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Uma questão de qualidade

Pedro Dutra

Sobre privatizações, concessões e controle de aeroportos. "Hoje o debate se trava entre a racionalidade administrativa e o regressismo político".

quinta-feira, 1 de março de 2012

Atualizado em 29 de fevereiro de 2012 09:13

Pedro Dutra

Uma questão de qualidade

Privatizar é transferir a titularidade de empresa estatal a acionista privado. Concessão é a exploração por terceiro, empresa privada ou estatal, de serviço que a lei atribuiu à União prestar. E controle é o poder de o acionista dirigir o destino da empresa, exercido isoladamente ou em conjunto. O Executivo retirou da Infraero concessões de três aeroportos, leiloou-as, e as outorgou a empresas privadas a esse fim constituídas, das quais, todavia, a mesma Infraero detém 49% do capital e participa do controle delas. No novo modelo de concessão reponta o dirigismo estatal, redivivo em outros mercados.

O fundo autoritário de nossa cultura política, que articula o mando do Executivo na vida nacional, atraiu aos seus quadros tradicionais fração dos herdeiros do socialismo vencido, irmanados todos no exercício largo do poder. Nesse contexto singular, o dirigismo estatal, impositivo ao investidor privado e tutelar do consumidor, é identificado à defesa do interesse público, desacreditada a ação do Estado, por meio de órgãos técnicos e independentes do governo, para regular os mercados e neles reprimir o abuso do poder econômico.

Em outra perspectiva, a presidente da República quer nomear apenas técnicos para dirigir aqueles órgãos, e esse propósito surge como um facho de racionalidade na administração federal. E amparado pelos númerosda experiência: desde a privatização em 1998, foram investidos cerca de 250 bilhões de reais nas telecomunicações e, em regime de crescente de concorrência entre prestadores, o número de acessos a esses serviços pulou de 14 para mais de 140 por 100.

Hoje, o sucesso desse modelo impõe aos prestadores, todos privados, o saudável desafio de ampliar a oferta dos serviços a preços mais competitivos. De outro lado, os serviços aeroportuários, cujos usuários sequer dispõe de um call center junto à concessionária estatal deles, desvelam, dramaticamente, a situação da infraestrutura do país.

Os empedernidos defensores do dirigismo estatal deveriam indagar ao usuário desses dois serviços qual melhor os atende: o privado, sob a (reforçada) intervenção regulatória do Estado na forma da lei, ou a prestação estatizada desses serviços; em resumo: indagar aos 250 milhões de donos de celulares se eles prefeririam contar com o padrão de qualidade dos serviços aeroportuários.

Não entre partidos, hoje o debate se trava entre a racionalidade administrativa e o regressismo político.

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* Pedro Dutra é advogado do escritório Pedro Dutra Advogados

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Matéria originalmente publicada no jornal O Globo do dia 24/2/2012

 

 

 

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