função jurisdicional, concebida nos seus mais latos e elevados termos.

Não podem ser encarados como ferramentas estranhas à atividade jurisdicional e, muito menos, como atividade profissional subalterna.

Os magistrados devem entender que conciliar é tarefa tão ou mais essencial e nobre que dirigir processos ou expedir sentenças. É imperioso que o Judiciário coloque à disposição da sociedade outros modos de resolução de disputas além do meio tradicional de produção de sentenças, por vezes lento e custoso dos pontos de vista material e psicológico, e, quase sempre, de resultados nulos no plano das lides sociológicas subjacentes às lides processuais.

Para agentes sociais que legitimamente anseiam por soluções rápidas, justas e profundas do ângulo de suas raízes pré-jurídicas e da dinâmica da sociedade, parece extremamente frutífero tentar resolver os conflitos de modo pacífico, mediante consensos que nasçam do diálogo e das disposições dos próprios interessados, sujeitos e senhores das disputas.

Com base nessa visão do problema, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, em 29 de novembro de 2010, a Resolução n. 125, que criou as base da implantação de uma "Política Nacional de Conciliação".

O programa conta com dois objetivos básicos.

Em primeiro lugar, firmar, entre os profissionais do direito, o entendimento de que, para os agentes sociais, é mais importante prevenir e chegar a uma solução rápida para os litígios do que ter que recorrer, sempre, a um Judiciário cada vez mais sobrecarregado, ou de perpetuar nele, de certo modo, reflexos processuais de desavenças que tendem a multiplicar-se, senão a frustrar expectativas legítimas.

Em segundo lugar, oferecer instrumentos de apoio aos tribunais para a instalação de núcleos de conciliação e mediação, que certamente terão forte impacto sobre a quantidade excessiva de processos apresentados àquelas cortes.

A Resolução nº 125 estabelece a estrutura e os procedimentos para o encaminhamento das partes para a conciliação ou a mediação.

Daí a previsão da criação dos "CENTROS", que possam atender aos cidadãos que busquem solução de seus conflitos, dirigindo-os para a conciliação ou mediação pré-processuais, para a conciliação ou mediação em processos já iniciados, ou apenas conduzindo-os ao órgão competente, se a questão estiver fora das atribuições dos "CENTROS" ou da própria Justiça da qual estes façam parte.

Os "NÚCLEOS", órgãos administrativos dos tribunais com a função de supervisão das atividades relacionadas aos métodos consensuais de solução de conflitos, são, na concepção que inspirou a Resolução nº 125, a fonte da qual irradiam as diretrizes e as políticas locais para o tratamento da demanda, observada sempre a política nacional, calcada, em última análise, na garantia de acesso à Justiça.

A noção de acesso à Justiça já não pode limitar-se ao ingresso no sistema oficial de solução adjudicada de conflitos. O acesso deve significar, para o interessado, a possibilidade de estar diante do juiz, de dialogar com ele e influenciar sua decisão, apresentando-lhe diretamente os argumentos.

Essa maior integração das partes na solução dos conflitos, guiada, sobretudo, pelo princípio da oralidade, não teria sentido se não lhes fosse dada a oportunidade de engendrar ou conceber sua própria decisão, compondo por si mesmas o litígio.

Em outras palavras, é preciso difundir a cultura da conciliação e torná-la, como via alternativa aos jurisdicionados, um instrumento à disposição do Poder Judiciário na indelegável tarefa substantiva de pacificador social.

Daí a importância deste seminário e do livro que estamos lançando.

Agradeço a colaboração de todos os que estiveram envolvidos neste projeto, principalmente a Conselheira Morgana Richa, nossos convidados estrangeiros e velhos amigos e companheiros de luta por uma Justiça mais eficiente.

Tenho a certeza de este evento reforçará minha convicção de que os mecanismos consensuais de solução de conflitos constituem lição que merece ser conhecida por todos aqueles que se preocupam com o futuro do Poder Judiciário e da democracia no século 21.

Desejo a todos um bom trabalho. Muito obrigado.

FAAP, 28 de junho de 2011.

 

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Foto : STF
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