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Discussão sobre a aplicação da lei ainda está longe do fim

O caso de Luana Piovani trouxe à tona as divergências relacionadas à aplicabilidade da lei Maria da Penha.

terça-feira, 16 de julho de 2013

Atualizado em 15 de julho de 2013 13:08

O precedente em análise é originário do midiático caso envolvendo a agressão cometida pelo ator Dado Dolabella contra sua ex-namorada, a atriz Luana Piovani. A discussão gira em torno da aplicabilidade da lei 11.340/06 ("Lei Maria da Penha") aos casos envolvendo relações de afetividade sem coabitação ou hipossuficiência e vulnerabilidade da mulher.

Segundo dispõe o art. 5º da mencionada legislação, a violência doméstica ou familiar, para fins de sua incidência, pode ocorrer: a) no âmbito da unidade doméstica (compreendido como o espaço de convívio de pessoas, mesmo sem vínculo familiar); b) no âmbito da família propriamente dita; e c) em qualquer relação íntima de afeto, no qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

Como se vê, trata-se de um conceito legal extremamente amplo, o que vem causando severas críticas da doutrina, "pois mal redigida a norma e extremamente aberta" (Nucci, 2008, p. 1.128). Nesse sentido, há alguns julgados - como o ora em análise - que adotam uma interpretação restritiva na aplicação da Lei Maria da Penha. Assim é que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ao julgar o rumoroso caso, entendeu pela não aplicação da legislação especial. Do voto condutor do acórdão - o qual faz profunda incursão no histórico de surgimento da lei - extrai-se que: a) a ratio legis sempre foi a proteção da mulher contra a violência intrafamiliar e a agressão, in casu, operou-se fora do ambiente doméstico; b) a necessária condição da "hipossuficiência" ou "vulnerabilidade" da pessoa do sexo feminino inexistiu, eis que a agredida trata-se de renomada atriz, "que nunca foi uma mulher oprimida ou subjugada aos caprichos do homem"; e c) a aplicação da Lei Maria da Penha a qualquer caso que envolva agressões a mulheres acabaria por inviabilizar os Juizados de Violência Doméstica e Familiar.

Trata-se, é certo, de entendimento minoritário na jurisprudência. Contudo, a decisão em análise não é isolada e encontra ressonância inclusive em alguns julgados recentes dos Tribunais Superiores. Menciona-se, apenas a título de exemplo, o julgamento, pelo Superior Tribunal de Justiça, do Habeas Corpus 175.816/RS, ocorrido no último dia 20 de junho. Do voto do Relator - min. Marco Aurélio Bellizze - extrai-se que a violência doméstica é uma forma específica de violência de gênero, devendo ser utilizada para a "violência conjugal (...) como sinônimo de violência contra a mulher praticada por parceiros íntimos".

Contudo, a esmagadora maioria das decisões, nos mais diversos tribunais brasileiros, segue a literalidade da lei, compreendendo como violência doméstica aquela ocorrida em qualquer relação de afeto, atual ou passada, independentemente de coabitação. É o que se infere, apenas a título exemplificativo, do julgamento do Habeas Corpus 182.411/RS e do Conflito de Competência 103.813/MG. Deste último - de relatoria do min. Jorge Mussi e no qual se discutia briga entre ex-namorados - extrai-se que "não se exige a coabitação para a configuração da violência doméstica contra a mulher".

A decisão ora em comento reacende a discussão apresentada, a qual, aparentemente, está longe do fim.

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* Alexandre Knopfholz é advogado do Escritório Professor René Dotti.


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