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Dinheiro sujo, voto limpo?

O dinheiro sujo que tem atentado contra a normalidade e a legitimidade das últimas eleições tem potencialidade danosa suficiente para cassar os diplomas dos tenham recebido um centavo sequer.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Atualizado em 23 de julho de 2015 09:53

Não há poder sem autoridade nem autoridade sem legitimidade. Não basta que alguém seja autorizado pela maioria a exercer o poder se a autoridade que se lhe outorga com a investidura não se revestir de um valor maior - a legitimidade.

A Constituição da República tutela dois valores indissociáveis nas eleições - a normalidade e a legitimidade.

Assim, o processo eleitoral há que se realizar sob as normas legais sem discrepâncias, com peso igual para todos.

A legitimidade decorre da certeza absoluta de que nenhuma regra do processo deixou de ser cumprida, desde a convenção partidária à proclamação dos resultados e diplomação dos eleitos.

O abuso do poder político e o abuso do poder econômico são como células cancerígenas, umas detectáveis mediante conhecidos exames, outras que quase imperceptíveis porque incubadas demandam mais tempo para o diagnóstico e em muitos casos já irrompem em metástase.

Os antídotos prescritos pela Constituição da República para esses vírus são, em primeiro, as desincompatibilizações e, em seguida, as inelegibilidades - ambas tendo por fim a proteção da probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, aferível mediante aplicação da lei da ficha limpa.

A convenção partidária que, sem observância das regras estatutárias ou legais, lança candidatos ou faz coligações, impedindo o exercício da democracia interna, proclamando decisões sujeitas às vontades dos donos dos partidos, inocula vírus no processo eleitoral que diagnosticados a qualquer tempo são causas de cassação dos registros dos candidatos ou dos diplomas dos proclamados eleitos.

Configura-se nessa hipótese violação ao princípio constitucional da normalidade por abuso de poder das direções partidárias. Na maioria dos casos, o que move essas ações ilícitas é o poder econômico a corromper convencionais e dirigentes partidários.

Na campanha eleitoral então, como já lecionou a Dilma, é que se faz o diabo. Não havendo teto para as despesas, os gastos dos comitês dos candidatos extrapolam as previsões iniciais e a Justiça eleitoral candidamente autoriza os aumentos.

E se as doações ultrapassam os percentuais permitidos pela lei, recorre-se ao caixa 2 também conhecido como despesas eleitorais não contabilizadas.

Isso quando não fazíamos ideia da paleontologia a nos dar notícias sobre os fósseis do mensalão.

Convencidos de que dinheiro não tem carimbo, operou-se nas últimas campanhas o que os economistas chamariam de promiscuidade monetária - a mistura do dinheiro sujo com algum dinheiro limpo, talvez, passando tudo por uma lavanderia insuspeita conquanto ingênua ou desavisada chamada Justiça eleitoral.

É simples a equação. Empresas com contratos vultosos no governo Federal superfaturavam os preços. Auferiam lucros escandalosos dos quais tiravam uma beirada para os partidos políticos e campanhas eleitorais dos que apadrinhavam os operadores desses malfeitos nos cargos estratégicos das empresas públicas.

Ora, até ai saber-se se as doações para as campanhas eleitorais, todas elas, feitas por essas empresas ou pessoas, todas elas, encrencadas com a Polícia Federal e com o Ministério Público Federal tinham como origem o lucro líquido formado por dinheiro limpo declarado em balanço ou se oriundas também das bilionárias propinas repassadas aos operadores dos partidos políticos e campanhas eleitorais dos seus candidatos, não é tarefa impossível de provar. Aliás, já se está provando.

O dinheiro sujo que tem atentado contra a normalidade e a legitimidade das últimas eleições nacionais e estaduais contém potencialidade danosa suficiente para cassar os diplomas dos que tenham recebido um centavo sequer, o suficiente para contaminar o processo eleitoral.

Julgada procedente a impugnação do mandato eletivo por abuso de poder político ou de poder econômico, cassa-se a chapa por inteiro. Não mais assumem os segundo colocados. Aquilo foi arranjo vergonhoso quando foi para derrubar governadores ou prefeitos não alinhados como o fizeram com o governador Jackson Lago, do Maranhão.

Essa jurisprudência já foi revogada. Agora, convocam-se novas eleições diretas se a vacância dupla ocorrer nos dois primeiros anos do mandato. E eleições indiretas pelo Congresso Nacional se a vacância ocorrer nos dois últimos anos. Tudo na forma prevista pela Constituição da República.

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*Edson Vidigal é advogado e foi presidente do STJ e do CJF.




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