MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. Migalhas de peso >
  4. Destaques da pauta do STF na semana: IPI - Importação e IRPJ - Demonstrações financeiras

Destaques da pauta do STF na semana: IPI - Importação e IRPJ - Demonstrações financeiras

Eurico Marcos Diniz de Santi e Thiago Buschinelli Sorrentino

Espera-se que a análise prévia da pauta do STF seja útil para a sociedade civil e, quem sabe, para a própria Corte.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Atualizado às 07:05

Acreditamos que o Supremo Tribunal Federal é agente institucional estratégico para se pensar novas perspectivas para o futuro do direito, rumo ao exercício propositivo da cidadania fiscal e do controle social da administração pública brasileira. Nesse sentido, exercitaremos nesse espaço a tentativa de montar cenários antecipados sobre a pauta de julgamento do Supremo Tribunal Federal em matéria tributária.

Para a semana de 17/11/14, há dois recursos extraordinários sobre matéria tributária cujo julgamento está previsto na pauta de quinta-feira, 20/11/14: (i) o RExt 723.651 - IPI sobre operação de importação de veículo automotor, por pessoa natural, para o próprio uso e (ii) o RExt 188.083, que versa sobre a constitucionalidade das normas que modificaram a sistemática de correção monetária das demonstrações financeiras do exercício de 1989, em relação ao IRPJ (lei 7.799/89).

O primeiro, de relatoria do ministro Marco Aurélio, discute a incidência do IPI sobre operação de importação de veículo automotor, por pessoa natural, para o próprio uso. A discussão não é nova, por ser um desdobramento do quanto firmado na súmula 660/STF1. Com o reconhecimento da inconstitucionalidade da incidência do ICMS sobre o mesmo tipo de operação, nos termos da redação constitucional anterior à EC 33/01, alguns contribuintes passaram a arguir a impossibilidade de incidência do IPI.

A Corte debaterá quatro argumentos. O primeiro deles é a violação da regra da não-cumulatividade, na medida em que o contribuinte que não é industrial não poderia lançar mão dos créditos do tributo para compensar o que fosse devido em operações anteriores. Aponta-se também que, diferentemente do ICMS (art. 155, IX, a, tanto na redação primitiva como na redação dada pela EC 33/01), inexiste competência constitucional expressa para tributar operações de importação. Em terceiro lugar, a questão é saber-se se os critérios ou fundamentos determinantes que motivaram a jurisprudência expressa na súmula 660/STF são aplicáveis ao IPI. Por fim, a questão remanescente é definir se a função extrafiscal do tributo justificaria, tão-somente por si ou em conjunção com os demais argumentos, a tributação.

Se tomada a sistemática do ICMS, dois desses argumentos já foram debatidos pela Corte, ainda que em declarações laterais (obiter dicta). Nos RExts 427.267 e 439.796, de relatoria do ministro Joaquim Barbosa e julgados pelo pleno em 06/11/13. Naquela oportunidade, segundo o voto do relator, a aplicação da regra da não-cumulatividade às operações em que a sujeição passiva fosse de pessoas naturais foi considerada equivocada, por não haver efetiva cumulatividade tributária. Se essa orientação for mantida, a tendência da Corte também é rejeitar os argumentos em relação ao IPI (não-cumulatividade e "transcendência" dos fundamentos determinantes).

Ainda sobre esse julgamento, será interessante o debate sobre se há previsão de competência para tributar a importação pelo IPI na CF, se aliada à preocupação com as condições de concorrência no mercado nacional e o potencial de arrecadação. O argumento é simples: como o IPI incide nas operações domésticas, a desoneração das operações de importação colocaria os industriais e as empresas a eles equiparadas em situação de desequilíbrio. O quanto influirá nas decisões individuais a preocupação com as condições de concorrência entre produtos nacionais e estrangeiros? Em nossa expectativa, será difícil aferir o grau de influência dessa matéria em cada voto, embora se trate de um dos critérios determinantes para orientar a posição de cada julgador.

Já o RExt 188.083 versa sobre a constitucionalidade das normas que modificaram a sistemática de correção monetária das demonstrações financeiras do exercício de 1989, em relação ao IRPJ (lei 7.799/89). Também de relatoria do Min. Marco Aurélio, esse recurso tem a tramitação demonstrativa das dificuldades decorrentes do modelo de sessão de julgamento e de construção das respectivas pautas.

Distribuído em fevereiro de 1995 à relatoria do ministro Maurício Correa, os autos do RExt permaneceram na Procuradoria-Geral da República entre 28/08/1997 e 22/01/2003, para oferecimento de parecer. Iniciado o julgamento na sessão de 18/05/2006, somente em novembro de 2014 a Corte pôde devolver o recurso a julgamento, dada a quantidade de processos em estoque.

Discute-se nesse recurso a aplicação das regras da anterioridade e da irretroatividade, diante do aumento da carga tributária causado pela legislação que modificou a sistemática de correção monetária dos balanços.

Em jogo está a releitura da súmula 584/STF2. Essa releitura poderá ser provocada pela reavaliação das consequências da legislação em exame no aumento do valor do tributo devido. Vale lembrar que, noutro precedente, ainda que em declaração lateral, a Corte reconheceu que mudanças de regras que não estivessem sujeitas à anterioridade poderiam sofrer limitação, se comprovado o prejuízo decorrente do aumento abrupto do valor do tributo.

Esperamos que a análise prévia da pauta do STF seja útil para a sociedade civil e quem sabe para a própria Corte.

_______________

1 "Não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto".

2 "Ao Imposto de Renda calculado sobre os rendimentos do ano-base, aplica-se a lei vigente no exercício financeiro em que deve ser apresentada a declaração".
_______________

*Artigo produzido no âmbito das pesquisas desenvolvidas no NEF/FGV Direito SP. As opiniões emitidas são de responsabilidade exclusiva de seus autores. As informações contidas neste texto não têm caráter oficial. A pauta de julgamento do Plenário do Supremo Tribunal Federal é definida pela respectiva presidência, que pode alterá-la a qualquer momento.
_______________


*Eurico Marcos Diniz de Santi é mestre (1995) e doutor (2000) em Direito pela PUC/SP. Professor e Coordenador do Núcleo de Estudos Fiscais da FGV Direito SP.

*Thiago Buschinelli Sorrentino é mestre em Direito do Estado pela PUC/SP. Pesquisador do Núcleo de Estudos Fiscais. Professor de Direito Constitucional da Universidade Católica de Brasília.

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca