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Celebração

Os 90 anos de João Brasil Vita

Hoje a palavra de ordem é celebração, com o aniversário do advogado João Brasil Vita.

Da Redação

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Atualizado às 09:41

Hoje a palavra de ordem é celebração. O dileto amigo desta redação, advogado Jayme Vita Roso, lembra-nos das nove décadas de vida completadas hoje por seu primo, o advogado João Brasil Vita (OAB/SP 5.629).

O criminalista foi, durante mais de 30 anos, vereador da Câmara de SP. Formado pelas Arcadas (Turma de 1946), chega aos 90 anos com um currículo repleto de trabalhos nobres e a coragem em enfrentar inúmeras batalhas. Dentre essas batalhas, está o manifesto contra Getúlio Vargas, em novembro de 1943.

O então estudante da São Francisco participou da Passeata da Mordaça, em que a Polícia Especial agrediu o presidente do C.A., Hélio Mota, além de disparar as armas contra os participantes. João Brasil Vita foi ferido. Hospitalizado na Santa Casa, ficou por longos quinze dias entre a vida e a morte.

Outro desses tiros atingiu Jayme Carlos da Silva Telles, primo do Mestre Goffredo, tombando-o. O ilustre Professor conta essa história em sua essencialíssima A Folha Dobrada.

Acompanhe o relato, em que fica evidenciada a participação do criminalista João Brasil Vita.

Ao aniversariante de hoje, nossos mais sinceros parabéns, pela data e vida permeada de realizações.

__________

Em 30 de outubro de 1943, no Baile das Américas, realizado, ao fim de todos os anos, no Hotel Esplanada, Hélio Mota, presidente do Centro Acadêmico Onze de Agosto, chegou-se ao microfone e gritou: "Morra Getúlio!"

Foi um Deus nos acuda. O DOPS prendeu Hélio Mota.

Na manhã do dia seguinte, os estudantes lançaram um manifesto com 253 assinaturas, em que declararam que aprovaram o grito do Hélio. Resposta: duzentos homens da Polícia Especial invadiram o Onze; espancaram estudantes a socos, coronhadas e tacões de bota, e depredaram a sede do Centro. Muitos foram os feridos. Muitos, os presos.

Indignada e solitária, a Congregação dos Professores da Faculdade de Direito, reunida em sessão extraordinária, no dia 8 de novembro, redigiu e publicou a seguinte moção:

O que pôde a Congregação da Faculdade de Direito verificar, sem a menor sombra de dúvida, foi que a Polícia Especial do Governo do Estado, com a presença e sob a direção de seu comandante, enquanto os rapazes se entendiam com o senhor superintendente da Segurança Política e Social, apareceu de súbito, na madrugada do dia 2 do mês andante, às portas de uma das salas da Faculdade, onde tem sua sede o Centro Acadêmico Onze de Agosto, e aí, antes que se esboçasse qualquer reação (para a qual sequer houve tempo) à voz de prisão, dada pelo comandante da Polícia Especial, entraram os seus subordinados, em número de duzentos, a espancar a socos, a coronhadas, a tacões de bota, os estudantes desarmados, em reunião pacífica em sua casa, cujas portas, em carros de assalto, com carabinas e metralhadoras, soldados ameaçavam. Os feridos montam a mais de trinta. Agredidos, espancados, feridos, com sangue a escorrer, foram dezenas e dezenas de estudantes recolhidos às prisões do Estado. A velha tradição de respeito à Casa do Direito, cuja influência na formação da consciência liberal e na civilização jurídica do país é proclamada por todos, foi violada. E por quem? Acaso por desordeiros que a polícia dos países civilizados costumam filar pela gola? Não. Antes, foi a Polícia Especial que inverteu o seu papel.

E essa mesma Polícia Especial prendeu, incontinenti, três renomados mestres: os professores Waldemar Ferreira, Ernesto Leme e Soares de Melo.

Um comício é convocado para o dia 9 de novembro de 1943. A Secretaria da Segurança Pública proibiu a reunião. Os estudantes não realizaram o comício, mas fizeram uma passeata pelo centro da cidade.

Todos estavam de boca amordaçada, com lenços amarrados na nuca. Era a Passeata da Mordaça. O povo na rua aplaudiu o espantoso desfile.

Acompanhados pela multidão, os estudantes voltaram, afinal, ao Largo de São Francisco. Estrugem "pique-piques" à liberdade e à Democracia. O povo aplaude entusiasticamente.

Então, para susto de todos, os acadêmicos foram encurralados no Largo, pela polícia armada. Um tanque de guerra surgiu no Largo do Ouvidor.

Hélio Mota avança, desarmado e só, para conferenciar com o comandante do destacamento. Mas o major não quer ouvir razões. E, sedento, comanda o ataque. Os policiais investem contra o Hélio, com golpes de cassetetes e coronhadas, lançando-o ao chão. Estudantes e povo se atiram para socorrer o moço. A polícia reage com violência inaudita. Varre a bala e pancadas os dois Largos.

No Território Livre, os acadêmicos cantam o Hino Nacional.

Houve vinte e sete vítimas. Duas pessoas foram mortas a tiro: Jayme Carlos da Silva Telles, de vinte anos, meu primo, estudante em vésperas de exame vestibular; e uma pobre mulher, Domingas Coveli, de sessenta e quatro anos, que nada tinha com os acontecimentos.

Os feridos da Faculdade foram os seguintes: João Brasil Vita, Haroldo Bueno Magano, Idel Aronis, Sílvio de Campos Melo Filho, Aluísio Ferraz Pereira, Luiz Afonso Cardoso de Melo Alves Otero e Ciro Amaral Alcântara.

Quando todos estes fatos se deram, eu me encontrava no Largo de São Francisco, diante da Faculdade. Não participei da passeata. Permaneci no Largo, e estava no meio dos estudantes quando a polícia os agrediu.

Era Governador de São Paulo o doutor Fernando Costa. Consternado, ele telefonou imediatamente a meus pais, certo de que o moço fuzilado era meu irmão, então estudante da Academia.

Nessa noite, três Secretários de Estado (Abelardo Vergueiro César, Luiz de Anhaia Melo e Teotônio Monteiro de Barros) se exoneraram.

Goffredo da Silva Telles Junior, in A Folha Dobrada