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Certidão

Junta Comercial do Estado do PR não deve exigir das indústrias certidão negativa de débito para o arquivamento de atos

JF de Curitiba/PR proibiu a Junta Comercial do Estado de exigir das indústrias certidão negativa de débito para o arquivamento de atos.

Da Redação

quarta-feira, 7 de março de 2012

Atualizado em 6 de março de 2012 15:47

Certidão

Junta Comercial não pode exigir certidão negativa de débito para arquivamento de atos

A JF de Curitiba/PR proibiu a Junta Comercial do Estado de exigir das indústrias certidão negativa de débito para o arquivamento de atos, conforme dispõe a lei estadual 16.828/11.

O juiz Federal Nicolau Konkel Junior entendeu que a exigência feita pela lei paranaense não busca atender a uma situação regional específica hábil a justificar o exercício da competência suplementar.

O argumento é que a lei do PR 16.828/11, que passou a prever a apresentação da certidão negativa, estaria contrariando a lei 8.934/94, de âmbito Federal.

Os atos de arquivamento que exigiam apresentação da certidão negativa de débito na Junta Comercial eram: alteração contratual em que haja retirada de sócios ou redução de capital de sociedades mercantis; distrato e extinção de sociedades mercantis; cancelamento de firmas individuais; instrumentos de transformação de tipo jurídico, cisão, incorporação e fusão de sociedades.

  • Processo: MS 5051425-95.2011.404.7000

Veja abaixo a íntegra da decisão.

_______

MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO Nº 5051425-95.2011.404.7000/PR
IMPETRANTE : FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESTADO DO PARANÁ
ADVOGADO : Tiago Ruppel
IMPETRADO : JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DO PARANÁ
: Presidente de Junta - JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DO PARANÁ - Curitiba
MPF : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

SENTENÇA

I - Relatório

Trata-se de mandado de segurança coletivo, segundo o qual se pretende a impetrante que a autoridade coatora se abstenha de exigir das indústrias associadas aos sindicatos filiados à impetrante, para efeito de registros de atos perante a JUCEPAR, certidão negativa de débito, conforme disposto na Lei Estadual nº 16.828/11, impedindo-o de aplicar aos substituídos processuais qualquer sanção de ordem política.

Narra que a Lei Estadual nº 16.828/11 impôs à Junta Comercial do Paraná que exigisse dos interessados Certidão Negativa de Débito inscrito em dívida ativa junto à Fazenda Pública Estadual, nos casos de arquivamento dos seguintes atos: a) alteração contratual em que haja retirada de sócios ou redução de capital de sociedades mercantis; b) distrato e extinção de sociedades mercantis; c) cancelamento de firmas individuais; d) instrumentos de transformação de tipo jurídico, cisão, incorporação e fusão de sociedades. No entanto, ressalta que a referida lei é ilegal e inconstitucional, por implicar violação expressa das normas contidas nos artigos 5º, II, XXXV e LV, 24, § 1º e 170, parágrafo único da Constituição Federal e no artigo 37, parágrafo único, da Lei nº. 8.934/94. Isto porque a referida matériaé de competência legislativa concorrente entre a União, Estados e o Distrito Federal, nos termos do art. 24, inciso III, da Constituição Federal, de modo que cabe à União estabelecer normas gerais sobre a matéria, cabendo aos Estados o exercício dessa competência plena se houver mora legislativa da União. Ressalta que a União já promulgou essas normas gerais em relação às Juntas Comerciais, o que fez por meio da Lei nº 8.934/94 que dispõe sobre o 'Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins e dá outras providências', constando em seu art. 37 os documentos que devem instruir os pedidos de arquivamento, sem nenhuma referência à CND, além de expressa determinação de que nenhum outro documento, que não aqueles nela definidos poderão ser exigidos das firmas individuais e empresas para efeitos de arquivamentos na Juntas Comerciais.

O pedido liminar foi defiro no evento 6, decisão esta objeto da ação de suspensão de liminar ou antecipação de tutela, que restou indeferida (evento 21).

Notificada, a autoridade impetrada prestou informações no evento 14 alegando, preliminarmente, após tecer algumas considerações acerca das atribuições e competências das Justas Comerciais, sua ilegitimidade passiva com fulcro no art. 301, X, do CPC e a escolha da via de ação inadequada, tendo em vista a impetrante não apresentar qualquer fato concreto, apenas preocupou-se em questionar os efeitos da lei, violando, assim, a Súmula nº 266 do STF. Subsidiariamente, requer que o Estado do Paraná seja intimado a participar do feito. Pugna, portanto, pela extinção do processo sem julgamento do mérito. Defende, no mérito, a revogação da decisão liminar.

O Ministério Público Federal manifestou-se pela concessão da segurança (evento 18).

É o relatório.

II - Fundamentação

Do estudo do presente processo afiguram-se ausentes razões para a alteração do entendimento esposado quando da apreciação do pedido de liminar, concluindo-se pela procedência da pretensão inaugural, nos seguintes termos.

A existência de diversos entes políticos sobre a mesma base territorial exige do Constituinte a distribuição das tarefas estatais, sendo comum a doutrina classificá-las em competências de modelo horizontal e de modelo vertical. Na primeira, a Constituição Federal fixa para cada ente federativo um rol exaustivo de competências, sem nenhuma espécie de superposição do ente federativo mais abrangente. É o que se verifica, por exemplo, em relação às competências enumeradas da União (arts. 21 e 22), as remanescentes dos Estados (art. 25, § 2º) e as de interesse local dos Municípios (art. 30, I).

No modelo vertical, por sua vez, é permitido que os diferentes entes políticos atuem sobre as mesmas matérias, como uma espécie de 'condomínio legislativo'. Obviamente que essa divisão segue um modelo racional de exercício, haja vista os riscos de invasão, com abalo evidente na segurança jurídica. Assim, ao definir a chamada competência concorrente, a Constituição Federal, em seu art. 24, permitiu que a União, os Estados e o Distrito Federal legislassem sobre a mesma matéria. Por outro lado, a fim de afastar possíveis e inevitáveis conflitos positivos legislativos, fixou regras objetivas, delimitando a atuação legislativa de cada um desses entes federados.

A competência concorrente, na forma definida pelo art. 24 da Constituição Federal compreender dois elementos: a autorização para que os entes federados disponham sobre o mesmo assunto e a primazia da União, relativamente à fixação de normas gerais.

Característica do chamado 'federalismo cooperativo', a competência concorrente permite a participação de todos os entes federados, atribuindo-se à União o estabelecimento de normas gerais e aos Estados as normas particulares ou específicas. Ainda que essa técnica atenue o evidente modelo centralizador de nossa federação, com supremacia da União, é certo que o grau de autonomia dos Estados não é tão grande, pois lhes foi reservada apenas a suplementação das normas gerais federais.

Assim, a competência dos Estados, na hipótese em que a União já editou uma norma geral, pressupõe sua observância ('fidelidade federal'), devendo o Estado agir somente quando a norma geral da União carecer de complementação para sua aplicação, atendendo às peculiaridades regionais.

Não é o caso, por óbvio, da inclusão de novas exigências para os atos de arquivamento.

Com efeito, o art. 37 da Lei nº 8.934/94 já define os documentos que instruirão os pedidos de arquivamento:

Art. 37. Instruirão obrigatoriamente os pedidos de arquivamento:

I - o instrumento original de constituição, modificação ou extinção de empresas mercantis, assinado pelo titular, pelos administradores, sócios ou seus procuradores;

II - declaração do titular ou administrador, firmada sob as penas da lei, de não estar impedido de exercer o comércio ou a administração de sociedade mercantil, em virtude de condenação criminal;

III - a ficha cadastral segundo modelo aprovado pelo DNRC;

IV - os comprovantes de pagamento dos preços dos serviços correspondentes;

V - a prova de identidade dos titulares e dos administradores da empresa mercantil.

Parágrafo único. Além dos referidos neste artigo, nenhum outro documento será exigido das firmas individuais e sociedades referidas nas alíneas a, b e d do inciso II do art. 32.

Como se vê, nessa lista taxativa não está incluída a exigência de comprovação de situação regular perante o Fisco (nem mesmo federal), não havendo espaço para o Estado do Paraná exigi-lo, em relação a seus tributos. A falta de menção quanto aos tributos federais evidencia que a regularidade fiscal não é requisito para o exercício dos atos de arquivamento, de modo que a exigência feita pela lei paranaense não busca atender a uma situação regional específica hábil a justificar o exercício da competência suplementar.

Neste sentido é a jurisprudência pacífica do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ARQUIVAMENTO. JUNTA COMERCIAL. CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITOS RELATIVOS ÀS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS E ÀS DE TERCEIROS. FINALIDADE ESPECÍFICA. DESNECESSIDADE. A única hipótese em que deve constar expressamente na certidão a finalidade do ato para o qual ela será expedida é aquela prevista no inc. II do art. 47 da Lei nº 8.212/91, que diz respeito a certidão exigida 'do proprietário, pessoa física ou jurídica, de obra de construção civil, quando de sua averbação no registro de imóveis', segundo leciona o §4º do mesmo artigo.
(APELREEX nº 2009.71.00.003727-4, 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Relatora Desembargadora Federal Maria Lúcia Luz Leiria, D.E. de 02/06/2010)

ADMINISTRATIVO. PESSOA JURÍDICA. EXIGÊNCIA DE CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITOS ESTADUAIS E DO INSS PARA REGISTRO DE ALTERAÇÃO DO CONTRATO SOCIAL E ARQUIVAMENTO NA JUNTA COMERCIAL.
Não há na Lei nº 8.934/94 ou no Decreto Federal nº 1800/96 previsão legal para a apresentação de Certidão Negativa de Débito, para fins de pedido de arquivamento de alteração contratual perante a Junta Comercial. Todavia, para efetuar o arquivamento é necessário a apresentação do Certificado de Regularidade do FGTS, conforme o art. 27, e da Lei 8.036/90. (APELREEX nº 2006.70.00.017316-6, 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Relator Desembargador Federal Fernando Quadros da Silva, D.E. de 28/04/2010)

Destarte, a concessão da segurança é medida de direito que se impõe.

III - Dispositivo

Ante o exposto, confirmo a liminar e concedo a segurança, julgando procedente o pedido nos termos do art. 269, I, do CPC, ao efeito de ordenar ao Presidente da Junta Comercial do Estado do Paraná que se abstenha de exigir das indústrias associadas aos sindicatos filiados à impetrante, para efeito de registros de atos perante a JUCEPAR, certidão negativa de débito, conforme disposto na Lei Estadual nº 16.828/11. Impedindo-o de aplicar aos substituídos processuais qualquer sanção de ordem política.

Custas pela parte impetrada. Incabíveis na espécie honorários advocatícios.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Sentença sujeita ao reexame necessário.

Curitiba, 02 de março de 2012.

Nicolau Konkel Junior

Juiz Federal