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Decisão

Justiça de SC determina que plano de saúde forneça material importado para cirurgia de idoso

Plano de saúde sugeria colocação de material nacional.

Da Redação

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Atualizado às 18:04

Um homem de 68 anos teve garantida prótese importada para realização de cirurgia cardíaca em razão de sua idade e religião. A decisão é da 4ª câmara de Direito Civil do TJ/SC e mantém sentença da 4ª vara Cível de Blumenau. A ação foi ajuizada após negativa do plano de saúde em fornecer o material importado, de recomendação do médico, sob alegação da existência de similar no mercado nacional.

De acordo com os autos, o médico teria sugerido o material de empresa estrangeira em razão da idade avançada do paciente, a fim de evitar futuras rejeições. O paciente já havia se submetido, em 1998, uma cirurgia com utilização de válvula aórtica, o que poderia agravar o sofrimento no novo procedimento.

A religião seguida pelo idoso, que proíbe a transfusão de sangue, também foi utilizada como critério na indicação do médico. O especialista afirmou que a prótese nacional obrigaria a prescrição e utilização de anticoagulantes, o que não ocorreria com a estrangeira.

O plano de saúde alegou que não há dever contratual de pagar por próteses estrangeiras e apresentou parecer médico que não descarta o uso de produto nacional. Para os julgadores, as razões da indicação do aparelho estrangeiro se assentaram em idade, comodidade e religiosidade.

Para o desembargador Ronaldo Moritz Martins da Silva, relator da ação, o médico que acompanha o paciente é quem deve estabelecer o tratamento mais adequado para a sua completa recuperação, "pois somente ele tem o verdadeiro domínio e conhecimento nesse sentido".

__________

Apelação Cível n. 2011.042775-0, de Blumenau
Relator: Des. Ronaldo Moritz Martins da Silva
Apelação cível. Ação para cumprimento de obrigação de
fazer. Contrato de prestação de serviços de assistência à saúde.
Necessidade de colocação de prótese "valvar aórtica". Recusa de fornecimento de peça importada. Alegada existência de similar nacional. Cláusula contratual que prevê a cobertura do aparelho quando o procedimento estiver ligado a ato cirúrgico. Hipótese, in casu, condizente à situação dos autos. Ausência de dispositivo excludente de fornecimento do produto estrangeiro. Aplicação do artigo 47 do CDC. Interpretação da regra mais favorável ao consumidor. Precedentes desta Corte. Declaração do médico particular do postulante. Autor submetido a mesma cirurgia em 1998. Repetição do ato. Critério técnico utilizado na intervenção e idade do paciente que justificam a utilização da produto. Dever do médico que acompanha o paciente de indicar o tratamento mais adequado. Obrigação da requerida em fornecer a prótese configurada. Sentença de improcedência reformada. Inversão dos ônus sucumbenciais. Recurso provido, em parte.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2011.042775-0, da comarca de Blumenau (4ª Vara Cível), em que é apelante Moacir Luiz Tobias, e apelada UNIMED de Blumenau Cooperativa de Trabalho Médico:

A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, à unanimidade, conhecer e dar provimento, em parte, ao recurso, nos termos do voto do relator. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Victor Ferreira, com voto, e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador Luiz Fernando Boller.

Florianópolis, 26 de abril de 2012.

Ronaldo Moritz Martins da Silva
RELATOR

RELATÓRIO

Perante o Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da comarca de Blumenau, Moacir Luiz Tobias propôs "ação de obrigação de fazer " (processo n. 008.10.000797-7) em face da UNIMED Blumenau - Cooperativa de Trabalho Médico Ltda., objetivando autorização para cirurgia e implantação de valvar aórtica biológica da marca Carpentier/Magna e a condenação da ré ao pagamento de indenização por dano moral (fls. 01/12).

O pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi deferido, para a requerida permitir a operação, em 24 horas, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (fls. 56/ 62).

Citada (fls. 63 e 65), a demandada contestou (fls. 69/81), opondo resistência à pretensão do requerente.

O MM. Juiz de Direito, Dr. Emmanuel Schenkel do Amaral e Silva, prolatou a sentença de fls. 121/124, cujo dispositivo foi assim redigido:

3- Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na presente ação de obrigação de fazer c/c dano moral ajuizada por Moacir Luiz Tobias em face de Unimed de Blumenau - Cooperativa de Trabalho Médico, revogando a liminar de fls. 56-62 e determinando que o autor ressarça a requerida dos valores despendidos com a utilização da prótese valva aórtica biológica carpentier/magna, descontando-se o valor da prótese biológica similar coberta pela ré (Braile Biomédica e St. Jude, fl. 107).

Condeno o autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, esses fixados em R$ 2.000,00 (dois mil reais) nos termos do art. 20, § 4º, do CPC, suspensos em razão do deferimento dos benefícios da gratuidade judiciária (fl. 61).

P. R. I.

Inconformado, o autor apelou (fls. 129/134), alegando, em síntese, que 1) o decisum ignorou trechos essenciais da declaração do seu médico; 2) em nenhum momento exigiu a utilização de determinada prótese, apenas busca no judiciário resguardar seu direito; 3) o profissional cooperado da apelada é quem deve escolher o material utilizado e, na existência de produto nacional, requisitá-lo; 4) o especialista entendeu ser necessária prótese biológica importada, pois somente dois tipos com o perfil desejado são comercializados no Brasil (Carpentier Edwards/Magna).

Requereu o provimento do reclamo, para a reforma do decisum, a fim de obrigar a ré a fornecer o material solicitado, condenando-a ao pagamento de indenização

Intimada (fl. 137), a recorrida não apresentou contrarrazões (fls. 138).

Esse é o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo (fls. 126/128), anotando-se que o insurgente é beneficiário da gratuidade da justiça (fl. 61). Na inicial, aduziu o autor, em resumo, que 1) possui um plano de saúde contratado com a requerida para prestação de serviços médicos e hospitalares, denominado Plano Uniflex Vale; 2) em 1998 foi submetido a uma cirurgia cardíaca de correção do miocárdio; 3) em razão de estenose aórtica precisa de nova intervenção, para a troca da valvar aórtica; 4) seu médico recomendou a utilização da prótese (valvar aórtica) biológica Carpentier/Magna; 5) a Unimed negou o fornecimento da peça, com a justificativa de que previsão contratual limita o pedido, diante da existência de equipamento similar nacional; 6) a indicação do referido produto foi motivada pela "[...] idade do paciente, da qualidade e durabilidade da prótese, bem como para evitar futuras rejeições [...]" (fl. 02); 7) professa religião que proibe o recebimento de sangue, "[...] sendo este fato mais um impeditivo do uso de prótese mecânica que obriguem a prescrição e utilização de anticoagulantes [...]" (fl. 02); 8) seu médico é quem tem capacidade para decidir qual o material mais adequado para o tratamento; 9) se afigura nula a cláusula 2.1 do contrato, por ofensa ao art. 51, inciso XV e parágrafo único, do CDC; 10) merece ser indenizado pelos fatos alegados.

Em resposta (fls. 69/81), asseverou a demandada, abreviadamente, que 1) a cláusula 2.1 veda a autorização de material importado; 2) há prótese similar nacional; 3) o autor não apontou indícios de inadequação do produto brasileiro; 4) nenhuma cooperativa do 'Sistema Unimed' contempla o fornecimento de próteses importadas; 5) segue um padrão para a disponibilização de materiais, nos termas do art. 10 da Lei n. 9.656/1998; 6) não violou ou contrariou qualquer cláusula do ajuste; 7) a vedação contratual baseia-se no Código de Defesa do Consumidor, na Lei n.9.656/1998 e nas determinações da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar); 8) não está configurado o dano moral.

Mostra-se incontroverso a existência do contrato firmado para a assistência médico-hospitalar, plano Uniflex Vale, entre as partes (fls. 21/54).

Aplicável ao caso em apreço o Código de Defesa do Consumidor (Súmula 469 STJ).

A cláusula de "cobertura hospitalar"- Apartamento ou Enfermaria, item 2.0 da avença prevê que (fl. 42 e 45):

2.0 - Incluí-se nesta cobertura, os seguintes procedimentos: Cirurgia Cardíaca Prótese e Órtese Cirúrgicas (quando necessárias durante o ato cirúrgico)

Em seguida, estipula a cláusula 2.1 (fl. 42):

2.1 - As próteses cirúrgicas terão cobertura desde que fornecidas pela CONTRATADA ou por quem esta indicar.

O dispositivo previsto na cláusula quarta descreve os procedimentos excluídos (fl. 26):

4.1 - Estão excluídas da cobertura deste contrato as despesas decorrentes de:

a) consultas, tratamentos e internações realizadas antes do início da cobertura ou do cumprimento das carências previstas;

b) tratamento clínico ou cirúrgico experimental;

c) inseminação artificial;

d) Procedimentos clínicos e cirúrgicos para fins estéticos, bem como órteses para o mesmo fim;

e) Fornecimento de medicamentos importados não nacionalizados;

f) Fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar;

g) Fornecimento de próteses, órteses e seu acessórios não ligados ao ato cirúrgico;

h) Tratamentos definitivos como ilícitos ou antiéticos, assim definidos sob o aspecto médico, ou não reconhecidos pelas autoridades competentes;

i) Casos de cataclismo, guerra e comoções internas, quando declarados pela autoridade competente;

j) Transplantes, a exceção de córnea e rim;

k) Consultas domiciliares. (grifou-se)

A Lei n. 9.656/1998 repete em seu inciso VII do artigo 10 a redação da alínea g acima referida:

"É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária à internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art.12 desta Lei, exceto:

(...)

VII- fornecimento de próteses, órteses e seus acessórios não ligados ao ato cirúrgico;"

Não há, dentre os aludidos dispositivos, qualquer indicação ou menção de exclusão de prótese importada. Fica afastado o fornecimento de aparelho se ele não estiver ligado a ato cirúrgico. O procedimento versado nos autos envolve operação cardíaca, para colocação de peça, como forma de remediar o problema do requerente (fl. 15).

A cláusula 2.1 que, limita a entrega das próteses desde que fornecidas pela ré ou por quem esta indicar, não indica se o material será nacional ou importado.

O § 4º do artigo 54 do CDC estipula que as normas que impliquem limitações ao direito do consumidor devem ser redigidas de forma expressa e de fácil compreensão.

Se não há exclusão de cobertura para fornecimento do produto estrangeiro, inexiste razão para a recusa do material solicitado pela postulante.

Dessa forma, tendo em vista a inquestionável incidência do CDC, aplica-se o seu artigo 47, que assegura a interpretação das cláusulas contratuais da forma mais favorável ao consumidor.

A propósito, já se julgou neste Pretório:

1) Apelação Cível 2011.018142-1, da Capital, Des. Eládio Torret Rocha, j. em 10.11.2011:

DIREITO OBRIGACIONAL. COMINATÓRIA C/C PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. RECUSA DE FORNECIMENTO DE PRÓTESE IMPORTADA SOB ALEGAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE MATERIAL NACIONAL SIMILAR. CLÁUSULA CONTRATUAL QUE PREVÊ EXPRESSAMENTE O PROVIMENTO DE PRÓTESE LIGADA AO ATO CIRÚRGICO. NEGATIVA DA SEGURADORA QUE NÃO ENCONTRA JUSTIFICATIVA ANTE A INDICAÇÃO MÉDICA PERTINENTE.

INTERPRETAÇÃO FAVORÁVEL, ADEMAIS, AO CONSUMIDOR (ART. 47 DO CDC). VIOLAÇÃO AO PRÍNCIPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. RECURSO

DESPROVIDO.

É de sujeitar a seguradora ao fornecimento de prótese estrangeira, indicada como necessária ao ato cirúrgico a que seria submetido o segurado, dado que o plano de saúde avençado entre as partes possui cláusula contratual clara e expressamente permissiva no tocante à cobertura do material prescrito pelo médico responsável pelo tratamento. É que, como se sabe, cabe ao médico e não à empresa que gerencia o plano de saúde a escolha da terapia mais adequada à cura da doença apresentada pelo segurado.

2) Apelação Cível 2007.036031-6, da Capital/Estreito, rel. Des. Victor Ferreira, j. em 15/09/2011:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. ARTROPLASTIA. IMPLANTE DE PRÓTESE IMPORTADA. NEGATIVA DE COBERTURA PELA OPERADORA (UNIMED).[...] RECUSA DE COBERTURA. PRÁTICA ABUSIVA E INJUSTIFICADA. INTERPRETAÇÃO CONTRATUAL MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR.

AUSÊNCIA DE RESTRIÇÃO À PROCEDÊNCIA DO MATERIAL E À FAIXA ETÁRIA DO PACIENTE.

A falta de imposição legal expressa não desobriga a Operadora do que se comprometeu em contrato, beirando a má-fé a defesa de tese contrária, sob a alegação de restrição a material nacional e à faixa etária do paciente.

Uma vez prescrita a prótese de material importado, deve ser fornecida pela Operadora, sob pena de afronta à boa-fé e lealdade contratuais e à independência do médico responsável pelo tratamento.

DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

3) Apelação Cível 2010.026938-2, da Capital, rel. Des. Nelson Schaefer Martins, j. Em 30/07/2010:

AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. NEGATIVA DE COBERTURA DE PRÓTESE CIRÚRGICA IMPORTADA POR PLANO PRIVADO DE SAÚDE. REVISÃO DE ARTRODESE DE COLUNA VERTEBRAL. NECESSIDADE DE MATERIAL ESPECÍFICO. INTERPRETAÇÃO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS EM FAVOR DA CONSUMIDORA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, ARTS. 3º, § 2º, E 47. CLÁUSULA EXPRESSA QUE AUTORIZA A UTILIZAÇÃO DE MATERIAL IMPORTADO DESDE QUE INEXISTENTE SIMILAR FABRICADO NO BRASIL.

PROVA INEQUÍVOCA DA INADEQUAÇÃO DO MATERIAL DISPONIBILIZADO PARA A CIRURGIA REPARADORA DA PACIENTE. MATERIAL IMPORTADO COM CARACTERISTICAS ESPECÍFICAS. DECLARAÇÃO DO MÉDICO COOPERADO QUE ATESTA A NECESSIDADE DO USO DE MATERIAL ESTRANGEIRO.

DEMANDADA QUE NÃO COMPROVOU A EXISTÊNCIA DE MATERIAL IDÊNTICO AO SOLICITADO. RECURSO DESPROVIDO.

O demandante já foi submetido a cirurgia com utilização de valva aórtica em 1998 e conta com mais de 68 anos de idade (época do ajuizamento da ação).

Sucessivas cirurgias representariam um risco de agravar o sofrimento.

A necessidade da utilização da peça estrangeira é de extrema importância, como se pode extrair da declaração do médico do apelante, Frederico Di Giovanni, fl. 14:

Declaro para os devidos fins que o Dr. Moacir Luiz Tobias foi submetido à cirurgia cardíaca em 1998 para revascularização do miocárdio. Atualmente apresenta estenose de valva aórtica e deverá ser submetido a cirurgia cardíaca para substituir a valva aórtica.

Apresenta a idade de 68 anos e o melhor substituto valvar nesta idade é prótese valvar biológica em função de dispensar o uso de medicação anticoagulante.

Acrescenta ainda o paciente segue o credo religioso proibição de uso de sangue (testemunha de Jeová) sendo este fato mais um impeditivo para o uso de próteses mecânicas que obrigam o uso de anticoagulante.

Assim sendo recomendo o uso dos modelos valvares biológicas com maior durabilidade procurando evitar reoperações futuras. No Brasil são comercializados dois tipos de valvar com este perfil (Carpentier Edwards/Magna).

Não recomendo próteses mecânicas neste caso. (grifou-se).

O médico que acompanha o paciente é quem deve estabelecer o tratamento mais adequado para à sua completa recuperação, pois somente ele tem o verdadeiro domínio e conhecimento nesse sentido.

Deixar esse papel à operadora de saúde seria criar obstáculo ao melhor tratamento.

Colhe-se, a esse respeito, do Superior Tribunal de Justiça:

1) Resp n. 1053810/SP, Terceira Turma, Rela. Mina. Nancy Andrighi, j. em 17.12.2009

Somente ao médico que acompanha o caso é dado estabelecer qual o tratamento adequado para alcançar a cura ou amenizar os efeitos da enfermidade que acometeu o paciente; a seguradora não está habilitada, tampouco autorizada a limitar as alternativas possíveis para o restabelecimento da saúde do segurado, sob pena de colocar em risco a vida do consumidor

Mutatis mutandis:

1) STJ, Resp. 66.216-SP, Terceira Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. em 15.03.2007:

Seguro saúde. Cobertura. Câncer de pulmão. Tratamento com quimioterapia.

Cláusula abusiva.

1. O plano de saúde pode estabelecer quais doenças estão sendo cobertas, mas não que tipo de tratamento está alcançado para a respectiva cura. Se a patologia está coberta, no caso, o câncer, é inviável vedar a quimioterapia pelo simples fato de ser esta uma das alternativas possíveis para a cura da doença. A abusividade da cláusula reside exatamente nesse preciso aspecto, qual seja, não pode o paciente, em razão de cláusula limitativa, ser impedido de receber tratamento com o método mais moderno disponível no momento em que instalada a doença coberta.

2. Recurso especial conhecido e provido.

Em casos semelhantes aos dos autos, esta Corte manifestou-se:

1) Apelação Cível n. 2011.014738-8, da Capital/Estreito, rel. Des. Eládio Torret Rocha, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 22.09.2011:

DIREITO OBRIGACIONAL. PLANO DE SAÚDE. SEGURADO PORTADOR DE ESTENOSE VALVAR AÓRTICA SEVERA. NECESSIDADE DE IMPLANTE DE PRÓTESE. NEGATIVA SOB ALEGAÇÃO DE LEGÍTIMA EXCLUSÃO CONTRATUAL. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO ENTRE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. INTERPRETAÇÃO FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR (ART. 47 DO CDC). RECURSO DESPROVIDO.

1. Em tema de seguro saúde, como tem entendido o STJ e esta Corte, se o plano é concebido para atender os custos pertinentes a tratamento de determinadas doenças, o que o contrato tem de dispor é sobre quais as patologias cobertas, não sobre os tipos de tratamentos cabíveis a cada uma delas. Se assim não fosse, estar-se-ia concebendo, igualmente, que a empresa que gerencia o plano de saúde substituísse ao médico na escolha da terapia mais adequada.

2. Assim, é ilógico e atenta contra o princípio da razoabilidade, a circunstância de haver, no plano de saúde, previsão de cobertura quanto a doenças cardiológicas e respectivo tratamento e, contraditoriamente, no entanto, suceder restrição ao pagamento dos custos quanto aos materiais indicados pelo médico para o êxito do procedimento (valva aórtica biológica Carpentier Edwards).

2) Apelação Cível n. 2008.022244-2, de São Bento do Sul, rel. Des. Eládio Torret Rocha, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 08.08.2008

Diante dessas circunstâncias, a indevida resistência da Unimed em cumprir o contrato, gera, por isso mesmo, o dever de indenizar a segurada por danos morais, tanto mais porque a abusiva renitência tem o condão de aumentar a dor, o sofrimento e angústia de alguém anciã setuagenária com grave arritmia cardíaca que já vem abalada intimamente por doença tão séria e perigosa.

A ré apresentou razoável interpretação ao negar o fornecimento do material solicitado pelo médico do autor. Auditoria externa de cardiologia foi favorável apenas a prótese similar nacional. A recomendação do médico do postulante não descartou o uso de produto fabricado no nosso país. As razões da indicação do aparelho estrangeiro se assentaram em idade, comodidade e religiosidade.

Logo, não se observa conduta negligente da ré, o que afasta a prática de ilícito e, por conseguinte, a reparação por dano moral.

A propósito do tema:

1) Apelação Cível n. 2009.015521-6, da Capital, rel. o subscritor, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 12.04.2012:

APELAÇÃO CÍVEL. FORNECIMENTO DE MEDICAÇÃO PARA TRATAMENTO DE GRAVE ENFERMIDADE NEGADO[...].

A negativa de cobertura de tratamento, se amparada em interpretação fundamentada e consistente de cláusula contratual, não caracteriza, em tese, ato ilícito, afastando, assim, o dever de indenizar o alegado dano moral.

Pelo exposto, a Câmara deu provimento, em parte, ao reclamo para, confirmando o decisum que antecipou os efeitos da tutela, obrigar a requerida/apelada a fornecer o material solicitado pelo médico do autor, mostrando-se desnecessária a fixação de multa, tendo em vista que a ordem já foi atendida. Diante da sucumbência recíproca, condena-se o autor a pagar 50% das custas do processo e honorários advocatícios do Dr. Procurador da ré, os quais são arbitrados em R$ 2.000,00. Igualmente, condena-se a ré a pagar 50% das custas do processo e honorários do Dr. Advogado do autor, os quais arbitrados em R$ 2.000,00, impondo a compensação, consoante recomenda a Súmula 306 do STJ. Como o autor é beneficiário da gratuidade da justiça, suspende-se o seu desembolso, nos termos do art. 12 da Lei n. 1.060/50.

Esse é o voto.

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