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O STF, o ICMS e a várzea

O STF poderá, ao julgar a constitucionalidade de uma determinada norma, em decisão com aplicação a todas as demais ações, definir, de maneira bastante discricionária, como tal decisão será aplicada no tempo.

quarta-feira, 22 de março de 2017

Atualizado às 09:37

Felizmente, errei minha previsão, em artigo anterior, quanto ao julgamento da exclusão do ICMS sobre a base de cálculo do PIS/Cofins: Gilmar Mendes não pediu vistas, votou e, com isso, a ação foi julgada de modo favorável aos contribuintes por 6 x 4 votos.

A PGF (Procuradoria Geral da Fazenda, que defende o Fisco) já antecipou que, após a publicação da decisão, irá opor Embargos de Declaração, pleiteando a modulação dos efeitos da decisão.

A modulação dos efeitos, para os não iniciados, significa que o STF poderá, ao julgar a constitucionalidade de uma determinada norma, em decisão com aplicação a todas as demais ações (p.ex., controle concentrado de constitucionalidade, decisões com repercussão geral, etc.) definir, de maneira bastante discricionária, como tal decisão será aplicada no tempo; baseado em critérios subjetivos e razoavelmente vagos como a segurança jurídica e o interesse público.

Historicamente (se é que se pode falar em historicamente sobre um mecanismo ainda novo), a modulação tem se aplicado de modo a permitir a aplicação retroativa da decisão somente nas ações já ajuizadas, e aplicação dali para frente para os demais casos. Isso busca, com justificável razão, impedir uma corrida aos tribunais de todos aqueles que, diante de uma "causa ganha" pleiteiem aquilo que não se dispuseram a pleitear quando ainda havia algum risco.

Entretanto, o pedido de modulação que a PGF apresentou, em sustentação oral, defende que a tese vitoriosa seja aplicada somente a partir de 2018 (uma novelíssima jabuticaba, protelação dos efeitos do trânsito em julgado), e somente dali em diante, ou seja, sem que sejam ressarcidos os tributos pagos a maior, nem mesmo aos contribuintes que há bem mais de 10 anos discutem o tema no judiciário.

Caso o STF defira a pretensão da PGF (na qual será acompanhada pela AGU), considerada "extravagante" pelo ministro Marco Aurélio, garantirá ao Fisco a possibilidade de, até 2018, recuperar a perda pela retirada do ICMS da base de cálculo com a majoração as alíquotas de PIS e Cofins, obedecendo a anterioridade nonagesimal (aumentos de tributos devem ocorrer com 90 dias de antecedência); vale dizer, de modo que a decisão de ontem não custe um único centavo o Fisco e não restitua ou economize esse mesmo centavo aos contribuintes.

Ou seja, a PGF tenta transformar a decisão de ontem em verdadeira Vitória de Pirro dos Contribuintes, em "ganhou, mas não levou", em um grandessíssimo tapetão de dar inveja aos mais várzeos peladeiros.

Ainda há tempo para que os pudores acudam aos colegas da PGF e AGU e, se nisso falhar, que o respeito ao STF paute seus próprios magistrados. Caso contrário, vigorará a máxima dos cassinos, nos quais "a casa sempre vence".

Estaremos de olho.

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*Daniel Montanha Teixeira é advogado e gestor jurídico.


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