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Ações sobre direitos reais imobiliários e autorização do cônjuge

A autorização é um fenômeno diverso que não se confunde com os conceitos de capacidade processual. A autorização não é um requisito para a aquisição da qualidade de parte, mas é um requisito para a regular constituição em juízo e para o regular cumprimento dos atos processuais.

terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Atualizado em 21 de dezembro de 2017 15:44

Para a propositura de ações que versem sobre direitos reais imobiliários, o cônjuge necessitará da autorização do outro. Por óbvio, essa autorização só é necessária se as ações se referirem a bens comuns do casal e não se aplica para as ações de direito pessoal e para as ações que versem a respeito de direito real que recaia sobre bem móvel. Dado o reconhecimento pelos Tribunais Superiores da equiparação entre casais independentemente da orientação sexual, esse dispositivo também se aplica a casais do mesmo sexo.

A autorização é um fenômeno diverso que não se confunde com os conceitos de capacidade processual. A autorização não é um requisito para a aquisição da qualidade de parte, mas é um requisito para a regular constituição em juízo e para o regular cumprimento dos atos processuais. O cônjuge tem, assim, o ônus de se apresentar em juízo com respectiva autorização do outro, para o regular procedimento da ação (nesse sentido, Francesco P. Luiso, Diritto processuale civile, v. I., 4ª ed., Milano Giuffre, 2007, pp. 204-209).

Para a prova do consentimento do cônjuge, deve-se recorrer ao art. 220 do Código Civil, segundo o qual ''a anuência ou a autorização de outrem, necessária à validade de um ato, provar-se-á do mesmo modo que este, e constará, sempre que se possa, do próprio instrumento''. Indispensável, portanto, que o autor apresente já na petição inicial o consentimento de seu cônjuge para o processamento da demanda em questão. Se um dos cônjuges não der o seu consentimento, possível a requisição de ordem judicial que supra essa manifestação de vontade. Esse é o teor do art. 1.648 do Código Civil (in verbis: ''Cabe ao juiz, nos casos do artigo antecedente, suprir a outorga, quando um dos cônjuges a denegue sem motivo justo, ou lhe seja impossível concedê-la''). A falta de autorização do cônjuge torna anulável o ato praticado, nos termos do art. 1.649 do Código Civil.

Os cônjuges ocuparão necessariamente o polo passivo das ações i) que versem sobre direitos reais imobiliários; ii) resultantes de fatos que digam respeito a ambos os cônjuges ou de atos praticados por eles; iii) fundadas em dívidas contraídas pelo marido a bem da família, mas cuja execução tenha de recair sobre o produto do trabalho da mulher ou os seus bens reservados; iv) que tenham por objeto o reconhecimento, a constituição ou a extinção de ônus sobre imóveis de um ou de ambos os cônjuges. Os cônjuges também serão litisconsortes necessários nas ações possessórias de composse ou de ato por ambos praticados. Trata-se de litisconsórcio necessário, pois, a eficácia da sentença depende da citação de todos os litisconsortes, nos termos do art. 114 do Código de Processo Civil. A necessariedade do litisconsórcio, assim, está relacionada à legitimatio ad causam: nas hipóteses em que é obrigatória a formação do litisconsórcio ela pertence em conjunto a mais de uma pessoa. No processo, portanto, devem estar todos os destinatários dos efeitos da sentença. Na falta de um deles o juiz não pode se pronunciar sobre o mérito da controvérsia. (José Carlos Barbosa Moreira, Litisconsórcio Unitário, Forense: Rio de Janeiro, 1972, p. 11-12; Nicola Picardi, Manuale di diritto processuale civile, 2. Ed., Milano: Giuffre, 2010, pp. 197-198).

De acordo com o art. 73, § 3º, do Código de Processo Civil, as exigências previstas neste artigo também se aplicam às hipóteses de união estável, hetero ou homoafetiva, comprovada nos autos, dada a equiparação desta para com o casamento.

A ausência de integração da capacidade processual pelo cônjuge resulta em vício da relação processual que, se não sanado, enseja a extinção do processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 76 e 485, inc. VI do Código de Processo Civil.

Se o cônjuge ou o companheiro se recusar a conceder ao outro a autorização necessária para o processamento das ações sem um justo motivo ou se for impossível tal concessão, o cônjuge ou companheiro prejudicado poderá requerer ao juiz que supra esse consentimento faltante.

A falta de consentimento invalida o processo e enseja a extinção do processo sem resolução de mérito por ausência de legitimidade do cônjuge. Exemplo de justo motivo que autorizaria o não consentimento do cônjuge ou companheiro seria a demonstração por parte deste que a demanda a ser proposta por seu parceiro poderia comprometer toda a renda ou a estrutura familiar.

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*Paulo Henrique dos Santos Lucon é advogado do escritório Lucon Advogados.

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