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Balbúrdia nos extrajudiciais da Bahia (i)

Os representantes dos baianos, na Assembleia Legislativa, golpearam os magistrados e todos subscreveram uma lei, induvidosamente, inconstitucional e ferindo os brios do Tribunal e do CNJ.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Atualizado às 07:53

Depois de mais de dois anos de debates e mudanças, mais de 130 emendas, entre 2009 e 2011, a ALE/BA aprovou, à unanimidade, a lei 12.352/11, sancionada pelo governador Jacques Wagner. O Projeto original, encaminhado pelo TJ aos deputados, foi profundamente desfigurado e maltratado; assim, os representantes dos baianos, na Assembleia Legislativa, golpearam os magistrados e todos, sem exceção, inclusive o governador do Estado, subscreveram uma lei, induvidosamente, inconstitucional e ferindo os brios do Tribunal e do CNJ.

O Tribunal não ficou silente; a então presidente, desa. Telma Brito deslocou-se até Brasília e entregou ao então Procurador-Geral da República, Antonio Gurgel, toda a documentação necessária para arguir a inconstitucionalidade da lei baiana. Vencido o prazo de opção dos servidores notariais e registrais, concedido pela lei 12.352/11, de 120 dias, sem resultado algum no questionamento da lei no STF, o Tribunal não teve alternativa que não fosse cumprir a norma, ainda que afrontosa. Foi baixada a Resolução 01/12, dando início ao processo de delegação para 1.463 cartórios extrajudicias. Somente 130 servidores do interior e 15 da capital optaram pelo regime privado e tornaram-se delegatários; os outros, que também poderiam, segundo a lei baiana, escolher os cartórios extrajudiciais, preferiram continuar no serviço público ou aposentar.

Deu-se início à canhestra e conturbada privatização dos cartórios extrajudiciais da Bahia!

Os deputados quebrantaram a inteligência dos desembargadores e dos conselheiros do CNJ, à unanimidade, e privatizaram, de imediato, todos os cartórios, incluindo, evidentemente, aqueles que tinham servidores concursados e que não optaram pela delegação. Estes foram enxotados e continuaram, não mais como titulares dos cartórios, mas como servidores judiciais; nessa condição foram designados para exercer a função que não mais lhes pertencia.

Nesse período, desde 2012, os servidores designados para os cartórios extrajudiciais, perderam o sossego, porquanto, sem a minima estrutura, com direitos desrespeitados, tais como lazer, férias, recesso, recebimento de substituições, tiveram que desempenhar os encargos nos cartórios privatizados, mas sem delegatários.

Os jurisdicionados não eram bem atendidos e a lavratura da escritura, o registro do imóvel, o protesto do título, o registro do filho, todos esses serviços, eram e continuam sendo prestados sem obediência de prazos e, às vezes, erradamente. Os servidores não tinham nem dispõem de meios e estavam e continuam "tapando buraco" naquela função que não lhes pertenciam, nem lhes pertence.

Foram e prosseguem carregando a cruz e os jurisdicionados não compreendem o atordoamento desses servidores!

Imagina-se que com o concurso de provas e títulos, agora sim em obediência à CF, para os cartórios remanescentes, estará sanada a situação. Os problemas persistirão, tudo pela lei açodada e mal feita dos deputados da Bahia.

O Projeto original do Tribunal, de 2009, em consonância com os conselheiros do CNJ, determinava que a privatização seria gradual, ou seja, seriam delegados os cartórios vagos, através de concurso de provas e títulos, como manda a CF; aqueles que fizeram concurso de provas para a função pública, em 2004, continuariam nos cargos e só seriam entregues a delegatários, concursados de provas e títulos, quando vagassem. Respeitava-se assim o direito de permanência dos servidores notários e registrais até a aposentadoria, morte ou demissão.

A lei dos deputados da Bahia "deu um jeito", sem se importar com a inobservância da CF, apesar de advertidos pelos magistrados, quando permitiu que os titulares, concursados para o exercício da função pública, em 2004, migrassem para a função privada, como delegatários, sem concurso de provas e títulos específicos para a delegação.

A CF exige concurso público de provas e títulos para assunção do cargo de delegatário, mas os deputados, com o beneplácito do governador Jacque Vagner, assentaram na lei estadual que os servidores concursados em 2004 para analistas judiciários do serviço público poderiam, mesmo sem a prova de títulos, optar pelo regime privado, sem se submeterem ao concurso específico de provas e títulos, repita-se.

Os legisladores da Bahia transgrediram, pensada e calculadamente, a CF, art. 236, parágrafo 3º, além de jurisprudência do STF e criaram imensas dificuldades para a direção do Tribunal. Exatamente pelo choque da lei estadual, art. 2º da lei 12.352/11, com a CF, tramita no STF a arguição de sua inconstitucionalidade. Mas este assunto fica para outra oportunidade.
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*Antonio Pessoa Cardoso é advogado do escritório Pessoa Cardoso Advogados.

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