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"Lei da Palmada": um tapa na cara da família brasileira!

Romeu Tuma Junior

O Estado já intervém naquilo que seu filho deve ou não assistir na TV, agora busca intervir na forma de criação deles, sem contudo dar solução ou apresentar alternativas.

terça-feira, 22 de julho de 2014

Atualizado às 07:55

No último dia 27 de junho foi publicada na edição do DOU a denominada "Lei da Palmada", que após sancionada pela presidente Dilma Roussef na noite anterior, em solenidade que contou com a presença da apresentadora Xuxa Meneguel, recebeu o número lei 13.010/14.

Referido diploma legal trouxe alterações na lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA), e na lei 10.406/02 (Código Civil), decorrendo de uma emenda constitucional que tramitava desde 2010 no Congresso Nacional.

Assim, com as alterações legislativas o artigo 18 do ECA, que já dispunha acerca do ser "dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor", passou agora a definir como sendo "castigo corporal" toda "ação de natureza disciplinar ou punitiva com o uso da força física que resulte em dor ou lesão à criança ou adolescente", cominando aos "infratores" penas que vão da "advertência", passando pelo "encaminhamento a programas de proteção à família" e "orientação pedagógica".

Passemos, então, à análise das alterações legislativas mais relevantes e que, sem dúvida, trarão enorme impacto no seio familiar:

Analisemos, preliminarmente, a nova redação dada pela "Lei da Palmada" aos artigos 18 do ECA, passando então a vigorar com os seguintes dizeres:

"Art. 18 - A. A criança e o adolescente têm o direito de ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protege-los."

Dada a inexistência de definição precisa acerca do que seriam os aludidos "tratamento cruel ou degradante" ou no qual seria a natureza do propalado "castigo físico", o legislador cuidou de defini-los nos incisos I e II do mesmo dispositivo, que assim foram redigidos:

I - castigo físico: ação de natureza disciplinar ou punitiva com o uso de força física que resulte em sofrimento físico ou lesão à criança e ao adolescente;

II - tratamento cruel ou degradante: conduta ou forma cruel de tratamento que humilhe, ameace gravemente ou ridicularize a criança ou o adolescente.

Nesse passo, cumpre indagar, ficarão doravante os pais ou responsáveis pele menor à mercê da análise subjetiva do autor da denúncia ou dos Conselhos Tutelares, sempre que, de alguma forma, obstarem alguma ação reprovável do menor quando poderão, ao mesmo tempo, praticando uma ação que "humilhe" ou "ridicularize" a criança?

Quer nos parecer que é exatamente isso o que teremos daqui por diante, numa flagrante cassação de uma prerrogativa que a própria Constituição Federal assegurou à entidade familiar, antes dos demais agentes sociais, conforme se infere da leitura do artigo 227 da Carta Magna.

Ademais, a própria leitura do artigo subsequente da referida Lei, (18-B) não deixa dúvidas acerca do rol de medidas punitivas ao "infrator" caso a denúncia seja considerada procedente, conforme incisos I à V e parágrafo único que ainda abre margem para "outras providências legais".

Vejamos, portanto, o que dizem o artigo 129, incisos I, III, IV e VI desta lei (Estatuto da Criança e do Adolescente) e quais são as "outras sanções cabíveis".

Art. 129. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável: I - encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família; III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico; IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação; VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento especializado;

Numa análise preliminar, poderíamos interpretar que a intervenção estatal se daria somente ao nível do tratamento psicológico e da orientação, porém, a lei não prevê nenhum tipo de limitação nesse sentido.

Isso porque o propalado tal "programa oficial de proteção à família" não conta com uma mínima definição no texto legal acerca de qual seria sua real natureza; finalidade e alcance, distorção esta que acarretará enorme insegurança jurídica. Aliás, prática recorrente na legislação brasileira quando se refere a prever políticas ou programas de tratamento. Prevê, mas não define, não explica, não aponta recursos tampouco responsáveis.

Com efeito, pela forma como está redigida, inexiste dispositivo que impeça o estabelecimento, pelo órgão estatal, de um "programa oficial de proteção à família" cujas regras serão por ele próprio ditadas, o que dá margem para que se decrete, por exemplo, a separação compulsória da criança da família e sua internação em estabelecimento educacional em regime de internato, sem comunicação com os "agressores" que ousaram lhes dar um "tapa na bunda". Ademais, como se admitir tal agressão do Estado a um cidadão honesto, trabalhador e no pleno gozo de suas faculdades mentais, para que seja submetido a um tratamento "psicológico ou psiquiátrico", unicamente por que ousou dar uma palmada educativa num filho"?

O mais grave, contudo, são as "outras sanções cabíveis" nas quais está implícita a perda do poder familiar, ou seja, perda definitiva da guarda dos filhos, que não é citada explicitamente no artigo 18b introduzido no ECA mas é tornada possível devido à alteração do artigo 1634 inciso VII do Novo Código Civil, usurpando o poder família sob a falsa justificativa de "proteger a criança", coisa que na prática o Estado e o governo nunca fizeram.

Vejamos: Alterações no Novo Código Civil Art. 2o - O artigo 1634 da Lei 10.406, de 10/01/2002 (novo Código Civil), passa a ter seguinte redação:

"Art. 1634 - Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores: VII. Exigir, sem o uso de força física, moderada ou imoderada, que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição". Observem o que dizem a este respeito os artigos 1.637 e 1.638 do Novo Código Civil:

Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha. Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I - castigar imoderadamente o filho; IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente. Ora, nesse contexto, qualquer tapinha passa a ser um "abuso de autoridade" e uma "falta aos deveres a eles inerentes", enquadrando assim os pais, mães e responsáveis legais pelas crianças no artigo 1.637 do Código Civil, podendo doravante gerar a suspensão do poder familiar e, um segundo tapinha a perda definitiva do poder familiar, tudo isso conforme for o critério adotado pelo julgador, lembrando que o artigo 1.634 do mesmo Código Civil proíbe o uso de qualquer força física, moderada ou imoderada.

Vale dizer, criou-se uma situação absurda para os pais, na medida em que o Estado não lhes explica como eles poderão daqui por diante "exigir", sem o uso de força física, moderada ou imoderada, que os seus filhos lhes prestem obediência, respeito e as condutas próprias de sua idade e condição. A rigor, portanto, a Lei da Palmada limitou-se a instituir responsabilidade aos pais ou responsáveis pelo menor mas, ao mesmo tempo, não confere para estes os meios pelos quais será possível cumprir essa responsabilidade, criando assim uma verdadeira "arapuca jurídica" para a família brasileira.

Ora, o Estado, grande ausente no apoio a família e no suporte ao bem estar do lar, quer na questão moral quer na estrutural, vem agora intervir em questão dessa natureza, quando já existe na própria Lei Penal previsão suficiente para maus tratos e/ou lesões corporais e crimes dessa natureza.

Eis, portanto, a consumação de um Estado totalitário que emerge ao se erigir misticismos, demagogia e oportunismos à condição de Lei, tal como estamos agora assistindo com a famigerada "Lei da Palmada".

O que é constrangedor é constatar que até os dias atuais, as autoridades diziam, até com certa razão, que a educação é responsabilidade da família que muitas vezes tentava tranferir para o Estado e para a escola (essa responsável pela educação conhecimento), e agora, com essa famigerada Lei, o Estado não assume mas também não permite à família que eduque seus filhos da forma que julgue mais conveniente, não que bofetões seja o melhor diálogo, mas impedir corretivos quando o próprio Estado não impede a bandalheira oficial, é no mínimo incoerente.

O Estado já intervém naquilo que seu filho deve ou não assistir na TV, agora busca intervir na forma de criação deles, sem contudo dar solução ou apresentar alternativas. O seu papel mesmo, qual seja, o de dar acesso à Educação de qualidade nas escolas, esse ele está pouco se lixando.E aí surge a pergunta obrigatória: Quem vai intervir no Estado, quando ele espanca a sociedade?

Não por acaso, os mesmos atores governamentais que conceberam a famigerada "Lei da Palmada", buscando criminalizar a educação doméstica, quando já existe legislação suficiente para esse fim, são os que pregam a descriminalização do uso das drogas, o que deixa claro que o objetivo não é proteger crianças, jovens e adolescentes da violência, mas ao contrário, é destruir a família, e cada vez mais expor a sociedade ao desígnios nefastos do aparato estatal.

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* Romeu Tuma Junior é advogado, sócio responsável pelas Áreas Criminal e Penal empresarial do Gaiofato e Tuma Advogados Associados.

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