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Dez novos enunciados sobre direito falimentar são aprovados pela II Jornada de Direito Comercial

Gláucia Mara Coelho, Renata Martins de Oliveira e Carolina Mascarenhas

Os enunciados consolidaram importantes conceitos e posições a respeito de institutos e princípios fundamentais do Direito Falimentar.

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Atualizado às 08:33

A Jornada de Direito Comercial, em sua segunda edição, consolidou-se como referência para a comunidade jurídica, com a aprovação de 24 novos enunciados pelas quatro comissões temáticas.

A Comissão denominada "Crise da Empresa" apresentou 12 propostas, das quais 10 se tornaram enunciados. Estes enunciados, de uma forma geral, vêm esclarecer e consolidar a aplicabilidade de institutos importantes do direito falimentar, especialmente em razão do fato de muitos deles ainda não terem sido analisados pelo Poder Judiciário ou de não haver entendimento consolidado a seu respeito, considerando a relativa novidade da lei 11.101/05 ("LRF") e a polêmica envolvendo casos com grande repercussão na sociedade.

Com efeito, possivelmente motivado pelo impacto decorrente das famosas falências do Banco Santos S/A, do Banco BVA S/A e do Banco Cruzeiro do Sul S/A, dentre outros, o enunciado 72 dispõe que o MP, na qualidade de responsável por assegurar os direitos transindividuais dos poupadores de instituições financeiras, é o órgão dotado de legitimidade ativa para propositura da ação de responsabilidade prevista no art. 46 da lei 6.024/74, até mesmo depois da decretação da quebra.

No mesmo sentido, tendo em vista a importância do papel dos bondholders, tal como se viu nas recuperações judiciais do Grupo Independência, do Grupo Arantes, do Grupo Rede e do Grupo OGX, o enunciado 76 veio reconhecer expressamente a faculdade dos bondholders pleitearem autorização judicial que permita o desmembramento dos direitos de voz e de voto, para exercê-los individualmente em assembleia geral de credores, ainda que o exercício de voto em assembleia caiba ao agente fiduciário (indenture trustee) ou a figura similar representando uma coletividade de credores, nos termos do documento de emissão do título de dívida.

Ainda a respeito da temática das assembleias gerais de credores, estabeleceu-se no enunciado 77 que as alterações ao plano devem ser submetidas à assembleia mesmo após decurso de dois anos da recuperação judicial, mas desde que não encerrada por sentença. Em caso de aprovação do novo plano conforme as regras do art. 45 da LRF (que trata das regras aplicáveis para votação de planos de recuperação), a alteração vinculará a todos os credores concursais, valendo lembrar que, na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia (art. 50, §1º, da LRF).Assim, resta consagrada a regra da maioria, típica das assembleias gerais de credores, ao vincular as alterações do plano posteriores ao término do prazo de dois anos da concessão da recuperação judicial e ao não restringi-las apenas aos anuentes.

No mais, relativamente a outros importantes institutos e princípios da LRF, tais como o princípio da paridade de credores e o da preservação da empresa, tem-se que a edição do Enunciado 81 consagrou expressamente que o princípio da par conditio creditorum se aplica, no que couber, à recuperação judicial.

Tal princípio também embasou o Enunciado 73, o qual estabelece que a preservação da eficácia da prerrogativa insculpida no §2º do art. 6º, da LRF, de que o crédito trabalhista poderá ser incluído automaticamente no quadro geral de credores por meio de simples ofício expedido pelo juízo trabalhista ao juízo falimentar, está condicionada à regra de que o crédito seja calculado até a data do pedido de recuperação judicial ou da decretação da falência, conforme determinado pelo art. 9º, II, da LRF.

Isso porque, caso se admitisse que atualização do crédito observasse a data da liquidação, a aplicação do referido dispositivo implicaria em afronta ao princípio da par conditio creditorum, na medida em que os credores que tivessem seus créditos liquidados após o marco temporal do art. 9º, II, da LRF seriam inscritos no quadro geral de credores por importância maior, em razão do parâmetro diverso de atualização, de maneira que estariam sendo favorecidos em detrimento dos demais.

Quanto ao princípio da preservação da empresa, o Enunciado 74 institui que, a despeito de a execução fiscal não se suspender em virtude do deferimento do processamento da recuperação judicial (art. 6º, §7º, da LRF), os atos que importam na constrição do patrimônio da recuperanda estão sujeitos à análise do juízo recuperacional.

Ademais, vale citar que os créditos fiscais, assim como os demais créditos excluídos da recuperação judicial, também deverão ser indicados na relação de credores do devedor que instrui a petição inicial, a fim de garantir um completo e adequado conhecimento da situação econômico-financeira do devedor, preservando-se a transparência, como uma decorrência natural do princípio da boa-fé.

Finalmente, firmando a posição autônoma da cláusula compromissória em relação ao contrato no qual foi inserida, o Enunciado 75 estatuiu que, havendo convenção de arbitragem, se uma das partes tiver a sua falência decretada, eventual procedimento arbitral em curso não se suspende por ocasião da falência e novo procedimento arbitral pode ser iniciado, seguindo a regra do art. 6º, §1º, da LRF. Além disso, conforme o mesmo Enunciado, o administrador judicial não poderá recusar a eficácia da referida cláusula compromissória.

Como se vê, portanto, os Enunciados da II Jornada de Direito Comercial acerca da "Crise da Empresa" consolidaram importantes conceitos e posições a respeito de institutos e princípios fundamentais do direito falimentar, a partir de entendimentos firmados pela jurisprudência e doutrina, servindo de importante fonte de direito.

Com isso, espera-se que haja uma maior uniformidade das decisões e, consequentemente, que a almejada segurança jurídica na aplicação da LRF seja progressivamente alcançada.
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*Gláucia Mara Coelho é sócia do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados.

*Renata Martins de Oliveira é advogada do Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados.

*Carolina Mascarenhas é advogada do Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados.



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