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O jeitinho - Raiz do soft power brasileiro

O poder brando no Brasil não passa da institucionalização e organização do nosso famoso "jeitinho", ou manha, nada de condenável, e sim um modo mais flexível de relação entre o poder público e o interesse privado.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Atualizado em 9 de julho de 2012 13:09

No programa "Roda Viva" da última segunda-feira (2/7/2012) foi entrevistado o sociólogo Francisco de Oliveira, aposentado da USP, fundador do PT e hoje talvez o mais feroz dissidente do partido e de Lula. Certamente, o mais preparado intelectualmente dos ex-petistas. Independente e cioso de sua independência, original em suas posições, e sempre muito engraçado, adotou o ornitorrinco, este bicho estranho, misto de mamífero e ave, como a melhor metáfora das contradições brasileiras.

Autor de um livro cujo título diz tudo sobre seu horror aos maniqueísmos, "Crítica da razão dualista", e dizendo-se homem de esquerda, adota um conceito do capitalismo que seus ex-companheiros do PT devem repudiar com toda a força da ignorância. Um conceito sábio. Sustenta que a social-democracia consiste na humanização, na educação do capitalismo, o que não deixa de ser verdade, mas um conceito inadmissível para o maniqueísmo socialista, este de aceitar o capitalismo, bastando transformá-lo.

A certa altura do programa, o conhecido jornalista Ricardo Noblat, mauzinho como ele só, dirige ao entrevistado uma pergunta suavemente maliciosa. Não foi bem formulada, mas parecia indagar em que medida o famoso "jeitinho" brasileiro foi institucionalizado no Brasil, ou se não passa de folclore. Oliveira, talvez por não entender a pergunta, deixou de responder de forma clara e lúcida, como de seu estilo.

Mas a questão proposta por Noblat tem sentido. Na minha modesta opinião, o jeitinho, a manha brasileira, tende a institucionalizar-se no assim chamado soft power, conceito proposto por Joseph Nye, professor em Harvard, como a maneira de um Estado influir em outros Estados por meio da cultura, dos valores e das ideias , de forma sutil, em contraste com o hard power, mais generalizado, baseado no tamanho da população, na extensão dos recursos, na altura do PIB e do poder econômico e militar. Soft seria o poder brando, em contraponto ao hard, o poder duro.

Ocorre que já se fala no soft power brasileiro (por exemplo, Gilberto Gil, Luiz Nassif, etc.). Fernando Henrique Cardoso, em seu último livro, "A soma e o resto" , faz clara e nítida referência ao futuro promissor do soft power brasileiro, mal avaliado por políticos e intelectuais.

Pois o poder brando no Brasil não passa da institucionalização e organização do nosso famoso "jeitinho", ou manha, nada de condenável, e sim um modo mais flexível de relação entre o poder público e o interesse privado, que se generalizou como o estilo brasileiro de ser em todos os setores. Compare-se o samba, com sua malemolência, e o tango, com sua passionalidade agressiva. O samba, o carnaval, o futebol brasileiro são expressões de nosso jeitinho feito maneira de ser do povo. E a Bossa Nova? Haverá algo de mais soft que esta maneira tão suave de amar e declarar o amor? A Bossa Nova não introduz o jeitinho no modo de amar?

Outros países latino-americanos também praticam o jeitinho. Eles têm o soft, mas lhes falta o power, o poder de conquistar sugestivamente outros povos e outros Estados em escala de mercado, por assim dizer. O criador do conceito, Joseph Nye, declarou que "o Brasil exerce naturalmente o poder brando", palavras textuais. Pena que não o faça com maior alcance.

Por exemplo, o que estamos esperando para desenvolver em grande escala nosso imenso potencial turístico? Onde está a infraestrutura, hotéis, estradas, aeroportos, lazer, energia barata, segurança?

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* Gilberto de Mello Kujawski é procurador de Justiça aposentado, escritor e jornalista





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