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Valdemar da Costa Neto não será indenizado por reportagem da Veja

Matéria trazia narrações sobre cobranças de propinas relacionando o parlamentar.

Da Redação

sábado, 19 de janeiro de 2013

Atualizado às 08:31

O deputado Federal Valdemar da Costa Neto teve negado pedido de danos morais contra um jornalista e contra a editora Abril por reportagem publicada na revista Veja. A decisão é do juiz de Direito Raimundo Silvino da Costa Neto, da 5ª vara Cível de Brasília.

A reportagem falava sobre a existência de um esquema de superfaturamento de obras, cobrança de propina e tráfico de influência junto ao Ministério dos Transportes, com imputação da prática de crimes de corrupção passiva e peculato.

Na matéria havia narração de supostos encontros e cobranças de propina. A editora e o jornalista afirmaram que se limitaram a veicular as informações com base no que consta em investigações, atuando dentro de uma linha editorial respeitável e séria, amparada em dados concretos.

O magistrado decidiu que não há dano moral a ser reparado. "A narração dos fatos não excede o legítimo dever de informação, de modo que não ataca ou vilipendia à pessoa do autor, reproduzindo apenas as apurações. Assim a matéria se limitou a reproduzir e repassar aos leitores os acontecimentos. Se limitou àquilo que teria sido narrado pelas suas fontes, cujo sigilo é comum nesse tipo informativo. Os réus não agiram com animus ofendendi, mas sim com animus narrandi. Não se pode olvidar que os réus agiram em exercício regular dos direitos constitucionais e fundamentais de acesso à informação e de liberdade de pensamento".

  • Processo: 2011.01.1.153750-6

Veja abaixo a íntegra da decisão

_________

JUÍZO DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA CIRCUNSCRIÇÃO ESPECIAL JUDICIÁRIA DE BRASÍLIA-DF.

DISTRIBUIÇÃO N. 153750-6/11

S E N T E N Ç A

VALDEMAR DA COSTA NETO ajuizou ação de reparação por dano moral em face da EDITORA ABRIL S/A E DANIEL PEREIRA.

Dentro desse contexto, infere que na edição N. 2224, do dia 06/06/2011, a empresa de notícia ré divulgou, sob a autoria do segundo réu, uma reportagem intitulada "O Mensalão do PR", de cunho calunioso, difamatório e injurioso, com a atribuição de acusações inverídicas e ofensivas à pessoa do autor.

Continuando a sua narrativa, aduz que a reportagem afirma a existência de um esquema de superfaturamento de obras, cobrança de propina e tráfico de influência junto ao Ministério dos Transportes, com a imputação da prática dos crimes de corrupção passiva e peculato.

Por conseguinte, aduz também que a matéria está acompanhada de uma fotografia do autor com o seguinte trecho: "Os Administráveis do PR"; com a narração de supostos encontros e cobranças de propina, com relatos apresentando nítido propósito de denegrir a imagem do autor.

Em conclusão, consigna que tais fatos atingiram não apenas sua honra, mas, notadamente, a sua imagem pública e seu apreço social, causando-lhe graves danos morais, suscetíveis de reparação. Alfim, pede o arbitramento de danos morais, discorrendo acerca da legitimidade passiva e ativa, registrando que propôs queixa-crime contra os réus.

A parte ré apresentou contestação conjunta às fls. 63/84, defendendo que os réus não cometeram nenhum ilícito, tendo agido legitimamente no exercício do direito-dever de informar, segundo as disposições constitucionais.

Por conseguinte, a revista se limitou a veicular as informações com base no que consta em investigações, atuando dentro de uma linha editorial respeitável e séria, amparada em dados concretos. Ainda, sustenta a ausência de culpa, dano ou nexo de causalidade. Por fim, pugna pela improcedência dos pedidos.

Réplica às fls. 183/200, reiterando os termos propostos na exordial.

Foi realizada audiência de conciliação, restando infrutífera a composição (fl. 278).

Autos conclusos (fl. 307).

É o relatório. Decido.

Promovo o julgamento antecipado da lide, com fundamento no artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil, uma vez que é desnecessária a dilação probatória.

Presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, passo a análise do mérito.

Cuida-se de ação de reparação de danos, onde o autor requer a condenação do jornalista e da empresa de comunicação ré ao pagamento de danos morais em virtude de reportagem veiculada, a qual teria maculado a sua imagem.

Inicialmente, deve-se observar que a Lei de Impressa não será aplicado à solução da lide, pois conforme decidiu o plenário do Supremo Tribunal Federal, referida lei n. 5250/67, não foi recepcionada pelo novo ordenamento jurídico instituído com a Constituição Federal de 1988. Portanto, os seus dispositivos foram todos revogados por não haver compatibilidade material com a CF/88, em face da não recepção. Assim, eventuais excessos cometidos pela imprensa e meios de informação serão analisados à luz do que dispõe a Constituição Federal, bem como a legislação infraconstitucional, como o Código Civil.

Contudo, analisando detidamente os autos, depreende-se do conjunto probatório que não há dano moral a ser reparado.

O autor alega ofensa ao nome, honra e imagem em função da matéria publicada na edição n. 2224 da Revista Veja, ao fundamento de que tal matéria teria feito uma ligação do seu nome a um suposto esquema criminoso que estaria atuando junto ao Ministério dos Transportes.

Com efeito, segundo todos os apontamentos apurados nos autos, vê-se que a narração dos fatos não excede o legítimo dever de informação, de modo que não ataca ou vilipendia a pessoa do autor, reproduzindo apenas as apurações que vinham sendo dadas ao caso em liça, notadamente quanto à supostos pedidos de propina nos procedimentos de contratação do órgão, o que teria sido objeto de denúncia pelos próprios participantes.

Percebe-se, assim, que não há como se cercear a prerrogativa de real apuração dos fatos, até porque na hipótese haveria o eventual emprego incorreto de recursos públicos.

Também impende destacar que tais apontamentos vinham sendo amplamente divulgados pelos demais setores de informação, conforme comprovam os elementos probatórios juntados pela parte ré (fls. 128 e seguintes), de modo que a conduta apurada em nada "desbordou" da narração que se espera de um órgão de comunicação sério.

Vale igualmente registrar que tais denunciais acabaram se tornando objeto de investigação pela Polícia Federal, o que revela a preocupação em se apurar os fatos.

Assim, a matéria se limitou a reproduzir e repassar aos expectadores os acontecimentos.

Por conseguinte, da análise dos fatos narrados pelas partes, é certo que a matéria jornalística não se dirige diretamente contra a honra e imagem do autor, mas, sim, se limitou àquilo que teria sido narrado pelas suas fontes, cujo sigilo é comum nesse tipo de informativo. Desta forma, fez-se presente a mera intenção de informar, sem o propósito de ofender a seara subjetiva e pessoal do autor.

Nada há de ilegal em noticiar os fatos de interesse da própria sociedade, até porque os casos de corrupção em setores públicos são - ou pelo menos, deveriam ser - acompanhados por todos os cidadãos, devendo ser cobrada e exigida a punição aos verdadeiros responsáveis, de modo que nada foi injustificadamente inventado, posto que esses fatos se tornaram objeto de investigação.

Forçoso reconhecer, portanto, que os réus não agiram com animus ofendendi, ou seja, com intenção de denegrir a reputação e dignidade do autor, maculando sua honra, mas, sim, agiu com animus narrandi.

Nesse diapasão, não se pode olvidar que os réus agiram em exercício regular do direito, no caso os direitos constitucionais e fundamentais de acesso à informação e de liberdade de pensamento (artigo 5º, incisos IV e XIV, ambos da Carta Magna), o que, a teor do artigo 188, inciso I, do Novo Código Civil, não constitui ato ilícito absoluto ou extracontratual hábil a ensejar indenização por dano moral como pretende o autor.

Desse modo, tem entendido a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, vejamos:

DIREITOS CONSTITUCIONAL E CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. MATÉRIA JORNALÍSTICA. EXERCÍCIO DA LIBERDADE DE INFORMAÇÃO. AUSÊNCIA DE ANIMUS CALUNIANDI OU DIFAMANDI. ANIMUS NARRANDI. LIBERDADE DE MANIFESTAÇÃO. ARTIGOS 220, §1º, E 5º, INCISOS IV, X, XIII E XIV DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ART. 186 DO CÓDIGO CIVIL. A difusão pela imprensa de fatos com a mera intenção de informar e sem o propósito de ofender a honra e a dignidade dos autores não constitui ato ilícito apto a ensejar indenização, mas apenas o exercício da liberdade de informação. Se a notícia veiculada na imprensa limita-se a narrar fatos, sem o propósito de ofender o bom nome, não há qualquer ato ilícito, ao contrário, presente se faz o direito da imprensa de informar o público leitor, dando ciência do fato ocorrido. A liberdade de expressão, desde que submetida aos limites da licitude, precisa ser preservada por ser imperativo de ordem constitucional. Os fatos podem ser veiculados se traduzirem fielmente o direito de informar sobre um acontecimento, bem como alertar à população, exigir providências, trocar experiências e informações com outras pessoas, tratando-se de animus narrandi, e não caluniandi ou difamandi, o que é protegido pelos artigos 220, §1º e 5º, incisos IV, X, XIII e XIV da Constituição Federal. Nos termos do artigo 186, do Código Civil vigente, Lei Federal nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, "aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito." Apelo conhecido e não provido. (20030110292095APC, Relator ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO, 6ª Turma Cível, julgado em 21/07/2010, DJ 29/07/2010 p. 181)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. MATÉRIA VEICULADA EM REVISTA DE GRANDE CIRCULAÇÃO. FONTE DE INFORMAÇÃO. INVESTIGAÇÃO CONDUZIDA PELA POLÍCIA FEDERAL. CONTEÚDO NARRATIVO DA NOTÍCIA. RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL NÃO CARACTERIZADA. - Limitando-se o veículo de comunicação em reproduzir, em seu periódico, os fatos apurados por investigação conduzida pela Polícia Federal, denominada "Operação Navalha", sem se afastar do animus narrandi, resta descaracterizada a responsabilidade de indenizar. - Recurso improvido. Unânime. (20070111038980APC, Relator OTÁVIO AUGUSTO, 6ª Turma Cível, julgado em 02/12/2009, DJ 16/12/2009 p. 108)

Não restou, diante dos pontos cotejados no feito em estudo, demonstrado injustificável excesso, não denotando, por conseguinte, ato ilícito a ser atribuído á empresa ré.

Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos e condeno o autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), a teor do artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil.

Julgo extinto o processo, com resolução do mérito, nos moldes do artigo 269, inciso I, do referido diploma legal.

Fica o autor advertido de que, caso não cumpra, espontaneamente, a presente sentença em relação ao valor da condenação e no prazo de 15 (quinze) dias a contar do trânsito em julgado, incidirá, automaticamente, a multa legal de 10% prevista no artigo 475-J, do CPC, inserido pela Lei 11.232/05.

Após o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquivem-se os autos.

Publique-se; registre-se e intimem-se.

Brasília, 14 de janeiro de 2013.

RAIMUNDO SILVINO DA COSTA NETO
Juiz de Direito Substituto

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