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Na sociedade líquida, como se apresenta a irresponsabilidade moral da oligarquia contemporânea?

Ausentes de quaisquer retoques, mas predominando o egoísmo sem grilhão e sem empecilho, numa rivalidade ostentatória incontrolável, na sociedade líquida (Bauman) os fenômenos do superconsumo, sobretudo do supérfluo ou do descartável, provocam impactos consideráveis também ao meio ambiente.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Atualizado em 20 de maio de 2010 11:59


Na sociedade líquida, como se apresenta a irresponsabilidade moral da oligarquia contemporânea?

Jayme Vita Roso*

"Tais me parecem os políticos falsos, quando tratam como os homens sinceros: estes com a sua lisura os estimam porque não pegam bem neles os bicos e as agudezas daqueles." (Padre Manoel Bernardes)

Ausentes de quaisquer retoques, mas predominando o egoísmo sem grilhão e sem empecilho, numa rivalidade ostentatória incontrolável, na sociedade líquida (Bauman) os fenômenos do superconsumo, sobretudo do supérfluo ou do descartável, provocam impactos consideráveis também ao meio ambiente. É, corolário irremediável, que não haverá solução à crise ecológica sem levar em conta a ordem social, construída na insustentável leveza de um regime democrático hipócrita.

Esse nariz de cera surge da necessidade de se refletir sobre o comportamento ridículo dos personagens que discutem a respeito do pré-sal e de como reparti-lo, sem as inflexões sociais que deveriam precedê-lo, levando em conta o homem brasileiro. Eles cuidam da variação em tema de uma nota só paleontológica, como se tudo já estivesse ao alcance de sua mão cheia para sua aparente atitude de mão-aberta, utilizar a mão-boba. Afinal, da forma como está, o cidadão assiste a uma simulação de debate galhofeiro, presumindo que, para um resultado feliz, haverá uma festança com a mão molhada e na qual a oligarquia meterá a mão.

Para salvar o planeta, sair do capitalismo é o recurso (Hervé Kempf). Esse jornalista do Le Monde propõe sete axiomas: 1) se deixarmos a crise ecológica aprofundar-se, a civilização - com o ser humano inclusive - vai ingressar numa degradação contínua sem o poder de recuperar-se; 2) é indispensável proceder à inflexão e à inversão das tendências atuais de transformação da biosfera; 3) nada justifica que todos os povos não tenham acesso aos recursos da biosfera coletivamente; 4) para que todos os povos ingressem àqueles recursos de biosfera é de ser compulsório que alguns países - EUA, Rússia, China, Índia - levem em conta que ditos recursos não são inesgotáveis; 5) como as ditas sociedades desenvolvidas adotaram a economia libidinosa, donde serem desiguais dentro e fora de seus territórios, é preciso que exista uma forte redução de consumo material, com a contrapartida de melhoria e de barateamento de serviços coletivos, pois que beneficiam a todos; 6) a drástica redução do consumo ostentatório não vai mongolizar o comportamento da minoria egoísta e 7) o período de transição será árduo porque a oligarquia, com apoio da imprensa manipulada e até do próprio governo ou de estatais, quer seus privilégios mantidos, colocando em questão o regime democrático.

Frente a um governo que cedeu e inflexionou ao capitalismo que está no apogeu planetário com seu gigantesco, desmesurado e colossal crescimento, à custa de escandalosas inegalidades sociais, de uma economia criminalizada, das finanças suplantarem a produção de bem necessários e a mercantilização exacerbar-se pelo mundo afora, o povo brasileiro assiste, sem reagir, o que lhe enfiam pela goela, comendo pipocas em baldes, enquanto segue o Caminho das Índias, com suas fanfarronadas e gabolices.

Voltando-se ao pré-sal e ao cidadão, como o debate político vem sendo manipulado pelo Executivo e pelos governadores e pela mesquinha quão caricata oposição, é possível que forme uma cultura que condicione a visão de mundo do homem brasileiro com a criação de comportamentos culturais só voltados ao consumo exacerbado, discriminando ainda mais os com menos acesso aos bens. Biologicamente, essa cultura poderá decidir como viver e morrer dentro do sistema consumista, mesmo porque os indivíduos, sobretudo os brasileiros, com seu secular atraso, tem participação não homogênea na cultura do seu país, se é que conheçam o significado de país ou de nação.

Com a cultura onírica que está sendo disseminada em torno do pré-sal e de sua exploração e dos seus benefícios, como se fossem unívocos, a lógica dela parte da coerência de um hábito cultural e "somente pode ser analisada a partir do sistema a que pertence" (Roque de Barros Garcia). Como se entender essa cultura fragmentada que se está criando, com um debate proveniente de fonte suspeitas e integradas à economia libidinosa por personagens momescos e voltados aos seus interesses? Como pretender que exista um debate democrático, se as regras já estão catalogadas, os parceiros compraram as fichas, enquanto, ao povo, se dá pão, jogo de futebol além de outros, e muito sexo barato e vil, através da industria pornográfica e prostitucional, com geração consensual da cupidez sem pêias e insaciável?

Se a crise revelou que a corrupção medeia entre o governo e a empresa privada (Jessé Souza), a falta de um sério e bem elaborado planejamento pelo governo e a ausência de diálogo sincero com o povo, pois a parceria oposicionista PSDB-DEM é ridícula, de antemão, leva-nos a crer que o Fundo Social, que se originaria da exploração do pré-sal, resultaria em uma panacéia, Não seria melhor que as ONGS e a sociedade organizada parassem um pouco e refletissem que, para uma Universidade degradada (os conceitos 1 e 2 para 558 instituições é uma chaga vergonhosa), a reforma política vertical haveria de dar resultados compensadores, sobretudo, se o pré-sal tiver rendimento com investimentos sérios na educação, se se construíssem entradas de ferro, se se aproveitassem as vias fluviais, se se dotasse o país com leis duras, e inflexíveis e aplicadas sem temor, sem procrastinações pelo Judiciário preparado, aparelhado e interessado no país, não em cargos? Se os Ministros do STF só falassem nos autos? E, como disse Jadyr Barroso, a publicidade governamental fosse reduzida e, acrescento, garroteada. Aliás, é o que Itamar Franco ousou, custando-lhe vergonhosa campanha difamatória.

A sobrevivência humana na sociedade brasileira administrada pela corrupção, que vive em guetos apelidados de cidades, a ver deste articulista, só poderá vingar se houver cooperação para não tombarmos no despotismo bolivariano, porque o capitalismo, como está apregoado, é pútrido. Indispensável escapar dele e da sua filha bastarda - a economia do mercado. É incondicional que se taxem as riquezas que não produzam benefícios sociais. É preciso ser corajoso, mas antes honesto e com propósitos definidos. Dispensa-se a cosmética da ética empresarial e a caricatura dos políticos de plantão. Tudo dependerá com que vontade e com que presteza conseguimos disseminar a imprescindível exigência da solidariedade entre todos os brasileiros, mormente através das reformas sempre anunciadas, mas de todas, custe o sacrifício que for preciso.

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*Advogado e fundador do site Auditoria Jurídica


 



 

 

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