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Doação de órgãos: o que falta para o Brasil?

Fernanda Martorelli

Dados oficiais comprovam que o número de recusa familiar cresce a cada ano no Brasil.

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Atualizado em 11 de setembro de 2014 15:19

O Brasil é o segundo país do mundo em número de doação de órgãos, perdendo apenas para os Estados Unidos que lidera o ranking mundial. Entretanto, é considerável a diferença entre as cirurgias realizadas e o número de pacientes na lista de espera. Em 2013 foram realizados 7.649 transplantes, mas a lista de espera tinha aproximadamente 30.000 pacientes.

Uma das causas para essa discrepância está na forma de consentimento adotada pela lei 9.434/97. A princípio, a intenção dessa lei era estabelecer o consentimento presumido, a fim de aumentar o número de doações. Isso quer dizer que, aquele que não quisesse ser doador, deveria registrar em sua carteira de identidade ou habilitação essa opção.

Contudo, após imensa pressão popular, a legislação foi alterada e hoje a remoção de órgãos e tecidos destinados a transplante somente poderá ser realizada após autorização do cônjuge ou parente maior de idade, obedecida a linha sucessória.

Atualmente, então, apenas os familiares possuem o poder de decidir se os órgãos e tecidos do falecido podem ser transplantados, sem qualquer espaço para a preponderância da liberdade de escolha do doador.

Alguns argumentam que esse conceito viola direitos fundamentais, como a dignidade da pessoa humana e a liberdade de expressão. O fato é que, muitas vezes, a família não é bem orientada pelos agentes de saúde e termina por rejeitar a doação sem qualquer motivo razoável.

Dados oficiais comprovam que o número de recusa familiar cresce a cada ano no Brasil. Em 2006 houve 1.539 recusas, enquanto que em 2013 o número chegou a 2.622. Dessa maneira, a alternativa para aumentar as doações sem reforma legislativa está no treinamento dos profissionais de saúde que têm a árdua tarefa de convencer a família do ente falecido de que a doação pode vir a salvar vidas.

O procedimento é simples, deve haver uma entrevista objetiva, após o diagnóstico da morte encefálica, deixando claro para o parente que foi estabelecida a morte e que o corpo está apto a ser doado. Todas as dúvidas da família devem ser amplamente discutidas e esclarecidas, para que não haja qualquer mal entendido e que a família fique segura de sua decisão, afinal, trata-se de vidas que podem ser salvas acaso a doação venha a ocorrer.

Tudo isso pode ser um paliativo para aumentar a quantidade de doações, mas o que realmente seria eficaz para que estes transplantes chegassem perto do número de necessitados seria o retorno ao consentimento presumido, com a opção de exclusão pelo doador, intuitu personae, como ocorre em 13 países da Europa e coloca a França em terceiro lugar do mundo em transplantes de órgãos, logo atrás do Brasil, com uma população de um terço de nosso país.

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*Fernanda Martorelli é advogada do escritório Martorelli Advogados.

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