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A docência no curso de Direito

A docência no curso de Direito

"O profissional é um eterno aluno, com a responsabilidade de buscar o aperfeiçoamento de seus estudos, pois a evolução das ciências jurídicas se esboroa diante do conservadorismo pedagógico."

domingo, 9 de outubro de 2016

Atualizado em 7 de outubro de 2016 12:52

Quando se fala a respeito das opções profissionais para os estudantes do curso de Direito, os concursos públicos de variadas carreiras surgem como interessantes atrativos em razão da estabilidade e segurança e, corpo a corpo, a advocacia em suas inúmeras especialidades, com o imenso potencial que carrega, cativa outra fatia significativa.

Nada se comenta, no entanto, a respeito da carreira de docente nos cursos jurídicos que é vista como uma alternativa complementar àquela que já vem sendo exercida pelo profissional. Assim, em regra, a seleção de professores, pelo menos nas instituições particulares, é ditada pela competência do profissional. Mas, como é sabido e muitas vezes repetido, nem sempre o bom profissional, arguto e diligente em suas causas e cioso em seus processos, demonstrará a mesma competência em sala de aula. Já as públicas, valem-se dos concursos de ingresso de provas e títulos.

Indiscutíveis a importância e a relevância da carreira de docente nos cursos de Direito. Não é uma opção para qualquer profissional e sim talhada tão somente para aqueles dotados da vocação para o ensino e que, desde os anos de graduação, foram construindo e revelando o talento para tanto. Daí que, como profetizava Paulo Freire, não há docência sem discência, provocando o raciocínio no sentido de que o profissional é um eterno aluno, com a responsabilidade de buscar o aperfeiçoamento de seus estudos, pois a evolução das ciências jurídicas se esboroa diante do conservadorismo pedagógico.

O Exame de Ordem, avaliação a que se submetem os bacharéis em Direito para o exercício da advocacia e mesmo para alguns cargos públicos, não é condição exigida para o magistério. Mas nem por isso libera o docente da obrigatoriedade de ter conhecimento mais do que suficiente para transitar por várias áreas do saber, como a filosofia, antropologia, sociologia, psicologia, política e muitas outras relacionadas com as ciências sociais. Justamente para não engessar o pensamento do aluno e permitir que ele alce voo solo e aterrisse livremente em campo que se sente seguro, por ter tido exímio instrutor.

Outra exigência, no entanto, e esta não afeta aos advogados e aos concursos das carreiras jurídicas, é a titulação dos docentes, preferencialmente de mestres e doutores, conteúdo indispensável e suficiente para que possam transmitir com clareza os componentes fundamentais das aquisições científicas e culturais da humanidade, que constituem o eixo central do curso de Direito.

Assim, um professor com o perfil delineado pelos mais rigorosos critérios de exigência, deve dividir seu tempo entre o ensino e a pesquisa para que possa acompanhar a evolução de sua disciplina não só no seu país, como também em outros de tradição cultural recomendada.

"Quando consideramos a função das universidades na vida da humanidade, advertia Russell, vemos que a pesquisa é, no mínimo, tão importante quanto a educação. O conhecimento novo é a principal causa do progresso e, sem ele, o mundo logo se tornaria estacionário. O mundo poderia continuar melhorando, por um tempo, com a difusão e o emprego mais amplo dos conhecimentos existentes, mas esse processo, por si só, não duraria muito"1.

A habilidade pedagógica, por si só, apesar de ser necessária para se fazer a aproximação com o aluno, já não é vista como credencial insuperável e sim o domínio da disciplina, a segurança com que é transmitida para que o discente permaneça interessado e conectado com o curso. O professor de Direito, pelo seu caráter formador, desenvolve relevante tarefa de ensinar a pensar e provocar a reflexão crítica a respeito da vida e dos fatos que a acompanham, para que o aluno possa descortinar novas perspectivas e produzir seu próprio pensamento. Daí que não pode balizar e ter como fundamento somente o ensino teórico e sim mesclá-lo com a prática, proporcionando o verdadeiro ensino criativo.

Não se trata de uma missão rotineira, repetitiva a cada ano e nem mesmo um exercício consolidado de transferência de conhecimento. Os conteúdos trabalhados em salas de aulas vão desde a grade curricular estabelecida para o curso até o alcance do fato social que esteja acontecendo e que reclama a interpretação doutrinária e a postura jurisprudencial do mais alto tribunal.

Inegáveis, portanto, não só a importância do professor de Direito

na formação do aluno, sedimentado-a de sólidos ensinamentos, como também sua influência como agente social de transformação jurídica, pois suas ideias penetram de forma difusa, potencializando novos caminhos em busca da difícil concretização do jus suum cuique tribuere.

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1 Russell, Bertrand. Sobre a educação. Tradução Renato Prelorentzou. São Paulo: Editora Unesp, 2014, p.258.
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*Eudes Quintino de Oliveira Júnior é promotor de Justiça aposentado, mestre em Direito Público, pós-doutorado em Ciências da Saúde. Advogado e reitor da Unorp.

 


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