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Apenas só

"Mais duro que estar só é não perceber a solidão roendo quieta". Confira a crônica.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Atualizado em 30 de novembro de 2012 15:13

De que adianta o circulo de áulicos, os salamaleques em derredor, o poder que engana?

De que adiantam os aplausos resultantes da mera formalidade e nem carregam a sinceridade da emoção mais verdadeira silente e omissa deixando espaços ao silencio?

De que adianta, moçoila, acreditar nas estatísticas em torno de um mundo que ninguém conhece nem ouviu falar de sério por aqui e ainda assim achares que nós, da plebe rude, te somos devedores?

Além da atmosfera, num espaço ainda sossegado num latifúndio azul celeste, circulam velozes os meteoritos e com eles aquelas pedras gigantescas e uma delas num cascudo de leve no coco da terra pode, assim num piscar de olhos, com tudo acabar.

E aí do que vai adiantar teu dinheiro de origem duvidosa, aquela cirurgia plástica que só te fez parecer mais velha, ah meu Deus que horror, do que vai adiantar tua coleção de vitórias se as coleciona sem vencer, mas tomando na marra, ludibriando, trapaceando?

Outrora cruzavas com uns dissimulados, meio encabulados, e parecias encantá-los. Uns até se deram bem. Outros não se deram mal. Investiste e perdeste. Do que adiantou?

De que adianta escaladas maiores se não consegues sobreviver sem o teu baralho, teu cigarrim e teu uisquim, tendo teus dóceis amiguins em derredor fingindo que perdem o jogo só para em troca de amaciar teu ego levarem vantagens, outras vantagens, que não diminuem em nada o teu baú?

Ah nem percebes que a cada dia mais quando convocas os teus áulicos para o teu derredor e os aumenta em quantidade, de nada adianta porque só amplias a longa avenida da tua solidão.

Mais duro que estar só é não perceber a solidão roendo quieta, comendo em silencio, multiplicando calmamente os átomos devoradores de sonhos e de amplidão.

Oh tu, moçoila orgulhosa, orgulhosa não porque tiveste em algum dia alguma razão nobre de que pudesses te orgulhar! És incansável, sim, mas no desassossegar, no transgredir, no xingamento com os nomes mais feios. Nem teu pai nem tua mãe te os ensinaram.

Mas de que adianta tu te achares a linda, a tosa, e não inspiras aos homens mais que um gesto de piedade, aquela piedade de levar cristão a velórios ou, quando muito, um soneto do Vinicius, daqueles tristes, como o que tenta decantar a solidão.

Depois foi só. O amor era mais nada

Sentiu-se pobre e triste como Jó.

Um cão veio lamber-lhe a mão na estrada

Espantado, parou. Depois foi só.

Há um tempão que eu não te via assim bem de perto. Poxa, mas como estás feia. Quem sabe se tirando essa raiva de dentro de ti talvez melhores. E ficando doce e menos infeliz até melhores.

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*Edson Vidigal é ex-presidente do STJ e professor de Direito na UFMA






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