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O ressarcimento de prejuízos nas operações em bolsa

Luiz Eduardo Martins Ferreira, Luciana Simões Rebello Horta e Fabiano de Melo Ferreira

Visto que há informações colocadas à disposição do investidor que possibilitam total e imediato conhecimento das operações realizadas em seu nome, fica inviável o ressarcimento dos prejuízos adquiridos.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Atualizado em 3 de agosto de 2011 14:53

O ressarcimento de prejuízos nas operações em bolsa

Luiz Eduardo Martins Ferreira*

Luciana Simões Rebello Horta*

Fabiano de Melo Ferreira*

Em 14/7/2011, a 6ª Câmara de Direito Privado do TJ/SP proferiu decisão unânime, cuja ementa é a seguinte:

RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C. C. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. OPERAÇÕES EM BOLSA DE VALORES. AUTOR QUESTIONA DETERMINADAS TRANSAÇÕES QUE REDUNDARAM EM PREJUÍZOS, ALEGANDO QUE NÃO AS AUTORIZOU. FALTA DE VEROSSIMILHANÇA DA VERSÃO APRESENTADA. IRREGULARIDADES IMPUTADAS ÀS RÉS NÃO DEMONSTRADAS. ORDENS À CORRETORA QUE ERAM TRANSMITIDAS VERBALMENTE. MANTIDA A SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. RECURSO DESPROVIDO.

A íntegra desta decisão foi publicada no Migalhas do dia 22/7/2011 (clique aqui).

Com tal decisão, o TJ/SP deu importante balizamento a todos aqueles que pretendem obter, quer pela via administrativa, quer pela judicial, o ressarcimento de prejuízos que tiveram em operações realizadas na BM&FBOVESPA.

O mercado de ações, um investimento tipicamente de risco, funciona como se fosse uma maré, ora está em alta, ora está em baixa. A cada ciclo de alta, vem um de baixa, ou vice-versa.

Quando o mercado de ações apresenta um período de alta, ocorre o que podemos chamar de "círculo da felicidade perfeita": todos ganham. Quem comprou uma ação a, por exemplo, R$ 10,00, pode vendê-la no mesmo dia ou em dia posterior a preço maior. Também ganhou quem vendeu esta ação a R$ 10,00, pois, seguramente, comprou-a por menos.

Diante desse contexto, esquecem os investidores que o mercado de ações, por ser de risco, tanto pode apresentar ganho, como prejuízo, sendo que o prejuízo pode ser a perda, total ou parcial, do capital investido no caso de compra e venda de ações à vista, bem como pode ser maior ainda, caso o investidor opere nos chamados mercados derivativos (termo, futuro e opções).

Antes de iniciar suas operações com uma corretora, o investidor preenche e assina um cadastro-contrato, onde ele declara que conhece o investimento em ações e os riscos inerentes ao mesmo.

Com relação aos riscos a que está sujeito o investidor, bem como aos cuidados que deve tomar no investimento em ações, os sites da Comissão de Valores Mobiliários (CVM)1 e da BM&FBOVESPA Supervisão de Mercados (BSM)2 contém uma série de recomendações a respeito. Tais recomendações deveriam ser lidas com todo o cuidado e atenção, mas, infelizmente, na maioria das vezes não é assim que ocorre.

Quando o mercado de ações entra em um ciclo de baixa, surgindo, daí, os prejuízos, muitos investidores procuram obter o ressarcimento dos prejuízos que tiveram alegando que as ordens de compra e venda que geraram prejuízos não foram por eles autorizadas. Logo, a corretora teria agido à revelia deles e, por consequência, deve repor o prejuízo sofrido. O curioso é que ninguém reclama das operações que deram lucro, ainda que tenham sido realizadas à revelia...

Esta tentativa de reposição é feita geralmente na via administrativa, reclamando o investidor ao Mecanismo de Ressarcimento de Prejuízos administrado pela BSM, ou diretamente à CVM.

Acontece que esses dois órgãos especializados vêm rechaçando tais tentativas, sempre que fica provado que o investidor tinha conhecimento das operações realizadas em seu nome, e não as questionou de imediato. Afinal, o investidor sempre tem esta informação, pois periodicamente recebe, no endereço por ele mesmo indicado no momento de seu cadastro junto à corretora:

  1. as notas de corretagem, que indicam em detalhes as operações realizadas em nome do investidor em determinada data. Tais informativos são encaminhados pela própria corretora ao investidor, seja pelos Correios, seja por e-mail, logo após a data das respectivas operações. É através da nota de corretagem que o cliente sabe o que irá receber ou pagar à corretora, com base nas operações que realizou;
  2. os ANA1s (Aviso de Negociação de Ações), encaminhados quinzenalmente pela BM&FBOVESPA, onde são relatadas as operações que realizou em cada corretora na última quinzena. Se operou por duas corretoras diferentes, por exemplo, receberá dois ANA's;
  3. os Extratos Mensais de Custódia, enviados também pela BM&FBOVESPA, onde são discriminadas todas as movimentações realizadas em nome do investidor no mês anterior.

Além desses, o investidor tem a possibilidade de acompanhar as operações realizadas em seu nome pela internet, seja pelo Home Broker da sua corretora, seja pelo Canal Eletrônico do Investidor (CEI), um serviço disponibilizado pela BM&FBOVESPA3.

Ou seja, as informações colocadas à disposição do investidor possibilitam total e imediato conhecimento das operações realizadas em seu nome na Bolsa, ainda que eventualmente realizadas sem o seu consentimento. Diante desse quadro, a CVM e a BSM vêm manifestando em seus julgados que o fato de o investidor ter acessado as referidas informações, sem questionar de imediato as operações supostamente não autorizadas, é um claro elemento tendente a concluir que o investidor as autorizou.

Afinal, qualquer entendimento contrário configuraria um absoluto desprestígio do sistema de informações em vigor (ou seja, a disponibilização das informações mencionadas acima careceria de sentido), além de premiar a eventual negligência de investidores com o seu próprio patrimônio, ante a displicência no acompanhamento das operações realizadas em seu nome.

Esse entendimento torna-se ainda mais evidente na hipótese de investidor que, habitualmente, transmite ordens pelo telefone. Isso porque, inexistindo as gravações dos diálogos em que foram transmitidas as ordens à corretora, e inexistindo questionamento imediato do investidor com relação às operações supostamente não autorizadas, não há como considerar que o investidor as autorizou.

Do contrário, se o investidor apenas as questiona após tomar conhecimento do seu resultado, e mais, só questiona as operações que resultaram em prejuízo, é evidente que nenhum julgador se verá convencido de sua alegação.

Assim, vemos que a decisão do TJ/SP adotou a mesma posição da CVM e da BSM, contribuindo, portanto, para a segurança e a credibilidade do mercado.

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1 www.cvm.gov.br

2 www.bsm-autorregulacao.com.br

3 Mais informações em www.bmfbovespa.com.br

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*Responsáveis pela área de Mercado de Capitais do escritório Albino Advogados Associados

 

 

 

 

 

 

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