MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. A corrupção e o princípio da razão suficiente

A corrupção e o princípio da razão suficiente

Se o advogado defende um acusado usando argumentos derivados de premissas falsas ou ele não é um bom advogado ou o cliente é realmente culpado.

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

Atualizado às 13:57

O bom argumento é aquele que deriva corretamente de premissas apoiadas por evidências reais. Quando construído sobre premissas falsas - aquelas sem respaldo em evidências reais -, o argumento se torna frágil e pode voltar-se contra aquele a quem pretende defender. Se o advogado defende um acusado usando argumentos derivados de premissas falsas (sem evidências apoiadoras), ou ele não é um bom advogado ou o cliente é realmente culpado. Ouvindo os argumentos dos advogados da Operação Lava Jato, lembro-me dos ensinamentos de Leibniz, Kant e Schopenhauer sobre a razão. Em suas declarações, o ser humano faz uso da razão, que é uma maneira de compreender a realidade, elaborar explicações e expô-las de forma compreensível. A razão funciona com base em princípios. São eles:

O?princípio da identidade afirma que uma coisa, seja ela qual for, só pode ser conhecida e pensada se for percebida com as características que a identificam e que são necessárias para definir a coisa e conhecê-la a partir de sua definição. Se afirmamos que um retângulo é uma figura de quatro lados e quatro ângulos, toda vez que nos for oferecido um problema referente a um retângulo saberemos tratar-se de uma figura com quatro lados e quatro ângulos, e nenhuma outra.

O?princípio da não contradição afirma que dez é dez, e é impossível que seja, ao mesmo tempo, "não dez". Isto é, o princípio da não contradição afirma ser impossível uma coisa negar a si mesma. Sem esse princípio, o já citado princípio da identidade não poderia funcionar. O?princípio do terceiro excluído afirma que algo é "x" ou é "y" e não há terceira possibilidade. Exemplos: encontro um amigo e afirmo "ou este homem é Pedro ou não é Pedro". Nessa afirmação não há a menor chance de uma terceira hipótese. Da mesma forma, se há US$?100 milhões na conta de um funcionário da Petrobras na Suíça, "ou é crime ou não é crime".

O?princípio da razão suficiente afirma que tudo o que existe e tudo o que acontece tem uma razão para existir ou para acontecer, e isso pode ser conhecido por nossa razão (capacidade de raciocinar). O princípio da razão suficiente também é conhecido como princípio da causalidade por estabelecer conexões entre coisas, entre fatos ou entre acontecimentos. Por exemplo: "Se houver 'a', necessariamente ocorrerá 'b'"; "se chover, necessariamente a terra ficará úmida".

Ouvi um palestrante dizer: "Se o sujeito é funcionário público há 30 anos, não recebeu herança, não ganhou na loteria e tem US$?100 milhões na Suíça, não é preciso qualquer outra prova, é ladrão!" A simples existência da fortuna é a razão suficiente para provar que o dinheiro tem origem ilícita, criminosa. Mas isso não dispensa o processo legal e o respeito ao direito de defesa.

Assim como a função do zagueiro é impedir que o atacante marque gol, a função do advogado é dificultar que a polícia, o promotor e o juiz provem que há crime (materialidade) e que o acusado é culpado (autoria). Sem o advogado de defesa, o processo de chegar à verdade é falho e ilegítimo; seria como atacantes ganharem um jogo em que não há zagueiro nem goleiro adversários.

__________

*José Pio Martins é economista e reitor da Universidade Positivo.

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca