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Porandubas Políticas

Por dentro da política.

Gaudêncio Torquato
quarta-feira, 13 de março de 2024

Porandubas nº 840

Nesse mundão em que o tempo corre veloz, a memória anda como tartaruga. O esquecimento bate na janelinha da memória. Cuidado, amigos. Vejam o que ocorreu com esses desembargadores. O nome do médico Dois desembargadores aposentados, do alto de uma juventude acumulada durante oito décadas e meia, encontram-se no aniversário do neto de um deles. Os desembargadores Amaro Quintal da Rocha e Antônio Vidal de Queiroz, como sói acontecer com amigos que se conheceram no início da idade da razão, foram direto ao assunto que mais os motivava: - Até que enfim, encontrei o médico que curou a minha amnésia, disse Amaro. - Como é mesmo o nome dele? Perguntou Vidal. - É, é, é, deixe-me ver, é... é... Como é mesmo o nome dele? Espere aí... é, é... é. O nome, escondido num cantinho do cérebro, relutava em aparecer. Começou a se perturbar. Mas não deixou a onda abatê-lo. - É, é, como se chama... é... é... como se chama mesmo aquela coisa vermelha, amarela, branca, que nasce em um galho cheio de espinhos, aquele assim? (e foi mostrando o tamanho do galho e o formato da coisa). Vidal matou a charada: - Rosa, o nome é Rosa. Amaro, radiante, grita para a mulher que estava sentada logo adiante: - Rosa, oh, Rosa, como é mesmo o nome daquele médico que curou a minha amnésia? Parte I - Detalhes de marketing A rejeição Rejeição a candidato é coisa séria. Não se apaga um índice de rejeição da noite para o dia. O maior adversário de muitos futuros candidatos a prefeito será a rejeição. Em um colégio eleitoral de cerca de 10 milhões de eleitores, mais de 25% do eleitorado paulista - 35 milhões de eleitores - a capital de São Paulo reúne o maior contingente eleitoral entre os 5.570 municípios brasileiros. A rejeição aqui será um fator impactante. Na última pesquisa Folha, Guilherme Boulos (PSOL, com apoio do PT) tem 34% de rejeição e o atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB, com apoio do PL de Bolsonaro), aparece com 26%. Tabata Amaral (PSB), também pré-candidata, aparece com 19%. Muito cuidado com a rejeição. Presságio agourento A rejeição é um presságio agourento, que pode derrubar qualquer candidato. Principalmente em uma campanha com tendência à polarização. Quando um candidato registra um índice de rejeição maior que a taxa de intenção de voto, é oportuno começar a providenciar a ambulância para entrar na UTI eleitoral. Caso contrário, morrerá logo nas primeiras semanas do segundo turno. A rejeição deve ser convenientemente analisada. Trata-se de uma predisposição negativa que o eleitor adquire e conserva em relação a determinados perfis. A fisiologia da consciência Para compreendê-la melhor, há de se verificar a intensidade da rejeição dentro da fisiologia de consciência do eleitorado. O processo de conscientização leva em consideração um estado de vigília do córtex cerebral, comandado pelo centro regulador da base do cérebro e, ainda, a presença de um conjunto de lembranças (engramas) ligadas à sensibilidade e integradas à imagem do nosso corpo (imagem do EU), e lembranças perpetuamente evocadas por nossas sensações atuais. Ou seja, a equação aceitação/rejeição se fundamenta na reação emotiva de interesse/desinteresse, simpatia/antipatia. Pavlov se referia a isso como reflexo de orientação. Fator variável O fenômeno varia de candidato para candidato. Paulo Maluf, por exemplo, sempre teve altos índices de rejeição em São Paulo, mas passou a administrar o fenômeno depois de muito esforço. Mudou comportamentos e atitudes. Tornou-se menos arrogante, o nariz levemente arrebitado desceu para uma posição de humildade e começou a conversar humildemente com todos, apesar de não ter conseguido alterar aquela antipática entonação de voz anasalada. Os erros e as rejeições dos adversários também contribuíram para atenuar a predisposição negativa contra ele. Purgou-se, também, pelos pecados mortais dos outros. Ruim por ruim, vou votar nele, pensam seus contingentes eleitorais. A velha política Em regiões administradas pela velha política, a rejeição a determinados candidatos se soma à antipatia ao familismo e ao grupismo. O eleitor quer se libertar das candidaturas impostas ou hereditárias. Mas não se pense que o caciquismo se restringe a grupos familiares. Certos perfis, mesmo não integrantes de grandes famílias políticas, passam a imagem de antipatia, seja pela arrogância pessoal, seja pelo estilo de fazer política, ou pelo oportunismo que suas candidaturas sugerem. Em quase todas as regiões, há altos índices de rejeição, comprovando que os eleitores, cada vez mais racionais e críticos, estão querendo passar uma borracha nos domínios perpetuados. Ir ao fundo A rejeição até pode ser diminuída, quando o candidato, indo ao fundo nas causas profundas que maltratam a candidatura, enfrenta o problema sem tergiversação ou firulas. Pesquisas qualitativas, com representantes de todas as classes sociais, indicam as causas. Aparecerão questões de variados tipos: atitudes pessoais, jeito de encarar o eleitor, oportunismo, mandonismo familiar, valores como orgulho, vaidade, arrogância, desleixo nas conversas, cooptação pelo poder econômico, história política negativa, envolvimento em escândalos, ausência de boas propostas, descompromisso com as demandas da sociedade. Para enfrentar alguns desses problemas o candidato há de comer muita grama. Ajustar a identidade Não se diminui a rejeição de uma hora para outra. Ao contrário, quando o candidato demonstra muita pressa para diminuir a rejeição, essa atitude passará a ser percebida pelo conjunto de eleitores mais críticos, que é exatamente o grupamento mais afeito à rejeição. E aí ocorre um bumerangue, ou seja, a ação se volta contra o próprio candidato, aumentando ainda mais a predisposição negativa contra ele. Trabalhar com a verdade, eis um ponto-chave para administrar a taxa de rejeição. O eleitor distingue factoides de fatos políticos, boas intenções de más intenções, propostas sérias de ideias enganosas. O candidato há de montar no cavalo da própria identidade, melhorando as habilidades e procurando atenuar os pontos negativos. Equilíbrio É erro querer mudar de imagem por completo, passar uma borracha no passado e cosmetizar em demasia o presente. Mas é também grave erro persistir nos velhos hábitos. Mudar na medida do equilíbrio. Mudar sem riscos. Inovar é preciso. De maneira gradual. Urge ter cuidado com mudanças constantes e bruscas, de acordo com a sabedoria da velha lição: não ganha força a planta frequentemente transplantada. Parte II Raspando o tacho O caso Petrobras: Tem mosca na sopa. - Por trás das matérias que mostram queda no valor da Petrobras no mercado, há um acervo de fatos positivos, que não têm merecido o devido destaque. - O Lucro líquido de 2023 = R$ 124,6 bi - ~ USD 25 bi, é maior que as multinacionais globais TotalEnergies (Fr) e Chevron (EUA). É o terceiro maior lucro dentre as grandes empresas de petróleo, atrás apenas de Exxon e Shell que são maiores e mais espalhadas pelo mundo. - No cenário em que o preço do barril (Brent) caiu 18% e o crack/diesel caiu 23%, a Petrobras conseguiu bater 13 recordes operacionais incluindo maior produção de diesel S10, maior uso da capacidade de refino e maior processamento de gás da história da empresa dentre outros recordes em produção, refino, engenharia, gás, redução de emissões, patentes, diesel, logística etc. - Já no cenário de preços internacionais voláteis e altos, a empresa conseguiu contribuir para dar mais estabilidade aos preços e reduzir o custo da gasolina A (na porta da refinaria, antes da adição de etanol anidro) em mais de 14% e o do diesel-A (porta da refinaria, antes da adição de biodiesel) em quase 30% (28,6%). O querosene de aviação e o botijão de gás igualmente apresentaram redução na porta das refinarias da Petrobras. - A dívida financeira da Petrobras foi reduzida em mais de 6 bilhões de reais, com o ganho de mais de 112% de retorno total das ações preferenciais em NY (em dólar) - valor muito superior ao maior retorno das maiores (que foi de 20%). - Quanto aos dividendos, cumpriu-se a regra de distribuição de dividendos mínimos de 45% do fluxo de caixa livre, e o Conselho de Administração votou pela retenção de 100% dos dividendos extraordinários numa conta que só pode ser usada para remuneração de acionistas, ou seja, apenas diferiu sua distribuição no tempo. O total de dividendos distribuídos referentes a 2023, por enquanto, ultrapassa 72 bilhões de reais (bem abaixo dos 222 bilhões do último ano de Bolsonaro, quando a intenção era claramente esvaziar a empresa e vender seus ativos e pulverizar seu capital). - A Petrobras está em linha com as empresas congêneres, distribuindo na média o que as empresas globais semelhantes também distribuem. - Por que, então, tanta carga negativa? Interesse político, meus caros. - As críticas à gestão carregam um viés político. Há sintonia fina entre a direção da empresa e o Palácio do Planalto. Jean-Paul Prates conta com o endosso de Lula. Que vê "choradeira" do mercado. Detecta-se. inclusive, fogo amigo. Uns tiros deflagrados pelo próprio PT. Afora, os tiros do Ministério de Minas e Energia. Avaliação do governo - O próprio Lula reconhece que o governo ainda não entregou o que prometeu. Daí a queda na avaliação da administração. - São Paulo, capital, é o maior polo crítico da administração lulista. - A lua de mel entre Lula e a comunidade política chega ao fim. Agora, as massas querem ver resultados. - A continuar seu crescimento, daqui a pouco, Ricardo Nunes ultrapassará Guilherme Boulos em São Paulo. - Este analista enxerga muito estardalhaço no episódio da foto manipulada pela princesa de Gales, Kate Middleton. Muito barulho por nada. Uma simples foto para mostrar a família. - Bolsonaro até que apreciaria aumentar o seu "índice de vitimização". A prisão calharia bem nesse momento. - A deputada Federal Rosângela Moro saiu do Paraná, onde mora, para São Paulo, onde se elegeu. Ante a possibilidade de cassação do marido, senador Sérgio Moro, por abuso do poder econômico, quer voltar a ter domicílio eleitoral no Paraná. E se candidatar ao Senado e ocupar o lugar do marido. Um deboche. A lei eleitoral até abre essa chance. Convenhamos, um deboche. - Arthur Lira, presidente da Câmara, assume, a cada dia, a postura de um primeiro-ministro. Só mesmo nesse parlamentarismo à brasileira. - As guerras na Ucrânia/Rússia e na faixa de Gaza/Israel/Hamas não dão sinais de arrefecimento.
quarta-feira, 6 de março de 2024

Porandubas nº 839

Abro a coluna com a historinha de um gaúcho bem "esperto". Na barbearia Certo dia, chega à barbearia juntamente com um menino, ambos para cortar o cabelo. O barbeiro, gente mui buena, faz um corte da moda no gaúcho, que aproveita para aparar a barba, a sobrancelha, os pelos do nariz, enfim, um trato geral. Depois de pronto, é a vez do guri. Diz o gaúcho ao barbeiro: - Tchê, enquanto tu corta as melena do guri, vou dar um pulo até o bolicho da esquina comprar um cigarrito e já tô de volta. - Tá bueno! - diz o barbeiro. Termina de cortar o cabelo do guri e o matreiro não aparece. - Senta aí e espera que teu pai já vem te buscar, diz ao moleque. - Teu irmão, teu tio, seja lá o que for, senta aí. - Ele não é nada meu! - fala o guri. O barbeiro pergunta intrigado: - Mas quem é o animal, então? - Não sei! Ele me pegou ali na esquina e perguntou se eu queria cortar o cabelo de graça! Parte I - O caminhar das eleições Os sem-discurso Por todas as regiões do país, ao lado dos Sem-Emprego, Sem-Terra, Sem-Teto, Sem-Escola, cresce a categoria dos Sem-Discurso. Trata-se da leva de pré-candidatos que levarão para os eleitores, nas eleições de outubro, uma boca cheia de intenções, um bolso cheio de dinheiro e uma cabeça carente de ideias. Geralmente os Sem-Discurso são ricos, administram interesses de grupos e são usados por partidos como financiadores de campanhas. São inexperientes em política e acreditam que o poder do dinheiro é capaz de operar milagres e colocá-los no pedestal mais alto. São centenas entre os 5.570 prefeitos de cidades brasileiras. A despolitização Não há exceção. Todos os Estados possuem candidatos Sem-Discurso, até porque eles se multiplicam nas sombras da abundância da sociedade industrial, que se caracteriza pela despolitização. Nas últimas décadas, vemos as doutrinas fenecerem, as utopias falecerem e as tecnocracias se expandirem. A administração das coisas tem substituído o governo dos homens. Os Sem-Discurso constituem a graxa de um ciclo, onde a densidade ideológica da competição política é cada vez menos forte. Parlamento e Executivo Por uma dessas contradições da cultura brasileira, os Sem-Discurso se fazem mais presentes na Câmara Federal e no Senado, na Câmara de vereadores, nas prefeituras e governos estaduais. Vejam o caso do Senado, um céu, segundo dizia o velho senador Dinarte Mariz, da ex-UDN do RN. Dos 81 senadores que ali chegam, há um grande grupo de suplentes que entram na cúpula convexa por causa do afastamento de titulares, guindados a governos de Estados e a ministérios. No Senado, a divisão entre senadores de primeira e segunda classes é mais expressiva que a distinção entre o alto e o baixo cleros na Câmara. Inexpressivos Muitos ex-governadores se sentam ao lado de figuras inexpressivas no campo da política e da administração pública. Esfacela-se, assim, a imagem de grandeza do Senado, que, desde o Império Romano, é, por excelência, a casa que abriga nomes de maior respeito de uma Nação. Por isso, justifica-se um antigo projeto de lei - atualmente engavetado - que redefine critérios para eleição de suplentes. Há, até, a ideia de se levar para o Senado, na vaga do titular afastado ou licenciado, o deputado Federal mais votado no Estado. Os "recursados" Enquanto isso não acontece, cresce, nos Estados, a procura por figuras Sem-Discurso, porém Com-Recursos, para azeitar as campanhas. É o que veremos no pleito de 2016. Teremos, portanto, um vasto espaço para oba-oba, reuniões sociais e empresariais, encontros que buscam engajamento e solidariedade em torno de candidatos que mal sabem recitar as funções de um senador. Que ninguém se iluda. Já na campanha municipal deste ano, nomes, propostas, projetos, experiências e atitudes serão conferidos a rigor pelo eleitorado. Se os mal alinhavados candidatos a prefeito e vereador quiserem um bom conselho, aí vai: procurem um discurso, uma identidade, um diferencial. Abandonem a linguagem tatibitate, patética e mirabolante. A micropolítica Para candidatos a prefeito, também é oportuno lembrar a mudança no mapa cognitivo do eleitorado: a micropolítica (questões locais, regionais) ganha mais pontos que a macropolítica (temas generalistas e difusos). Dinheiro, sozinho, não ganha campanha. E inexiste sorte em política. A ponte mais sólida para chegar ao eleitor se faz, ainda, com a argamassa do discurso. É claro que há bolsões que ainda reagem à moda antiga, exigindo recompensas. Nesse caso, os Sem-Discurso concorrerão com caciques que sempre levam a melhor, porque contam com o voto de cabresto. O discurso apropriado A intuição está cedendo lugar ao planejamento. Aquilo que um candidato acha que pode dizer deve passar, previamente, pelo pré-teste da aferição popular. E quem quiser chegar mais perto dos números finais de campanha, deve se lembrar da aritmética eleitoral: cerca de 20% dos votos esperados normalmente desaparecem. Parte dos eleitores gosta de cometer uma "traiçãozinha", outra parcela é permeável às "pressões" de última hora. O voto mais seguro ainda é aquele compromissado com o discurso, a proposta, o ideário. Todo cuidado é pouco para quem gosta de fazer campanha à base de meros refrões publicitários. Fraseados e palavras bonitas, quando artificiais, não fazem a cabeça do eleitor. Frequentemente, transformam-se em bumerangue, voltando-se contra o próprio candidato. Parte II Raspando o tacho... - Lula quer ver o Brasil como potência no campo do petróleo, ao lado do Brasil, líder no campo da sustentabilidade, da energia verde. Algo não combina. - O general Freire Gomes, ex-comandante do Exército, deu o empurrão final: Jair Bolsonaro queria dar um golpe. E tinha conhecimento da minuta da "virada de mesa". - O tenente-brigadeiro do ar, Carlos de Almeida Baptista Junior, também dera depoimento à Polícia Federal sobre os fatos apurados na investigação do plano do golpe. Teria confirmado. - É questão de tempo. Bolsonaro deverá ser preso. E ganhar de vez o papel de vítima. O país continuará rachado. - Trump não foi julgado pela Suprema Corte dos EUA, que decidiu sobre a competência dos Estados no veto à candidatos presidenciais. O mérito não entrou na decisão. Ou seja, os processos contra Donald Trump continuam em pauta. - A França tomou direção oposta aos EUA. Inseriu na Constituição o direito das mulheres ao aborto. 86% dos franceses apoiam a constitucionalização do aborto, como demonstrou uma pesquisa do final de 2022 - taxa bem superior à do Brasil, onde a aprovação ao aborto é de 39%. - O ano eleitoral escancara o cofre público. Uma dinheirama para a campanha municipal. - O presidente do STF, Luis Barroso, disse que as Forças Armadas fizeram "um papelão" e foram "arremessadas" da política, por ocasião das últimas eleições presidenciais. - As Forças Armadas inauguram a abertura de um novo ciclo de profissionalização. - Chega de morticínio. Que os senhores das guerras na Faixa de Gaza e na Ucrânia entrem em um ciclo de paz. Urge cessar fogo. Fecho a coluna com uma historinha de português (para gáudio da colônia) Pregos Garcia - 2000 anos de garantia Um português abre filial de sua loja de pregos em Roma. Como a propaganda é a alma do negócio, fez um outdoor com a figura de Cristo pregado à cruz e em baixo estava escrito: - "Pregos Garcia - 2.000 anos de Garantia". Foi aquele rebuliço. O Bispo de Roma foi pessoalmente conversar com o português e explicar-lhe que não podia fazer aquilo, um pecado mortal... Então o português resolveu fazer um novo outdoor. Colocou Cristo com uma das mãos pregadas na cruz e a outra solta, a acenar. Em baixo estava escrito: - "Adivinhe em qual mão foi usado o Prego Garcia?" Meu Deus do céu! Até o Santo Papa saiu do Vaticano e foi conversar com o português: - Que heresia meu filho! Não se pode usar Jesus Cristo como personagem de propaganda... Inventa outra coisa e retire isto imediatamente! O portuga pensou, pensou, pensou e... - Ok se é assim, vou fazer um novo outdoor, desta vez sem a imagem de Cristo! Colocou a foto da cruz vazia e em baixo o escrito: - "Se o Prego fosse Garcia, o tipo não fugia..." (Anedota sugerida por Maria Mouzinho).
quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Porandubas nº 838

Historinhas conhecidas que merecem repeteco. Por que não? Quando Winston Churchill fez 80 anos, um repórter de menos de 30 foi fotografá-lo e disse: - Sir Winston, espero fotografá-lo novamente nos seus 90 anos. Resposta de Churchill: - Por que não? Você me parece bastante saudável. Veneno no seu chá Bate-boca no Parlamento inglês. Aconteceu em um dos discursos de Churchill em que estava uma deputada oposicionista, Lady Astor, conhecida pela chatice. Ela pediu um aparte (Sabia-se que Churchill não gostava que interrompessem os seus discursos, mas concedeu a palavra à deputada). E ela disse em alto e bom tom: - Sr. ministro, se Vossa Excelência fosse o meu marido, eu colocava veneno em seu chá! Churchill, lentamente, tirou os óculos, seu olhar astuto percorreu toda a plateia e, naquele silêncio em que todos aguardavam, mandou: - Nancy, se eu fosse o seu marido, eu tomaria esse chá com prazer! Parte I - A conjuntura O tamanho do comício 185 mil ou 750 mil participantes? Afinal, qual foi o montante aproximado da massa na avenida Paulista, domingo, 25 de fevereiro, por ocasião do evento convocado por Bolsonaro? A USP, usando critérios técnicos e medições que primam pelo cuidado, calcula em 185 mil, o maior número já registrado por seus cálculos. A PM fala em 750 mil. A PM, do governo Tarcísio de Freitas, correligionário de Bolsonaro. A PM, que tem dito não mais fazer cálculos, decidiu abolir suas medições. E que, agora, volta a insistir com seus registros. Em quem acreditar? O que importa Seja qual for o número, importa reconhecer que o evento foi um empreendimento vitorioso. Recebeu muita gente. Bolsonaro demonstrou ser capaz de promover grandes manifestações. E mostra, mais uma vez, que o partido está dividido. As duas alas polarizam o debate. Jair canaliza todas as energias que não se postam ao lado do lulopetismo, que continua a receber a contrariedade de quase metade dos eleitores. O fato é que a rejeição ao petismo é forte. O PT, ao longo de sua existência, fixou uma barreira entre ele, território muito fechado, e parcela da comunidade política. Água e óleo Para milhares de brasileiros, o PT não consegue diluir o óleo que se mistura à água. Padece de uma doença que tem se alastrado desde sua fundação, no final dos anos 80. Pregou por décadas o receituário de que o partido é puro, é ético, é banhado nas águas límpidas da dignidade. Foi pego com a mão na massa. O escândalo do mensalão, o escândalo do petrolão. Caiu na vala comum dos manchados entes partidários. Governou o Brasil por anos a fio. Lula chegou ao seu terceiro governo sob a crença de que foi o maior presidente do país, chegando a ultrapassar Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek. O impacto Voltando ao evento da Paulista. É claro que o acontecimento marca um gol no campeonato de disputas pelo poder. Bolsonaro deixa claro que é candidato em 2026, esperando uma nova decisão da Justiça para voltar a ganhar elegibilidade. Espera, igualmente, fazer uma grande bancada de prefeitos e vereadores na eleição de outubro próximo. Lula vai correr o país, tentando nadar nas águas da estabilidade da economia. Se o ambiente lhe for favorável, com os brasileiros agradecidos por terem um bom dinheiro no bolso, Luiz Inácio será o maior eleitor em outubro. A recíproca é verdadeira. A pororoca É possível haver uma pororoca, com ondas balançando a canoa eleitoral? Sim. Tudo vai depender dos ventos, ou mais brandos e acolhedores ou mais devastadores. As siglas estão com um olho voltado para os fundos partidários e o outro tentando descobrir o espírito das ruas. E tome liberação de emendas. Lula escancara a porta do Tesouro. Nunca se viu tanta grana em ano eleitoral. Ou tudo ou nada. Uma derrota do petismo seria uma catástrofe. O pleito fechará ou ampliará os horizontes do amanhã. A direita em pé A direita já não tem vergonha de se posicionar como tal no arco ideológico. Maior possibilidade de ganhar estofo na contemporaneidade. E seu quadro mais significativo será Ronaldo Caiado. Mais que Tarcísio de Freitas. O governador de Goiás leva vantagem de ter melhor avaliação. Transmite a receita da experiência política, seja na esfera parlamentar, seja no espaço do Executivo. Precisa começar a se mostrar por inteiro ao país. Ganhar adeptos. Formar vínculos. A esquerda deitada A esquerda ainda se encontra deitada. Parece acomodada. O PT e Lula tomam conta dos cantos e recantos da esquerda. Os mais radicais do PSOL ou PSTU se encontram distantes dos grandes conglomerados. A exceção é Guilherme Boulos, o mais forte pré-candidato à prefeitura de São Paulo. Se Boulos se firmar, a esquerda teria a chance de vir a governar a maior metrópole do país, e, sob essa moldura, adubar as sementes da floresta de 2026. Kassab escondido Gilberto Kassab já foi melhor no campo da articulação e visibilidade. Parece escondido. O comandante do PSD estaria sob a sombra do lema "passarinho na muda não pia". É estranho seu desaparecimento. O que seu amigo Guilherme Afif Domingos, também secretário da gestão Tarcísio, em São Paulo, acha? Aloysio Nunes em zigue-zague Aloysio Nunes Ferreira, uma das melhores cabeças pensantes destas terras, caminha em zigue-zague, dois pra lá, dois pra cá. Continua no PSDB e vai dirigir a APEX, a partir da Bélgica. O ex-governador e ex-senador estava à frente da SP Negócios, ligada à prefeitura de SP, chefiada por Ricardo Nunes, do MDB. Nomeado por Lula, que demonstra ser um bom pescador. Curto ensaio ético I A entrada na terceira década do século XXI pode significar a abertura de um ciclo ético na política? A pertinência da questão se relaciona aos movimentos pela depuração ética, que brotam no seio da sociedade e o motor principal são as denúncias de velhas práticas e obsoletos padrões no modus operandi da política. O fato é que uma fogueira ética começa a esquentar a paisagem política não apenas brasileira, mas internacional, deslocando eixos tradicionais de poder para a sociedade, que passa a ser mais autogestionária e determinada a cumprir as suas metas de bem-estar. Curto ensaio ético II A ética na política e na administração pública é um dos instrumentos que a sociedade coloca no plano estratégico de suas lutas. E a consequência imediata dessa vontade ocorre no palco político. A relação entre ética e política é bastante estreita, tratando a primeira, pela visão aristotélica, da análise das virtudes, a busca da felicidade, a consideração sobre o conceito de justiça e a segunda tratando da análise das normas constitucionais e dos regimes mais adequados para bem servir a comunidade. Portanto, não há justiça, virtude ou felicidade à margem da sociedade política. O plano político afeta o plano ético e vice-versa. Donde se pode concluir que qualquer aperfeiçoamento ético no país terá fortes repercussões sobre a arena política, o terreno da administração pública, a relação entre o poder público e os grupos privados e o perfil da autoridade. Parte II Raspando o tacho - O programa de recapeamento do prefeito Ricardo Nunes começa a exasperar os motoristas na capital paulista. Muita interrupção do fluxo de trânsito. Congestionamentos promovem indignação. - A Covid voltar a atacar forte. Os registros de casos e mortes aparecem com intensidade. - A dengue também exibe dados preocupantes. Nas gavetas, faltam vacinas. - Cheias ao norte, chuvas no Nordeste, seca em algumas regiões. O retrato de um país continental. - O PSDB quer evitar revoada de tucanos. Está difícil. - A janela partidária será aberta em 7 de março, fechando-se em 5 de abril. Permite que candidatos que detenham mandato possam trocar de partido sem que sejam punidos por infidelidade partidária. Isso pelo motivo de a legislação proibir a troca partidária ao longo do mandato. - Lula deixa de responder perguntas inconvenientes. Uma, de uma repórter de Valor Econômico, Lu Aiko Otta, sobre o evento de Bolsonaro na avenida Paulista. Fecho a coluna com uma historinha sobre o bem e o mal. Jung e o rei africano Jung perguntou, uma vez, a um rei africano: - Qual é a diferença entre o bem e o mal? O rei meditou, meditou e respondeu às gargalhadas: - Quando roubo as mulheres do meu inimigo, isso é bom. E quando ele rouba as minhas, isso é muito ruim.
quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

Porandubas nº 837

Abro a coluna com o "francês" Dirran. Infame, mas engraçada...! Dirran (com "biquinho" para parecer um francês correto), galego meio sarará, entroncado e de pernas curtas, jogava no Clube Atlético Potengi, no Rio Grande do Norte. Um dia, disputava no Machadão uma partida contra o Potyguar de Currais Novos, pela 2ª divisão do campeonato potiguar. O jogador atleticano era o destaque. Fazia dribles desconcertantes e lançamentos perfeitos. Fechou as glórias com um golaço. O narrador da rádio Poti gritava: "Dirran é um craque", "Dirran, revelação do futebol norte-rio-grandense". Dirran prá cá, Dirran pra lá. No final do jogo, o Clube Atlético Potengi perdeu por 3 x 1. Mas o destaque foi Dirran. Vendo todo aquele sucesso, um jovem repórter da Rádio Poti correu para fazer uma entrevista com o craque na beira do gramado. Disparou uma bateria de perguntas: "Você tem parentes na França? Qual a cidade onde nasceu, Monsieur? Como veio parar no Brasil? Pode comparar o futebol europeu com o futebol brasileiro? Qual a origem de seu nome?" Espantado, sem atinar com a situação, o jogador respondeu ao incrédulo repórter: "Pera aí, meu sinhô, num é nada disso; meu apelido é Cú de Rã, mas como num pode falar na rádio, então, eles abreveia pra Dirran." (Historinha enviada pelo amigo Álvaro Lopes). Parte I A conjuntura - A síndrome do touro A fala desastrada do presidente Luiz Inácio, ao comparar a guerra de Israel contra o Hamas, na faixa de Gaza, com o holocausto, que ceifou a vida de seis milhões de judeus, nos coloca diante de uma das mais terríveis síndromes da contemporaneidade: a síndrome do touro, o animal que pensa com o coração e arremete com a cabeça. Lula ganhou do governo de Israel a pecha de "persona non grata", um ato de rejeição da diplomacia para pessoas indesejáveis, que não recebem o status de bem-vindas ao país atingido. Lula não vai pedir desculpas, sob a crença de que "sacudiu o mundo", nas palavras de seu assessor para assuntos internacionais, Celso Amorim. O Estado-Espetáculo Lula vai presidir o G20, numa temporada que confere ao Brasil uma posição de destaque no campo da visibilidade nesse ano. Pensa em usar o grupo das 20 Nações mais poderosas no campo da economia para acabar ou diminuir a fome no mundo. No horizonte, sinaliza com o recebimento do Prêmio Nobel da Paz. Com a expressão sobre os judeus, "a vaca vai pro brejo", ou seja, o sonho do Nobel vai para o atoleiro. O Estado-Espetáculo parece guiar os passos do mandatário em seu terceiro governo. Brilho, glórias, aplausos, subir ao pódio da visibilidade mundial - eis a teia com que Lula sonha para acolher sua imagem. Impactos A fala de Lula terá impactos na área da política. De um lado, afastará de suas proximidades a poderosa comunidade judaica, que tem forte influência no meio da pirâmide social. De outro, verá mais longe a comunidade de igrejas religiosas que, hoje, ainda estão próximas do bolsonarismo. Há tempos, Luiz Inácio procura atrair esses núcleos. Sem sucesso. E agora, os verá mais distantes. É fato que Lula procurou uma fala para massagear o coração de sua base encravada no território da extrema esquerda. Há um contingente que concorda com seu antissemitismo. O país continua dividido. Lula perde com a boca falante. Encarna a síndrome do touro. Boulos, Tábata e Nunes Guilherme Boulos, o candidato do PSOL apoiado pelo PT, receberá respingos da cachoeira palanqueira de Lula. Fosse Tábata Amaral mais experiente, canalizaria muitos votos desgarrados do lulopetismo. Quem sabe, mais adiante poderá ser mais viável. Hoje, o prefeito Ricardo Nunes, MDB, é quem mais se beneficia dos indignados contra Lula. Nunes espera contar com a massa satisfeita com seu programa de recapeamento. Boulos espera agregar setores do centro. Tábata tem esperança de que sua imagem ganhará densidade na esteira de maior conhecimento junto ao eleitorado. Bolsonaro no palanque Dia 25 próximo, domingo, Jair Bolsonaro espera um milhão de pessoas na avenida Paulista. Quer ver muita gente no que espera ser o comício inicial do terceiro turno das eleições. Pode juntar bastante gente, mas não a quantidade com que sonha. O pastor que comandará o espetáculo é Silas Malafaia, sem apelo popular em São Paulo. Diz que contratará dois carros de som. Só? Garante-se que cerca de 100 deputados Federais confirmaram presença. Bolsonaro passa a impressão de que quer se vitimizar e receber o aplauso das massas. O papel de vítima lhe convém em momento de tiroteio na imagem de Lula. P.S. Nunes, o prefeito, perderá ou ganhará com sua eventual presença no palanque da Paulista? Os paradoxos da modernidade Não há lugar para certezas nesse quase meado da segunda década do século XXI. Não deixa de impressionar a escalada de paradoxos da modernidade: nunca se gastou tanto em segurança pública e privada, mas os cidadãos nunca se sentiram tão inseguros; investem-se bilhões e bilhões em biotecnologia e nas mais diversas áreas da medicina para prolongar o tempo de existência do ser humano, mas o percurso de uma pessoa sobre a terra é um fio tênue e fragilizado pela ciclópica cadeia de problemas das cidades. Por momentos, ondas de civismo banham Nações, fortalecendo a consciência da Cidadania, mas cresce também a letargia da alienação, decorrente do stress, dos medos, da insegurança, da falta de governos, da ausência de políticas públicas capazes de acender o entusiasmo das populações. Cadeias máximas? A venda de fugas passou a ser um grande negócio. Essa fuga de dois bandidos da cadeia de segurança máxima de Mossoró/RN é o cume da montanha da contradição em que vive o país. Nossas cadeias mais seguras mostram que são inseguras. Diz-se uma coisa e a realidade é outra. O nosso território está inundado de drogas, milícias e violência. Estamos passando da posição de corredor de drogas para o ranking dos consumidores. Os governos prometem agir. Mas agem em outras direções. Arrecadar mais, por exemplo. É isso que mais entusiasma a burocracia de Brasília. A arte de governar Há 227 anos, o segundo presidente dos Estados Unidos, John Adams, fazendo uma reflexão sobre os governos, dizia que "todas as ciências progrediram, menos a de governar, que não avançou, sendo praticada apenas um pouco melhor que há quatro mil anos". O conceito se amolda a alguns dos nossos governantes. Daltônicos, confundem cores. Insensíveis, invertem prioridades. Agem como touros, decidindo com o coração e arremetendo a cabeça contra as massas. Abílio Diniz A coluna presta homenagem a um empreendedor de vulto. Um visionário que espalhou grandeza pelos campos em que caminhou. Um homem trabalhador. Um amigo das artes e da cultura. Um amante dos esportes. Um são-paulino como este escriba. Viva, Abílio Diniz. Viva! Viva! Viva! Parte II Raspando o tacho - A convocação do embaixador brasileiro em Israel, Frederico Salomão Duque Estrada Meyer, pelo governo israelense, para receber uma reprimenda no espaço do Museu do Holocausto, e não na sede do Ministério de Relações Exteriores, como é praxe, foi um gesto extravagante. Mais ainda pelo fato de que o chanceler israelense puxou a orelha do nosso embaixador em uma fala em hebraico, sem tradução simultânea, merecendo apenas um olhar interrogativo de Duque Estrada. - Lula vai fazer campanha municipal nas grandes cidades. Quer chegar em 2026 equipado. - O oposicionismo ganha mais uma pauta em seu calendário de críticas ao governismo: o alinhamento simpático de Luiz Inácio a Maduro, da Venezuela, e Putin, da Rússia, que não são democracias. - Por falar em Putin, ele está ganhando a guerra contra a Ucrânia. E se dando ao luxo de presentear o ditador da Coréia do Norte, Kim Jong-un, com uma limusine fabricada na Rússia, no mesmo estilo da que lhe serve no Kremlin. Um carrão. - O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, está no Brasil para uma rodada de conversas. Chegou sem estardalhaço. Trata-se de funcionário que está em primeiro lugar na ordem de precedência e na linha de sucessão presidencial. Blinken conversa hoje com Lula e participará de reuniões do G20, que reúne as maiores economias do mundo. Com Lula, deve discutir as questões bilaterais e globais entre Brasil e Estados Unidos. - A questão da idade estará no centro do debate presidencial nos EUA. Joe Biden estaria se esquecendo de coisas importantes. Memória falha. Trump, com 77, tem apenas quatro anos a menos do que Biden, com 81 anos. Em 2026, Lula terá 80. - O vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, em palestra na FIESP, segunda-feira, ganhou aplausos da plateia ao demonstrar amplo conhecimento sobre os terrenos da indústria, história da globalização, meio ambiente, medicina, e até - pasmem - biologia. Um arquivo ambulante de números, temas da atualidade e historinhas hilárias. Fecho a coluna com a desconfiança do coronel Juca Peba. Desconfiado e matreiro, o coronel Juca Peba não era de muita conversa. Tinha dinheiro, e muito, guardado sob o travesseiro. Até o dia que inauguraram a Agência do Banco do Brasil, em Cajazeiras. A gerente foi procurar o coronel Juca Peba com o argumento: - Coronel, bote o dinheiro no banco. Vai ser guardado, bem guardado, e vai render juros. Depois de muita conversa, e muitos cafés no varandão da casa, o coronel, ainda desconfiado, foi ao banco. Com 100 contos numa bolsa de couro. Tirou devagar o pacote. Contou. Uma, duas, três vezes. Depositou. Matreiro, ficou na espreita, na calçada, olhando, espiando o movimento do banco. Para ver se aquele troço não era tramoia. A desconfiança aumentou. Entrou no banco. Foi ao Caixa. Ordenou: - Quero os 100 contos que eu botei aqui. Já. Aflito, o bancário foi buscar o dinheiro. O coronel pegou o maço. Conferiu. Uma, duas, três vezes. E devolveu, sob a expressão juramentada: - Eu só queria mesmo conferir. Pode guardar.
quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Porandubas nº 836

Abro a coluna com o impagável José Maria Alkmin. Calma, prisão suavemente... José Maria Alkmin foi advogado de um crime bárbaro. No júri, conseguiu oito anos para o réu. Recorreu. Novo júri, 30 anos. O réu ficou desesperado: - A culpa foi do senhor, dr. Alkmin. Eu pedi para não recorrer. Agora vou passar 30 anos na cadeia. - Calma, meu filho, não é bem assim. Nada é como a gente pensa da primeira vez. Primeiro, não são 30, são 15. Se você se comportar bem, cumpre só 15. Depois, esses 15 são feitos de dias e noites. Quando a gente está dormindo tanto faz estar solto como preso. Então, não são 15 anos, são 7 e meio. E, por último, meu filho, você não vai cumprir esses 7 anos e meio de uma vez só. Vai ser dia a dia, dia a dia. Suavemente. (Sebastião Nery conta a historinha em Folclore Político). Parte I A violência afugenta investidores A manchete faz o alerta: a violência é um fator que afugenta os investidores no Brasil. E faz com que o país deixe de crescer 0,6 ponto do PIB. É a análise do Fundo Monetário Internacional mostrando que insegurança custa caro ao país e diminui a produtividade da economia. No últimos dias, o país tem vivido episódios que atestam como a violência afeta a economia. Na rua Santa Ifigênia, centro de comércio eletrônico da capital paulista, um empresário teve sua loja invadida. O prejuízo foi de R$ 300 mil e o dono decidiu fechar seu estabelecimento. Na Cracolândia, região central de São Paulo, lojas de produtos eletrônicos foram também invadidas. Expansão do crime Nos últimos anos, o número de estabelecimentos comerciais na região despencou, de acordo com matéria de O Estado de São Paulo. Em 10 anos, a quantidade de empresas caiu de 15 mil para cerca de 2,5 mil. O ambiente é de medo. Veja, leitor: antes de você terminar de ler este parágrafo, mais de dois cidadãos estão tombando ou sendo assaltados, nos vastos espaços do território nacional, vítimas da bandidagem. Entre janeiro e outubro do ano passado, 71.078 pessoas morreram por causas violentas, uma média de 234 mortes por dia. De cinco doentes que baixam nos hospitais brasileiros, pelo menos um é vítima de uma "guerra civil" que mata por ano quase 50 mil brasileiros, três vezes mais que nos Estados Unidos, mais gente que os mortos em conflitos étnicos, e mais do que a guerra entre Rússia e Ucrânia. O rombo da previdência A violência empobrece o país. O rombo da Previdência tem a colaboração do cano assassino que aleija multidões, alarga fila de hospitais, multiplica pensões de viúvas e devasta 10% do PIB, ou seja, R$ 84 bilhões, dinheiro que poderia estar sendo investido em hospitais, escolas, habitação, transportes, agricultura. Mata-mata O quadro é aterrador: bandidos assaltando, matando pessoas; chacinas explodindo nos finais de semana; policiais matando bandidos; bandidos matando policiais; policiais matando policiais; bandidos roubando o dinheiro de companheiros presos; cárceres apinhados; estupros e mortes violentas cometidas pela mais fria estupidez. O número total de custodiados no Brasil é de cerca de 650 mil em celas e cerca de 200 mil em prisão domiciliar. Nas prisões-depósito, feitas para abrigar 107 mil presos, cerca de 196 mil presos germinam novas formas de violência, enquanto as gavetas se entopem com 240 mil mandados de prisão, envolvendo, no mínimo, 100 mil bandidos soltos nas ruas, 40 mil só em São Paulo. Proporção geométrica A brutalidade jorra em proporção geométrica e as paliativas soluções governamentais - melhoria e ampliação do sistema penitenciário, reforço e reaparelhamento das polícias - estão longe de um crescimento em proporção aritmética. Os cinturões metropolitanos, já saturados de lixões que ofertam um banquete pantagruélico para urubus, crianças e mães famintas, são também palco para a exibição de corpos chacinados em decomposição, vítimas do maior ciclo de violência do Brasil contemporâneo. Trata-se, no fundo, da projeção da sombra do FMI sobre o país, com seu rígido programa monetário e escandaloso custo social. Recursos necrológicos A miséria dos conglomerados periféricos abre vastas oficinas de morte. E assim o mais rico país do mundo em recursos biológicos está se transformando no mais fértil país do mundo em recursos necrológicos. Os descalabros se sucedem na área de segurança, com a bandidagem produzindo a mais aterradora estatística de mortes violentas de que se tem notícia. Os governos, inermes, permanecem estáticos, olímpicos, discursivos, eloquentes, apenas cheios de boas intenções. As polícias estão desmotivadas. O crime compra espaços nas prisões, superlotadas, nas delegacias e nos quartéis. E a solução certamente não passa pela pedagogia da soltura de bandidos perigosos, como querem alguns. A onda mundial do crime É triste. O país se torna um dos países mais violentos da humanidade. A violência, de tão desalmada, está matando a vontade do povo. Sem ânimo, emoções envenenadas pela angústia, os cidadãos entram no limbo catatônico, assemelhando-se a dândis em passeio macabro e estonteante por um jardim de horrores. A violência suga a vitamina da vida, a alegria de viver. O que fazer? Lutar com a arma da mobilização. Denunciar, pressionar, acusar, assinalar, abrir a palavra. Toffoli e o perdão Se há uma autoridade que parece querer ser o símbolo do perdão no país, esta é o ministro Dias Toffoli. Bilhões de dívidas de empresas que cometeram ilicitude e foram objeto de investigação pela operação Lava Jato foram suspensas por decisão do ministro. Suspensas, não anuladas, dizem advogados de clientes que advogaram contra a Lava Jato. O plenário do STF dará a palavra final? Esta é uma dúvida. Petrobras e ex-Odebrecht, investigadas pela operação Lava Jato, confessaram suas culpas. Bilhões foram devolvidos aos cofres públicos. E agora? José Paulo Cavalcanti O jurista José Paulo Cavalcanti Filho, a respeito das decisões de Toffoli e Alexandre de Moraes sobre as investigações da Lava Jato, em entrevista à Rádio Jornal (Recife), segunda-feira, explica: "Todo o palavreado dos ministros está baseado em gravações da Intercept, site de notícias que divulgou gravações sobre a Lava Jato"... (e lembra) que, nos EUA, "o Poder Judiciário aceita gravações autorizadas como prova, mas as não autorizadas apenas como provas circunstanciais, pois precisa estar acompanhada de outras evidências para ser considerada"... essa situação funcionou como "substrato" para Toffoli e Moraes... "de forma técnica, é um escândalo que isso ocorra. Na política é outro escândalo.", diz o ex-ministro da Justiça do governo Sarney, José Paulo Cavalcanti. E arremata: "eles não poderiam ter usado, e ainda que isso mudasse a gravação feita por alguém que é réu por fraudar gravações". O retrato em dados O site Poder360, criado e dirigido pelo competente jornalista Fernando Rodrigues, esboça um retrato da Lava Jato em números: "No total, de março de 2014 a março de 2019, as operações deflagradas no Rio e no Paraná resultaram em 1.644 buscas e apreensões, 262 conduções coercitivas, 347 prisões preventivas, 196 prisões temporárias. Com o descobrimento de esquemas ilícitos e a detenção de possíveis envolvidos, os procuradores da Lava Jato apresentaram 167 denúncias, muitas baseadas em delações premiadas que resultaram na abertura de inquéritos". 600 réus "Somente no âmbito do STF (Supremo Tribunal Federal) foram instaurados 300 inquéritos. Atualmente, segundo a PGR, já são mais de 600 réus. O Ministério Público também firmou 183 acordos de colaboração premiada e 12 acordos de leniência, além de 1 termo de conduta. Com os acordos de colaboração, foi possível recuperar R$ 13 bilhões. Os procuradores também fizeram 548 pedidos de cooperação internacional no âmbito da Lava Jato, sendo 269 pedidos ativos para 45 países e 279 pedidos passivos com 36 países. No Paraná, o MP apresentou 91 denúncias no âmbito da Lava Jato, nas quais 426 pessoas foram acusadas de envolvimento nos crimes". Parte II Raspando o tacho - Arthur Lira, o poderoso presidente da Câmara, acha que o ministro da Articulação Institucional, Alexandre Padilha, não faz um bom trabalho. Comenta-se que pediu sua "cabeça". Lula assegura permanência de Padilha. Este, evidentemente, tornou-se alvo de Lira por ter contrariado seu desejo de avolumar sua fatia de poder. Lula espera acalmar os ânimos. Será difícil. O presidente da Câmara alardeia: o Orçamento não é uma peça apenas do Executivo. - Indícios de que a economia não dará os resultados esperados é um morteiro na imagem do governo. Pode ter impactos nas campanhas de candidatos petistas. - Bolsonaro ressuscita o "cercadinho", onde dava ligeiras entrevistas, na frente do Palácio da Alvorada. Que vontade de fustigar Lula. - Lula começa a correr o país para "nacionalizar" a campanha municipal. Começou por São Paulo e pela Baixada Fluminense. - Fez bem o Rei Charles em autorizar a transparência sobre seu estado de saúde. Tempos de clareza. - O ministro Toffoli manda investigar a ONG Transparência Internacional Brasil... - Elmar Nascimento, deputado Federal (União-BA), pode vir a ser o próximo presidente da Câmara. - A historiadora Lilia Schwarcz disputa com o romancista/diplomata Edgard Telles Ribeiro a vaga número 9, que foi ocupada por Alberto da Costa e Silva na ABL. Lilia é a favorita. Eleição daqui a um mês. Informação de Lauro Jardim, de O Globo. Fecho a coluna com um alerta aos candidatos deste ano. Propaganda negativa A revolução francesa de 1789 pode ser considerada o marco da propaganda agressiva nos termos em que hoje se apresenta. Ali, os jacobinos, insuflados por Robespierre, produziram um manual de combate político, recheado de injúrias, calúnias, gracejos e pilhérias que acendiam os instintos mais primitivos das multidões. Na atualidade, é a Nação norte-americana que detém a referência maior da propaganda agressiva, mola da campanha negativa. Este formato, cognominado de mudslinging, apresenta efeitos positivos e negativos. No contexto dos dois grandes partidos que se revezam no poder - democrata e republicano -, diferenças entre perfis e programas são mais nítidas e a polarização sustentada por campanhas combativas ajuda a sociedade a salvaguardar os valores que a guiam, como o amor à verdade, a defesa dos direitos individuais e sociais, a liberdade de expressão, entre outros. Nem sempre a estratégia de bater no adversário gera eficácia.
quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Porandubas nº 835

Abro a última coluna de janeiro com duas historinhas. Água no feijão Getúlio Vargas recebe o repórter no Palácio do Catete: - "Presidente, para vencer na política, o que é necessário?" - Vargas: "Muita coisa. Por exemplo, boa memória. A política é como água no feijão. O que não presta flutua. O que é bom repousa no fundo". Pequena reflexão. Tirando a diferença histórica: quem é bom e quem não presta na política brasileira? Quem flutua na água e quem está no fundo? Um prêmio para quem acertar a resposta. (Contada por Sebastião Nery) Será o Benedito? Às vésperas da escolha do interventor de Minas Gerais, em 1934, Benedito Valadares se encontrou no Rio de Janeiro com José Maria Alkmin: - Se você for o escolhido, me convida para secretário? - Você está louco, Benedito?, respondeu um divertido Alkmin. Dias depois, Getúlio Vargas anunciaria a escolha de Valadares, que logo recebeu um telegrama: "Parabéns. Retiro a expressão. Ass. Zé Maria". Zé Maria Alkmin acabou nomeado secretário do interior. (Enviada por Álvaro Lopes) Parte I A força dos prefeitos: pequena reflexão sobre a administração municipal Pergunta recorrente: no pleito de outubro, os prefeitos que se candidatam à reeleição têm mais chances? Resposta: em princípio, sim. Contam com uma superestrutura, milhares de servidores, que não possuem estabilidade, mas querem continuar nos seus cargos e posições, devendo se engajar, informalmente, na campanha, sob uma malha de obras na esteira do ano eleitoral. Portanto, esse aparato, por si só, pode alavancar o nome dos alcaides. A vacina da responsabilidade Os prefeitos acordaram. Depois de décadas de acomodação, regadas a mandonismo, filhotismo e votos de cabresto, a prefeitada tomou a vacina da lei de responsabilidade fiscal, aplicada sob o olhar duro de um eleitor cada vez mais crítico e exigente. O fisiologismo histórico que tem alimentado os currais eleitorais não foi embora de todo, mas está sendo paulatinamente substituído por cooptação eleitoral ancorada em ações substantivas, obras e projetos de interesse das comunidades. Os tempos do eleitor "maria-vai-com-as-outras" estão passando. Os prefeitos sabem muito bem que já não é mais possível governar com o lema: "para os amigos pão, para os inimigos pau". A velha política Os prefeitos continuam a enfeixar grandes fatias de poder. Não se trata daquele tipo de poder que Victor Nunes Leal tão bem descreveu em "Coronelismo, Enxada e Voto", um clássico sobre o mandonismo municipal: "exerce o coronel uma ampla jurisdição sobre seus dependentes, compondo rixas e desavenças e proferindo, às vezes, verdadeiros arbitramentos, que os interessados respeitam. Também enfeixam em suas mãos, com ou sem caráter oficial, extensas funções policiais, de que frequentemente se desincumbe com sua pura ascendência social, mas que eventualmente pode tornar efetivas com o auxílio de empregados, agregados ou capangas". Os coronéis "padeceram", mas deixaram herdeiros, entre os quais centenas de prefeitos espalhados principalmente nas regiões menos desenvolvidas cultural e politicamente. A micropolítica O que passa a predominar no cenário político é um conjunto de prefeitos mais conscientes, imbuídos do ideal de servir, atentos aos movimentos sociais e, sobretudo, preocupados com fazer algo mais substantivo. Promessas mirabolantes já não fazem a cabeça de um eleitor, cujas demandas se abrigam no terreno da micropolítica - a escola perto da casa, o transporte fácil e barato, a iluminação e o asfaltamento da rua, o sistema de esgoto, o alimento barato, a assistência social. E, nesses tempos de violência em crescimento, segurança. O passaporte de volta A pergunta que abriu a coluna pode ter também uma resposta negativa: não. O cargo de prefeito não garante a reeleição. Por quê? Prefeito ineficaz não se reelege e não fará o sucessor. Ganhará o passaporte para voltar à sua casa. Dinheiro até pode mudar o sentido de uma eleição, mas não tem o mesmo peso do passado. Vida limpa, passado e presente decentes, obras focadas no interesse coletivo, transparência administrativa, enxugamento de estruturas, racionalização de processos, circulação no meio do povo, desburocratização e simplificação de serviços constituem os parâmetros modernos para a conquista do eleitorado. Só dinheiro não elege O dinheiro está curto e cada centavo passa a ser valorizado. Apesar de um fundo eleitoral que ultrapassa os R$ 4 bilhões, aprovado por Lula sob pressão do Congresso. Ademais, fortalece-se o poder crítico das bases municipais, fator que se percebe na conduta de vereadores conscientes do papel fiscalizador. E, para arrematar o quadro, há uma mídia denunciativa, que procura bem informar, interpretar e opinar criticamente. O poder centrípeto Um fenômeno dos novos tempos é o poder centrípeto. Nasce nas margens sociais e corre para o centro, a denotar uma força extraordinária adquirida pela sociedade. A maior taxa de responsabilidade que incide sobre os 5.570 prefeitos do país recebe, assim, o endosso de uma malha de conscientização e controle, inserida nas organizações intermediárias da sociedade. Esse fenômeno merece estudo. Há uma nova e forte articulação social em marcha no país, pouco detectada por pesquisas e quase despercebida pelos cientistas políticos. A força emergente da sociedade nasce nos grupamentos organizados, na "nova classe" integrada por segmentos do empresariado médio, principalmente do setor terciário, que vive fase de expansão, após a pandemia da Covid-19, e, ainda, pela estrutura do comércio das cidades polos do interior e por correntes de trabalho voluntário e de religiosidade que se espalham pelo país, levando mensagens de solidariedade, esperança e renovação. Poder de pressão Milhares de entidades se formam em todas as regiões, juntando grupos de interesse e de opinião, promovendo mobilização e desenvolvendo articulação entre os eixos da grande roda social. Essa rede funciona como paredão de pressão sobre os poderes Legislativo e Executivo. E por falar em pressão, é oportuno lembrar que a comunidade municipal exerce maior pressão sobre os prefeitos que a comunidade estadual sobre a figura do governador. Quanto menor a unidade, maior será a pressão, em função da proximidade entre os agentes políticos e as bases. Governadores não são tão cobrados quanto prefeitos. Democracia participativa Nessa moldura, a democracia representativa está sendo exercida pelo universo de entidades intermediárias, com forte prejuízo para a instituição política tradicional, caracterizada pelos "catch-all parties" ("partidos agarra tudo que puderes"), na expressão de Otto Kirchheimer, cientista social alemão. Não é à toa que os nomes de candidatos, entre nós, têm prevalência sobre os partidos. Os perfis mais atraentes são os funcionais-assépticos, descomprometidos com esquemas corrompidos, de propostas diretas, objetivas e que se comunicam diretamente com o eleitorado. A impopularidade de uns e outros tem muito a ver com a embalagem que lhe proporcionam as estruturas e formas tradicionais da política. A falta de continuidade na administração pública também proporciona desconforto e descrença. O eterno retorno O povo tem a sensação de que estamos sempre recomeçando, saindo do nada. O novo governante apaga tudo que o antecessor construiu, inclusive as coisas boas. O fato gera desesperança. Por isso mesmo, o povo acalenta farta dose de apatia. Deixa as decisões para a última hora. Na nova parede, a mulher tem destaque. Ela não quer mais ser apenas figuração de cenário. Assume, cada vez mais, papel de coadjuvante. Parte II Raspando o tacho - O governo Lula coleciona derrotas no Congresso, apesar dos largos espaços concedidos ao Centrão. O corpo parlamentar derrubou até agora (repito, até agora) 53% dos vetos de Lula a MPs e projetos de lei. - Constatação à boca pequena entre analistas, consultores e jornalistas: a corrupção voltou com força nesses tempos de "eterno retorno". À propósito, o Brasil cai 10 pontos no ranking de percepção da corrupção, assinado pela Transparência Internacional. - O recapeamento em São Paulo, capital, é o mais intenso das últimas décadas. A cidade virou um canteiro de obras. Ricardo Nunes, o prefeito, pensa em "capturar" muitos votos com sua avalanche obreira. Será que pensou no "vice-versa"? Os transtornos no trânsito multiplicaram as imprecações contra o alcaide. - Voltou também com força a onda de violência, que se espraia por todos os espaços. A segurança pública, mesmo se sabendo que não é função das municipalidades, será um dos carros-chefes da campanha municipal deste ano. - Os filmes que concorrem ao Oscar enchem as salas de cinema, que estiveram vazias por um bom tempo, na esteira da pandemia de Covid. - A governadora de Pernambuco, Raquel Lira, surpreende. Por enquanto, é mal avaliada pelos pernambucanos. Pesquisas mostram que tem a menor aprovação dentre os 27 governadores do país. Levantamento da Atlas Intel diz que tem 36% de aprovação e 49% de desaprovação. Esta coluna torce para seu crescimento. - Ronaldo Caiado, de Goiás, leva, por enquanto, a melhor avaliação. Repito, por enquanto. Seu eixo? Segurança pública. - Tarcísio Nunes, de SP, tinha cerca de 60% de aprovação em dezembro. Caiu cerca de 10 pontos. Mas continua bem avaliado. Por enquanto. - O PT quer fazer uma grande bancada de prefeitos e vereadores. Será um desafio. Em jogo, uma avaliação do governo Lula 3. Fecho a coluna com um conceito. Comunicação organizacional: uma orquestra A comunicação organizacional é a possibilidade sistêmica, integrada, que reúne diversos instrumentos. Exerce a função de laço, por meio da criação de um sentimento de unidade, com todos se sentindo irmanados em um mesmo grupamento. Assemelha-se a uma orquestra, tendo, nessa imagem, a função de clarim. Ou seja, trombeteia para anunciar aos públicos os negócios e a imagem de uma organização. Possui também a função de diapasão, que procura compor uma linguagem homogênea. Registra-se, ainda, a função do apito, quando a comunicação convoca os participantes para atuarem no jogo organizacional. Por último, a comunicação organizacional usa a função de boca. A metáfora quer abrigar o cochicho, os aconselhamentos.
quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

Porandubas nº 834

Depois de uma breve interrupção, por conta das férias, a coluna volta ao convívio das amigas e amigos. Começo abrindo o riso. Emprego pro prural Arandu, em São Paulo, começou sua história como pequeno povoado, no bairro do Barreiro, no município de Avaré. Em 1898, um pedaço de uma fazenda leiteira da região foi doado para a construção de uma capela. Elevado a distrito de Avaré/SP, em 1944, recebeu na ocasião a atual denominação. Em 1964, conquistou a emancipação política. No primeiro comício, os candidatos a prefeito exibiam seus verbos. Dentre eles, o simplório José Ferezin. Subiu ao palanque e mandou brasa: "Povo de Arandu, vô botá agua encanada, asfaltá as rua, iluminá as praça, dá mantimento nas escola...". Ao lado, um assessor cochichou: "Zé, emprega o plural". O palanqueiro emendou: "Vô dá emprego pro prural, pro pai do prural e pra mãe do prural, pois no meu governo não terá desemprego". (Historinha enviada por Marcio Assis) Haddad e o Congresso O ministro Fernando Haddad é a estrela brilhante da constelação petista. Sua forma educada de se comportar abre frestas de simpatia na esfera parlamentar. Merece crédito seu esforço para lutar por um déficit zero no orçamento. Abre boa articulação com os presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira e Rodrigo Pacheco. É o mais visível do governo Lula. Se for derrotado em sua missão de viabilizar uma economia forte, fará a administração Federal cair no despenhadeiro. Haddad e o PT O ministro, no entanto, é um ente isolado no PT. Conta com poucos apoiadores em sua tarefa de trabalhar com o botão apertado na engrenagem dos recursos do Orçamento. De maneira explícita, a presidente do partido, Gleisi Hoffmann, que conta com o apoio velado do próprio mandatário-mor, Luiz Inácio, defende o estouro da boiada, se necessário for. Ou seja, que se gaste e se abram os cofres. O populismo, antes de mais nada. Segundo ela, a economia ganhará com isso. É a gastança dos mandatos anteriores. Dirceu José Dirceu, em artigo na Folha de São Paulo, nesta segunda, faz um alerta: a esquerda precisa se unir ante a ameaça de hegemonia da extrema direita conservadora no planeta. E aponta: "hoje, governa a Itália, a Holanda e a Suécia; é uma alternativa na França; consolida-se na Polônia e na Hungria e pode retornar nos EUA. É uma ameaça na Alemanha e, derrotada no Brasil, acaba de vencer na Argentina". Dirceu diz que o PT e as esquerdas necessitam de renovação a fim de enfrentar a nova conjuntura. 100 anos em 10 "O Brasil precisa fazer 100 anos em 10", acentua o ex-ministro chefe da Casa Civil no governo Lula, entre 2003 e 2005. Solta um torpedo contra Haddad: é um equívoco histórico o pressuposto de que o Brasil pode resolver seus problemas ou via austeridade ou apoiado na agregação de valor da agricultura e da mineração, associada com a negação do Estado e das políticas industriais. Marina e a energia... Marina Silva vem se tornando a maior intérprete da energia verde no país. E tem driblado o paradoxo que aparece, aqui e ali, nos momentos de exposição pública de Lula. Marina usa um acervo de compromissos que não convence. Seguinte: o governo reforça seu parque de energia fóssil com novas refinarias, como a unidade de Abreu e Lima, em Pernambuco, que seria uma parceria com a Venezuela (nos tempos do coronel Hugo Chávez), que acabou deixando o Brasil na mão. Lula promete concluir a obra. A polêmica A polêmica refinaria vai custar mais R$ 8 bilhões, já tendo engolido, até agora, mais de US$ 20 bilhões, custo que a torna "a mais cara do mundo". O governo acena também com a exploração de óleo na foz do Amazonas. Logo no Amazonas? Marina tem feito um extraordinário esforço para amenizar tal intenção do governo Lula. Logo ela, tão impregnada do discurso da energia verde, energia a partir de fontes renováveis, como vento, água e biomassa. O Brasil, segundo ela, será no planeta um exemplo de produção de energia verde. A ministra, infelizmente, não tem convencido os ouvintes de sua "santa" peroração. A IA O debate sobre a Inteligência Artificial foi levado ao fórum de Davos, na Suíça. Os empreendedores começaram a luta para mostrar o sistema mais avançado. A briga é de gigantes. O mundo será revirado no plano da expressão. Alô, alô, alô? Procurem a verdade antes que ela desapareça. SOS. SOS. SOS. Os ricos Elogiável a carta assinada por 250 bilionários no Fórum Econômico de Davos, na Suíça, pedindo para pagarem mais impostos. Querem taxas mais altas. Milagres acontecem. O que os super-ricos brasileiros acham da iniciativa? A coluna abre espaço. Clima árido Esta é para o professor Benedito Vasconcelos, que está a frente do monumental Museu do Sertão, de sua criação, em Mossoró, RN. Cientistas descobrem um clima árido no Brasil. Leiam: Pela primeira vez, especialistas identificaram uma região de clima árido no Brasil, um dado surpreendente e alarmante que tem uma explicação clara: as mudanças climáticas causadas pelo homem. O trecho de quase 6 mil km² fica no centro-norte da Bahia e abrange toda a área das cidades de Abaré, Chorrochó e Macururé, além de trechos de Curaçá, Juazeiro e Rodelas, municípios baianos que fazem fronteira com o sertão pernambucano. Em tempo: a aridez é a falta crônica de umidade no clima, indicando um desequilíbrio constante entre a oferta e a demanda de água. Ela é permanente e, por isso, difere da seca, período temporário de condições anormalmente secas. Ué, pensava que esse clima já havia sido descoberto....! A conta Nunca a falta de energia, na paisagem das chuvas e quedas de árvores, foi tão sentida como nesse começo de ano. A conta de luz deve subir 5,6% em 2004, segundo a Aneel. Enem dos concursos Já superou 500 mil o número de inscritos. Poderá ultrapassar os dois milhões. O maior salário será de auditor do trabalho. Inscrições até 9 de fevereiro. Prova em 5 de maio em 220 cidades. Filme Este consultor indica o seguinte filme: As Bestas (no cinema). Indicados ao Oscar Melhor filme "American Fiction" "Anatomia de uma Queda" "Barbie" "The Holdovers" "Assassinos da Lua das Flores" "Maestro" "Oppenheimer" (este filme bate Barbie, com 13 indicações) "Past Lives" "Pobres Criaturas" "Zona de Interesse" Melhor ator Bradley Cooper, "Maestro" Colman Domingo, "Rustin" Paul Giamatti, "The Holdovers" Cillian Murphy, "Oppenheimer" Jeffrey Wright, "American Fiction" Melhor atriz Annette Bening, "Nyad" Lily Gladstone, "Assassinos da Lua das Flores" Sandra Hüller, "Anatomia de uma Queda" Carey Mulligan, "Maestro" Emma Stone, "Pobres Criaturas" Parte II Raspando o tacho - Bola fora da semana: José Genoíno, ao defender boicote aos produtos e empresas de judeus. - Matando a bola no peito e preparando a próxima jogada: ministro da Justiça, recém-nomeado, Ricardo Lewandowski. - A FIESP acaba de compor/recompor os seus Conselhos, importante instrumento de debates sobre diversos campos da vida institucional. - Lula promete isentar do IR quem ganha até dois salários-mínimos. - Geraldo Alckmin continua praticando seu exercício de falas pontuais, obedecendo à liturgia dos vices. Bem avaliado pela área empresarial. - O Brasil dos contrastes: seca em algumas regiões, chuvas e inundações em outras. - O Poder Judiciário, sob o comando de Luís Roberto Barroso, está à procura de um eixo. - Paraguai pressiona para aumentar o preço da energia de Itaipu. Passar a tarifa de serviços da usina hidrelétrica para US$ 20,75 por quilowatt (kW) por mês em 2024. Hoje, o valor é de US$ 16,71, ou seja, a proposta representaria um aumento de 24%. - Ronaldo Caiado é o governador com maior pontuação no ranking dos administradores estaduais. Seu eixo: segurança pública. - Aliás, este será o refrão a impregnar as campanhas municipais deste ano. O eleitor quer se sentir seguro, sem se importar se a segurança pública é função da União, dos Estados e municípios.
quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

Porandubas nº 833

Bom Dia. Abro com os "ocro". "Só quero os ócro" O oftalmologista Manoel Teixeira de Araújo recebeu a mulher em seu consultório, em São João do Sabugi, para um exame de vista. Convidou a paciente para ler a tabuleta, para a qual apontava: "Por favor, a senhora pode ler estas letras"? Em sua sertaneja ingenuidade, a mulher respondeu com calma e muita convicção: "Doutor, ler mesmo eu não sei não, mas essa menina que tá aqui pode fazer isso por mim. O que eu quero mermo é os ócro. Só os ócro". Divertido causo narrado por Valério Mesquita (RN). Na primeira Parte da coluna, tento esboçar o perfil do eleitor brasileiro. Fatores para decisão Quando um eleitor opta por um candidato, que fatores balizam sua decisão? Esta é uma das mais instigantes questões das campanhas. A resposta abriga componentes relacionados ao conceito representado pelo candidato e ao ambiente social e econômico que cerca os eleitores. No primeiro caso, o eleitor leva em consideração valores como honestidade/seriedade; simplicidade; competência/preparo; capacidade de comunicação; entendimento dos problemas; arrogância/prepotência e simpatia. Sob outra abordagem, o voto quer significar protesto, um castigo aos atuais governantes e a candidatos identificados com eles, vontade de mudar ou mesmo aprovação às ideias dos perfis situacionistas. Neste caso, os pesos da balança assumem o significado de satisfação e insatisfação; ou confiança e desconfiança. Qual é a prioridade? A questão seguinte é saber qual a ordem em que o eleitor coloca essas posições na cabeça e por onde começa o processo decisório. Não há uma ordem natural. O eleitor tanto pode começar a decidir por um valor representado pelo candidato - simpatia, preparo, capacidade de comunicação - como pelo cinturão social e econômico que o aperta: carestia, violência, desemprego, insatisfação com os serviços públicos precários etc. Os dois tipos de fatores tendem a formar massas conceituais - boas e ruins - na cabeça do eleitor. A exposição dos candidatos na mídia vai criando impressões no eleitorado. E as impressões serão mais positivas ou mais negativas, de acordo com a capacidade de o candidato formular ideias e apresentar respostas aprovadas ou desaprovadas pelo sistema de cognição dos eleitores. O bolso e a saúde E daí, qual a lógica para a priorização que o eleitor confere às propostas de candidatos? Nesse ponto, cabe uma pontuação de natureza psicológica. As pessoas tendem a selecionar coisas (fatos, ideias, eventos, perfis) de acordo com os instintos natos de conservação do indivíduo e preservação da espécie. Ou seja, o discurso mais impactante e atraente é o que dá garantias às pessoas de que elas estarão a salvo, seguras, alimentadas. O discurso voltado ao estômago do eleitor, ao bolso, à saúde é prioritário. Tudo que diz respeito à melhoria das condições de vida desperta a atenção. Depois, as pessoas são atraídas por um discurso mais emotivo, relacionado à solidariedade, ao companheirismo, à vida familiar. Credibilidade, eis a questão Esses apelos disparam os mecanismos de escolha. Se a insatisfação social for muito alta, os cidadãos tendem a se abrigar no guarda-chuva de candidatos da oposição. Se candidatos com forte tom mudancista provocarem medo, as pessoas recolhem-se na barreira da cautela, temendo que um candidato impetuoso vire a mesa abruptamente. Assim, mesmo com certa raiva de candidatos apoiados pela situação, os eleitores assumem a atitude dos três macaquinhos: tampam a boca, os ouvidos e olhos e acabam votando em candidatos situacionistas. O maior desafio de um candidato de oposição, dentro dessa lógica, é o de convencer o eleitorado de que garantirá as conquistas dos seus antecessores, promovendo mudanças que melhorarão a vida das pessoas. Simples promessa não adiantará: é preciso comprovar tim-tim por tim-tim como executará as propostas. Coerência Por isso mesmo, quando o candidato agrega valores positivos, a capacidade de convencimento do eleitor será maior. Não se trata apenas de fazer marketing, mas de expressar caráter, personalidade, a história do candidato. Uma história amparada na coerência, na experiência, na lealdade, na coragem e determinação de cumprir compromissos. Proposta séria e factível transmitida por candidato desacreditado não colará. Os dois tipos de componentes que determinam as decisões do eleitor - as características pessoais dos candidatos e o quadro de dificuldades da vida cotidiana - caminham juntos, amalgamando o processo de decisões dos cidadãos. Racionalidade Os estímulos começam com a apresentação pessoal dos candidatos, a maneira de se expressar, de se vestir. Os cenários aguçam ou atenuam a atenção. A fluidez de comunicação, a linguagem mais solta e coloquial cria um clima de intimidade com o eleitor. As propostas precisam ser objetivas, claras e consistentes. As influências sociais e até as características espaciais e temporais despertam ou aquecem as vontades. O eleitor é uma caixa-preta. O eleitor está cada vez mais desconfiado e crítico. Não quer comprar gato por lebre. Aumentou sua taxa de racionalidade. Desvendar o quê e como pensa é o maior desafio dos candidatos. Mais ou menos A tipologia humana essencialmente brasileira se rege por um alfabeto nítido que começa com a parte mais visível, que é a cor da pele. Os morenos e os pardos, que carregam a mistura do sangue do branco colonizador, do negro e do indígena, são a própria expressão da cultura do mais ou menos que sua pele exibe. "Quantas horas trabalha por semana? Mais ou menos 40 horas. É religioso? Sou católico, mas não praticante. Ou, ainda: sou ateu, graças a Deus". Ora, a tendência de querer ficar no meio termo ainda é reforçada pela condição de contemporizador, que transparece nas frequentes locuções "deixar estar para ver como fica", "deixa pra lá", "fulano está empurrando com a barriga". Dubiedade Traços de incerteza e dubiedade caracterizam o perfil do eleitor, fruto, aliás, dos elementos de improvisação que se fazem presentes no caráter nacional. Há nisso alguma indicação de displicência? Sem dúvida e este é outro matiz do nosso perfil. As decisões, que identificam uma forte cultura de protelação, são deixadas para a última hora na esteira de um comportamento que se identifica com um misto de lerdeza e negligência, despreocupação e negação de critérios de prioridade. Quem não tem na ponta da língua exemplos de obras mal construídas, trabalhos malfeitos, acabamentos defeituosos, sujeiras nos lugares públicos? Imediatismo O brasileiro é imediatista. Tem prazer pelas coisas que lhe trazem conforto ou benefício imediato. Daí não se interessar pela macropolítica, a política dos grandes projetos, das grandes obras que gerarão efeitos benéficos no longo prazo. Mas é exigente em relação às coisas de seu cotidiano: a escola perto da casa, o transporte fácil, a segurança na rua, a comida barata, o emprego perto de casa. Sob tal aspecto, os candidatos terão de contemplar esses contingentes eleitorais - que constituem a grande maioria - com propostas de fácil compreensão e alto impacto para o bolso. Infiel O eleitor brasileiro é fiel? No sentido abrangente, mais coletivo, a resposta é não. Há grupamentos fiéis, particularmente entre estratos médios, formadores de opinião, segmentos engajados nos partidos, setores religiosos, imigrantes de sangue anglo-saxão e pequenos núcleos ideológicos. Os grandes contingentes são amorfos, alheios ao cotidiano político e capazes de mudar de posição, de acordo com as circunstâncias e as necessidades mais imediatas. A infidelidade do eleitor tem a ver com a incultura política que semeia florestas de desinteresse pelos espaços nacionais, incluindo os centros mais evoluídos. Pessimista Os vetores de decisão do eleitorado são influenciados, ainda, por dois elementos que parecem paradoxais. De um lado, um pessimismo galopante, que se faz presente nas locuções de que o "o país não tem jeito, estamos todos perdidos, não vale a pena lutar por isso etc., etc.". De outro, um otimismo extravagante, que evidencia a superlativa dose emotiva da alma nacional. Nesse sentido, as alavancas de força se apresentam nas festas de época e fora de época, no Carnaval, nas folias cotidianas dos bares e até na esteira da bagunça que, em maior ou menor grau, transparece na fisionomia das cidades, na improvisação dos motoristas de trânsito e na linguagem desabrida das ruas. O pessimismo induz o eleitor a se afastar dos políticos, que, indistintamente, ganham a pecha de "ladrões e corruptos". Imprecação e exageros Os perfis populistas e messiânicos é quem levam a melhor, ao sintonizarem a linguagem com a imprecação popular. Não por acaso, o chavão "bandido bom é bandido morto, lugar de bandido é na cadeia", toca forte no coração das massas. Já o otimismo de nuances ufanistas, cuja origem remonta os passos iniciais da descoberta das belezas naturais, da exuberância da flora e da fauna, marca o caráter nacional com os selos da displicência, da sensualidade, do ócio e da pachorra. As grandezas do Brasil afloram e são apresentadas pelas embriagadas quantificações de nossos potenciais: o maior carnaval, o maior São João do mundo, o maior produtor disso e daquilo, as mulatas mais bonitas, as melhores iguarias e algumas maravilhas do mundo. A busca da catarse Se o pessimismo é oposicionista, o otimismo tropical é situacionista, ou, em outras palavras, tende a reforçar o status quo. Infere-se, assim, que a crença da vitória do Brasil nas Copas sempre faz a catarse coletiva. E a catarse, com suas vertentes de emoção, vibração, êxtase e felicidade, acaba purgando pecados acumulados. Trata-se de uma formidável estrutura de consolação da sociedade. A consequência se fará presente na maior complacência dos eleitores ao analisarem os quadros de amargura e angústia que os afligem. Parte II Raspando o tacho - Javier Milei nomeia a irmã como secretária-Geral da presidência da Argentina. Na verdade, uma espécie de superministra. - Bolsonaro teria sido impedido de participar da foto oficial de Milei com as autoridades mundiais presentes à posse. É verdade que alguns presidentes vetaram sua presença? Como? Avisando ao cerimonial? Estranho. - A cratera de Maceió é um gigantesco buraco eleitoral, com impacto nas urnas de 2024. - Marcelo Alecrim, o super-empreendedor potiguar, foi anunciado pré-candidato à prefeito de Natal em 2024. Este escriba acha que Alecrim preferirá contemplar a cena eleitoral da rede de sua bela casa praiana. - O prefeito Álvaro Dias, de Natal, é um gestor muito bem avaliado. - Ronaldo Caiado exibe boa performance em pesquisas do Instituto Paraná Pesquisas. Em um cenário, bate Lula com 40,4% contra 20,9%. Tarcísio de Freitas teria 12,5% e Ciro Gomes 6,2%, Romeu Zema, 4,1%. Se as eleições presidenciais fossem hoje. - Como Javier Milei governará sem apoio do Congresso? E sem plata? - Falta coerência ao Brasil em matéria de condenação dos combustíveis fósseis. Então, evite incentivar exploração de novas fronteiras de petróleo. - Lula foi pego de surpresa com o espetáculo circense de Nicolas Maduro. - Renan Calheiros denunciou a Braskem: crônica de um desastre anunciado. A cratera em Maceió. - Pelo que se percebe, Aloysio Mercadante está feliz na presidência do BNDES. - Como é possível? A pior gestão da improvisada Dilma Rousseff lhe confere o título de economista de 2023? Afinal, quem conferiu este galardão? Entidades que prezam fazer loas? - Tempos de calor extremos nos esperam no verão. Fecho a coluna com a mineirice de Zé Abelha. As três pessoas No confessionário, Monsenhor era rápido. Não gostava de ouvir muita lengalenga. Ia logo perguntando o suficiente e sapecava a penitência que, sempre, era rezar umas ave-marias em louvor de N. S. do Rosário. Fugindo ao seu estilo, certa feita ele resolve perguntar ao confessando quantos eram os mandamentos da lei de Deus. - São 10, Monsenhor. - E quantos são os sacramentos da Santa Madre Igreja? - São 7, Monsenhor. - E as pessoas da Santíssima Trindade, quantas são? - São 3, Monsenhor. Monsenhor, notando que o confessando só sabia a quantidade, pergunta rápido: - E quais são essas pessoas? A resposta encerrou a confissão: - As três pessoas são o senhor, o Dr. Didico e o Dr. Zé Augusto. (Historinha contada por José Abelha em A Mineirice).
quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

Porandubas nº 832

Retomo a historinha hilária, que se tornou marca desta coluna. Um leitor lembrou-me que essa piada cabe bem nesse momento em que a Argentina dá posse ao seu novo presidente Javier Milei. Este escriba lembra e pede desculpas: trata-se de um chiste. Uma brincadeira.Humildade argentina A Argentina de Javier Milei declara guerra à China. Comoção geral. Após consulta popular feita na "Plaza de Mayo", a Argentina enviou uma mensagem à República Popular da China nesses termos: - Chinos de mierda, maricones: les declaramos "guierra": tenemos 105 tanques, 47 aviones sanos, 4 barcos que navegan y 5.221 soldados. O governo chinês deu imediatamente a resposta: - Aceitamos a declaração. Informamos que temos 100.000 tanques, 150.000 aviões, 2.500 navios e 800 milhões de soldados. Orgulhosos, os argentinos retrucam: - Retiramos la declaración de guierra... No tenemos como alojar tantos prisioneros. Vamos às coisas sérias.... Parte I A coluna faz, na primeira parte, uma pequena reflexão sobre a força moral na política, um conceito que se esvai na poeira da deterioração de valores e princípios. O maior trunfo de uma campanha No momento em que interessados começam a se habilitar para se apresentar como candidatos à prefeito e vereador em 2024, nasce a conveniência de se fazer um levantamento sobre os trunfos de uma campanha. O maior deles é a força moral. Será esta o contraponto ao estado de degradação que corrói parcela razoável de nossos quadros políticos. Trata-se de uma força que funcionará como imã, puxando a atenção e a adesão dos eleitores. Quem tem força moral? Os candidatos se esforçarão em dizer que a possuem. Ocorre que a força moral não é um conceito sobre o qual se possa cantar loas. Quem a carrega, não precisa discorrer sobre ela. Será reconhecido por isso. Gandhi, pobre e despojado, era um ícone de força moral. Arrastou multidões. Como a simplicidade, a força moral é a virtude dos sábios e a sabedoria dos santos. Quem possui esse tipo de força neste país? Poucos. Quem detém um conceito de moral é aquele cuja vida sai pura depois de um simples ensaio de observação. Não é levado a processo de investigação. O ideal da coletividade Tem força moral aquele que coloca o ideal da coletividade acima dos interesses personalistas de grupos e pessoas. Em uma sociedade acentuadamente corporativista como a nossa, isso é muito difícil. Políticos e candidatos cada vez mais tendem a fechar posições com expectativas e demandas setorizadas, provocando um reducionismo no ideário social que acaba inviabilizando políticas mais globais. Os detentores de força moral são aqueles que fazem da política uma missão, dentro da qual, com sacrifício próprio, se submetem a passar quatro, oito ou mais anos, servindo ao povo. As regras do jogo Não há como sofismar. Para a grande maioria de candidatos, os gastos de uma campanha política são absurdamente maiores do que ganharão, se eleitos para exercer um mandato de prefeito ou de vereador por quatro anos. Logo, as regras do jogo precisam ser esclarecidas. E as alternativas são estas: primeiro, as campanhas são patrocinadas por terceiros, cidadãos ricos que se postam ao lado das causas sociais; segundo, candidatos fazem o sacrifício de pagar de seu bolso quantias que jamais serão ressarcidas e, desta forma, oferecem uma contribuição cívica e um exemplo de amor pátrio; e - a alternativa mais plausível - ao longo do mandato, recuperam o gasto com altos juros e correção monetária superfaturada. Valores morais A política pouco atrai a cidadania moral. A moralidade, como se pode deduzir, se instala em espíritos cívicos desprovidos de ganância, distantes da arrogância e do utilitarismo imediatista que nivela quase todos os viventes de um mundo muito estruturado no apego aos bens materiais. Cidadãos de espírito moral abrigam valores como a modéstia, a humildade, a misericórdia, o senso de justiça, a fidelidade a princípios, a generosidade, o amor ao próximo, a tolerância e a coragem de ser honesto e autêntico em ambientes corrompidos, sujeitos a pressões e contrapressões, invadidos pela ligeireza das circunstâncias. Parece um decálogo religioso? Sim. Difícil de cumprir? Sim. Mas deve se tentar segui-lo à risca. É fácil descobrir os espíritos morais Os espíritos morais são pessoas de palavra, coerentes, com marca registrada no cartório do caráter. Sabem medir as palavras, ocupando-se de temas relevantes. São pessoas substantivas. O comportamento de uma pessoa com força moral é como um verso, no qual todas as sílabas são medidas. Alguém que chegou a essa altura do texto conhece, por acaso, alguém com esses atributos? Há pessoas com tal perfil, mas poucas, muito poucas, no mundo da política. É fácil reconhecê-las. Por isso, quando identificadas, elas devem ser conduzidas à missão na esfera pública. Basta olhar para seu passado, sua origem, examinar seu pensamento, seu legado. Basta analisar como se comportam, o que dizem, como falam. Driblando a linguagem Há candidatos que falam muito e dizem pouco. Quase nada se extrai de seu discurso. Alguns chegam ao exagero de querer transformar erros crassos em acerto ou em mais uma firula de marketing. São notados pelos dribles que dão na linguagem ou pela maneira como transformam o choro em riso ou vice-versa. Mas há quem fale coisas certas, no momento adequado, para atender às demandas legítimas e justas. Há pessoas que entendem a política como missão, não como negócio. Contra modismos O candidato com força moral não é levado a adulterar as coisas. A demagogia não imanta seu discurso. Não se faz de santo, nem de sábio. Ele é o que é. Não se agarra ao populismo, forma muito usada para não contradizer o sentimento popular e, assim, evitar o afastamento das forças sociais. Não promete escadas para se chegar ao céu. Como sabemos, a experiência brasileira revela que esse estilo complacente rende frutos apenas imediatos, porém de altos custos futuros. O candidato moral luta contra os modismos. Retidão É capaz de reconhecer erros, não como desculpa para ganhar eleição ou como forma de exorcizar os pecados, mas como um ato de profunda convicção. Elege a retidão como inspiração de vida. Confúcio disse: "se um homem consegue dirigir com retidão sua própria vida, as tarefas de governo não devem ser um problema para ele. Se ele não consegue dirigir sua própria vida com retidão, como pode dirigir outras pessoas com o espírito de correção? Quando, por cem anos, o país for dirigido por homens de força moral, a crueldade poderá ser vencida e o homicídio eliminado." A utopia da transformação Por fim, o político de força moral é sincero com seu sonho. Embala-se na utopia da transformação e, sobretudo, na crença de que qualquer avanço no caminho do progresso só será possível pela via da efetiva incorporação do povo no processo de controle e decisão das ações públicas. Parte II Raspando o tacho (Pequenas notas sobre a conjuntura). - A cratera que o empreendimento da Braskem abriu em Maceió é um pedaço da montanha de irresponsabilidade que grassa no país. Faz bem o senador Renan Calheiros em pedir urgência para o funcionamento da CPI da Braskem, que já pagou à prefeitura quase 10 bilhões de reais ao correr do tempo. - A crônica do desespero e da angústia que solapa a população da região afetada ganha espaços na mídia. - Lula, com suas falas, constrói barreiras que impedem maior aproximação com o agronegócio. - Aliás, o Brasil mostra posições antagônicas de suas estratégias. Uma no cravo, outra na ferradura. - De um lado, fixa-se no terreno dos combustíveis fósseis. Sinaliza, até, intenção de explorar o petróleo na região equatorial da Amazônia. Estudo da Petrobras indica que bloco na Foz do Amazonas possa conter 5,6 bilhões barris de petróleo. Um único bloco na Margem Equatorial, na região amazônica do Amapá, pode conter reservas de mais de 5,6 bilhões de barris de petróleo. - De outro lado perfila ao lado do hidrogênio verde, apontado por especialistas como uma possível alternativa aos combustíveis fósseis. O Brasil tem se apresentado como um possível grande produtor desse tipo de combustível. - O "não" de Macron ao acordo da UE com o Mercosul não significa um veto. Ele fala pela França, pressionado pela forte indústria do leite. Os produtores defendem fortes medidas protecionistas. - O Brasil precisa ser coerente na moldura internacional. - O PSD terá a palavra final no acordo para eleger o novo presidente do Senado. Tem a maior bancada, 15 senadores. Davi Alcolumbre, (União-Amapá), pensa em se filiar ao PSD ou ao MDB para se viabilizar como candidato. Está muito cedo. Mas a senadora Eliziane Gama (PSD-MA) tem possibilidades. Rodrigo Pacheco tem muito tempo, ainda, para fazer suas manobras. - A governadora de Pernambuco, Raquel Lyra, pode deixar o PSDB, um partido em declínio. Os tucanos, agora sob o comando de Marconi Perillo, sairão do fundo do poço? Perillo, ex-governador de Goiás, garante que o "fundo tem mola". - Geraldo Alckmin, o vice-presidente da República, hoje no PSB, foi visitar João Doria, a convite deste, dirigindo seu carro. Sinal de modéstia e vivência. Foi maltratado pelo ex-governador de SP quando este acirrava o discurso de campanha. Alckmin foi abraçar seu ex-pupilo. Minha saudosa mãe sempre dizia: nunca diga - desta água não mais beberei. Fecho a coluna com JQ. Saudação aos presidentes Juscelino Kubitschek, presidente da República, foi ao Ceará com Armando Falcão, ministro da Justiça. Sebastião Nery conta que Falcão, cearense, levou JK a um desafio de cantadores. Um cego estava lá, com sua viola, gemendo rimas. Juscelino chegou, cumprimentou-o. O cego respondeu na hora: - Kubitschek, ai, meu Deus, que nome feio. Dele eu só quero o cheque por que do resto ando cheio. Um ano depois, a mesma cena. Jânio Quadros, presidente, vai a Fortaleza, há um desafio de cantadores. Chega com os óculos grossos e longos bigodes, um outro cantador o vê, saúda: - Vou louvar o meu patrão que já vem chegando agora. Engoliu a bicicleta e deixou o guidão de fora. Nunca mais ninguém levou presidente para ouvir cantador no Ceará.
quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Porandubas nº 831

A primeira parte da coluna tem como foco uma leitura dos governantes. Quais são os sete pecados capitais dos administradores? Confiram. Parte I Olhando no espelho Os governantes não gostam de ver seus retratos em preto e branco. Só a cores. Ou seja, com muita cor, muito adorno. Alguns se olham no espelho, como a madrasta da Branca de Neve, e perguntam: "espelho, espelho meu, há alguém mais competente do que eu"? O deleite que desfrutam na cama do poder acaba desenvolvendo neles uma cultura de fruição e gozo, que lhes enfraquece a capacidade de ver as coisas com isenção, acuidade e objetividade. Tornam-se imunes à realidade. Pecado 1 - A insensibilidade Cobrem-se com um manto que os deixam em estado contínuo de dormência. O poder provoca delírios e, assim, com o porre que lhes adormece as mentes, os governantes cometem seu primeiro pecado capital. É o pecado da insensibilidade. De tanto ver de perto, eles se desacostumam a ver de longe. Da tênue autoconfiança do início do governo, passam a maximizar essa qualidade, após três anos com a caneta na mão. Transformam-se em imperadores, donos do mundo, senhores de capitanias hereditárias. Incorporam o Complexo de Olimpo, com toda sua aura divina. Pecado 2 - A onipotência Com tal identidade, as realizações e programas do governo deixam de ser algo inerente à função de governar para se transformar em feitos pessoais do governante magnânimo e generoso. A população é inoculada com a injeção mistificadora que projeta a identidade física do governante sobre o conceito jurídico do governo. E o pior é que os governantes acabam se achando com a cara de Deus. Flagra-se, aqui, seu segundo pecado capital, o sentimento da onipotência. Pecado 3 - A crença na grana O mandonismo imperial está calçado no poder monetário. Os governantes decidem o quê, onde e como fazer. O planejamento orçamentário contemplará obras fundamentais, porém não deixará de atender o varejo eleitoral. O governo Federal cria um novo PAC. Os governos estaduais, PACs fragmentados. Com dinheiro nos cofres, não perderão a eleição. E aqui está seu terceiro pecado capital. A crença na força absoluta da grana. Pecado 4 - A rotinite Depois de meses de incessantes atividades administrativas e políticas, os governantes amolecem a musculatura e começam a padecer de rotinite aguda. Os Estados e municípios comem apenas o feijão e o arroz necessário à magra existência. Não há nenhuma criatividade, não se buscam soluções inteligentes e inovadoras. E o caldo insosso acaba gerando o quarto pecado capital dos governantes, a rotina. Pecado 5 - A improvisação Daí para o quinto pecado, o salto é pequeno. Pois os governantes já não obedecem a uma agenda planejada. Não administram seus tempos de acordo com um sentido de prioridades e lógica. Tudo ocorre ao bel-prazer. E a desorganização grassa, bagunçando as malhas burocráticas e gerando muita improvisação. Mas tudo vai as mil maravilhas, para eles, porque os seus assessores mais próximos capricham no puxa-saquismo. Vivem fazendo elogios, escondem as coisas malfeitas, sobrevalorizam os feitos positivos. Pecado 6 - A bajulação  As assessorias desqualificadas e os grupinhos de "luas-pretas" constituem um dos maiores danos à imagem e à eficácia dos governos, descortinando o panorama do sexto pecado capital, a bajulação consentida. E lá se vão os governantes desfilando suas glórias, feitos e emoções à imagem e semelhança do Criador. Suas carruagens de fogo e seus cometas planetários trafegam pelos céus, deixando rastros de nuvens coloridas que se esvaem nos ventos do tempo. De tanto andarem de sapato de salto alto, os governantes acabam pisando nos pés do povo. Pecado 7 - A ausência de senso comum Têm respostas prontas para perguntas que não são feitas. E são capazes de provar que o melhor para as massas desprovidas e incultas é aquilo que eles acham que elas merecem. Não acreditam em pesquisas. Fogem delas como o diabo foge da cruz. E, nesse ponto, os governantes abrem seu inferno para comemorar o sétimo pecado capital, a ausência do senso comum. Será o Benedito? Às vésperas da escolha do interventor de Minas Gerais, em 1934, Benedito Valadares se encontrou no Rio de Janeiro com José Maria Alkmin: - Se você for o escolhido, me convida para secretário? - Você está louco, Benedito? Respondeu um divertido Alkmin. Dias depois, Getúlio Vargas anunciaria a escolha de Valadares, que logo recebeu um telegrama: - Parabéns. Retiro a expressão. Ass. Zé Maria. Zé Maria Alkmin acabou nomeado secretário do interior. (Historinha mandada por Álvaro Lopes.) Mais uma da dupla. O engodo A matreirice sempre deu o tom na política nacional. No dia 31 de março, data do golpe dos militares para depor João Goulart, Benedito Valadares encontra-se com José Maria Alkmin e Olavo Drummond no aeroporto de Belo Horizonte. Benedito joga a pergunta: Alkmim, você está indo pra onde? O matreiro ex-ministro da Fazenda responde ao governador: vou para Brasília. Benedito puxa Olavo Drummond pelo paletó e tasca: ah, ah, ah, ele está querendo me dizer que vai para o Rio de Janeiro. Mas ele vai mesmo para Brasília. Velha artimanha das raposas políticas. Digo a verdade para o interlocutor desconfiar da informação. Um engano de segundo grau. Dizer a verdade e gerar desconfiança. Um povo descrente Um povo descrente é como um rio seco. Um povo sem esperança é como uma árvore desfolhada, sem viço e com a cor das coisas mortas. O povo brasileiro pena amarguras no deserto frio das desesperanças. Vive um avançado grau de desânimo e morre um pouco todos os dias ao sabor da febre intermitente dos sonhos desfeitos. Milícias e mortes por desvios de balas. Um povo sem sonhos é uma entidade sem espírito e sem direção. Tiraram-lhe a vontade, a admiração pelos ritos da pátria e o respeito às instituições. O clima de terra devastada em que se transforma o país, as acusações que pululam de todos os cantos, os interesses em choque e a polarização entre duas bandas políticas afastam grupos sociais do sistema político, abrindo vazios entre os poderes decisórios e a sociedade. Parte II Raspando o tacho - Javier Milei começa a viver a realidade política. Depois de execrar o presidente Lula, faz uma amistosa carta de convite para sua posse na presidência da Argentina. - Minha saudosa mãe já dizia: meu filho, nunca diga - desta água, não beberei. - Tudo indica que o amapaense Davi Alcolumbre se sentará novamente na cadeira de presidente do Senado, com o apoio do atual presidente Rodrigo Pacheco, que, por sua vez, sonha governar Minas Gerais. - Lula dá ao STF um vigoroso suporte com a escolha de Flávio Dino, um juiz preparado. O Maranhão está em festa. - Inimaginável ver o governo Lula, com os cofres abertos para o corpo congressual, ter de negociar projeto por projeto. Compras caras. - Gangues de drogas chegando em peso ao litoral do Nordeste, invadindo recantos turísticos. - Greve dos funcionários do metrô é teste para o governo Tarcísio de Freitas. - O mais próximo da cadeira do Ministério da Justiça, até o momento, é o ex-ministro do STF, Ricardo Lewandowski. - A Pasta da Justiça pode ser desmembrada para dar lugar a mais uma: a da Segurança Pública. O país vê aumentado o índice de violência. - Se a área da Segurança pode trazer intensa visibilidade ao gestor, pode também ser uma fonte de desgaste. - Joe Biden está apertado. Enfrenta pressões internas e externas. E Trump ganha, hoje, nas pesquisas. - A guerra Ucrânia x Rússia desapareceu do mapa. Os russos estão aproveitando do fato para incrementar seus ataques. Está em vantagem. - O PT não está satisfeito com as escolhas de Lula para o STF e para a PGR. E deve fechar o bico. Críticas? Muitas nos bastidores. Fecho a coluna com as linguagens do momento. Dez linguagens para o final de 2023 1. A linguagem da afirmação da identidade. 2. A linguagem da factibilidade/credibilidade. 3. A linguagem das pequenas coisas. 4. A linguagem da participação - o NÓS versus o EU. 5. A linguagem da verificação - exemplificação - como fazer. 6. A linguagem da coerência. 7. A linguagem da transparência. 8. A linguagem da simplificação. 9. A linguagem das causas sociais - a leitura dos mapas cognitivos do eleitorado. 10. A linguagem da tempestividade - rapidez/oportunidade/proximidade. (Adaptado do meu livro Tratado de Comunicação Organizacional e Política)
terça-feira, 21 de novembro de 2023

Porandubas nº 830

A primeira parte da coluna será uma tentativa de interpretar a vitória do excêntrico Javier Milei na eleição presidencial da Argentina. I Parte Uma ave rara A vitória do anarco-libertário-liberal Javier Milei na Argentina coroa o sentimento antipolítica que se espraia não apenas no sul do nosso continente, mas outros pedaços do planeta. O eleitor argentino elegeu um parente do outsider da política, um estranho no ninho das aves tradicionais que povoam os Executivos e Legislativos. Uma figura exótica até na maneira de se apresentar, casacos de couro dos roqueiros, cabelos em alvoroço. Que faz, logo no início do discurso de vitória, o maior agradecimento a irmã, Karina, sem a qual nada daquilo que estava ocorrendo não aconteceria. Autoestima mil Javier exibe uma autoestima no pico do ranking. Considera-se o primeiro libertário-liberal da História da Humanidade (sic) eleito presidente de um país. Promete colocar a Argentina no primeiro lugar das potências mundiais, posição que já ocupou no passado. Eita! Quando, quando foi isso????????? Não disse e, pelo que se sabe, se a ele foi perguntado, não se repercutiu a resposta. Reconstrução? Opa, opa! Repetiu no discurso que vai resgatar o lugar de potência mundial para a Argentina. E, a partir do dia 10 de dezembro, quando tomará posse, vai começar a era da Reconstrução. Opa! Termo que pertence a Lula? Pois sim, Lula também garantiu a reconstrução do país, devastado por Bolsonaro. Populismo Interessante. Os populistas acarinham o coração das massas com seus discursos genéricos e de eloquência extravagante. O mundo mirabolante é prometido. Os apelos ao coração das massas assoladas por alta inflação e corrupção acabam gerando urros catárticos. Na Argentina, a inflação beira os 150% por ano. A população abaixo da linha de pobreza é de 40%. Este é o pano de fundo da catarse ante a crença de que o inferno tem seus dias contados para dar lugar ao paraíso. Teor explosivo A cartilha de promessas de Javier Milei é uma ladainha de promessas de alto teor explosivo. Promete que vai dolarizar a economia, fechar o Banco Central, privatizar as estatais, cortar ministérios (de 18 para 8), privatizar o mar, nomeando até as baleias como alvo de sua "fúria privatizante", permitir a venda de órgãos do corpo humano, etc, etc..Sobre privatização: "Na transição que estamos pensando, na questão energética, a YPF e a Enarsa têm um papel. Desde que essas estruturas sejam racionalizadas, elas serão colocadas para criar valor para que possam ser vendidas de uma forma muito benéfica para os argentinos". Racionalidade? Difícil de acreditar. Se cumprir o prometido, cairá Diz essas extravagâncias com a boca de um leão, o rei da selva, com o qual se identifica ao começar seus discursos. No palco da vitória, uma pessoa vestida de leão fazia uma estrambótica ginástica. Pois bem, os efeitos dessas promessas, à luz do bom senso, seriam tão catastróficos, a ponto de sugerir a inferência: não aguentaria. Logo, logo, cairia. A desarrumação da casa, de modo drástico, o despejaria da Casa Rosada. Karina, a estrategista Karina Milei, a irmã de 50 anos, é a maior referência de Javier, o eleito. Não fosse ela, não haveria um Javier político, um homem destemido, um candidato vitorioso na eleição argentina. Pois a baixinha de cabelos alourados, discreta e atenta, será a primeiríssima dama do país, mais que a namorada de Javier, Fátima Florez, 40 anos, essa de cabelos naturais, não pintados, humorista de TV, imitadora de Xuxa e Cristina Kirchner, entre outras(os), como revela a imprensa argentina. Karina é superprotetora. Só chega perto de Javier Milei quem tem autorização da estrategista da campanha do irmão. Florez, porém, espera ocupar a vaga de primeira-dama. Casamento à vista? Pior para Lula A eleição de Javier Milei resvala na imagem do presidente do Brasil. Primeiro, observa-se que a escolha de um figurante de direita, mais que radical, um anarquista dos velhos tempos, reequilibra a balança ideológica na América do Sul, atenuando a força que a esquerda tem exibido, com a maioria dos mandatários nacionais que agrega. Milei não vai se afastar do Mercosul, mas bagunçará o coreto. Atente-se que o Brasil de Lula acaba de chegar, por rodízio, à presidência do órgão. Os bolsonaristas, ademais, ganham alento para corroborar suas posições e acirrar críticas ao lulopetismo. Quem irá à posse de Javier? Lula não deve ir à posse de Milei. Será o embaixador em Buenos Aires o representante do Brasil? O presidente espera que o novo presidente argentino peça desculpas pelo destempero com que brindou Lula: comunista e corrupto. Ou foi ladrão? Seja qual for o adjetivo, foi uma impropriedade, sabendo-se que a expressão raivosa deve, sempre, ser contida, sob pena de gerar constrangimentos. E se Javier não pedir desculpas? Atente-se para a nota de Lula parabenizando a democracia no país de Messi. Mas não citou o nome do eleito. II Parte Raspando o tacho - Milei fez dois discursos. O primeiro, lido, muito genérico. O segundo, para a massa concentrada na avenida Cordoba, de improviso, e também muito genérico, cheio de imagens e chavões. - Para a massa, a esperança venceu o medo. Os extremos do arco ideológico se cruzam. Lula e Javier. - Imaginem a cena de pessoas tentando sacar alguns dólares no Caixa Eletrônico e receberem a informação: não há disponibilidade no momento. - As eleições municipais começam a refazer o tabuleiro dos jogadores. - Araçuaí, em Minas Gerais, registrou 44,8º C, a maior temperatura já registrada na história do Brasil. - Pela primeira vez no mundo, registra-se um dia com temperatura média global 2º C acima da era pré-industrial. - Querem derrubar o presidente da Petrobras, o bem preparado ex-senador pelo RN, Jean-Paul Prates. Um expert na área de combustíveis. Precisam combinar com Lula, seu patrocinador. - Bolsonaro quer pegar carona no trem de Milei. Vai à posse do eleito e levará uma caravana. Uma farra em Buenos Aires. - Chuvas no Sul continuam a puxar tragédias. Seca no Norte continua a gerar escassez. - Recebo informação do professor Miguel Fernandes, do meu saudoso grupo Escolar Coronel Fernandes (onde estudei do 2º ao 4º ano primário), que os alunos dessa querida Escola vão participar do final de campeonato de xadrez em Natal. Viva! Viva! Viva! Meus cumprimentos aos alunos. Meu abraço no professor Miguel. P.S. Saudades do professor Chico Dubas, o diretor em minha infância. - Sensação deste escriba: o mundo está descendo a montanha. Em declínio.  Fecho a coluna com um pouco de humor Voxê que sabe Lembremos a conversa cheia de x do marechal Eurico Gaspar Dutra (1945/1951). O marechal trocava o c pelo x. Ganhou uma marcha carnavalesca no carnaval de 51: Voxê qué xabê Voxê qué xabê Não pixija sabê Pra que voxê qué xabê? O ex-secretário de Planejamento e Gestão do Estado da Paraíba, Osman Cartaxo, pinça do arquivo de seus engraçados "causos" uma historinha do marechal. De manhã, bem cedo, o marechal saiu do hotel e começou a passear na parede do açude de Pilões, nos confins da Paraíba. O matuto viu aquela figura fardada e tascou: - Bom dia, coronel. O velho marechal respondeu de pronto: - Não xô coronel. Xô o presidente da República. O matuto emendou: - Mas não é coronel porque não quer.
quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Porandubas nº 829

Abro Porandubas com o Barão de Itararé Pérolas - Cobra é um animal careca com ondulação permanente. - Tudo seria fácil se não fossem as dificuldades. - Sábio é o homem que chega a ter consciência da sua ignorância. - Há seguramente um prazer em ser louco que só os loucos conhecem. - É mais fácil sustentar dez filhos que um vício. - A esperança é o pão sem manteiga dos desgraçados. - Adolescência é a idade em que o garoto se recusa a acreditar que um dia ficará chato como o pai. - O advogado, segundo Brougham, é um cavalheiro que põe os nossos bens a salvo dos nossos inimigos e os guarda para si. - Senso de humor é o sentimento que faz você rir daquilo que o deixaria louco de raiva se acontecesse com você. - Mulher moderna calça as botas e bota as calças. - A televisão é a maior maravilha da ciência a serviço da imbecilidade humana. - Este mundo é redondo, mas está ficando muito chato. ------------------------------------------------------------------------------------ Na primeira parte da coluna, tentarei esboçar os movimentos e tendências que se farão presentes na paisagem institucional brasileira nos próximos tempos. Parte I O desenho institucional 1. A consolidação de polos ideológicos O país mostra-se exaurido do velho debate entre perfis. O individualismo sinaliza arrefecimento, com menor ênfase nas qualidades e defeitos dos fulanos, beltranos e sicranos. Não significa que entraremos, de imediato, nos polos ideológicos, e sim que começaremos a adentrar no terreno da racionalidade, abrindo campos doutrinários e ideológicos, ganhando clareza na defesa de posições de esquerda, direita e centro. O país tende a desfraldar bandeiras no campo da ideologia. 2. Economia sob o cabresto da política A política tende a guiar a locomotiva, puxando os carros do trem, a partir do vagão da economia. O Parlamento redescobre seu poder de mexer no orçamento, fazendo manobras, exigindo recursos, emendando peças orçamentárias e, dessa forma, influenciando os rumos econômicos. Significa que o país passará a vivenciar com mais (ou menos) conforto, a depender da panela de pressão da economia. Esta vazará seu vapor no ritmo e na forma da política. Em suma, o fôlego social dependerá da vontade política dos representantes. 3. Polarização lulopetismo x bolsonarismo na esteira da economia A efervescência que tem caracterizado o debate entre o lulopetismo e o bolsonarismo tende a arrefecer, mas sua intensidade ficará sob o guarda-chuva da economia. Caso a situação seja saudável, com impactos positivos na sociedade, o apoio ao governo será maior, sendo verdadeira a recíproca. Se as condições econômicas apertarem o bolso do consumidor, voltaremos ao estágio de acirramento de tensões. A economia ditará o tom da orquestra social. Afinada, a harmonia se estabelece. Desafinada, a efervescência se imporá. Como a política influenciará a economia, o espírito do tempo sairá das cúpulas côncava e convexa do Parlamento. 4. A intensificação da organicidade social É possível enxergar o papel dos grupamentos sociais na tessitura institucional. A sociedade parece esgotada com as promessas não cumpridas pela representação política, o que faz lembrar a expressão de Norberto Bobbio, quando escreveu sobre as promessas não cumpridas pela democracia. Significa que a sociedade se afasta do poder tradicional - os representantes - para criar novos polos de mando e influência, presentes na miríade de organizações não governamentais. Há, no Brasil, cerca de 815 mil Ongs. Que acolhem pleitos de grupos, setores, áreas, núcleos, encaminhando-os aos representantes políticos. 5. A pressão centrípeta (das margens) A organicidade social forma um rolo compressor, a partir das margens da pirâmide social, para fazer pressão junto ao poder público central. Trata-se de uma ferramenta poderosa, a pressão centrípeta, que age a partir das margens para Brasília, carregando suas demandas e dando vazão à sua locução. Nesse ponto, juntam-se às forças do meio da pirâmide, resultando daí uma fabulosa onda de reclamos e reivindicações. 6. O poder das classes médias As classes médias serão determinantes no processo de formação de opinião pública. Funcionam como pedras jogadas no meio da lagoa: seu impacto na água cria ondas que, em fluxo contínuo, correm até as margens. Significa que a tuba de ressonância da OP (Opinião Pública) será tocado pelas classes médias. O topo da pirâmide também recebe os inputs do meio, portanto, as classes médias também influenciam as elites, a par das classes D e E. 7. A força do regionalismo Observa-se, nos últimos tempos, a emergência do regionalismo, que fala alto, cobra e exige participação na mesa do poder federal. Os Estados parecem despertar do sono letárgico que, por décadas, os têm deixado distantes do poder executivo federal. Expõem seus problemas, clamam por fatias maiores do orçamento, exigem mais colaboração dos representantes regionais, enfim, querem dizer presença no processo decisório. 8. Obediência às funções dos poderes Após uma temporada de tensões entre os Poderes, com maior ênfase entre os Poderes Legislativo e Judiciário, descortina-se uma era de harmonia, com respeito aos limites funcionais de cada instituição. Na verdade, o que tem ocorrido fez e faz bem à democracia, conforme as lições do constitucionalista Michel Temer, que não enxerga crise entre Poderes, mas tão somente a disposição do Judiciário de dar respostas às demandas que lá chegam. Sob essa interpretação, a vida institucional tende a ganhar maior equilíbrio e harmonia. 9. O profissionalismo das forças armadas As Forças Armadas, após vivenciarem um ciclo de polêmica participação de seus quadros na vida política, entram em refluxo, intensificando o profissionalismo, assim respondendo às críticas que têm sofrido. Haverá participação de militares na vida política, sim, mas dentro dos parâmetros estabelecidos por dispositivos legais, como a proibição de quadros da ativa na participação da agenda eleitoral. A cúpula das Forças está comprometida com o resgate da boa imagem da instituição. 10. Discurso eleitoral com foco em doutrina Os pleitos eleitorais serão desenvolvidos sob o debate mais focado em doutrina, significando a exposição de propostas temáticas em detrimento dos traços pessoais de candidatos. Dessa forma, o discurso eleitoral tende a absorver matiz doutrinária, com clarificação sobre temas da atualidade, defesa da pluralidade de gêneros, aborto, privatização, marco temporal para as terras indígenas, reformas do Estado, entre outras temáticas. 11. A segurança pública como prioridade A segurança pública subirá no ranking de prioridades, exigindo ações mais profundas do Estado, com foco na eliminação dos grupos de milícias e na contenção das formas de bandidagem. As fronteiras serão mais policiadas, com o duro combate ao contrabando. 12. O espraiamento do ambientalismo O discurso ambiental continuará a ganhar espaço e a preservação do meio ambiente será uma bandeira desfraldada por todo o território nacional. Os cuidados ambientais terão reflexo na projeção da imagem do Brasil no mundo. II Parte Raspando o tacho (notas sobre a Conjuntura) - Os governos que tocam a flauta da privatização encontram forte resistência de grupamentos parlamentares, como o governo Tarcísio de Freitas. O apagão que deixou São Paulo sem energia durante 5 dias tem sido um argumento contra a privatização de serviços públicos. A Enel é o alvo do tiroteio. - As pautas econômicas entram na agenda de Rodrigo Pacheco e Arthur Lira. - Lula está demorando para indicar nomes para o STF e para a PGR. Pressões de todos os lados deixam-no em dúvidas. - Janja quer um gabinete no Palácio do Planalto. Ora, que seja dado. Ela é o termômetro de Lula. - O mundo, com as guerras da Ucrânia/Rússia e Israel/Hamas, ficou mais próximo da morte. A banalização do Mal. - O governo Lula chega ao fim de ano com desgastes maiores que os previstos. A taxa de aprovação tem diminuído. - As listas de saída de estrangeiros na faixa de Gaza não têm contemplado a última leva de brasileiros. A 5ª lista saiu e, mais uma vez, o Brasil não foi contemplado. Celso Amorim, o assessor especial/internacional do Governo, está muito chateado. Não tem explicação a dar. Pérolas Fecho a coluna com pérolas do Enem - A harpa é uma asa que toca. - O vento é uma imensa quantidade de ar. - O terremoto é um pequeno movimento de terras não cultivadas. - Os egípcios antigos desenvolveram a arte funerária para que os mortos pudessem viver melhor. - Péricles foi o principal ditador da democracia grega. - O problema fundamental do terceiro mundo é a superabundância de necessidades. - A unidade de força é o Newton, que significa a força que se tem que realizar em um metro da unidade de tempo, no sentido contrário. - Lenda é toda narração em prosa de um tema confuso. - O nervo ótico transmite ideias luminosas ao cérebro. - A febre amarela foi trazida da China por Marco Polo. - "O pobrema da amazônia tem uma percussão mundial. Várias Ongs já se estalaram na floresta." - "A amazônia é explorada de forma piedosa."
quarta-feira, 1 de novembro de 2023

Porandubas nº 828

Abro o texto com um "causo" hilário, envolvendo uma "raposa" da política mineira. Quiçá e cuíca Benedito Valadares, governador, foi a Uberaba para abrir a Expozebu. E passou a ler o discurso preparado pela assessoria. A certa altura, mandou ver: - Cuíca daqui saia o melhor gado do Brasil. Ali estava escrito: - Quiçá daqui saia o melhor gado do Brasil. A imprensa caiu de gozação. Tempos depois, em um baile na Pampulha, o maestro, lembrando-se do famoso discurso na terra do zebu, começou a apresentar ao governador os instrumentos da orquestra. Até chegar na fatídica cuíca. E assim falou: - E esta, senhor governador, é a célebre cuíca. Ao que Benedito, querendo dar o troco, redarguiu com inteira convicção: - Não caio mais nessa não. Isto é quiçá! (Historinha enviada por J. Geraldo). Parte I Na primeira parte da coluna, faço um registro histórico. Narro como vi o atentado terrorista no aeroporto dos Guararapes, em Recife, naquela manhã de sol ardente de 25 de julho de 1966. Esperando Costa e Silva Repórter da Folha de São Paulo, sucursal do Nordeste, andava eu de um lado para outro, no aeroporto dos Guararapes, em Recife, tentando identificar autoridades entre as cerca de 300 pessoas que aguardavam o marechal Costa e Silva. Ele viria de João Pessoa, na Paraíba, para seu périplo pelo NE na pré-campanha para a presidência da República pela então Aliança Renovadora Nacional, ARENA. Para frustração da multidão que o aguardava, o alto-falante avisou: devido a uma pane no avião, o marechal viria de automóvel. Em minha mente de repórter em início de carreira, tinha uma pergunta embaraçosa a fazer ao candidato: "Por que ele não era o preferido do presidente Castelo Branco para sucedê-lo"? A bomba Preparava-me para sair quando o artefato explodiu. Poderoso deslocamento de ar jogou-me a metros de distância (sensação horrível de voar pelos ares) de onde me encontrava. Intensa fumaça, gritos de terror e uivos de dor. Tonto, levantei-me, sem saber para onde ir. As pessoas corriam em direção à saída. Voz corrente: um atentado para matar Costa e Silva. Na frente do aeroporto, esperando um táxi, dava para enxergar o apoplético coronel Hélio Ibiapina, óculos Ray-Ban, face avermelhada, dando ordens, gesticulando nervosamente, ordenando o desvio de carros. E a dúvida bateu na mente: pane no avião? Será que os militares não sabiam de nada? Pane no avião presidencial? Hum... Sangue no paletó No táxi, um susto: vi sobre um dos ombros do meu paletó cinza-esverdeado massa de miolos esfarelados e gotas de sangue. Eu estava nas proximidades dos dois mortos do atentado: o jornalista Edson Regis de Carvalho, secretário da Casa Civil de Pernambuco, do governo Paulo Guerra, e o vice-almirante aposentado Nelson Gomes Fernandes. Fui direto à Italcable, na avenida Dantas Barreto, no centro do Recife, onde rabisquei telegrama para a Folha, noticiando a explosão e o zum-zum: outra bomba teria explodido na sede da União dos Estudantes de Pernambuco e mais uma na USAID (United States Agency for International Development). Diarréia Corri para a sucursal da Folha, na praça Joaquim Nabuco, ao lado do cine Moderno, no primeiro piso. Subi a pequena escadaria e fui direto ao banheiro para administrar o problema estomacal que me acometera. Uma disenteria. Só depois passei a relatar o atentado terrorista no aeroporto a Calazans Fernandes, chefe da sucursal e a Manuel Chaparro, grande jornalista, hoje em recuperação da saúde, e que sempre contou esse detalhe pitoresco deste escriba indo ao banheiro às pressas. Os dois, perplexos, olhavam para as manchas de sangue e detritos no meu paletó. As versões A história foi apurada. Passei anos desconfiado sem saber quem teria sido o mentor. Atribuía-se inicialmente ao ex-deputado Ricardo Zarattini, que chegou a ser torturado, e ao professor Edinaldo Miranda. Teria sido perpetrado pela Ação Popular, a AP, da esquerda católica, sendo o ex-padre Alípio de Freitas o mentor, e Raimundo Gonçalves Figueiredo, Raimundinho, codinome Chico, o operador. Este morreu em abril de 1971 em tiroteio com policiais. Maleta escura Jacob Gorender, no livro "Combate nas Trevas", relata parte do caso. Uma maleta escura com a bomba foi encostada numa pilastra próxima à livraria Sodiler. O guarda-civil Sebastião Thomaz de Aquino, o Paraíba, ex-jogador do Santa Cruz Futebol Clube, teria pegado a maleta para entregá-la no DAC, ali no aeroporto. A bomba explodiu. Matou duas pessoas e feriu 14. Investigação O Jornal do Commercio, de Recife, sob a coordenação do repórter Gilvandro Filho, entrevistou o padre Alípio de Freitas, já em Portugal, que defendia a causa de operários e a reforma agrária. A investigação concluiu que os dois acusados eram inocentes, fato reconhecido pelo Estado apenas em 2013, por meio da Comissão da Memória e Verdade Dom Hélder Câmara. Para passar o Brasil a limpo, é mais do que hora de tirar o lixo debaixo do tapete. Até hoje, há muita especulação sobre o atentado. Parte II Raspando o tacho - Ao desdizer o ministro Fernando Haddad sobre a meta do déficit zero no Orçamento de 2024, argumentando que não se preocupa com isso, o presidente Lula desautoriza e corrói o conceito de responsabilidade na gestão fiscal. Ruim para o prestígio do país. - O governo vê declinar sua avaliação positiva e aumentar a avaliação negativa. Últimas pesquisas de opinião. - Mais um naco (e que naco) do bolo foi dado ao Centrão: a Caixa Econômica Federal. - Menos uma mulher no topo da administração Federal. - A carnificina na Faixa de Gaza faz da ONU um organismo sem nenhum poder de decisão. Acorrentado. Inerte. - Os terroristas do Hamas ganham com o ímpeto de guerra. A corrente religiosa vê seus mortos no paraíso. - Cerca de 230 reféns estão nos túneis do Hamas. Israel tem encontrado poucos até o momento. - Lula usa a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, para dar recados ao mercado. E, às vezes, não se contém e manda, ele mesmo, recados obtusos. - Rodrigo Pacheco tem divergido muito de Arthur Lira. Cada presidente com seu rolo compressor sobre o Executivo. - Os candidatos a prefeitos em 2014 começam a contratar Institutos de Pesquisa. - Murilo Hidalgo, do Instituto Paraná Pesquisas, manda resultados do levantamento que acaba de fazer em Curitiba. O ex-prefeito Luciano Ducci (PSB) lidera a corrida para a prefeitura, com 25,6% das intenções de voto, seguido pela deputada Rosângela Moro (União Brasil), com 15,3%. - Brasil bate recorde de população empregada. Ótimo. - Em uma carta conjunta, Jennifer Aniston (Rachel), Courteney Cox (Monica), Lisa Kudrow (Phoebe), Matt LeBlanc (Joey) e David Schwimmer (Ross) lamentaram a partida do colega de elenco de Friends, Matthew Perry. "Éramos mais que uma família", dizem na carta. - Ex-diretora de Paulo Guedes, Marina Helena, suplente de deputada, será candidata do Novo à prefeitura de SP. Foi chefe de desestatização do governo Bolsonaro. - Mais enchentes no Sul. Seca piora no Norte. Brasil e suas regionalidades. - E Neymar, hein? Messi, pela 8ª vez, é o melhor jogador de futebol do mundo. Neymar vai passar uns 10 meses no retiro, viajando no seu avião e gozando férias no ócio. Claro, e tentando se recuperar da lesão no joelho. Seu time das Arábias que espere... Táticas de guerra - Fecho a coluna com pequenas lições sobre as formas de guerrear. Táticas de guerra, segundo o general Sun Tzu "Prepare iscas para atrair o inimigo. Finja desorganização e esmague-o. Se ele está protegido em todos os pontos, esteja preparado para isso. Se ele tem forças superiores, evite-o. Se o seu adversário é de temperamento irascível, procure irritá-lo. Finja estar fraco e ele se tornará arrogante. Se ele estiver tranquilo, não lhe dê sossego. Se suas forças estão unidas, separe-as. Ataque-o onde ele se mostrar despreparado, apareça quando não estiver sendo esperado. - Quando em região difícil, não acampe. Em regiões onde se cruzam boas estradas, una-se aos seus aliados. Não se demore em posições perigosamente isoladas. Em situação de cerco, deve recorrer a estratagemas. Numa posição desesperada, deve lutar. Há estradas que não devem ser percorridas e cidades que não devem ser sitiadas. - Não marche, a não ser que veja alguma vantagem; não use suas tropas, a menos que haja alguma coisa a ser ganha; não lute, a menos que a posição seja crítica. Nenhum dirigente deve colocar tropas em campo apenas para satisfazer seu humor; nenhum general deve travar uma batalha apenas para se vangloriar. A ira pode, no devido tempo, transformar-se em alegria; o aborrecimento pode ser seguido de contentamento. Porém, um reino que tenha sido destruído jamais poderá tornar a existir, nem os mortos podem ser ressuscitados."
quarta-feira, 25 de outubro de 2023

Porandubas nº 827

Abro o texto com um hilário "causo" de matreirice na política. Rui Carneiro Paraibano matreiro, era candidato a senador pelo PSD, em 1955. A UDN tinha apoio dos comunistas. Rui esteve na Europa, voltou, foi fazer o primeiro comício da campanha: - Paraibanos, estive em Roma com o Papa. Ele me cochichou: - Rui, se destruírem meu trono aqui no Vaticano, sei que tenho um grande amigo lá na Paraíba. Vá, dê lembranças à comadre Alice e diga ao povo que estou com você. Ganhou a eleição. Parte I - A mãe das reformas A primeira parte da coluna procura analisar a mãe das reformas, a administrativa. Vai ou não vai ser aprovada durante o governo Lula III? Ao leitor, as conclusões. A reforma administrativa Fala-se muito de reforma administrativa. E por que não é feita? Ora, porque a parte que puxa o cabo de guerra para o passado ganha de goleada do time que puxa o cabo para a frente. Analisemos. Quem se der ao exercício de contemplar a fisionomia nacional vai deparar com imensos contrastes. Há ilhas de excelência no meio de feudos. Há avanços de tecnologia de ponta ao lado de muralhas do passado. O mandonismo Na seara da administração pública, uma burocracia altamente profissionalizada convive com largas fatias do mandonismo político, a denotar o esforço de uns para olhar adiante sob o solavanco de outros que teimam em olhar para trás. Herança civilizatória: o patrimonialismo, a invasão da coisa pública pelo interesse privado. O pensamento de que o cargo público lhe pertence, pelo fato de ter ganho uma eleição, torna o representante uma estaca dos feudos que se implantam nas três esferas da Administração Pública, municípios, Estados e União. A mãe das reformas A mãe de todas as outras, antes mesmo da área política, como normalmente se tem propagado, é a reforma do modelo de operação do Estado. Redimensionar a estrutura estatal, conferindo-lhe dimensão adequada para a obtenção de eficácia, significa mudar comportamentos tradicionais, racionalizar a estrutura de autoridade, reformular métodos e, ainda, substituir critérios subjetivos e ancorados no fisiologismo por sistemas de desempenho. Coisa de democracias mais antigas e consolidadas. Coisa de cultura política voltada para o bem-comum. A meritocracia A meritocracia é o instrumento adequado para oxigenar, qualificar e expandir a produtividade na administração. As levas de indicações partidárias acabam contribuindo para inchar estruturas, expandir a inércia e as teias de interesses escusos. A proposta começa com a substituição de milhares de cargos comissionados por uma carreira de Estado, à semelhança do que existe em sistemas parlamentaristas, nos quais quadros permanentes, qualificados e motivados são imunes às crises políticas. O parlamentarismo Mudam-se os dirigentes, mas as equipes continuam comandando a gestão pública. Aliás, o parlamentarismo, sempre mal explicado por aqui, é o sistema mais adequado para o Brasil. Já o presidencialismo perpetua as mazelas. Cultiva uma "estadania", o sistema que coloca o Estado como o patrão que tudo resolve. Os "estadãos", não cidadãos, dependem das mamatas da vaca leiteira, o Estado. O empreguismo, os lotes de cargos distribuídos entre partidos, fazem parte da liturgia presidencialista. Reconhecer o mérito Da burocracia comprometida com o mérito deverão ser cobrados resultados dentro de metas preestabelecidas, reconhecendo-se as qualidades de cada perfil e implantando um modelo de premiação e promoção para motivar as equipes. Não será tarefa fácil alterar a fisionomia da Administração Pública. O atual sistema de loteamento faz parte da velha cultura patrimonialista. Formar quadros Sem quadros, qualquer reforma fenecerá. O fortalecimento das áreas de formação, reciclagem e aperfeiçoamento de recursos humanos, voltadas para a operação do Estado, deve ser prioridade. Essas ideias parecem consensuais entre grupos de bom senso da própria Administração Pública. E por que não se aplicam? O que se constata é uma assimetria da organização do poder no Brasil. O dono da orquestra dá o tom. Os músicos são indicados pelos senhores do mando. O círculo vicioso da política gira, gira, gira, mudando figuras e comandos, apenas trocando perfis, não o sistema. A pressão social Há poucas brechas para se avançar. Mas é possível, sob pressão intensa da sociedade, fazer fluir oxigênio novo. Quando ideias transformadas em projetos chegam ao Congresso sob o empuxo social, ganham repercussão e acabam entrando em pauta. Foi o que ocorreu com situações que caracterizam o ingresso do Brasil na modernidade: a pesquisa com células-tronco, a aprovação do Projeto Ficha Limpa, a Lei Maria da Penha, de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outros estatutos. Articulação Uma condição se faz necessária para se avançar. A força acumulada pelo governo para fazer rolar o seu rolo compressor no Congresso. E o governo precisa fazer isso no seu primeiro ano ou, no máximo, no segundo. À medida que se aproximam as eleições, tudo será mais difícil. O Congresso quer mais fatias de poder. Os representantes só decidem olhando para os umbigos. Parlamentares insatisfeitos Nem mesmo o poder dos presidentes das Casas congressuais - sejam eles Arthur Lira, Rodrigo Pacheco ou outros - conseguem apoio para aprovar pautas governamentais. Conclusão: Lula terá pequena margem de manobra para aprovar a reforma administrativa. Um projeto que gera polêmica. Parte II Raspando o tacho - A pauta econômica na reta final. Ufa. - Fernando Haddad vê semana decisiva para sua pauta econômica no Congresso. Mas parlamentares cobram alta fatura. Reforma tributária chega ao 'mata-mata' no Senado, que também vai votar projeto de extensão da desoneração da folha. - Já a Câmara deve analisar taxação de fundos exclusivos e offshore. - Lula volta a despachar no Palácio do Planalto. Mais alegre, andando de um lado para outro, e dando seus alôs midiáticos para líderes internacionais, entre os quais Vladimir Putin. - A força emergente no Congresso é a da bancada do agro. A maior. - A situação na Argentina continua mostrando uma grande interrogação. Os votos de Patrícia Bullrich vão para Massa ou para Milei? Para os dois. Mas quem terá a maior fatia? Bullrich ficou em terceiro, com uma boa votação, cerca de 24% dos votos, ou seja, 6,2 milhões. - O medo de Milei e o receio de terem Massa como uma continuidade administrativa na economia devastada balizarão o processo decisório na Argentina. Os eleitores se sentem entre a cruz e a caldeirinha. - E a guerra, hein? Os ataques terrestres dos israelenses em Gaza são o foco da guerra nesta semana. - E a guerra entre Rússia e Ucrânia, hein? Putin defende o cessar fogo em Gaza, mas fica de bico calado sobre sua guerra. - Na próxima semana, o Brasil deixará de presidir o Conselho de Segurança da ONU, onde passará um mês de comando. Cumpriu bem a tarefa. - Nota 10 ao programa de resgate de brasileiros vindos de Israel. Há ainda alguns em Gaza. - A seca no Norte do país é o novo calcanhar-de-Aquiles dos governantes, o Federal e os estaduais. - As enchentes no Sul do país constituem, por sua vez, o calvário de gaúchos e catarinenses. - A violência no Rio de Janeiro e em São Paulo é uma bomba que joga pra longe os governantes dos dois Estados, com sérios danos à sua imagem no ano eleitoral de 2024. Até porque não há esperança de melhoria no aparato de segurança. - O Brasil eleva sua posição no ranking da violência mundial. - Eduardo Bolsonaro, o deputado com estrondosa votação em São Paulo, fez o que pelo Estado? Não sabe nem onde fica o Tatuapé, que confunde com o animal correndo com suas quatro patas... - O pai, Jair Bolsonaro, quer emplacar o filho mais novo, Renan, como vereador em Camboriú, Santa Catarina, no pleito de 2024. - O mais velho, Flávio, gostaria de ser candidato a prefeito no Rio de Janeiro. Porém, teme ser um fracasso, o que impactaria todo o projeto de poder da família. - Guilherme Boulos, deputado Federal, tem imagem associada ao MST e suas invasões de propriedade. Sua meta: aliviar essa associação para ganhar densidade e se eleger prefeito de São Paulo no próximo ano. Conseguirá? Constatação: caiu na armadilha do Hamas, mais uma associação negativa da qual procura se desvencilhar. Fecho a coluna com outro "causo" de matreirice. A banana Na campanha pela prefeitura de São Paulo, em 1985, contra Fernando Henrique, Jânio foi ao bairro de São Miguel Paulista, reduto de nordestinos. Enfrentou uma feijoada, regada a caipirinhas múltiplas. Caiu na cama da casa de um eleitor. Atrasado, às 19h, foi acordado. Em sobressalto, vestiu o terno amarfanhado, pegou uma banana e colocou no bolso. Subiu o palanque e tascou: - Político brasileiro não se dá o respeito. Eu não. Desde as 7h da manhã estou caminhando por este bairro e até agora não comi nada. Então, com licença". Sob os aplausos da galera, devorou a banana. Ganhou as eleições. Espanou a cadeira onde, momentos antes, se sentara Fernando Henrique, que achava ter ganho o pleito.
quarta-feira, 18 de outubro de 2023

Porandubas nº 826

A coluna sempre trouxe uma historinha hilária na abertura. Ante a escalada de medo e violência dos últimos tempos, este analista decidiu suspender a "graça" para ajustar o texto ao espírito do tempo. Mas insistentes pedidos fazem retornar os "causos". Vez ou outra, eles abrirão a coluna. Lei da Gravidade A Lei da Gravidade, de vez em quando, dá dor de cabeça aos mineiros. E a lei da gravidez, essa, nem se fala. Na Câmara Municipal de Caeté, terra da família Pinheiro, de onde saíram dois governadores, discutia-se o abastecimento de água para a cidade. O engenheiro enviado pelo governador Israel Pinheiro deu as explicações técnicas aos vereadores, buscando justificar a dificuldade da captação: a água lá embaixo e a cidade, lá em cima. Seria necessário um bombeamento que custaria milhões e, sinceramente, achava o problema de difícil solução a curto prazo, conforme desejavam: - Mas, doutor - pergunta o líder do prefeito - qual é o problema mesmo? - O problema mesmo - responde o engenheiro - está ligado à Lei da Gravidade. - Isso não é problema - diz o líder - nós vamos ao doutor Israel e ele, com uma penada só, revoga essa danada de lei que, no mínimo, deve ter sido votada pela oposição, visando perseguir o PSD. O líder da oposição, em aparte, contesta o líder do prefeito e informa à edilidade, em tom de deboche, que "o governador Israel nada pode fazer, visto ser a Lei da Gravidade de âmbito Federal". E está encerrada a sessão. (A historinha é de José Flávio Abelha, em seu livro A Mineirice). Parte I Avaliação do governo O método é de Carlos Matus, cientista político chileno. Ele é o criador do Planejamento Estratégico Situacional, um modelo que surgiu da reflexão sobre a necessidade de aumentar a capacidade de governar. E que avalia o desempenho de uma administração pela somatória de quatro campos de viabilidade: o político, o econômico, o social e o organizativo. O equilíbrio entre eles é responsável pela fortaleza ou fragilidade das ações programáticas. Procuremos fazer breve leitura do governo Lula sob esses quatro cinturões. As coisas não acontecem O governo Lula III acumulou, desde a posse, força descomunal, a partir da reposição da imagem do país na paisagem internacional, mas não tem sabido transformá-la em ferramenta de eficácia da gestão. A administração tem deixado escapar, aos poucos, a condição de usar o poder como "capacidade de fazer com que as coisas aconteçam", como ensina Bertrand Russell. Basta analisar os furos exagerados em pelo menos três desses cinturões. Tensões na área política A área política é um território semeado de tensões e pressões, que têm levado à instabilidade. A base governista, de cujo apoio o governo tanto necessita para aprovar projetos e medidas provisórias, constitui um aglomerado de grupos heterogêneos, envolvidos em querelas. Cada partido, seja do Centrão, seja da esquerda, quer ganhar uma fatia maior do bolo. O ponto central, ainda não internalizado pelo governo, é o de que seu governo não se assenta no conceito de coalizão, mas na moeda fisiológica da adesão, o que torna frouxos os elos com as estruturas partidárias. O balcão Não se estabeleceu, desde o início, um pacto de longa duração. Os acordos ficam sujeitos ao gosto das circunstâncias, propiciando a negociação no balcão da fisiologia. Será tarefa quase impossível consertar um erro de origem, ainda mais quando se vê no comando da Câmara um perfil de forte tradição fisiológica. O território social não passa de paisagem devastada pela improvisação. Onde estão as políticas públicas para equacionar o déficit nas áreas da saúde, educação, mobilidade urbana, segurança pública? Se existem, o governo falha na comunicação. A gestão com congestão No cinturão gestão, da organização administrativa, a observação é de que é frágil para abarcar um corpo governamental muito gordo. Ministérios incham a máquina do Estado. Milhares de servidores exibem como qualidade a carteira de filiação partidária. Com o nivelamento por baixo, a burocracia emperra. Os gastos públicos têm obedecido ao patamar do teto de gastos aumentado em proporção geométrica. Para que formar 38 (ou 39?), se apenas 15 a 20 dariam melhor resposta às demandas nacionais? E que eficiência se pode esperar de um ministério que é uma colcha de retalhos, com partes esburacadas, como as que abrigam ministros sob suspeita, envolvidos em escândalos, gente sem competência gerencial, quadros que vivem em torno de uma Torre de Babel? A malha de transportes Como um país se dá ao luxo de ver uma parte de sua safra perdida por causa da péssima condição das estradas? Como se pode deixar cair no ralo dezenas de bilhões por ano em razão da calamidade do sistema viário? O cinturão econômico O cinturão econômico, esse sim, parece bem ajustado. Trata-se de uma área que navega pelo piloto automático. O ministro Fernando Haddad, apesar de prometer zerar o déficit público, ganhou apoio do mercado. Mesmo assim, é passível de críticas. Em que o superávit primário do PIB contribuirá para aumentar o emprego? O desemprego diminui, mas tem base para suportar os gastos governamentais? O arrocho tributário alcança patamar nunca visto. Ficaremos com 27% de tributação na reforma tributária? Mesma coisa de hoje. Com essa gama de interrogações, o sinal amarelo prenuncia que os cordões do governo poderão, logo, logo, se romper. A imagem do Brasil O governo Lula vai bem na área da imagem externa. O país conseguiu repor sua imagem na galeria das Nações respeitadas. Imagem destroçada pelo governo Bolsonaro. Com suas viagens, Lula reconquistou a posição de credibilidade do país. P.S. A maioria da população não aprova sua agenda internacional, segundo institutos de pesquisa. Parte II Raspando o tacho - Notinhas sobre a conjuntura - Murilo Hidalgo, do Instituto Paraná Pesquisas, manda sua última pesquisa sobre o governo Lula. O foco: as viagens internacionais do presidente. Aprovação - 44,1%; desaprovação - 50,4%; não sabe, não opinou - 5,5%. - Murilo também manda pesquisa de avaliação dos ministros de Lula. Alguns deles passando da nota 5, mas ali no meio, sem distinção. Simone Tebet e Camilo Santana, Planejamento e Educação, com 5,4%; Geraldo Alckmin e Flávio Dino, Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços e Justiça, ambos com 5,3%; Nísia Trindade e Fernando Haddad, Saúde e Economia, com 5,0%. - Lula continua sob uma cortina em sua recuperação. Não pode deixar de fazer rigorosa fisioterapia. - O governo merece nota 10 com seu programa de resgate de brasileiros de Israel. FAB, 10 com louvor. - O país foi ágil e eficaz na logística do transporte dos brasileiros. E agora se dispõe a ajudar os países amigos da região. - O texto costurado pelo Brasil no Conselho de Segurança da ONU tem mais chance de prosperar que o texto russo, aliás já reprovado. - Boa notícia: pessoas que estavam em situação de desespero no sul da faixa de Gaza conseguiram receber água e comida. - E a guerra Rússia x Ucrânia, hein? - O grande temor: o alastramento do conflito no Oriente Médio. - O Brasil dos contrastes: os rios secando na região amazônica e as ruas de cidades alagadas no Sul. Um país continental. - Bolsonaro, em viagens pelo país, se apresenta como o principal cabo eleitoral de 2024, ano das eleições municipais. - Impressiona como o país continua dividido. - Foco do governo no Congresso: reforma administrativa. E a pauta econômica. - A gestão de Josué Gomes, na FIESP, é um continuum de bons eventos. Uma administração voltada para debater o país. Parabéns. - O que é Felicidade? Rubens Figueiredo, cientista social e especialista em pesquisas, trabalhou bem o tema em palestra no COSENP da FIESP. Fez um interessante giro sobre os caminhos da felicidade no planeta. Dei minha contribuição lembrando os quatro impulsos básicos do ser humano, estudados por Pavlov: instintos combativo e nutritivo (ligados à conservação do indivíduo), sexual e paternal (voltados para a perpetuação da espécie). Todos eles propulsores da felicidade. - O vírus da Covid-19 volta a assustar. Nas últimas semanas, o alastramento da Covid ganhou volume em São Paulo. Um salto de 30%. Maior patamar desde janeiro. - Marcos da Costa, secretário de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência, comunica que o governo acaba de lançar o programa de acessibilidade das pessoas com deficiência auditiva aos serviços públicos do Estado de São Paulo. Vai atender a cerca de meio milhão de pessoas. Meus aplausos. - O papa Francisco é cobrado para expressar mensagens mais duras em relação ao terrorismo do Hamas. Sem prejuízo da defesa do Estado palestino. - Cessar fogo nesse momento seria um trunfo para o Hamas, dizem os analistas. Um impasse: e as mortes de civis? Fecho a coluna com uma pitada de riso. Precisamos trabalhar O brigadeiro Eduardo Gomes fazia, no largo da Carioca (Rio de Janeiro), seu primeiro comício da campanha presidencial de 1945. A multidão o ouvia em silêncio: - Brasileiros, precisamos trabalhar! Do meio do povo, uma voz poderosa gritou: - Ih, já começou a perseguição! Bagunça geral. O comício quase acabou.
quarta-feira, 11 de outubro de 2023

Porandubas nº 825

Parte I O mundo vive momentos de tensão. Cerca de 10 guerras fazem parte da paisagem de destruição, mortes, violência extremada, caos. A recente ação terrorista do Hamas, com seus ataques covardes ao Estado de Israel, é o ponto culminante da escalada de violência em que caminha o planeta. O Produto Internacional Bruto da Felicidade sofre perdas, só sentidas por ocasião dos tempos das Guerras Mundiais e da Guerra Fria. Tempos harmônicos se foram na poeira da Humanidade. Sob essa ordem de violência, assume capital importância o Poder Judiciário. Sobre ele, este analista dedica a primeira parte da coluna. Uma leitura sobre o Judiciário Uma onda criminosa, como a metástase de um câncer, propaga-se rapidamente no mundo, infiltrando-se até no Poder Judiciário. A constatação é grave. Afinal de contas, trata-se de um Poder que é o mais identificado com a virtude da moral. Representa o altar mais elevado e nobre da verdade e da justiça. Acusações que atingem um ou outro de seus pares acabam maculando a imagem da instituição. E a imagem de um Judiciário desacreditado estampa um dos maiores danos à alma nacional. Já foi o mais respeitado O Judiciário já foi o mais respeitado dos Poderes da República, seja pela identidade de seus integrantes, seja pela nobreza de suas funções constitucionais. Nos últimos tempos, o STF passa a imagem de uma gigantesca delegacia de polícia. Em alguns Estados, as práticas administrativas dos Poderes são influenciadas por costumes políticos desenvolvidos no seio de famílias e grupos. Tem sido comum a indicação política de juízes para as Cortes Superiores, a ponto de se identificar facilmente os patrocinadores políticos de espaços de mando e poder na área da Justiça. A sagrada função do juiz A figura do juiz, em nosso país, não se cerca mais daquela aura sagrada que tanta reverência impunha no passado. Em tempos idos, cultivava-se admiração pela liturgia da Justiça. Os juízes assumiam na plenitude aqueles traços nobres, que Francis Bacon tão bem descreveu em seus ensaios: "os juízes devem ser mais instruídos do que sutis, mais reverendos do que aclamados, mais circunspetos do que audaciosos. Acima de todas as coisas, a integridade é a virtude que na função os caracteriza." O rebaixamento O rebaixamento dos níveis educacionais, dos padrões técnicos e da qualidade dos recursos humanos, o descumprimento à tripartição dos Poderes, pela canibalização recíproca de espaços e funções, e o arrefecimento de valores fundamentais (o respeito à lei, à disciplina e à autoridade), a negligência para com o dever, a escassez de solidariedade, a falta de seriedade e a indignidade pessoal se fazem presentes na festa de banalização da vida pública. Tudo tem ficado mais assemelhado. E pior. A maré de demandas Atingido pela sujeira que borra a moldura de todas as instituições, sem exceção, o juiz tem de enfrentar um calvário particular, a via crucis da crise, determinada pelos dilemas que lhe são impostos pelo caráter dual do Estado brasileiro. De um lado, o Estado liberal, fincado nas bases do equilíbrio entre os Poderes, no império do direito e das garantias individuais. De outro, o Estado assistencial, de caráter providencial, voltado para a expansão dos direitos sociais, ajustados e revigorados pela CF de 88. Os resultados vão bater na mesa do juiz: enxurradas de demandas crescentes e repetitivas em questões de toda a ordem - trabalhistas, tributárias e previdenciárias - para milhares de reclamatórias nas instâncias da Justiça. A hora da verdade Chegou a hora da grande verdade para os tribunais. Ou o Judiciário se estrutura para atender às demandas de uma sociedade cada vez mais consciente e participativa ou acabará por ser afundado na vala comum do descrédito. Não há meio termo. Para ganharem o que merecem e precisam, as Cortes, respirando o cheiro do tempo, hão de se abrir para a sociedade, mostrando que não têm nada a esconder. Hão de fortalecer a imagem de guardiões da lei. Urge limpar das impurezas a estátua de Themis, a deusa da Justiça, cujos olhos cobertos por uma faixa simbolizam a imparcialidade no julgamento de ricos e pobres, poderosos e humildes, grandes e pequenos. Os contornos da crise A crise do Judiciário adquire contornos definidos quando junta os adjetivos que marcam sua ação: lento, formalista e inacessível. Sua estrutura tem sido incapaz de administrar a explosão dos novos e complexos conflitos de uma sociedade em mutação e propiciar tutela jurisdicional tempestiva aos litígios clássicos. A excessiva demora do processo traz insegurança e o acúmulo de demandas gera colapso no sistema. Cipoal legislativo O cipoal legislativo - 188 mil leis, das quais menos de um terço em vigor - atrapalha o ordenamento jurídico, provocando interpretações contraditórias, controvérsias e aumento progressivo dos recursos. Apesar de termos um modelo federalista, copiado do norte-americano, a esfera Federal é quem legisla nos campos do Direito material e processual, gerando excesso de centralização. Os Tribunais Superiores, por seu lado, mais atendem às demandas dos Poderes Executivo e Legislativo do que às lides oriundas do povo. Os instrumentos criados para assegurar celeridade à Justiça - juizados especiais de pequenas causas cíveis e criminais, rito sumaríssimo na Justiça do Trabalho, súmula vinculante, súmula impeditiva de recursos, tutela antecipada - são uma gota d'água no oceano dos processos. O próprio Estado é quem mais entope as veias do Judiciário. A judiciocracia A política passa a ser objeto de contestação, dando origem à "judiciocracia", neologismo para designar uma democracia feita sob obra e graça do Poder Judiciário. Vale lembrar, porém, que a tendência de maior participação dos tribunais em ações legislativas e executivas decorre da própria "judicialização" das relações sociais, fenômeno que se expressa de maneira intensa tanto em democracias incipientes quanto em modelos consolidados. No princípio do Estado moderno, o Judiciário era mero executor de leis. Montesquieu ponderava que juízes significavam a boca que pronuncia as palavras da lei, entes que não podem aumentar ou enfraquecer seu vigor. Invasão entre Poderes O tripé dos Poderes alinhava-se numa reta, embora o Legislativo ainda tivesse maior projeção. Com o advento do Welfare State, o Executivo passou a intervir de maneira forte para expandir a rede de proteção social. Passou, inclusive, a legislar, fato hoje medido entre nós pelas medidas provisórias. Ganhou proeminência entre os Poderes. O atual ciclo confere mais força ao Judiciário pelo fato de ser este intérprete final da letra constitucional. Ao decidir se os Poderes Executivo e Legislativo, partidos e outras instâncias agem de acordo com a Constituição, o STF acaba definindo a política que regra a vida nacional, elevando o Judiciário a um patamar superior. A coloração política Infelizmente, o país passou a conviver com um processo de judicialização da vida social. Disputas multiplicaram-se nas esferas pública e privada. A visibilidade dos tribunais se intensificou e seus membros passaram a dar uma interpretação política aos conflitos sociais. Hoje, nomeações de juízes assumem forte coloração política. Ao lado de alta cultura jurídica, magistrados passam também a ser conhecidos como ministros nomeados pelos presidentes fulano, beltrano e sicrano. O tensionamento O contencioso político-jurídico se adensa. Instâncias políticas e jurídicas convivem, ora pacífica, ora conflituosamente. Tensões acendem as fogueiras de crises intermitentes. Nesse ponto, afloram críticas. Ao interferir fortemente na política, o Judiciário estaria desenvolvendo uma hegemonia dentro do arranjo político-institucional. Posta nesses termos, a inquietação leva em conta, ainda, o processo de nomeação "política" de juízes das altas Cortes, o voluntarismo político e a orientação ideológica de membros do MP que buscam afirmar o caráter politizado da instituição. O fato é que a intervenção jurídica no campo político não pode passar despercebida. Parte II Raspando o tacho - Lula, bem orientado, expressou sua visão sobre a guerra entre Israel e o Hamas, designando esse grupo como "terrorista". Fez bem. Não dá para dourar a pílula diante de tamanha barbaridade cometida contra homens, mulheres e crianças. - A reação de Israel tem sido devastadora. Netanyahu precisa mostrar ação decisiva ante o fracasso da inteligência israelense, que não detectou indícios de planejamento dos ataques - água, terra e ar - dos terroristas. - A ONU não emprega o termo terrorista para o Hamas. Hora de mudar a concepção. - Hora de um grande diálogo de Israel com os palestinos. Hora de consolidar a posição em prol do Estado Palestino. - Cerca de dois mil brasileiros devem ser retirados de Israel. - Ante esse novo conflito, a guerra entre Rússia e Ucrânia passa "batida" na mídia. - Ambos os países perdem com esse novo conflito. Zelensky vai sofrer o desvio de atenção dos europeus e dos EUA, que começam a considerar prioritária a ajuda a Israel. Kiev receberá menos ajuda. Putin ganha com a reorientação de rumos dos países ocidentais. - Lula está mesmo recolhido. Não deu as caras nem para mostrar o tratamento das bolsas em redor dos olhos. - Essa semana será, para a esfera política, um feriadão. - A ameaça de dar visibilidade à morte de civis, tornados reféns, é mais um ato de covardia do Hamas. Barganha para fazer parar a reação israelense sobre a faixa de Gaza. Fecho a coluna com Augusto Franco. Sergipe de Franco Augusto Franco, governador, cheio de si, desceu no Galeão, e foi logo respondendo à pergunta de uma atendente da Varig: - O sr. é o dr. Augusto Franco, de Sergipe? - Não, minha filha, Sergipe é que é de Augusto Franco.
quarta-feira, 4 de outubro de 2023

Porandubas nº 824

O Estado forte Na primeira parte da coluna de hoje, tentarei analisar o porte do Estado. Um Estado forte ou um Estado mínimo? De pronto, a resposta: o Estado necessário. A intervenção do Estado O sociólogo Alain Touraine, que foi professor e amigo de Fernando Henrique, prega o aumento da capacidade de intervenção do Estado como forma de o país atenuar as desigualdades sociais. Seria este o caso do Brasil? O Estado tem sido fraco para debelar as mazelas sociais, a partir da violência nas cidades, como essa guerra de milícias como a que se observa no Rio de Janeiro? Autoritarismo Libelo candente contra os ultraliberais, para quem o mercado é a panaceia para todos os nossos males, a visão do professor não deixa de ser um hino de louvor às utopias. Pois Estado forte, no Brasil, tem sido sinônimo de autoritarismo, arbitrariedade, estrutura burocrática ineficiente e corporativismo. Como liberar o Estado do universo corporativo, como prega Touraine, dando-lhe uma capacidade de manobra, de orientação a longo prazo, sem uma profunda reforma política, capaz de deflagrar novos costumes e consolidar nossas instituições? Poder de decisão Só mesmo uma visão utópica é capaz de colocar na mesma equação componentes como liberalismo, eliminação de desigualdades sociais, Estado forte, maior institucionalização política, extinção do corporativismo e clientelismo. O fortalecimento do poder de decisão do Estado é uma meta que deve ser perseguida, até para se combater a cultura dos interesses individuais e grupais que, entre nós, prevalece sobre as políticas sociais. Mas este é um desafio que ultrapassa décadas, não sendo objeto de consideração de um só governo. O toma lá dá cá Por aqui, a reforma do Estado esbarra na cultura paroquial da política. O fisiologismo substitui a mudança do sistema. A lista de cargos ou liberação de recursos do orçamento é a chave para abrir as portas da política, o instrumento adequado para pavimentar a governabilidade. O fisiologismo é um dos galhos podres da árvore patrimonialista. A política volta a ser aquilo que Paul Valéry mais temia: "a arte de impedir que as pessoas cuidem do que lhes dizem respeito". Nesses tempos de grande influência da mídia, é bom ter cuidado, porque a espetacularização da política pode significar a ruína dos atores. As táticas A ciência política ensina que o reformador deve isolar cada questão o mais depressa possível, retirando-a da agenda política antes que os seus oponentes possam mobilizar suas forças. Se quiser tentar fazer tudo ao mesmo tempo, termina por conseguir pouco ou nada. Se angariar condições para operar em escala global, à base da blitzkrieg, é claro que deve fazer o cerco por todos os lados, rapidamente, antes que a oposição seja ativada. Ora, por aqui, a tática é a de fazer uma coisa por vez, de forma lenta e gradual. Estabilidade É assim que o país sobe a escada da mudança. Seu desafio, agora, é andar num ritmo mais apressado. Reformar o Estado não é tarefa para uma só legislatura. Maquiavel já lembrava que nada é mais difícil de executar, mais duvidoso de obter êxito ou mais perigoso de manejar do que iniciar uma nova ordem de coisas. O reformador tem inimigos na velha ordem, que se sentem ameaçados pela perda de privilégios, e defensores tímidos na nova ordem, temerosos que as coisas não deem certo. O dilema Qualquer análise sobre o sistema político há de contemplar a complexidade da dialética da mudança. Como fazer o Estado mais forte com a debilidade de nossas instituições? Como aparar as desigualdades sociais, com programas liberais, que dão vazão a climas concorrenciais e suas consequências sobre a corrente dos marginalizados? Como deixar de atender a um parlamentar dos grotões, que sem clientelismo é expurgado da política? O x da questão Lula quer ver a velha Eletrobras. Ou melhor, rever a privatização do sistema Eletrrobras, privatizado em junho de 2022, durante o governo Bolsonaro. O então governo de Jair Messias colocou ações da empresa à venda e reduziu sua participação nela de 65% para 42%. Com isso, deixou de ser acionista majoritário e perdeu o controle da companhia. O governo teria recebido cerca de R$ 30 bilhões. O atual presidente diz que o feito com a Eletrobras foi uma "sacanagem". Os braços compridos do Estado são propícios para abrigar legiões de comilões das migalhas do poder. Um projeto de poder Ora, um projeto de poder para o longo prazo requer um Estado gordo. Amplos espaços de mando, principalmente por meio de estruturas que mexem com questões vitais, energia, óleo e água. Em São Paulo, o governador Tarcísio se vê às voltas com a privatização da Sabesp. E pensa colocar no menu da privatização outras empresas, como CTPM e Metrô. O tema gera grande polêmica. O fato é que os liberais de direita acreditam que o Estado menor é o mais eficaz para avançar com seus projetos de crescimento. Os governantes de esquerda defendem o Estado gordo. Nem lá nem cá. O ideal é o Estado necessário. Parte II Raspando o tacho -Lula começa no Alvorada seu programa de recuperação. Lula quer acelerar os passos. E começa seu home office. Ansiedade geral: escolha dos nomes para a PGR e o STF. - Oito horas após o encerramento das votações para o Conselho Tutelar na cidade de São Paulo, os nomes dos 260 conselheiros eleitos foram divulgados em evento de apuração na Câmara Municipal. - Até nessa eleição para Conselhos Tutelares, foi intensa a polarização entre direita e esquerda. Brasil dividido. Interessante fenômeno. Durando mais que o previsto. - Congresso articula mudar negociação de emendas e retirar mais poder de Lula. Plano prevê retomar controle maior sobre a verba e um cronograma de liberação para obras e municípios escolhidos pelos parlamentares. Conferir com minha leitura na parte I da coluna. - Escândalo no kirchnerismo ameaça campanha de Sergio Massa na reta final das eleições na Argentina: imagens do chefe de gabinete do governo de Buenos Aires, de férias, com uma modelo em iate na Espanha. Modelo Sofia Clerici publicou em seu Instagram fotos junto com Martin Insaurralde, kirchnerista, chefe de Gabinete da Província de Buenos Aires. Vai bater em Massa. O extremista de direita, Javier Milei vai faturar. - Queda de braço em São Paulo: grevistas do metrô, CPTM e Sabesp versus Tarcísio, o governador. Pano de fundo: privatização das companhias. P.S. O governador abre os cofres para atenuar o conflito com os deputados estaduais. Coisa de R$ 10 milhões para parlamentares da base e R$ 5 milhões para oposicionistas. - Governo em queda de braço com MST. Ministro Paulo Teixeira, da Agricultura, puxando os cabelos. - Quinta-feira, às 16h, ocorrerá o lançamento do livro "Mulheres no Controle Externo", uma homenagem ao centenário de Lindalva Torquato Fernandes, na sede do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, à avenida Rangel Pestana, 315, Centro, São Paulo/SP. O livro tem como organizadoras Andressa Guimarães Torquato Fernandes, Adriana Cavalcanti Magalhães Faustino Ferreira e Ana Cristina Moraes. A homenageada Lindalva Torquato foi a primeira mulher a presidir um Tribunal de Contas, o do Rio Grande do Norte. O evento ocorre durante o II Congresso Internacional de Direito Financeiro e Cidadania. Muito simbólico nesse momento em que o país clama pela presença de mulheres nas entidades de controle externo. - Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, incrementa defesa de tempo de mandato para ministros do STF. Conflitos à vista. - Juros no cartão: bancos terão 90 dias para fixar teto. - Ministro André Mendonça, do STF, altera cronograma de votação dos processos em julgamento de réus acusados nos ataques de 8 de janeiro. A Corte, a partir de decisão de Mendonça, deverá julgar em plenário físico e não no plenário virtual. Atraso no fluxo de julgamentos. - Os 70 anos da Petrobras comemorados com muitos planos e promessas pelo presidente Jean Paul Prates, que faz uma boa gestão. - Murilo Hidalgo, do Instituto Paraná Pesquisas, manda pesquisa sobre a disputa para a prefeitura de São Luís, no Maranhão. Eduardo Braide (PSD), o prefeito, lidera, com 34,8% das intenções de voto, seguido do deputado Federal Duarte Junior (PSB), com 22,6% pontos percentuais. Fecho a coluna com o cônego Amando, de Mariana/MG. Mudou de nome? Mariana, em Minas Gerais, já foi chamada de Roma brasileira. Terra de fé e de velhas igrejas. E cheia de placas com nomes engraçados nas ruas: - Cônego Amando - Armando Pinto O cônego Amando era conhecido pela verve. Um dia, viajando pelo interior do município, uma de suas acompanhantes caiu do cavalo. Rapidamente ficou em pé. Meio sem graça, perguntou ao cônego: - O senhor viu a minha agilidade? - Minha filha, respondeu, eu até que vi. O que eu não sabia é que tinha mudado de nome.
quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Porandubas nº 823

Qual a identidade do governo Lula, após nove meses de administração do país? A coluna pretende, na primeira parte, fazer uma leitura de sua índole, permanecendo na esfera qualitativa, não se detendo, portanto, na análise de cifras. Na segunda parte, raspo o tacho. Parte I O espírito do governo I O terceiro mandato de Lula sinalizava uma retomada do traçado petista, com a visão socializante do PT e sua inserção na margem esquerda do arco ideológico. Mesmo levando em consideração as mudanças na fisionomia geopolítica dos países na contemporaneidade, apostava-se que o lulopetismo haveria de fincar estacas profundas na vida do país, em sua volta triunfal ao centro do poder. O espírito do governo II Mas, ao pisar no terreno da realidade nua e crua de uma Nação que tem mostrado intensa busca por resultados, não se deixando enganar por muito tempo, o novo mandatário desloca-se, sem sobressaltos, para o centro do arco. Deixou à distância protagonistas importantes da fase ideológica do PT, puxou outros para o meio do palco, faz alianças com blocos oportunistas e utilitaristas da política e montou um programa que parece satisfazer a gregos e troianos. O espírito do governo III O PT, evidentemente, teve que amainar o seu discurso. Garantiu o naco principal do bolo, ao ganhar as pastas no entorno do presidente, aquelas localizadas no Palácio do Planalto, e os comandos decisivos das ações administrativas. Não levou tudo que pediu, daí os reclamos que continua a fazer para abocanhar fatias gordas dos programas. O fato é que o espírito do governo exibe um posicionamento no campo de centro-esquerda, apesar de muitos discordarem dessa visão quando se faz uma leitura de perfis de um grupo de ministros, todos eles ligados ao que se pode designar como o território conservador-patrimonialista-personalista. Lula, palanque e gabinete Luiz Inácio Lula da Silva não abandonou o palanque. Porém, agora, sobe em palanques mais grupais. Nos tempos idos dos palanques do ABC paulista, Lula expressava contundência, agressividade. Era o João Ferrador, personagem criado pelo jornalista Antônio Félix Nunes para apresentar as reivindicações dos trabalhadores na Tribuna Metalúrgica, jornal do sindicato. Ao driblar a censura que o regime militar impunha à imprensa, o personagem era o porta-voz dos trabalhadores. O seu bordão mais conhecido era: "Hoje eu não tô bom". O tempo voa. Lula, agora, faz manifesto com Joe Biden, presidente dos EUA, com pauta comum em defesa dos trabalhadores. O palanque aberto ficou menor, as massas cederam lugar a grupamentos setoriais. Novos tempos O fato é que Lula apressa-se para se adaptar às novas realidades. O chão de fábrica está bem organizado. As greves sumiram. As reivindicações são feitas por lideranças. A sociedade brasileira é exemplo de organicidade social. A luta de classes dá lugar ao diálogo entre patrões e empregados. Lula compreende a nova dinâmica e procura interpretar o fenômeno. Vez ou outra comete a asneira de resgatar antigos bordões. É lembrado sobre a inconveniência e refaz o dito no dia seguinte. Sem admitir que errou. Isso ele nunca admite. Andando nas curvas e retas de estradas mais largas, o comandante-em-chefe tenta se equilibrar. Os ministros Não se pode dizer que o maxistério de Lula seja um todo uníssono. São ilhas de um arquipélago, cada qual com sua vegetação. E ponha grama nesses territórios fragmentados... A Casa Civil, chefiada pelo ministro Rui Costa, tenta apitar o jogo. E evitar que os jogadores queiram aparecer muito. Tem sido difícil coordenar as ações. Ministros correm atrás de recursos. O verbo é para liberar a verba. E usam o cargo para administrar seus feudos. O Parlamento O Congresso quer convalidar as decisões. A seu modo. A reforma tributária anda a passos de caranguejo. A reforma administrativa vai para as calendas. Existe proposta? A minirreforma eleitoral é um arranjo para driblar os apertos do TSE. Rodrigo Pacheco se mostra contrário à reeleição para o Executivo, enquanto ensaia apoio ao senador Davi Alcolumbre para substituí-lo. Arthur Lira quer fazer de Elmar Nascimento, deputado do União Brasil, da Bahia, seu sucessor no comando da Câmara. A conferir com um olho no conjunto de parlamentares que vota com a mão pedindo verba. Poder Judiciário O Poder Judiciário vive momentos de má fama. Entrou no vocabulário das imprecações. Nos próximos dias, o preparado ministro Luís Barroso assumirá o comando do STF, sucedendo Rosa Weber. Promete todo seu esforço para resgatar a era de confiança na Corte, sob o império da segurança jurídica. O Supremo carece mesmo de ampla e intensa campanha para recuperar seu respeitado papel constitucional. A direita O país sinaliza leve inclinação para a direita, com a banda que perdeu as eleições procurando se organizar nos Estados e municípios para garantir uma grande bancada de prefeitos e vereadores em 2024. Bolsonaro não tem estofo para correr o país no esforço de mobilização que o PL e adjacentes precisa desenvolver. As cartas começam a ser jogadas. Seu desempenho dependerá das próximas decisões do Judiciário sobre sua atuação. Será preso? Mesmo preso, será forte cabo eleitoral. E Michelle, a pastora? Também estará nas ruas. O PL poderá bancar os movimentos do casal. Está com o cofre cheio. Classes médias Para onde caminharão as classes médias, com seu poder de fogo? Elas exercem o poder da pedra no meio do lago, ou seja, o poder de criar pequenas ondas que correm até as margens. As classes D e E serão influenciadas pelas classes B e C. Tudo vai depender dos resultados do governo Lula. A esfera internacional Lula inscreve o país na moldura internacional. O Brasil passa a ser ouvido. O discurso é bom. Mas há certas contradições. A sustentabilidade ambiental ganha manchetes, mas a busca de petróleo na foz do Amazonas, com que o governo Lula acena, compromete o ideário defendido na ONU. O bem-estar Como está o Produto Nacional Bruto do Bem-Estar Social em nove meses de governo? Aumentando ou diminuindo? Cada qual com suas conclusões. As redes sociais Serão o termômetro do clima ambiental e do estado de espírito dos grupamentos sociais nos próximos tempos. Parte II Raspando o tacho - Lula será operado do quadril nessa sexta-feira. Passará um mês no estaleiro do Palácio do Alvorada. Cirurgia bem dominada pela medicina. Haja despacho, com correntes de ministros entrando pelos portões do Alvorada. Enxurrada de imagens. - Murilo Hidalgo, do instituto Paraná Pesquisas, manda pesquisa que mostra, em Santos, a seguinte posição para a prefeitura, em 2024: Rosana Valle, com 34,4%; Rogério Santos, com 24,7% e Telma de Souza, com 17,8%; Ivan Sartori, com 3,9% e Débora Camilo, com 3,4%/. Num segundo cenário, Paulo Alexandre Barbosa tem 40,0% e Rosana Vale, 28,9%, enquanto Telma de Souza tem 12,6%, Ivan Sartori, 3,7% e Débora Camilo, 2,7%. - O uso de aviões da FAB pelos ministros e assessores bate recorde. Fins de semana de lazer e ócio. - Aperta-se o cerco ao ex-presidente Bolsonaro. - O calor excessivo bate recordes no país. El Nino não perdoa. Primavera quentíssima. Verão de pegar fogo. - Forças Armadas com prestígio abalado. Urge resgatar sua imagem constitucional. - Zelenski, da Ucrânia, vive seu inferno astral. Parceira, a Polônia, puxou sua orelha. OTAN se retrai. - Trump passa Biden nas pesquisas mais recentes. Cada povo com suas loucuras. - Armênia sob o pano de fundo de grandes tragédias. - O extremista argentino de direita, Javier Milei, ameaça ganhar a eleição, no primeiro turno, em 22 de outubro próximo. - General Augusto Heleno, ex-poderoso ministro do GSI, garante "nunca ter discutido assuntos políticos com subordinados". - Copom sinaliza: redução de 0,5% na taxa de juros, conforme ata da última reunião. - Bancada evangélica se prepara para atuação mais firme a favor de pautas conservadoras. - Moraes vota para condenar mais cinco réus do 8/1 a penas que variam de 12 a 17 anos. - Gasolina sobe e prévia da inflação atinge 5% em 12 meses. Fecho a coluna com Tancredo Neves. Conchavo Premido pelos casuísmos, Tancredo Neves foi obrigado a fundir o seu PP com o MDB de Itamar. Alguns pepistas pularam do barco e protestaram alegando conchavo. Tancredo foi curto e seco: "Conchavo é a identificação de ideias divergentes formando ideias convergentes". O sábio tinha razão. Há curvas que desembocam em retas.
quarta-feira, 20 de setembro de 2023

Porandubas nº 822

Parte I O Brasil do improviso e do pragmatismo Nesta primeira parte, tento fazer breve leitura sobre mais um pacote legislativo que se embrulha sem consulta ao freguês, o eleitor. Trata-se da minirreforma eleitoral, em discussão na Câmara dos Deputados. Como é sabido, teremos eleição municipal em outubro de 2024. Nada mais oportuno fazer um pacotão de regras que beneficiem a esfera dos representantes e candidatos. Essa análise, em parte, se ancora em matéria do Brasil de fato. Cerca de 500 mil postulantes Teremos cerca de 500 mil candidatos na eleição municipal. Se possível, regidos por novas regras. No dia 14, a Câmara dos Deputados aprovou dois projetos da minirreforma eleitoral. Os projetos ainda precisam passar pelo Senado e ser sancionados até o dia 5 de outubro para entrarem em vigor para o pleito de 2024. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), diz não ter pressa. Mas tudo vai depender do jogo de pressões. Proposta - Mudar a Ficha Limpa Analisemos algumas alterações no Código Eleitoral. O relator do projeto, o deputado Federal Rubens Pereira Júnior (PT-MA), como se percebe, deve ter o endosso do Executivo, ficando implícito o apoio do PT. O projeto quer mudar a lei da Ficha Limpa, diminuindo o tempo em que os políticos ficam afastados das disputas. Há dois pontos de vista na mesa de debates: o do Ministério Público, que prega o rigor da lei e defende penas de até 20 anos; e a visão dos advogados, que acham exagero apenar com um afastamento de 10 a 15 anos. Proposta - Quociente eleitoral Outra proposta é para alterar a norma que abriga as sobras eleitorais no Legislativo. O texto sugere que apenas as siglas que alcançarem 100% do quociente podem disputar as cadeiras que sobrarem, em detrimento de candidatos mais votados, mas cujos partidos foram menos selecionados pelos eleitores. Ou seja, um fortalecimento dos grandes partidos. Um perigo para formar poder hegemônico. Sofrerão os partidos pequenos, onde se constata maior abrigo à diversidade e inclusão. Quem é dono da flauta quer dar o tom. Proposta - Prestação de contas Um dos imensos gargalos da legislação é a prestação de contas. Muitos candidatos pelejam na Justiça para terem a aprovação de suas contas. Pelo projeto em tela, flexibiliza-se a prestação de contas de campanhas e a punição a contraventores. Mais uma importante mudança: hoje, há a possibilidade de cassar a chapa para quem for pego na compra de votos. As alterações resultarão em apenas multa, que varia de R$ 10 mil a R$ 150 mil para quem fizer a compra de voto. E, ainda, alteração do artigo 100, que fala que não vai precisar de mais de documento de subcontratação de empresa. Um alívio para aqueles que usam o caixa 2, a par de centenas de candidatos que não preencheram os quesitos exigidos pelo TSE. O projeto contempla a possibilidade de doações via Pix e vedação de cheques cruzados. Porém... os Pix são rastreáveis. Proposta - Cotas Propõe-se mudança nas cotas femininas, nas cotas de negros(as) e a proibição de candidaturas coletivas. Segundo a proposta, a cota de 30% de candidaturas femininas passa a ser contabilizada por federação e não mais por partido. Além disso, abrem-se espaços para o uso de verbas que atualmente são destinadas apenas a candidaturas femininas. As despesas poderiam ser combinadas com as dos homens, desde que acompanhadas de mulheres e pessoas negras em publicidades. Portanto, o projeto é para diminuir as cotas, significando que a cota de 30% de candidaturas femininas seja contabilizada por federação, não mais por partidos. Implicará em significativa redução de mulheres. Proposta - O coletivo As candidaturas coletivas integram o pacote. Como se sabe, nesse modelo, um grupo de pessoas se junta numa chapa, mas apenas um nome aparece na urna. Essa pessoa será a responsável legal pelo mandato. Toma posse, enquanto as outras pessoas passam a trabalhar no gabinete. Os partidos de esquerda defendem o coletivo na representação legislativa, por ver no mecanismo a possibilidade de agregar forças. Há segmentos diversos que formam o poderio de esquerda. Mas os partidos de direita, a partir do Partido Liberal, querem acabar com as candidaturas coletivas. Proposta - Cota racial O relator incluiu no texto uma cota mínima de 20% dos recursos dos fundos eleitoral e partidário para candidaturas de pessoas pretas e pardas, independentemente do sexo. Além disso, quilombolas poderão ser incluídos na lei de Cotas, nos termos de projeto já aprovado pela Comissão de Direitos Humanos. Atualmente, as cotas valem para pessoas pretas, pardas, indígenas, estudantes de escolas públicas e com deficiência. Enfim... A minirreforma eleitoral, nos termos como se apresenta, nada mais é que um empurrão dos grandes partidos para contornar o contencioso jurídico que os abarca. Todo esforço se fará para que este pacotão de benefícios (para uns) e prejuízos (para outros) seja aprovado até 5 de outubro. Mais ação e menos discurso Perguntaram, certa vez, a Demóstenes, o maior orador da Antiguidade: "qual a principal virtude do orador"? Respondeu: "ação". E depois? Repetiu: "ação". Sabia ele que essa virtude, própria dos atores, era mais nobre que a eloquência. E qual a razão? Ora, a razão é o motor da Humanidade. Mais ação, governantes; mais ação, ministros; mais ação, parlamentares. RS espera por ação Possivelmente tenha sido esse o motivo pelo qual o presidente Luiz Inácio não foi ao Rio Grande do Sul prestar solidariedade às famílias das vítimas. Especula-se que antes da visita, iria esperar pelos resultados do pacote financeiro que liberou para ajudar municípios e populações atingidas por inundações. Lula é esperto. E o RS espera resultados da ajuda do governo. Parte - II Raspando o tacho - O discurso de Lula na abertura da Assembleia da ONU foi muito objetivo. Destaco alguns aspectos: cobrou responsabilidade dos países ricos pela poluição que maltrata o planeta; defendeu de forma veemente mudança no Conselho de Segurança, com número maior de assentos para ser mais representativo; sugeriu diálogo para acabar com a guerra entre Rússia e Ucrânia; fez severa crítica ao neoliberalismo; destacou a importância do Brics ampliado, com a entrada de mais países; colocou o Brasil na vanguarda dos programas mundiais de sustentabilidade; destacou a diminuição, em oito meses, do desmatamento na Amazônia; conclamou as nações para acabar com a fome no mundo; fez uma defesa de Cuba, condenando os embargos contra a ilha. Foi aplaudido em sete momentos. - O discurso de Joe Biden focou na crise climática. Ucrânia perde espaço. - Lula, com dores, deve antecipar volta ao Brasil. - Zelensky ouviu com atenção discursos de Lula e Biden. - Os investidores internacionais deram um mergulho no Brasil durante os últimos dias, quando políticos e empresários, em caravana, baixaram em Nova Iorque. - Dona Janja prepara o Alvorada para uma temporada do marido-presidente naquele Palácio. Lula será submetido a uma cirurgia para aliviar as dores que sente na cabeça do fêmur. - Minha solidariedade ao querido ex-senador e hoje vereador de SP, Eduardo Suplicy. Ele padece de Parkinson, conforme anunciou, ontem, em entrevista para Mônica Bergamo, da Folha de SP. "Me sinto bem, continuo ativo, faço ginástica", frisou. Suplicy revelou que se trata com cannabis. - O que Lira colocará em votação quando voltar de NY? Fecho a coluna com um "causo" de Benedito Valadares, a raposa da política mineira. Desde que o dinheiro venha Mais uma da matreirice mineira. Benedito Valadares chegou a Curvelo/MG, para visitar a exposição de gado do município. Na hora do discurso, atrapalhou-se: - Quero dizer aos fazendeiros aqui reunidos que já determinei à Caixa Econômica e aos bancos do Estado a concessão de empréstimos agrícolas a prazos curtos e juros longos. Lá do povo, alguém corrigiu: - É o contrário, governador! Empréstimo a prazo longo e juro curto. Valadares: - Desde que o dinheiro venha, os pronomes não têm importância.
quarta-feira, 13 de setembro de 2023

Porandubas nº 821

Parte I A avaliação dos governantes A primeira parte da coluna desta quarta será dedicada à análise das razões que contribuem para colocar os governantes no fundo do poço ou no pico da glória, sejam eles prefeitos e governadores, seja ele presidente da República. Não adianta querer olhar apenas para as pesquisas de avaliação de imagem. Olhem, senhoras e senhores governantes, para o seu dia a dia. O roteiro abaixo tem a intenção de colocá-los na sala de aula da credibilidade. Promessas - Não se deve prometer o que não se poderá cumprir. O país exige verdade, sinceridade. Alegorias, promessas mirabolantes, planos fantásticos acabam sendo cobrados pelo cidadão. Identidade - Um político deve ter identidade, personalidade, eixo. Coluna vertebral torta gera desconfiança. A imagem que um político quer projetar deverá corresponder ao seu conceito. Não convém uma comunicação exuberante para enaltecer feitos inexistentes. Quando isso ocorre, o eleitor fará sua avaliação nas urnas. Coluna reta abriga as vértebras da lealdade, coerência, honestidade e senso do dever. Representação social - Representar o povo significa escolher as melhores alternativas para propiciar bem-estar. Discurso demagógico para amenizar as dores das periferias angustiadas não vai resistir ao tempo. O apoio que o povo dá ao político, hoje, poderá, amanhã, ser retirado. O governante sério se preocupa com rumos permanentes e medidas condizentes com as demandas das populações. Sabedoria - Sapiência não significa vivacidade. Sabedoria é mistura de aprendizagem, compromisso, equilíbrio, paciência, busca de melhores alternativas, capacidade de convivência e decisões racionais. Já a vivacidade reflete a cara de fisiológicos, aproveitadores e demagogos. Cheiro do povo - O cheiro do povo está nas ruas, nos ônibus, no metrô, nos escritórios, nas fábricas e nos espaços rurais. Há governantes que se isolam em seus gabinetes e, até nas catástrofes, não dão as caras. A população, principalmente a vitimada por desastres naturais, sabe quem está a seu lado. O trabalho (estafante...?) de Brasília e dos rincões mais distantes do território não impede que um político saia de suas tocas. Esconderijos - Não dá mais para alguém se esconder. A corrupção, é claro, não acabará. Mas é preciso atentar para o fato de que as denúncias sobre negociatas e trocas de favores ilícitos constituem o prato predileto das redes sociais e das mídias. Alguém pode estar ingerindo um alimento indigesto e amanhã todo mundo ficará sabendo. A hora requer transparência. Discurso - O discurso que vinga deve ser composto por propostas concretas, viáveis, simples e de metas temporais. Sua adaptação ao momento é fundamental. A população dispõe de entidades que a representam em diversos foros, algumas delas com atuação política tão importante quanto a das casas representativas. Simplicidade e modéstia - O homem público não precisa se vestir com a roupa de Deus. A honraria que os cargos conferem é passageira. Mandatos pertencem aos eleitores. Ser simples não é deixar se fotografar com crianças no colo, ou comer cachorro quente na esquina e gesticular para os transeuntes. Simplicidade é pensar bem, dizer bem e agir com naturalidade. Sem artimanhas e maquiagens. O marketing da atualidade se inspira em verdade. Estado e Nação - A Nação é a pátria, que acolhe a população. É o território onde os cidadãos se sentem bem, gostam de viver e constituir um lar. O Estado é a entidade técnico-jurídico-institucional, composta por interesses e conflitos, recebendo as críticas de pessoas e grupos de diversas classes. Aproximar o Estado da Nação constitui a missão basilar da política, compromisso cívico inegociável. O Brasil de hoje e do amanhã vislumbra essa meta. Parte II Raspando o tacho - A afirmação de Lula de que, na próxima cúpula do G-20, Putin poderia vir ao Brasil, sem medo, pois não seria preso, é a quinta-essência do lema L'État c'est moi, de Louis XIV, da França. O Estado sou seu, tentou garantir dom Luiz, do Brasil. - Ainda bem que, alertado e surpreso com a repercussão negativa da afirmação, corrigiu a "loucura" dizendo que seria a Justiça a tomar qualquer decisão sobre a prisão de Vladimir Putin, caso venha a entrar em território brasileiro em 2024. - Eis o que disse Lula: Eu não sei se o tribunal, não sei se a Justiça brasileira vai prender. Isso quem decide é a Justiça, não é o governo [brasileiro], nem o Parlamento. É importante. Eu, inclusive, quero muito estudar essa questão desse Tribunal Penal [Internacional], porque os Estados Unidos não são signatários dele, a Rússia não é signatária dele também. Então, eu quero saber por que o Brasil é signatário de um tribunal que os EUA não aceitam. Por que somos inferiores e temos que aceitar uma coisa? - Só para lembrar. Lula nomeou, em 2003, a juíza Sylvia Steiner, para compor os quadros do TPI. Mais recentemente, petistas até tentaram pedir a condenação do ex-presidente Bolsonaro por aquele Tribunal. Dizer que não conhecia essa Corte até o momento, como frisou na cúpula do G20, é driblar a verdade. - Há um conjunto de 123 países que firmaram compromisso com o Tribunal Penal Internacional, com sede em Haia. Os signatários do Estatuto de Roma se comprometem a cumprir as disposições do Órgão. O Brasil, em 2002, ainda sob FHC, aprovou o TPI. Leiam: Decreto nº 4.388, de 25 de setembro de 2002. Promulga o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VIII, da Constituição, Considerando que o Congresso Nacional aprovou o texto do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, por meio do decreto legislativo no 112, de 6 de junho de 2002; Considerando que o mencionado Ato Internacional entrou em vigor internacional em 1o de julho de 2002, e passou a vigorar, para o Brasil, em 1º de setembro de 2002, nos termos de seu art. 126; Decreta: Art. 1º O Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, apenso por cópia ao presente Decreto, será executado e cumprido tão inteiramente como nele se contém. - O planeta está dando sinais de saturação. E responde às ações de degradação feitas pelos dominadores do poder com catástrofes e terríveis eventos. Inundações, ciclones, tempestades, terremotos ocorrem em diversos recantos. Como em Marrakech, no Marrocos, na Líbia, nos EUA, e em cidades do Rio Grande do Sul, Brasil. - O fenômeno El Nino, com o esquentamento das águas dos oceanos, ainda poderá provocar este ano muita devastação. Como o planeta aguentará o aumento de sua temperatura em 2,5% nas próximas décadas, já dando sinais de que as águas estão mais quentes? - Alckmin (com n) levou oito ministros em sua viagem, domingo último, ao Rio Grande do Sul. E arrumou R$ 741 milhões para ajudar cidades e populações. Pelo tamanho da tragédia parece pouco. Geraldo cumpre bem o seu dever. Pessoa que cultiva a simplicidade. - O G20 passou para a coordenação do Brasil. Por enquanto, simbolicamente. A presidência efetiva terá início em em 1º de dezembro de 2023 e se encerra em 30 de novembro de 2024. A agenda do G20 será decidida pelo governo do Brasil, com apoio direto da Índia, última ocupante da presidência, e da África do Sul, país que exercerá o mandato em 2025. - Lula faz bem em acentuar que o Mercosul, hoje sob a presidência do Brasil, não aceitará as restrições feitas pela União Europeia. Restrições que golpeariam os programas dos países que integram o bloco. - Alexandre de Moraes, o ministro mais midiático do STF, acalenta ódios e anima platéias, que acompanham as ocorrências junto ao Judiciário, que carece esforço para resgatar a boa imagem. Viu, ministro Barroso, nosso próximo presidente da Alta Corte! - Ex-deputado estadual e ex-prefeito do município, Carlos Grana lidera, hoje, a disputa para prefeito de Santo André, com 19,5% das intenções de voto. O 2º lugar é de Luiz Zacarias, vice do prefeito Paulo Serra, com 15,2%. Pesquisa do Paraná Pesquisas que a coluna acaba de receber. - O transplante cardíaco de Faustão despertou a sociedade. As doações de órgãos têm aumentado. - O super festival The Town, que levou uma multidão a Interlagos, em SP, teve muitos problemas de logística e apoio, escondidos da mídia. A partir das imensas filas para comprar alimentos. Haverá outro em 2025. Plano de Medina. Claro, se o imprevisível não der as caras. Batam na madeira três vezes... - Esperemos o discurso de Lula na abertura da Assembleia Geral da ONU nos próximos dias. Será ouvido com muita atenção. Luis Inácio tenta repor o Brasil na moldura das Nações a serem ouvidas. Mas comete frequentemente "luladas". Fecho a coluna com a era JK. O ciclo Kubitschek Figura carismática, Juscelino Kubitschek era jovial, alegre. Encarnava o Brasil moderno. Em 1959, o palhaço Carequinha popularizou uma batucada de Miguel Gustavo - Dá um jeito nele, Nonô ("Meu dinheiro não tem mais valor./Meu cruzeiro não vale nada./Já não dá nem pra cocada./Já não compra mais banana./Já não bebe mais café./Já não pode andar de bonde./Nem chupar picolé./Afinal, esse cruzeiro é dinheiro ou não é?"). O ministro da Fazenda era o mineiro José Maria Alkmim (com m). O clima ambiental era de descontração, como demonstra a historieta gráfica da revista Careta: "Juscelino: - Preciso de divisas, ouro, seu Alkmim, para as realizações do meu governo. O ministro: - Ouro, seu Juscelino?! Eu sou Alkmim, não sou alquimista". JK vestiu a camisa do desenvolvimento e seu slogan "50 anos em 5" foi um sucesso. Colou. Seu sorriso era a estampa de um país feliz. (História narrada pela historiadora Isabel Lustosa)
quarta-feira, 6 de setembro de 2023

Porandubas nº 820

Parte I Análise do regime presidencialista A coluna, nesta primeira parte, vai se debruçar sobre o nosso regime de governo. Como temos lido, cotidianamente, Lula conversa aqui, conversa ali, para remanejar o ministério e ceder mais alguns nacos ao Centrão. E recebe um, outro e mais outro que vão até ele fazer pressão e indicar candidatos para o STF, o STJ, o TST e para as Cortes Estaduais? Em suma, Luiz Inácio age como um monarca. Daí este escriba carimbar a natureza do regime como presidencialismo de cunho imperial. As origens A disposição monocrática de exercer o poder vem, no Brasil, desde 1824, quando a Constituição atribuiu a chefia do Executivo ao imperador. A adoção do presidencialismo, na Carta de 1891 - que absorveu princípios da Carta americana de 1787 -, só foi interrompida no interregno de 1961 a 1963, quando o país passou por ligeira experiência parlamentarista. Portanto, o presidencialismo está fincado no altar mais alto da cultura política. Benemérito O poder que dele emana impregna a figura do mandatário, elevado à condição de pai da Pátria, protetor, benemérito. Essa imagem ganhou tintas fortes no desenho de nossa cidadania. Presidencialismo de cunho imperial a caminho da autocracia. Para os mais refinados, o Brasil adota como sistema de governo o presidencialismo de coalizão. A premissa é: quanto mais extensa a aliança em torno do Executivo, maior a probabilidade de seu comandante, o presidente, administrar sismos nas frentes congressuais e garantir a governabilidade. O estilo europeu Siglas e blocos, portanto, detêm boa dose de mando na condução do país, mesmo que se reconheça a índole monárquica do presidencialismo brasileiro, que se revela avassaladora nos espaços do Legislativo. A relação de troca é a medida do equilíbrio entre os dois Poderes. O presidencialismo de coalizão alimenta-se da base política e esta come do seu pasto para engordar. É assim o jogo. Por isso mesmo, qualquer tentativa de atenuar a hegemonia presidencial por nossas bandas soa como loas à utopia. O presidencialismo mitigado, ou um parlamentarismo à moda europeia, francesa ou portuguesa, não parece combinar com os traços de nossa realidade política. Sua arquitetura é mais refinada. Seu escopo, mais plural. Presidente deveria bater o pênalti A semente presidencialista, como se sabe, viceja em todos os espaços, dos mais simples e modestos aos mais elevados. O termo presidente faz ecoar significados de grandeza, forma associação com a aura do Todo-Poderoso, com as vestes do monarca, com a caneta do homem que tem influência, poder de mandar e desmandar. Até no futebol o presidente é o mandachuva. O chiste é conhecido: como o ato mais importante da partida de futebol, o pênalti deveria ser cobrado pelo presidente. De presidente para presidente Em 1980, no final do campeonato brasileiro, o Flamengo ganhou por 3 a 2 do Atlético Mineiro, em polêmica partida disputada no Maracanã. O árbitro expulsou três jogadores do Atlético, a bagunça tomou o campo e agitou os nervos. No fim, transtornado com o "resultado roubado", Elias Kalil, presidente do Atlético, exclamou aos berros: "Vou apelar para o presidente da República, João Figueiredo! Vou falar pra ele de presidente para presidente!" O culto à figura do presidente e, por extensão, a outros atores com forte poder de mando faz parte da glorificação em torno do Poder Executivo. Tronco do patrimonialismo ibérico. Os ritos da Corte Herdamos da monarquia portuguesa os ritos da Corte: admiração, bajulação, respeito e mesuras, incluindo o beija-mão. O sociólogo francês Maurice Duverger defende a tese de que o gosto latino-americano pelo sistema presidencialista tem que ver com o aparato monárquico na região. O vasto e milenar Império Inca, com seus grandes caciques, e depois o poderio espanhol, com seus reis, vice-reis, conquistadores, aventureiros e corregedores, plasmaram a inclinação por regimes de caráter autocrático. O traçado de Marshall O presidencialismo por estas plagas agrega uma dose de autocracia. Já o parlamentarismo que vicejou na Europa teria inspirado na ideologia liberal da Revolução Francesa, cujo alvo era a derrubada do soberano. Isso explicaria a frieza europeia ante o modelo presidencialista. De acordo com o conhecido traçado do sociólogo Thomas Marshall, os ingleses construíram sua cidadania abrindo, primeiro, a porta das liberdades civis, depois, a dos direitos políticos e, por fim, a dos direitos sociais. Entre nós, os direitos sociais precederam os outros. A estadania A densa legislação social (benefícios trabalhistas e previdenciários) foi implantada por Getúlio Vargas entre 1930 e 1945, num ciclo de castração de direitos civis e políticos. Portanto, o civismo e o sentimento de participação ficaram adormecidos por muito tempo no colchão dos benefícios sociais. A imagem do Estado (e a do governante) imbricava-se ontem como se junta hoje. Sob essa configuração, imaginar que o parlamentarismo tenha chance por aqui é apostar que a fada madrinha decidiu deixar o reino da fantasia para nos visitar. Portanto, como já dizia José Murilo de Carvalho, vivemos sob uma estadania, uma cidadania abrigada na sombra do Estado. Temos um "imperador", que age como autocrata. O poder concentrado num único governante. Parte II Raspando o tacho - Esta semana devem aparecer mais dois ministérios cedidos ao Centrão, que, aliás, Lula diz que não existe. - A CPI do MST acaba como um cabo de guerra vencido por ninguém. - Antes de embarcar para a Índia, nesta quinta, para participar do G-20, Lula participará do desfile do 7 de setembro em Brasília engalanada. - O G-20 é o principal fórum de cooperação econômica internacional, reunindo as 20 maiores economias mundiais. Caberá ao Brasil coordenar o fórum de economia digital e receber o grupo no país em 2024. - O ministro José Múcio, da Defesa, tem feito das tripas coração para apaziguar ânimos e acalmar grupos descontentes nas Forças Armadas. - São Paulo, capital, verá um dos pleitos mais acirrados em 2024. A eleição municipal abrirá o palco mais polarizado do território nacional. - Cresce o número de artistas, influencers (e profissões assemelhadas) na arena das agressões e violência. - O ministro Flávio Dino pode ser descartado logo, logo, com eventual nomeação para compor o STF. Assim, teríamos um postulante a menos no pleito de 2026. - Bolsa Família aumentado será o grande eleitor no pleito municipal. Vai avolumar o governismo. - Para tanto, Executivo precisará de aval para destravar R$ 318 bilhões. Presidencialismo imperial conseguirá. - Curiosidade: Jorge Paulo Lemann já não é o mais rico brasileiro no ranking da revista Forbes. É Eduardo Saverin, com fortuna de US$ 17,6 bilhões, superando Lemann e Vicky Safra. - Ele é o cofundador do Facebook. Saverin também entrou para o clube dos 100 mais ricos do mundo, aparecendo na 91ª posição no ranking geral da revista. - Mudança à vista: inelegibilidade dos políticos deve se contar a partir da condenação e não após a pena cumprida. Medida está parada no Senado. - Xi Jinping não irá ao G-20 em Nova Délhi. Motivo? Acirramento de tensões entre China e Índia. - Clima maluco: temperatura variando 12 a 15 graus por dia. Enchentes de um lado, chuvas de outro. El Niño dando as cartas. - Semana passada, sexta, Lula foi até os confins do Polígono das Secas, no sopé da serra de minha querida cidade natal: Luis Gomes, na fronteira com Paraíba e Ceará. Foi ver a obra do viaduto que subirá que furará a montanha para levar água a 57 municípios da região. A propósito, o hoje senador Rogério Marinho, então ministro de Bolsonaro, esteve no mesmo lugar para ver a mesma coisa. - Felicito o povo de minha terra por mais um compromisso dos governantes para o município, mas não posso deixar passar a dica: o Brasil é um eterno retorno. Vemos hoje as coisas de ontem e, com certeza, as veremos também amanhã.
quarta-feira, 30 de agosto de 2023

Porandubas nº 819

Abro com um "causo" da Justiça. Esselentíssimo juiz Ao transitar pelos corredores do fórum, o advogado, que também era professor, foi chamado por um dos juízes: - Olha só que erro ortográfico grosseiro temos nesta petição. Que coisa vergonhosa! Estampado logo na primeira linha do petitório lia-se: "Esselentíssimo juiz". Gargalhando, o magistrado perguntou ao advogado: - Por acaso, professor, esse advogado foi seu aluno na faculdade? - Foi sim - reconheceu o mestre. Mas onde está o erro ortográfico a que o senhor se refere? O juiz pareceu surpreso: - Ora, meu caro, acaso você não sabe como se escreve a palavra Excelentíssimo? Então explicou o professor: - Doutor juiz, acredito que a expressão pode significar duas coisas diferentes. Se o colega desejava se referir à excelência dos seus serviços, o erro ortográfico efetivamente é grosseiro. Entretanto, se fazia alusão à morosidade da prestação jurisdicional, o equívoco reside apenas na junção inapropriada de duas palavras. O certo então seria dizer: "Esse lentíssimo juiz". ... Silêncio geral! Depois desse episódio, aquele magistrado nunca mais aceitou o tratamento de "Excelentíssimo juiz", sem antes perguntar: - Devo receber a expressão como extremo de excelência ou como superlativo de lento? __________ Nas Porandubas de hoje, tento mergulhar nas águas do ethos nacional. Compreender o que é e como o brasileiro abre trilhas para o entendimento dos nossos costumes e o modus operandi da política. Parte I - O ethos nacional Errado no lugar do certo Quem escreve errado por linhas corretas? O brasileiro. Para ser mais justo, os políticos. Mais certo, os governantes, que não cumprem promessas de campanhas, que administram como donos de feudos, que geralmente governam no estilo dos três macaquinhos: não vi, não ouvi, não falei. E assim, corroboram a expressão: o dito pelo não dito. O tanto faz como tanto fez. O Brasil é o território por excelência para abrigar a desorganização dos Trópicos. Uma historinha Costumo ilustrar a cultura do país com uma historinha. Há quatro tipos de sociedade no mundo. A primeira é a inglesa, a mais civilizada, onde tudo é permitido, salvo o que é proibido. A segunda é a alemã, sob rígidos controles, onde tudo é proibido, salvo o que é permitido. A terceira é a totalitária, pertinente às ditaduras, na qual tudo é proibido, mesmo o que é permitido. E, coroando a tipologia, o quarto tipo, a sociedade brasileira, onde tudo é permitido, mesmo o que é proibido. Heterogeneidade Como explicar o fato de o Brasil ser um país tão usado como caricatura da esquisitice? Fazendo uma leitura sobre o ethos nacional. A engenharia social brasileira, assentada sobre a miscigenação de raças (colonizadores portugueses, índios e negros), expressa uma heterogênea coleção de valores. Temos, porém, uma unidade étnica básica, apesar da confluência de tão variadas matizes formadoras, que poderiam, na visão de Darcy Ribeiro, resultar numa sociedade multiétnica, "dilacerada pela oposição de componentes diferenciados e imiscíveis". Um povo-nação Nosso saudoso antropólogo e ex-senador, em seu livro O Povo Brasileiro, arremata: "Mais que uma simples etnia, porém, o Brasil é uma etnia nacional, um povo-nação, assentado num território próprio e enquadrado dentro de um mesmo Estado para nele viver seu destino. Ao contrário da Espanha, na Europa, ou da Guatemala, na América, por exemplo, que são sociedades multiétnicas regidas por Estados unitários". Trabalhador? Desconfiado? A adjetivação para qualificar o homo brasiliensis é vasta e, frequentemente, dicotômica: cordial, alegre, trabalhador, preguiçoso, verdadeiro, desconfiado, improvisado. Afonso Celso, em Porque me Ufano do meu País, divide as características psicológicas do brasileiro entre positivas e negativas, dentre elas a independência, a hospitalidade, a afeição à paz, caridade, acessibilidade, tolerância, falta de iniciativa, falta de decisão, falta de firmeza, pouco diligente. Antagonismos equilibrados? Gilberto Freyre, em Casa Grande & Senzala, pontifica: "Considerada de modo geral, a formação brasileira tem sido, na verdade, um processo de equilíbrio de antagonismos. Antagonismos de economia e de cultura. A cultura europeia e a indígena. A europeia e a africana. A africana e a indígena. A economia agrária e a pastoril. A agrária e a mineira. O católico e o herege. O jesuíta e o fazendeiro. O bandeirante e o senhor de engenho. O paulista e o emboaba. O pernambucano e o mascate. O grande proprietário e o pária. O bacharel e o analfabeto. Mas predominando sobre todos os antagonismos, o mais geral e o mais profundo: o senhor e o escravo". O primeiro mito Sérgio Buarque de Holanda, no clássico Visão do Paraíso, desenha a paisagem que baliza a índole nacional, com o pincel dos três mitos que construíram a moldura do nosso tecido valorativo. Primeiro, o mito do Éden. Ao aportarem, os nossos colonizadores se depararam com a exuberância da natureza e seus habitantes, rudes e inocentes, índios sem vestes, uma paisagem deslumbrante, o jardim do paraíso. A descoberta do país proporcionou ao europeu: "o enlevo ante a vegetação sempre muito verde, o colorido, a variedade e estranheza da fauna, a bondade dos ares, a simplicidade e inocências das gentes", como, aliás, já escrevera Pero Vaz de Caminha. Sob essa primeira visão, a seara valorativa produziu seus primeiros frutos: o ócio, a indolência, a sensualidade, a voluptuosidade, a glutonaria, a improvisação, a festa, a dança, o eterno carnaval. O segundo mito O segundo mito: o Eldorado. As riquezas apareciam ao longo das descobertas do ouro e das pedras preciosas. Na esteira da exploração predatória, outro conjunto de valores tomou corpo: a cobiça, a ganância, a traição, a destruição da natureza, a ambição, a disputa, a guerra entre grupos, os conflitos. O terceiro mito O inferno verde é o terceiro mito. A cobiça levou os colonizadores ao interior profundo. A floresta despontava como ambiente inóspito, selvagem, agressivo. As doenças debilitaram corpos, fustigando as mentes. Claude Lévi-Strauss, em seu celebrado Tristes Trópicos, radiografava o Brasil como o lugar mais inabitável do planeta, onde seria impossível a um homem sobreviver. Na paisagem da conquista do interior do país, outro feixe de características aparece: a miséria, a desorganização, a improvisação, a sujeira, a marginalidade, o desleixo. Outros ingredientes O sentido da importância individual: "Você sabe com quem está falando?" O gosto pela imprecisão, para a ausência de objetividade: "Quantas horas você trabalha por semana?" "Trabalho mais ou menos 40 horas". Petrolândia nunca teve petróleo. Nos termos de Jorge Amado, a Bahia de Todos os Santos é a Bahia de Todos os pecados. O senhor é católico? "Sou, mas não frequento a igreja". O mais ou menos é coisa muito nossa. O fingimento: o político, ao cumprimentar o interlocutor, pisca para alguém que está ao lado. O sentido de grandeza O catastrofismo comum na interlocução diária: os maiores potenciais, as maiores riquezas ou a mais degradante miséria. A propensão para a protelação do fazer: vou deixar para amanhã. A semente da anarquia. Buarque de Holanda em Raízes do Brasil: "os elementos anárquicos sempre frutificaram aqui facilmente, com a cumplicidade ou a indolência displicente das instituições e costumes. As iniciativas, mesmo quando construtivas, foram continuamente no sentido de separar os homens, não de os unir". Vulcão emotivo O apadrinhamento, o patrocínio dos favores, o ludismo. Somos o país do futebol. E um vulcão de explosões emotivas. Trocamos com facilidade o choro pelo riso, a festa pela briga. A recorrência aos eixos valorativos e a descrição de seus efeitos sobre o caráter da política se fazem presentes nas abordagens que expresso em minhas análises. Desde a Independência, conservamos o feito para compor arranjos partidários, múltiplas colorações, sistemas de governos, alguns de talhe autoritário e outros traumáticos, farta produção de cartas constitucionais e o desenvolvimento dos corpos jurídicos que plasmam a arquitetura do Estado. Parte II Raspando o tacho - A escolha da advogada Daniela Teixeira para o STJ sinaliza a indicação de um homem para o STF. Minha leitura. Daniela, componente da lista tríplice de advogados encaminhada ao presidente, é preparada, tem visão progressista e é muito bem relacionada nos universos jurídico e político. Um tento de Lula. - Dizem que a primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja, faz pressão para Lula indicar uma mulher ao Supremo. Dizem também que a disputa está hoje entre dois homens: o ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, e o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas. Lula quer nomear uma pessoa com a qual tenha interlocução. - Do modo como se apresenta a reforma tributária, o setor de serviços vai pagar o pato, a conta, algo que beira 96% de impostos e tributos. O setor de serviços é o que detém a maior fatia do PIB, 70%, e o maior empregador, 60% dos empregos. A indústria, como sempre, trabalha com o lobby mais poderoso. E aí, meu amigo Hauly? - Lula cria Ministério da Pequena e Média empresa e do Empreendedorismo. Para acolher o Centrão. Mais um espaço burocrático. Quase 40 ministérios. 15 a 20 já seria uma boa régua. - A taxação dos super-ricos, investidores de fundos fechados, passará pelo crivo parlamentar? Tenho dúvidas. - Déficit zero no Orçamento de 2024? Duvido. - A violência no país chega ao cume da montanha. Chacinas e mortes em tiroteio na festa da bala. - Deputado Rubens Pereira Junior, do PT do Maranhão, quer mexer em tópicos da legislação eleitoral, a saber: 1) federações partidárias, prestação de contas,) propaganda eleitoral, regras do sistema eleitoral, registro de candidatura, financiamento de campanhas, inelegibilidade e violência política contra a mulher. - Bolsonaro faz queixa-crime, recurso contra o hacker Walter Delgatti Neto, conhecido por invadir o Telegram de membros da operação Lava Jato, por suposta prática do crime de calúnia. Fecho a coluna com o meu RN. "Só quero os ócro" O oftalmologista Manoel Teixeira de Araújo recebeu a mulher em seu consultório, em São João do Sabugi, para um exame de vista. Convidou a paciente para ler a tabuleta, para a qual apontava: "Por favor, a senhora pode ler estas letras"? Em sua sertaneja ingenuidade, a mulher respondeu com calma e muita convicção: "Doutor, ler mesmo eu não sei não, mas essa menina que tá aqui pode fazer isso por mim. O que eu quero mermo é os ócro. Só os ócro". Divertida historinha narrada por Valério Mesquita, da Academia Norte-riograndense de Letras, historiador e nosso pesquisador de "causos".
quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Porandubas nº 818

Abro com o pai do Ariano. Quanta terra...! João Suassuna, velho coronel e líder político do Estado da Paraíba, pai do escritor Ariano Suassuna, ao punir um trabalhador de seu latifúndio, mandou dar um purgante de óleo de rícino e chamou dois jagunços aos quais deu essa ordem, no relato de Sebastião Nery: - Levem esse cabra até a fronteira da fazenda. Vão os três a pé. E o purgante não pode fazer efeito em minhas terras. Se fizer, podem sumir com ele. O homem saiu na frente dos dois capangas, andou, andou, apertou o passo, escureceu, e nada de chegar o fim da fazenda. O remédio começava a torturar e o homem suando frio e andando ligeiro. De repente, não aguentou mais, gemeu: - Êta coronel pra ter terra! Parte I Os heróis, onde estão? A figura do herói Em o Estado Espetáculo, Roger-Gérard Schwartzenberg pontua: o grande papel com que sonham os monstros sagrados da política é o de grande homem. O de herói, o semideus da mitologia, o homem excepcional, o homem das façanhas, do entusiasmo e da glória, o salvador, o messias, o chefe genial, o profeta de sua gente. Os clássicos Xenofonte desenhava o esboço do herói. Aquele que impunha respeito, um ser superior. Aristóteles via no herói o gênio. Maquiavel também admitia o homem excepcional que se impõe sem contestação, um "deus entre os homens". Rousseau via no herói o homem "extraordinário", o legislador que produz leis, o fundador do Estado. Max Weber distingue três tipos de autoridade; a tradicional, fundamentada nos costumes; é a do senhor feudal, o monarca hereditário e a legal-racional, ancorada nas instituições. A ele se emprestando obediência em função do papel conferido pela Constituição. E, por último, a carismática, aquela que porta um dom particular conferido pela graça divina. Nietzsche O filósofo dizia: "o super-homem destrói os ídolos, orna-se com seus atributos; a apoteose da aventura humana é a glorificação do homem-Deus". A propaganda nazista/fascista criava uma nova religião: o culto do Estado e de seu chefe. Os heróis? Quem? Quem teriam sido heróis? César, Jesus Cristo, Luiz XIV, Hitler, Mussolini, Tito, João XXIII, o papa, De Gaulle, Roosevelt, Kennedy, Churchill, Stalin, enfim, que perfis podem ser inseridos na seara do heroísmo? Os seres que ilustraram a história com seus atos e sua política ou aqueles reverenciados sem as trambicagens do autoritarismo, o poder de mando pela força? Cada país tem seus heróis, seres venerados e cultuados por seu povo. Trata-se de tarefa inglória defender ou limitar os espaços de domínio dos heróis. Assassinos? Afinal, é possível considerar herói quem foi responsável pelo assassinato de milhões ou milhares de pessoas? Seria cabível considerar Hitler um herói? Só mesmo na imaginação de seus adeptos. Da mesma forma que Stalin e todos os outros, do passado ou da contemporaneidade, cujo âmbito de ação abrigaria a responsabilidade pela "matança" ou desaparecimento de seres humanos ou mesmo destruição da natureza. Por isso, é complexa a tarefa de classificar heróis e heroísmo. E por aqui? Quem são os nossos heróis? O descobridor Pedro Álvares Cabral? Uh, longe de ganhar essa láurea... Pedro I, o Imperador, ganharia no voto popular. Tiradentes já entraria melhor na galeria. Os ídolos populares de nossa história integrariam também a fileira de retratos na parede. Alguns dele ainda estão presentes no memorial de nossa gente: Getúlio Vargas, Kubitschek, Jânio, Garrincha, Pelé, Airton Sena. Fiquemos assim... Viram como é difícil classificar o tipo heroico? Na área política, este escriba tem restrições para considerar heróis aqueles que, reconhecidamente, provocaram e/ou provocam atos contra o povo, assassinatos ou desaparecimento de indivíduos, e que cometeram/cometem injustiças. Por isso, a luz que ilumina essa trilha é a da Justiça, a virtude de dar a cada qual o que lhe merece por direito, fazendo o bem, partilhando suas glórias com a coletividade. Por isso, é mais fácil (ou cômodo) ficar no terreno esportivo, onde os aplausos e o reconhecimento aos feitos dos protagonistas são mais intensos. Quem tem dúvidas de que Garrincha, Pelé, Guga, o tenista, e Airton Sena, o campeão de automobilismo, se enquadram nessa categoria? O povo procura um herói O Brasil está à procura de um herói. Mas o herói procurado não é aquele capaz de operar milagres, um São Jorge de espadas determinado a matar os dragões da maldade. O povo passou a rejeitar perfis milagreiros, divinos. O herói procurado deve ter face humana, uma feição plasmada pelos valores da honestidade, ética, autoridade, respeito, determinação, coragem, despojamento, simplicidade. Há alguém com esse perfil? Quem se arrisca a apontar algum? A nossa galeria de heróis é uma parede vazia. A seleção de futebol já não encanta. Os esportes, por sua vez, são enrolados com o manto do marketing. P.S. Atenção, muita atenção. O populista não é necessariamente um herói. Neymar? Jamais Veja-se Neymar, o contundido, com seu quase um bilhão das Arábias. Puro marketing. As disputas são movidas pela força do metal. E o glamour se esvai dos palcos e estádios, sufocando nossas emoções. O mundo se materializa. Os homens são cada vez mais tratados como coisas. Aqueles que merecem aplausos unânimes estão enterrados no cantinho da saudade. Da política, sobram poucos. Tancredo nem teve tempo de dar fulgor à imagem. Recebeu o pranto nacional, com as esperanças perdidas. Juscelino Kubitschek foi um símbolo de progresso. Quem mais? Só mesmo os vultos de nossa história mais antiga. A dissonância nacional O desfile nas telas de TV é uma ampla exibição da dissonância nacional. Passam pelos nossos olhos figuras esquisitas e discursos tortos. Alguns querendo aparecer como heróis. A demagogia campeia nas promessas mirabolantes, na recitação artificial de qualidades inventadas, na exposição de cenários e propostas irreais, nas mentiras proferidas nas CPIs. A política no Brasil está se transformando em um grande comércio, onde atores procuram se revezar no balcão das trocas. Será que a maior parte dos 5.568 prefeitos estarão se recandidatando? Para ficar mais pobres ou mais ricos? Ache seu herói Leitor, procure achar seu herói. Não precisa distinguir nele a aura dos santos. Basta olhar para os perfis, avaliar o seu passado, examinar o que faz ou o que promete, compará-lo com outros. Tenha cuidado para não comprar gato por lebre. Há muito canalha desejando parecer santo. Parte II Raspando o lixo.... - Na Conferência dos BRICS, há uns 20 países que tentam entrar no Grupo. Seria uma desconfiguração do atual modelo. Lula quer incluir os latino-americanos. - Dilma, com seu supersalário, presidente do Banco dos BRICS, posa de toda poderosa. - Já estão culpando o competente Marcos Troyjo, ex-presidente do Banco, por faltar dinheiro nos cofres. - Osires Silva, meu candidato à "guerreiro da educação" no troféu CIEE. O setor aeronáutico brasileiro deve muito a ele. - A cúpula das Forças Armadas está preocupada com a queda da boa imagem do setor. E mais ainda com o desenrolar da CPMI do 8 de janeiro. O que acontecerá com o tenente-coronel Mauro Cid e com o pai dele, o respeitado general Lorena Cid? - A campanha para a prefeitada, em 2024, será a mais endinheirada dos últimos tempos. O primeiro turno da eleição ocorrerá no primeiro domingo de outubro, dia 6. - Os municípios com mais de 200 mil eleitores terão, caso necessário, segundo turno, no último domingo de outubro, para o cargo de prefeito, caso nenhuma das candidatas ou candidatos ao cargo obtenha metade mais um dos votos válidos no primeiro turno. - Os partidos do centro lutarão para fazer a maior "baciada" de prefeito. - O ministro José Múcio, da Defesa, expõe seus dotes como cantor/compositor de músicas românticas. Com um disco na praça. - Parte considerável do planeta padece do maior calor da história. Anúncio da terra devastada. - Se Milei ganhar a eleição, na Argentina, os nossos trópicos viverão tempos mais tensos e perigosos. - A Fiesp promove importantes debates sobre o país, com palestras dos presidentes do Senado e Câmara, Rodrigo Pacheco de Arthur Lira, do diretor de política monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo e do ex-deputado Fábio Feldmann, que sob o comando do ex-presidente da República, Michel Temer, discorreu sobre Meio Ambiente. Programação intensa. O maior foro de debates, depois do Congresso Nacional. Parabéns ao presidente Josué Gomes da Silva. - A campanha paulistana para prefeito será ideologizada: esquerda versus direita. A conferir. - Quando a vida de um depende da morte de outro: é o que me vem à mente com essa triste notícia do transplante de coração para Faustão. E para milhares de outros que estão na fila de espera do SUS. Fila da morte. - A vida é como um pequeno fio que se esgarça na camisa quando apertamos o botão. - Tristeza pela morte da mãe Bernadete, líder quilombola. A lei do fuzil. Fecho com mais uma historinha da Paraíba. Brejo das Freiras é uma Estância Termal nos confins da Paraíba, perto de Uiraúna e Souza. Trata-se de um lugar para relaxamento e repouso. O Governo da Paraíba tinha (não sei se ainda tem) um hotel, com uma infraestrutura para banhos nas águas quentes. Década de 70. Apolônio, o garçom, velho conhecido dos fregueses da região, recebe, um dia, um hóspede de outras plagas. Pessoa desconhecida. Lá pelas tantas, quase terminando a refeição, o senhor levanta a mão, chama Apolônio e pede: - Meu caro, quero H2O. Susto e surpresa. Anos e anos de serviços ali no restaurante e ninguém, até aquele momento, havia pedido aquilo. Que diabo seria H2O? Apolônio, solícito: - Pois não, um instante! Aflito, correu na direção da única pessoa que, no hotel, poderia adivinhar o pedido do hóspede. Tratava-se de Luiz Edilson Estrela, apelidado de Boréu (por causa dos olhos grandes de caboré), empedernido boêmio, acostumado aos salamaleques da vida. - Boréu, tem um senhor ali pedindo H2O. O que é isso? Desconfiado, pego sem jeito, Boréu coça o queixo, olha pro alto, tenta se lembrar de algo parecido com a fonética e, desanimado, avisa: - Apolônio, sei não. Consulte o Freitas. Freitas era o diretor do Grupo Escolar, o intelectual da região. Localizado, o professor tirou a dúvida no ato: - H2O é água, seus imbecis. Quer dizer água. Apressado, Apolônio socorreu o freguês com uma jarra do líquido. Depois, no corredor, glosando o feito, gritou em direção a Boréu: - Ah, ah, ah, esse sujeito achava que nós não sabia ingrês. Lascou-se!
quarta-feira, 16 de agosto de 2023

Porandubas nº 817

Parte I Abro com Goiás. Não mudou nada Miguel Rodrigues, velho e sábio político de Goiás, foi visitar uma escola primária. Ali, a professora ensinava os primeiros dias de Brasil: - No começo do Brasil colônia, como a América e o Brasil ficavam muito longe, para cá vieram, primeiro, muitos ladrões, degredados, condenados. O coronel Miguel suspirou: - Então não mudou nada. Modos de governar - Chimpanzé, Maquiavel e Gandhi A democracia é um jogo de cooperação e oposição. No tabuleiro de cooperação, as regras são a persuasão, a negociação, os acordos, a busca de espaços de consenso. No campo de oposição, o método é o de medir forças, confrontar o adversário, provocar tensões, desgastar, impor a vontade pela força. Esse jogo implica em escolher as formas de governar que expressem o estilo do governante. Carlos Matus, cientista social chileno, aponta três estilos: o modo chimpanzé, o modelo Maquiavel e a forma Gandhi. O modo chimpanzé Esse modelo se ancora no projeto de poder pessoal, na rivalidade, na hierarquização de forças. Quem entra como uma luva na mão no modo chimpanzé é Arthur Lira e seus comandados, que lutam por espaços de poder e influência, com o chefe olhando para seu projeto de poder pessoal, usando seu corpo de aliados para garantir "o poder pelo poder". Usam a arma de manobra da agenda legislativa e o voto em plenário. O objetivo é ampliar terrenos e aumentar o número de "feudos" sob seu mando. Para tanto, adotam a tática de disparar processos de tensão, ameaçar o governo com retiradas de apoio, buscar novas coalizões de um lado e de outro. "O fim sou eu mesmo". A representação popular é algo menor. O ideal da vida é conservar o próprio representante. O modo Maquiavel Ancora-se no personalismo do Príncipe, coluna vertebral do modelo, que procura desfraldar a bandeira do projeto de Estado. Ele, o Príncipe não é o projeto, o projeto é o Brasil. Quem se encaixa no modelo? Luiz Inácio Lula da Silva. É o que mostra, por exemplo, o novo PAC, ambicioso empreendimento em praticamente todas as áreas do governo, com um orçamento de R$ 1,7 trilhão. O objetivo, que se infere, é a reeleição em 2026. Tudo deve ser sacrificado pelo projeto, a partir da distribuição de recursos por partidos e representantes. Para atender à competição feroz da classe política, a conduta maquiavélica faz concessões ao estilo chimpanzé, e este acaba ganhando o jogo. Não há como escapar à sensação de que o país desce o despenhadeiro. A imagem pode ser forte. Mas é o que se vê, quando se constata a imensa dificuldade de se cumprir os compromissos da âncora fiscal. Gastar menos do que o país pode suportar. O modo Gandhi No Brasil, as manobras divisionistas vencem as táticas de cooperação e é por isso que o país anda devagar. As reformas caminham a passos lentos. Se em cima e no meio, elites e políticos fazem a confrontação, em outras margens da sociedade reina um clima de concórdia e solidariedade. Os pobres não têm munição para fazer guerra. No meio de humildes e marginalizados, reparte-se o pão, cultiva-se a amizade, busca-se a cooperação, o adversário é respeitado e a honestidade é um valor coerente entre a palavra e a ação. A política obedece ao estilo Gandhi, onde o líder representa o consenso, a austeridade e a modéstia. Ele não carece de força física, porquanto repousa seu poder na espiritualidade. Trata-se de um estágio superior de cultura, mas não é necessário alguém se transformar em Papa ou Madre Tereza de Calcutá para alcançar tal grandeza. Esse é o estilo que o Brasil precisa incorporar à modelagem governativa. Quem se enquadra nessa moldura? Há alguém no horizonte? P.S. Nunca precisamos tanto como agora do diálogo, da elevação dos espíritos, da negociação, da convivência, de um pacto por causas coletivas. Transformar a cultura egocêntrica da política numa cultura socio-cêntrica, inspirada na motivação pelos ideais da sociedade. A maldição de Sísifo A vida é um eterno recomeço. Recordemos o castigo de Sísifo. De vida solerte e pecaminosa, conseguiu livrar-se da morte por duas vezes, sempre blefando. Rei de Corinto, não cumpria a palavra empenhada, até que Tânatos veio buscá-lo em definitivo para jogá-lo no Hades. Como castigo, os deuses o condenaram impiedosamente a rolar montanha acima com um grande bloco de pedra sobre os ombros. Quase chegando ao cume, o bloco desaba montanha abaixo. A maldição de Sísifo: recomeçar tudo de novo, tarefa que há de durar eternamente. O povo brasileiro se sente no estado de um eterno recomeço. Quando acha que as coisas estão se normalizando, o desastre aparece. Os horizontes estampam: pequenas e grandes catástrofes, escândalos, corrupção desbragada, favorecimentos, ausência de critérios racionais, mandonismo, novos impostos, politicagem, feudos, deterioração dos serviços públicos, falta de continuidade nas administrações. Parte II Raspando o tacho - Se o fluxo de novas descobertas continuar desvendando o affaire das joias oferecidas ao ex-presidente Jair Bolsonaro em viagens internacionais, que teria tentado passá-las para seu patrimônio pessoal, desenha-se uma prisão. - O ministro Alexandre de Moraes, com quem está o imbróglio, no STF, deve estar sob intensas dúvidas. Tomar uma decisão sobre o caso: remeter a questão para a 1ª instância? Ordenar uma prisão? - O advogado e jurista Miguel Reale Jr. garante que tem fundamento uma prisão preventiva. - Jair coloca suas contas à disposição da Justiça. Comenta-se que só usa dinheiro vivo para pagar contas. - O jurista e desembargador Walter Maierovitch identifica os crimes de peculato, lavagem de dinheiro e outros no caso, mas é cauteloso quanto a uma prisão no momento. Sugere seguir a trilha da legalidade. Em sua contabilidade, os crimes cometidos já somam uma pena de uns 10 anos. - Bolsonaro não tem mais foro privilegiado. O caso pode seguir para a 1ª instância. - O fato é que aliados se afastam ante um silêncio que fecha a boca de protagonistas. - Há ilícitos de todos os lados. Sujeira. Procurador alerta Aras, o PGR, sobre 'ilegalidades' em desconto de R$ 6,8 bilhões em favor da J&F. - Se ocorrer prisão, é de se prever manifestação de rua. O Brasil continua dividido. Há certa preocupação com o 7 de setembro. - Grandes empresas têm avançado na montagem de sistemas de proteção de dados. - A polícia da Bahia matou 1.464 pessoas em intervenções em 2022. Nos Estados Unidos, as forças de segurança mataram 1.201 pessoas. A Bahia ganha o título de território de maior letalidade, comparada a de um país de 330 milhões. Tem apenas 15 milhões. Santo Antônio de Jesus é o município mais perigoso, com 116,9 mortes a cada 100 mil habitantes. A taxa média brasileira é de 24,9. Proteja Santo Antônio, Jesus. - Essa é surpreendente: o ser humano pode chegar a viver 20 mil anos. É o que garante o especialista em biogerontologia molecular, professor português João Pedro de Magalhães, da Universidade de Birmingham, na Inglaterra. Publicou um estudo no site Scientific American. - O governador de Roraima, Antônio Denarium, foi cassado pelo TRE. Teria distribuído cestas básicas na campanha. Apelou para o TSE. Defende-se no cargo. - E se Javier Milei, candidato da extrema-direita, ganhar a eleição presidencial na Argentina? Como será a convivência com Lula, hein? Defensor do fim do Banco Central e de propostas libertárias na economia, o candidato não depende de apoio militar. Como Bolsonaro, é a favor do povo armado. Considera-se um "anarcocapitalista". - Ronaldo Caiado se prepara para o embate de 2026. A acompanhar. - Outra variante do Covid-19: Eris. Trata-se de subvariante da ômicron, predominante nos EUA, com crescimento no Reino Unido. Não causa doença grave nem representa maior risco à saúde pública, garantem autoridades no tema. - Fernando Haddad, o poderoso ministro da Economia, dá o aviso: "a Câmara está com um poder muito grande e não pode humilhar o Senado e o Executivo". - Atenção com gorduras e carboidratos. Mais um alerta da OMS, destacando a importância de levar em conta tanto a quantidade quanto a qualidade do que é consumido. "Não há novidades nas orientações sobre o consumo de gorduras, mas, em relação aos carboidratos, a nova orientação destaca a importância da inclusão de carboidratos de boa qualidade para uma boa saúde", avalia a nutricionista Serena del Favero, do Hospital Israelita Albert Einstein. - Esse novo PAC é o guarda-chuva que Lula reconstruiu para abrigar seu governo de chuvas e trovoadas. Vai ser difícil. Controlar as obras e conferir as "inacabadas" é tarefa para um Hércules sem dores no quadril. Fecho com o Paraná. De paranaenses Jorge Takachi, japonês simpático e generoso, querido em toda a cidade, saiu candidato a prefeito de Nova Esperança/PR. A oposição começou a falar mal dele. Jorge Takachi não aguentou. Foi fazer comício: - Jorge Takachi bom para a cidade, constrói hospital, dá dinheiro para a igreja, ajuda os pobres, paga feira dos outros, povo diz: Jorge Takachi muito bom. Jorge Takachi candidato a prefeito, povo diz: Jorge Takachi filho da puta. Num é, né? Assim, Jorge Takachi não entende povo. Risadas. E comentários gerais: "Takachi não entende mesmo".
quarta-feira, 9 de agosto de 2023

Porandubas nº 816

Abro com JK nos velhos tempos ditatoriais. JK? Anos de chumbo grosso. Tempos magros, época de fechadura braba. Falar em Juscelino era, no mínimo, pecado mortal. Mudança das placas dos carros, as chamadas alfanuméricas. A Câmara Municipal de Diamantina oficia ao CONTRAN solicitando as letras JK para as placas dos carros do município, "como uma forma de homenagear o grande estadista John Kennedy". O CONTRAN não atende. Um conterrâneo de Juscelino desabafa: - Esse pessoal do Conselho deve ser republicano, eleitor do Nixon. (Historinha de Zé Abelha) Parte - I As democracias correm perigo? Sim. A resposta é afirmativa. As democracias correm o risco de estiolamento ante a emergência de um conjunto de ameaças que partem de lideranças, situações e ondas que aparecem em todos os quadrantes do planeta. Mesmo as democracias consolidadas, como a norte-americana, não estão imunes aos fenômenos corrosivos. O livro Nesse sentido, os pensadores Steven Levistky e Daniel Ziblatt escreveram o livro "Como as democracias morrem". Descrevem uma paisagem de corrosão, com destaque para o caso dos EUA, onde, nos anos recentes, assistimos a uma tentativa de golpear o sistema. O autor da mal-sucedida operação foi Donald Trump. Morte ou enfraquecimento? É mais viável acreditar e constatar o enfraquecimento dos sistemas democráticos, não na sua morte, cujos efeitos seriam desaparecimento, extinção, ausência. Daí acharmos conveniente falar em perda de vigor, entorpecimento, queda de alguns dos eixos democráticos. Quantas democracias? Deve haver, segundo critérios de institutos que se dedicam à análise do tema, cerca de 100 democracias no mundo. O Polity Project - projeto que classifica o regime político dos países ao longo do tempo - havia nos meados dos anos 80, 42 democracias, abrigando 20% da população mundial. Em 2015, esse número subiu para 103, com 56% da população mundial. Atente-se para a existência de 195 países no mundo. Com uma população de 8,05 bilhões. Fatores Segundo Levitsky e Ziblatt, há fatores que estão por trás da fragilização das democracias. Um deles trata das regras de escolha dos candidatos a presidente, que propiciam condições para a escolha de um outsider como Trump. Outro é a tolerância mútua, o reconhecimento de que os rivais têm o mesmo direito de competir pelo poder e governar. E há ainda o compromisso com as instituições, significando evitar ações que, mesmo respeitando a lei, violam claramente seu espírito. Em suma, uma democracia necessitaria de líderes que conheçam e respeitem as regras informais. O autoritarismo O fato é que, mesmo nos EUA, as instituições podem dar vazão ao autoritarismo. É quando "reescrevem regras eleitorais, redesenham distritos eleitorais e até mesmo rescindem direitos eleitorais para garantir que não perderão", de acordo com Levistky. Qualquer semelhança com o Brasil não é mera coincidência. Por aqui, temos observado um forte ímpeto autoritário, a par de intensa interpenetração de deveres e funções entre as instituições do Estado. (Tirem suas conclusões) Tempos imemoriais O autoritarismo se instala com a ascensão de um poder central e supressão das liberdades individuais e coletivas. Muita repressão. Perseguição. Censura. Caímos nas ditaduras. Há um líder supremo. A ordem deve emanar de uma pessoa. Trata-se de um sistema secular. O apoio popular A viabilidade de líderes que se inserem no território autoritário ocorre quando as massas, insatisfeitas com o status quo, manifestam de modo explícito ou subjacente razoável grau de apoio aos protagonistas que encarnam "virada de mesa" ou mudança da ordem governativa. Quando as massas acorrem às ruas, o sucesso dos "autoritários" sob a capa populista é mais viável. Dessa forma, vemos os "mudancistas" assumirem o poder sob um poderio corrosivo para as instituições. A insatisfação As manifestações das massas se avolumam quando as economias descem o despenhadeiro. Falta de dinheiro no bolso para prover as mínimas necessidades do indivíduo adensam a insatisfação popular. Nesse meio, quando surge um protagonista envergando nova aparência, as massas se inclinam em sua direção. Ganha ele mais apoio quando desafia a velha ordem, prometendo refazer as coisas e acenando com o lenço da esperança (seja ele branco, vermelho ou verde-amarelo). O declínio dos partidos Nessa moldura, são visíveis os traços de definhamento dos partidos políticos, nas ondas que engolfam as ideologias, os parlamentos, a desmotivação das massas, a personalização da política. De modo paulatino, as democracias perdem seiva e vigor. O resgate dos eixos democráticos Reconstruir o edifício da democracia, vitalizando seus andares, é um exercício de muita paciência. Quando se trata de militares, que tomam o poder sob a força das armas, tal recuperação vai depender da índole dos líderes, da pressão das massas nas ruas, da pressão internacional e a imagem (geralmente desgastada ) do país, entre outros componentes. No contexto internacional, o autoritarismo que abre portas para as ditaduras, enfrenta grandes dissabores. Mesmo as grandes potências, como Rússia e China, entram na área do desgaste. Parte - II Raspando o tacho - Lula desce do trono ambiental e proclama: o bioma amazônico não pode ser visto apenas como "santuário". Deve gerar riqueza. - A cúpula amazônica é mais um evento político. Um sucesso. Seu caráter técnico está esquecido. Os países do grupo amazônico têm réguas diferentes. - Vem aí a moeda digital: Drex, o primo do Pix. O público deve ter acesso a ela em finais de 2024. Inserção digital da moeda. - 410 bilhões de dólares. Espantado? Pois essa é a soma do comércio ilícito na economia mundial. Só na América Latina, o contrabando movimenta US$ 210 bilhões ao ano. No Brasil, segundo o COAF, o setor mais vulnerável ao comércio ilegal é a indústria do tabaco, onde quase metade (48%) do mercado nacional é dominado por cigarros contrabandeados, principalmente do Paraguai. - 17 mil e-mails na lixeira, eis o legado que o grupo bolsonarista, no entorno de Bolsonaro, deixou para conferência da Justiça. - Ozonoterapia, a nova receita aprovada pela Anvisa e sancionada por Lula. Cada qual com suas maluquices. - De Fernando Rodrigues, o competente jornalista de Poder360: Bolsonaro se articula com Ricardo Nunes, prefeito de São Paulo, após apoio oficial e manifesto do PT ao pré-candidato Guilherme Boulos, do PSOL. Campanha será nacionalizada. - Romeu Zema, governador de MG, com sua visão separatista, mostra-se um ponto fora curva da política: jejuno, inexperiente, infantil, despreparado, um elefante limpando uma loja de cristais. O Nordeste agradece. Mobilizar os Estados do Sul/Sudeste contra o NE é um disparate. Para não usar uma palavra mais forte. - Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, volta e refaz opinião: Escolas podem e devem usar livros impressos, não apenas digitais. Política é a arte de dançar bem em todas as circunstâncias. Tarcísio vai bem nos mais diferentes palcos. - A técnica da seleção brasileira feminina de futebol, a sueca Pia Sundhage, deverá deixar o cargo. Por pressão. - Os casos de assédio, estupro e violência, praticados por jogadores de futebol, com destaques diários na mídia, serão intensamente diminuídos. O receio de punição baixou nos gramados. A conferir. - O Plano Real completou 29 anos no dia 1º de julho último. Foi o grande marco na história econômica do país. Em 1994, sob o governo de Itamar Franco, tendo FHC como ministro da Fazenda, o Real acabou com uma inflação de 40% ao mês. - Na época, o PT votou contra o Plano Real. O Diário do Congresso de 19 de maio de 1994 dá conta que o então deputado Jair Bolsonaro, então no PRP, também votou contra a Medida Provisória 482, que implementou a URV (Unidade Real de Valor) e, consequentemente, a conversão da moeda. O aniversário de 92 anos de FHC reuniu uma coleção de figurantes de todos os partidos, 90 pessoas, em torno de uma grande mesa de almoço, organizado por Andrea Matarazzo. Passaram por lá o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, e o ex-presidente da República, Michel Temer. Fecho a coluna com Benedito Valadares. Zema, o atual governador de MG, deveria conhecer melhor suas tiradas para aprender sobre "raposice política". Quiçá e cuíca Benedito Valadares, governador, foi a Uberaba para abrir a Expozebu. E passou a ler o discurso preparado pela assessoria. A certa altura, mandou ver: "cuíca daqui saia o melhor gado do Brasil". Ali estava escrito: "quiçá daqui saia o melhor gado". A imprensa caiu de gozação. Passou-se o tempo. Tempos depois, em um baile na Pampulha, o maestro, lembrando-se do famoso discurso na terra do zebu, começou a apresentar ao governador os instrumentos da orquestra. Até chegar na fatídica cuíca. E assim falou: "e esta, senhor governador, é a célebre cuíca". Ao que Benedito, querendo dar o troco, redarguiu com inteira convicção: - Não caio mais nessa não. Isto é quiçá! (Historinha enviada por J. Geraldo).
quarta-feira, 2 de agosto de 2023

Porandubas nº 815

Abro com a matreirice do sábio mineiro JMA. José Maria Alkmin, um dos maiores sábios mineiros, nunca perdia a tirada. O eleitor chegou aflito: - Doutor Alkmin, meu filho nasceu, eu estava desprevenido, não tenho dinheiro para pagar o hospital. A matreira raposa tascou: - Meu caro, se você que sabe isso há nove meses, estava desprevenido, calcule eu que soube agora. Parte I A vida é um espetáculo Hoje, o tema é a violência, que para ser compreendida, carece do desenho da paisagem onde se apresenta. Pinço, para começar, o lembrete do escritor francês Roger-Gérard Schwartzenberg (O Estado Espetáculo): A política, outrora, era ideias. Hoje, pessoas. Personagens... Cada dirigente parece escolher um emprego e desempenhar um papel. Como num espetáculo. Vou mais adiante. Não só a política virou espetáculo. A vida hoje é embalada no celofane da espetacularização. Até a violência é espetáculo. Puxa os fios do divertimento. Às vezes, puxa a catarse. Divertir Roger-Gérard lembra que divertir significa desviar-se da ocupação. Distrair a atenção. A pessoa é desviada de pensar em problemas essenciais com os quais deveria se preocupar. Pascal, a partir desse conceito, passou a usar a palavra "divertimento", que nos distrai e nos ilude, nos engana. O divertimento político absorve a atenção do público. Daí se extrai uma nova leva de conceitos. Personalização A pessoa se sobrepõe à ideia. Figurantes substituem a estrela na hora de ajustar os focos de luz. Na contemporaneidade, o espetáculo tomou conta do Estado. Seus personagens e programas entraram no palco. Até a morte ganhou adereços de espetáculo. Números da morte Todos os dias, deparamo-nos com os números da morte. O último grande número foi o da Covid-19, que registrou 700 mil mortes no Brasil. 500, 600, 1 milhão, cifras impactam, mas se nivelam. Morrem amigos. Antigamente, ante a notícia de morte de um conhecido, a reação seria assim: "Que Deus o tenha... puxa, foi embora cedo". A comoção já não tem a intensidade de outrora. Até as 18h40 desta segunda-feira, a população mundial era de 8.051.535.706; 77.910.603 nascidos neste ano; 286.560 nascidos hoje; 35.253.725 mortes este ano; 129.213 mortes hoje; 42.656.879 - crescimento populacional este ano. Até dez minutos atrás. Quem se importa se houver um milhão a mais?Manchetes do início da semana Os dados do cotidiano aparecem. Abrimos a semana com as manchetes estampando: ...Agentes celebram e fazem 'contagem de mortes' em operação em meio a relatos de tortura no Guarujá (SP): 'Hoje as pessoas vão morrer'... ...Sniper do tráfico que matou agente em SP deixou ao menos 10 mortos... ...PMS comemoram mortes em massacre no Guarujá. ...Tiro a mais de 50 metros que matou PM da Rota no Guarujá partiu de 'sniper do tráfico'... ...Bahia registra 15 mortos após confrontos entre policiais e suspeitos; arsenal apreendido era exibido em redes sociais. ...Morrem 110 pessoas por dia no Brasil, vítimas da violência. ...Sobe para 54 o número de mortos em atentado suicida reivindicado pelo Estado Islâmico no Paquistão. Banalização gera amortecimento Um dos efeitos da exposição diária da violência é a banalização. As gigantescas quantidades de mortes que as mídias registram no cotidiano acabam gerando o fenômeno do embrutecimento, que carrega o amortecimento, a ausência de emoção, surpresa, susto, enfim, a impassividade do leitor/ouvinte/telespectador diante das situações de violência expostas. A falta de comoção social ganha intensidade na paisagem de sangue desenhada pelos atos violentos. Um incêndio Costumo pinçar o exemplo do incêndio para focar a catarse que laça os contingentes sociais. Diante de um incêndio que devasta os andares de um arranha-céu, as pessoas vão chegando, chegando, formando uma aglomeração diante do fogo que se alastra. O espetáculo toma conta dos ânimos. As cenas de bombeiros subindo em escadas atraem a atenção. Helicópteros surgem do alto e tentam baixar no teto do edifício para salvar vítimas que correram para o último andar. As pessoas, mesmo sob lamentos e até choro, entram em catarse. "Graças a Deus, não estou ali", pensam em seus íntimos. O incêndio vira um espetáculo, que vai render longa conversa com os familiares ao chegarem em suas casas. Anomia Outros fenômenos se juntam para impregnar a alma do vivente. A anomia é um deles. A ausência de lei. A desordem toma o lugar da ordem. E aí, a desordem institucional nos cerca. O estado de anomia começa com a falta de boa fé entre os homens. Ou de confiança. Basta verificar a política de emboscadas que inspira o relacionamento entre os partidos nacionais. Na base governista, as dissensões se acentuam. Os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário vivem às turras, energizados por visões que parecem inconciliáveis a respeito de temas polêmicos. A impunidade generalizada reforça o sentimento de descumprimento de lei. As eleições As eleições, então, constituem uma batalha acirrada, onde não faltam os impropérios, as denúncias contra adversários, a calúnia e a difamação, a compra de votos, a cooptação pelo empreguismo e pela distribuição de benesses. A política, como exercício democrático da defesa de um ideário social, como missão para salvaguarda dos interesses coletivos, está cada vez mais assemelhada ao empreendimento negocial, voltado para o enriquecimento de indivíduos e grupos. A liberdade comprimida O conceito de liberdade confunde-se com a baderna gerada pela liberalidade extrema, tocada pela improvisação, pela irresponsabilidade, pela invasão dos espaços privados (MST continua sua política de invasão). Quando o escopo libertário foi esculpido, no bojo da Revolução Francesa, carregava consigo o eixo da promoção dos valores do homem, da defesa dos direitos individuais e sociais, da dignidade e da Cidadania. O imperalismo disfarçado O inimigo que se combatia era o Estado opressor, o absolutismo monárquico e a escravização que fazia do ser humano. Erigiu-se o altar das liberdades que, ao longo da história, tem sido conspurcado por outras formas de vilania e torpeza. Na modernidade, a opressão econômica, a subordinação dos valores e princípios espirituais ao prazer das coisas materiais, a miséria absoluta que maltrata parcelas significativas da sociedade, a desigualdade de classes, o descompromisso de governos e representantes do povo para com os destinos da coletividade, entre outros elementos, contribuem para corroer o sentido da liberdade e da dignidade do homem. A banalização da desordem A banalização da violência; a morte súbita a que estão sujeitas pessoas de todas as idades, em qualquer região do país; o descumprimento das leis; a falta de parâmetros reguladores que definam responsabilidades nas instâncias públicas; a angústia do desemprego; a frustração das classes médias em constatar rebaixamento em seu nível de vida; e o enriquecimento escandaloso de grupos que se incrustam na administração pública; a política incapaz de promover mudanças profundas no tecido institucional, a corrupção que continua e a impunidade - arrematam o sentimento de que a vida do país é um território de anarquia. Um país desorganizado. O lamento de Bolívar Simon Bolívar, em tempos idos, escreveu: "não há boa fé na América, nem entre os homens nem entre as nações. Os tratados são papéis, as constituições não passam de livros, as eleições são batalhas, a liberdade é anarquia e a vida um tormento". Parte II Raspando o tacho -O humor de Lula está diminuindo. O mau humor se avoluma sob as dores no quadril e no fêmur. - Bolsonaro começou a campanha de 2024. Começa a alavancar seus candidatos às prefeituras. - O governo político anda de forma trôpega. O governo econômico anda a passos firmes. - Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, é uma estampa em processo de boa visibilidade. - Quem anda na moita é Gilberto Kassab. Passarinho na muda não pia. - Trump deverá ser candidato à presidência dos EUA, condenado ou não. E ameaça ganhar. - Como um preparador físico de um grande time dá um soco na cara de um jogador? Sendo este um dos principais quadros? Estado geral de esculhambação, nos termos da parte I deste texto. - Dona Janja, a primeira-dama, é figura onipresente em eventos. Não está nem aí para comentários negativos. - Onde anda FHC? Encolhido? Olhando a cena de bico calado? - Lula, teoricamente, conta com 370 deputados alinhados ao governo. Na prática, cerca de metade. Muitos esperando o cofre abrir. - Camilo Santana, ministro da Educação, embola palavras e frases em seus improvisos. Parece natural. O ministro da Educação, porém, carece dar o exemplo. - Lula entre a cruz e a caldeirinha: a cruz, as invasões do MST sobre áreas privadas e públicas; a caldeirinha, o apetite voraz do Centrão. Lula garante que ele não existe. Mas vem reforma por aí para o grupo indicar seus prediletos. Fecho a coluna com a Paraíba. Campina Grande Num comício em Campina Grande/PB, o grande tribuno Alcides Carneiro falava e foi aparteado por um popular. - "Campina Grande é de Argemiro!..." ( seu opositor ) De imediato respondeu: - "Campina, és muito grande para pertenceres a um só homem...". Cruz das armas Em Cruz das Armas, na campanha política de 1950, iniciado o discurso de Alcides, o tempo mudou e começou a chover. Motivado, Alcides declarou: - "Sou recebido com palmas, bênção dos homens e, sob a chuva, bênção de Deus, que umedece e fertiliza o generoso solo da nossa Paraíba".
quarta-feira, 26 de julho de 2023

Porandubas nº 814

Abro com a hilária historinha do amigo Sebastião Nery. Ô jardineira... Na cidadezinha do norte do Rio de Janeiro, a procissão de Senhor Morto caminhava lenta e piedosa, na sexta-feira da Paixão, com o povo cantando, de maneira compungida, os hinos sacros. O velho padre na frente, o sacristão ao lado e os fiéis atrás, cantando as músicas que o vigário puxava. De repente um pequeno ônibus, que na região chamam de "jardineira", passou perto e começou a subir a íngreme ladeira da igreja, bem em frente da procissão. No meio da ladeira, a "jardineira" afogou, encrencou, parou, deu aceleradas fortes e inúteis e começou a dar para trás, de costas. Os fiéis não viram, mas o padre, atento, viu. E ficou apavorado. A "jardineira" já despencava numa grande velocidade. O padre gritou: - Olha a jardineira! E os fiéis começaram a cantar, em ritmo de samba: - Ô jardineira, por que estás tão triste? Mas o que foi que te aconteceu? Foi a camélia que caiu do galho, deu dois suspiros e depois morreu. A "jardineira" descambou ladeira abaixo, até que parou. Não atropelou ninguém. Sob o olhar do Senhor Morto! Mas os fiéis não aguentavam de tanto rir. Pergunta que não cala A pergunta continua no ar. Quem mandou matar Marielle Franco? Vou dar a resposta: o Brasil encapuzado. O Brasil do crime organizado. O Brasil dos bandidos das drogas, dos assassinos que comercializam as mortes, dos oportunistas e dos esquemas de apropriação ilícita do dinheiro público. Estourar o Brasil da arbitrariedade é meta impossível, mas diminuir seu tamanho é dever inarredável dos homens públicos e da sociedade organizada, sob pena de vermos cada vez mais fraquejar o ideal da democracia como governo do poder visível. Malhas da corrupção A tarefa em desvendar os poderes ocultos e as malhas de corrupção e de violência institucionalizada, que se processa no âmbito político e na esfera dos meios de comunicação, tem sido didática e de alta relevância para a conscientização da sociedade. A estratégia de combate aos poderes invisíveis, voltados para a arbitrariedade e a rapinagem, requer a força da pressão coletiva, mais que simples castigos aos criminosos. Não adianta prender um ou dois. Urge prender todos os integrantes do poder invisível. A ambição desmesurada No meu livro Marketing Político e Governamental, cito um pensamento do cientista político Robert Lane, em Political Life, que explica como a ambição desmesurada pelo poder funciona como um bumerangue. "A fim de ser bem-sucedida em política, uma pessoa deve ter habilidades interpessoais para estabelecer relações efetivas com outras e não deve deixar-se consumir por impulsos de poder, a ponto de perder o contato com a realidade. A pessoa possuída por um ardente e incontrolável desejo de poder afastará, constantemente os que a apóiam, tornando, assim, impossível a conquista do poder". O Brasil subterrâneo Na área do Brasil subterrâneo, são bastante disputados os jogos de interesse entre políticos; entre políticos e grupos econômicos; entre tecnocratas dos governos (Federal, estadual e municipal) e empresários; e facínoras. Os grupos se multiplicam em subgrupos, formando uma esteira que desce do topo até as bases da sociedade, onde nadam os "bagrinhos" levados pela onda dos grandes "tubarões". Na área do Brasil arbitrário e violento, o campeonato é disputado, entre outros, por contingentes marginais das drogas, pelo aparato policial e pelos dois sistemas conjuntamente, que frequentemente jogam no mesmo time. E não se pense que o sistema jurídico está fora disso tudo. Não. A corrupção e a arbitrariedade também imantam perfis de parcelas do sistema judiciário, na forma de decisões injustas, parcialidade em julgamentos, enfraquecimento de posições, atenuação de culpas, vistas grossas a processos, prejulgamentos e desvio de padrões condizentes com a missão da Justiça. Sentimento de descrença Os comportamentos tortuosos de representantes e agentes de todos os setores da vida produtiva e do sistema institucional do país acabam estabelecendo uma densa camada de insensibilidade social e fortes manchas nos padrões morais e éticos. Além, é claro, de contribuírem para o estiolamento das instituições nacionais. A escalada do caos resulta na sensação geral de incredibilidade, descrença, frieza, mesmice, eixos da cultura de acomodação que amortece o tecido social. Os súbitos ciclos de sensibilização, fruto de violências explícitas do aparelho policial e de denúncias sobre grandes escândalos, chegam até a criar na sociedade um desejo de participação e um sentimento de indignação. Lutar pela plena cidadania Mas os sentimentos de repúdio tendem a cair no vazio, por não encontrarem mecanismos de continuidade capazes de deixar sempre acesa a chama da consciência coletiva. Essa meta só será conseguida quando o mais humilde dos cidadãos decidir abandonar o anonimato das massas para se transformar em agente ativo de sua própria história. Daria ele, assim, um gigantesco passo rumo à plena cidadania. A conquista da cidadania O povo, em suas extremas carências, tem dificuldades de exercer sua cidadania. Sua autonomia de decisão é escassa e tênues são suas vontades. Em consequência, submete-se, como entidade passiva, à opressão dos discursos e a uma engenhosidade operacional e técnica que acaba sugando suas emoções. Vota em candidatos salvadores da pátria, confia em promessas e propostas e morre na praia dos desconfortos. Quando se abre a portinha do lamaçal, começa-se a desvendar a identidade cultural da política brasileira e a hipocrisia das elites. Estas são verdadeiramente as fontes do poder corrupto. Quem acredita em CPI Instalam-se CPIs, a dos movimentos golpistas de 8 de janeiro, a do MST. Ora, ninguém aposta em seus resultados. É espetáculo. O Congresso quer desfiar o novelo das mazelas? Ora, já sabemos qual sua extensão. Muitos parlamentares são eleitos por meio de uma engrenagem viciada, que não resistiria a um bom código de ética. Não faz bem ao Congresso tirar proveito da crise para melhorar sua imagem, se, em paralelo, ele não tomar decisões a respeito dos mecanismos eleitorais, da reforma partidária e do sistema de representação política. Mudança? Coisa longínqua As figuras que comandam o processo político dominam a cena política nacional há bastante tempo. Vejam Arthur Lira. Representa ele mudança? Respira ar novo? O populismo aparece como arma de mistificação das massas e os truques das denúncias funcionam mais como altar de visibilidade do que como ato de patriotismo. Constituem uma espécie de para-choque do grupismo em que se transformou o sistema político. A mudança política é uma meta de longo prazo. Significa reordenamento nas instituições e redefinição de padrões e valores. Defesa e ataque "A invencibilidade está na defesa; a possibilidade de vitória, no ataque. Quem se defende mostra que sua força é inadequada; quem ataca, mostra que ela é abundante". (Sun Tzu) Parte II Raspando o tacho - Mais uma semana teremos um raio-x completo ou quase? Do caso Marielle Franco. - Lula deve fazer um tremendo esforço para suportar as dores na bacia. Tenho artrose no joelho, coloquei prótese e sei bem como é viver com essas dores. O mau humor se instala. - Vem uma reforminha ministerial por aí. Lula vai ser compelido a fazê-la. - O futebol feminino é um bailado que não se vê no futebol masculino. - Sonho cheio: Os Bolsonaros querem eleger como senadora/senadores, Michele, Eduardo e Flávio. Três de uma vez. - Hoje, 26 de julho, é dia de Senhora Santana, a padroeira de minha cidade, Luis Gomes, na tromba do elefante, como é o mapa do RN. Extremo oeste. - Ouvi de um empresário que Paulo Guedes derrete-se de elogios a Fernando Haddad. - Continuo achando que Janja faz muito bem ficando perto de Lula. Como Elizabeth Trudeau, não quer ser apenas uma rosa na lapela do marido. (Mãe do atual 1º ministro do Canadá, Justin Trudeau, primeira-dama na época do 1º ministro Pierre Trudeau). A socióloga tem conteúdo. - Quem está se entusiasmando com a visibilidade em crescimento é o governador Romeu Zema, de Minas Gerais. - O calor na Europa e EUA bateu na consciência dos sofridos. - A direita ganha volume em alguns países, nos últimos tempos. - Transferir a cracolândia dos Campos Elíseos para o Bom Retiro, como chegou a propor Tarcísio de Freitas, o governador de SP, é trocar seis por meia dúzia. - Em três mandatos, atual governabilidade de Lula é a mais baixa. - O El Nino é responsável pelas mudanças climáticas. Seca no Norte e chuvas no Sul. - Biden se arrisca a perder as eleições nos EUA. Fecho a coluna com pequenas lições de marketing eleitoral. - Saber ler corretamente o meio ambiente, os novos valores do eleitorado e as motivações de voto. - Escolher o discurso para o momento adequado. - Definir segmentos-alvo do eleitorado. - Selecionar sólidos reforçadores de decisão de voto. - Descentralizar a campanha para multiplicar pontos de eco e agregar organizações intermediárias. - Compor programa simples, objetivo, factível. - Trabalhar com modelos diferenciados de pesquisa. - Programar ações de surpresa e impacto - Organizar estrutura adequada e estabelecer cronograma prevendo: lançamento da campanha (junho); crescimento (julho - 1ª quinzena de agosto); consolidação / maturidade (segunda semana agosto - primeira quinzena de setembro); clímax (segunda quinzena de setembro - semana da eleição); declínio (evitar que esta fase ocorra antes da eleição). - Garantir meios e recursos.
quarta-feira, 19 de julho de 2023

Porandubas nº 813

Abro a coluna com uma historinha de Einstein. Einstein Certa vez, Einstein recebeu uma carta da Miss New Orleans onde dizia a ele: "Prof. Einstein, gostaria de ter um filho com o senhor. A minha justificativa se baseia no fato de que eu, como modelo de beleza, teria um filho com o senhor e, certamente, o garoto teria a minha beleza e a sua inteligência". Einstein respondeu: "Querida miss New Orleans, o meu receio é que o nosso filho tenha a sua inteligência e a minha beleza". Parte I - Panorama... Qual a taxa? 25%? 28%? 30? Qual será a alíquota do IVA, já considerando o tratamento diferenciado de alguns setores, agro, transporte, saúde, educação, hotéis, restaurantes, parques temáticos, por enquanto? Há quem diga que será o maior IVA do mundo. Outros defendem uma taxa menor que 25%. O debate está no ar. A bola está no campo do Senado. O arcabouço fiscal ainda está inclinado. Pegando a onda Lula tem faro apurado. Faz boa leitura do que ocorre no mundo. China crescendo menos. A depender do nosso agronegócio. Rússia metida na guerra contra a Ucrânia até o pescoço. EUA tentando se cacifar ante os países da União Europeia e com um olho na China e outro na Rússia. O Brasil colhendo a maior safra de grãos da história. Deflação mostrando economia sob controle. Juros altíssimos? Sim, é verdade, mas em agosto começarão a baixar. Nesse cenário, Lula comemora sua presença constante nas reuniões dos grandes. P.S. O Brasil comanda os BRICs e, a partir de 2024, comandará o G-20, o clube das maiores economias mundiais. Serviços, o bode expiatório Antonio Florêncio de Queiroz Junior, presidente da Federação do Comércio, Bens e Serviços, em primoroso artigo, ontem, 18, em O Globo. Martelou: "...tratar situações diferentes de forma igual gera desigualdades...é o que acontece com o setor de serviços. Com as empresas que terão a mesma alíquota de cobrança, poderão abater créditos, certamente aquelas que os possuem em maior quantidade pagarão menos impostos...como as empresas de serviços, por sua natureza, possuem o seu maior custo atrelado à mão de obra, e essa mão de obra não dá crédito, elas terão menos para abater no pagamento do novo tributo, o IVA. Assim, mesmo tendo tantas despesas quanto outros segmentos, por serem empresas que não dão crédito (isso mesmo, gerar emprego não dá crédito), o setor de serviços pagará mais impostos que os demais". Falou e disse Florêncio foi categórico. Os serviços serão castigados se for aprovada in totum a proposta de reforma tributária aprovada pela Câmara. O presidente da Fecomércio-RJ é filho do saudoso deputado e empresário Antônio Florêncio, de Pau dos Ferros, cidade polo do oeste potiguar. Centrão na mão Na contramão? Jamais. O Centrão, comandado por Arthur Lira, o comandante das Alagoas, se amarra na árvore do governo Lula. Ganha espaços e até ministérios. Luis Inácio aprendeu a lição que seus mandatos anteriores lhe ministraram. Diminui os carros parlamentares que viriam na contramão para atropelar sua administração. Coisa que Dilma Rousseff não soube fazer. Haddad, a surpresa O chamado mercado e seus afluentes até apostavam na entrada de Fernando Haddad na seara do comando da economia. Mas o sujeito está se saindo bem melhor que a encomenda. Entre 0 a 10, ganha um 8, enquanto, antes da caminhada, dava-se a ele um 6. No máximo. Imagem negativa O ministro-chefe da Casa Civil, o baiano Rui Costa, ex-governador da Bahia, é a nota mais dissonante do governo. Sua imagem cai na banda negativa da gestão lulista. Uma reflexão Vejam este pensamento de Hannah Arendt: "A sociedade burguesa, baseada na competição, no consumismo, gerou apatia e hostilidade em relação à vida pública, não somente entre os excluídos, mas também entre elementos da própria burguesia." Ou seja, a atividade econômica passou a exercer supremacia sobre a vida pública. Os eleitores se distanciaram de partidos, juntando-se em núcleos ligados ao trabalho e à vida corporativa - sindicatos, associações, movimentos. Eis a nova face da política. Se há participação dos aglomerados sociais, ela ocorre dentro das organizações intermediárias. Nivelando por baixo Saiu uma pesquisa mostrando que os políticos melhoram sua imagem. Será? Tenho cá minhas dúvidas. O fato é que o discurso institucional, levado a efeito por atores individuais e partidos, não faz eco. A estética da política pontua e remanesce nos sistemas cognitivos, emoldurando a policromia e o polimorfismo do modus operandi dos atores em seus palcos: parlamentares brigando em plenários, encontros mafiosos, dinheiro escondido, negociações por mais espaços na teia dos Poderes e assim vai. Desvio de papéis Os conjuntos representativos desviaram-se de seus papéis. Por quê? Ora, a política deixou de ser missão para se tornar profissão. No bojo da sociedade pós-industrial, outros condimentos passaram a compor parte do escopo político, refazendo escopos e reconstruindo práticas. Onde e como o Brasil evoluiu ao longo de sua história? Quais as frentes de progresso e modernidade que pode registrar? E quais os eixos que ainda ligam o país à tradição colonial, ao ethos nacional e à coleção de "ismos"? Força cresce É inegável que a moldura brasileira adquiriu atualidade no concerto das Nações. A nação brasileira se posiciona ao lado dos grandes, formando um bloco que provoca profundas mudanças na geopolítica internacional. Não se descartam otimistas previsões sobre a maior influência brasileira no mundo. O ponto nevrálgico O patrimônio brasileiro no campo da megabiodiversidade haverá de conferir maior prestígio à Nação. Esse é o ponto sensível que Lula percebeu para impor maior respeito ao país. Vamos acompanhar a trajetória brasileira na política ambiental. Mais carros As duas maiores capitais do país, com orçamentos extraordinários e administrações que se vangloriam de êxitos, atravessam um dos mais angustiantes ciclos de sua vida. São Paulo, com 12 milhões de habitantes, é a perfeita imagem do caos. Corredores se entopem de carros em todos os horários. Ao lado dos cerca de 1.000 veículos novos que entram diariamente no trânsito (vindo a se somar aos oito milhões que circulam na Grande São Paulo), ainda está às voltas com o problema de imigrantes. Não é de admirar que o número de mortes no trânsito, em São Paulo seja três vezes maior que as da Inglaterra, EUA e Canadá. E mais, a metrópole terá de suportar a onda de "carros populares" da era Lula. Compromisso com programas claros As aflições seriam menores se o processo de escolha dos dirigentes adotasse o figurino racional: candidatos devem ser obrigados a apresentar nas campanhas um programa a ser executado pela prefeitura sob rígido controle das Câmaras Municipais e fiscalizado pela sociedade. A verborragia de cada postulante daria lugar à exposição detalhada de ações para debelar os problemas. Os homens públicos deveriam aprender a lição: suas fogueiras de vaidade não resistem à água em ebulição. Parte II Raspando o tacho - Ricardo Nunes, o prefeito de São Paulo, conta com o apoio tucano à sua reeleição. Na visão deste analista, os tucanos estão observando sua floresta ser incendiada. Sem votos. - O futebol feminino começa a aparecer no ranking do prestígio e atenção da sociedade. Tem uma sueca como técnica. Com pouco domínio do português. Mas a seleção feminina não faz feio. - Como ficarão os salários das moças diante da norma estatuída pelo governo para que homens e mulheres tenham o mesmo salário nas mesmas funções? Ah, no futebol e em outras áreas, é diferente... - Antônio Furlan, atual prefeito de Macapá, é franco favorito na disputa para a prefeitura. Tem 66,8% das intenções de voto, enquanto José Alcolumbre, irmão do senador Davi Alcolumbre, tem 8,7%. Dados enviados à coluna por Murilo Hidalgo, do Instituto Paraná Pesquisas. - O cientista político Paulo Kramer tem ministrado interessantes e oportunos cursos de marketing político. O último: Como causar boa impressão? Anotem: @kramer.paulo no LinkedIn. Conheço o cientista político. E atesto sua seriedade. - Álvaro Dias, escritor e prefeito de Natal, foi eleito para a Academia Norte-rio-grandense de Letras. - Eleições livres na Venezuela, como pregam Lula e Macron? Mais crível é acreditar que, amanhã, o mundo não terá sol. - O calor extremo ameaça norte-americanos, que enfrentam semana de calor extremo. São 110 milhões de pessoas sob alerta de altas temperaturas. A situação é mais grave no sul e no oeste do país. Em Phoenix, no Arizona, há 18 dias as temperaturas estão acima dos 38°C. Em Las Vegas, termômetros ultrapassaram os 45. Na Califórnia, a temperatura bateu 56°C no Vale da Morte - um lugar conhecido por ser perigosamente quente. O mundo quase em chamas. Fecho a coluna com um "causo" de Recife. Creusa Joaquim Francisco Cavalcanti era delegado da polícia, em Recife. Uma noite, em um baile de travestis no bairro do Recife velho, a pancadaria come solta. Prisão de todos os participantes. O delegado fichava cada um e mandava embora: - Nome? - Greta Garbo. - Nome? - Sophia Loren. - E seu nome? - Marilyn Monroe. - E o seu? - Creusa. - O que, seu sem-vergonha? Creusa é o nome de minha mulher. Você vai ficar seis meses na prisão de Itamaracá. Seis meses depois, o delegado Joaquim Francisco manda buscar Creusa para soltá-lo: - Seu nome? - Joaquim Francisco. - O que, imbecil? Como tem coragem, sem-vergonha? Vai ficar mais seis meses na prisão. E para lá Creusa voltou. Sem piedade.
quarta-feira, 12 de julho de 2023

Porandubas nº 812

Abro a coluna com uma historinha dos velhos tempos. Promessas de campanha A historinha foi enviada por um leitor do Paraná. Candidatos de duas famílias disputavam a prefeitura de uma pequena cidade. Final de campanha. A combinação era de que os dois candidatos e seus familiares teriam de usar o mesmo palanque. Discursou, primeiro, o candidato que tinha 70% de preferência dos votos: - Povo da minha amada terra, povo ordeiro, trabalhador, religioso e cumpridor de suas obrigações. Se eleito, irei resolver o problema de falta de água e de coleta de esgoto. Farei das nossas escolas as melhores da região, educação em tempo integral. Vou construir uma escola técnica do município... E arrematou: - E tem mais, meus amigos, ordeiros, religiosos e cumpridores de seus deveres morais, vocês não devem votar no meu adversário. Ele não respeita nossa gente, nossas famílias, nossos costumes! Ele desrespeita nossa igreja. Ele nem se dá ao respeito. Vocês não devem votar nele. Porque ele tem duas mulheres. O adversário, com 20% de intenção de voto, quase enfartou quando viu a mulher, ao seu lado, cair no palanque. Ela não aguentara ouvir a denúncia do adversário de que o marido tinha uma amante. A desordem ganhou o palanque. A multidão aplaudia o candidato favorito e vaiava o adversário. Cabos eleitorais começaram a se engalfinhar. Passado o susto, com muita dificuldade, o estonteado candidato acusado de ter duas mulheres começa seu discurso, depois de constatar que a esposa estava melhor: - Meu amado povo, de bons costumes e moral ilibada, religioso e cumpridor de seus deveres morais, éticos e religiosos. Quero dizer aos senhores e senhoras aqui presentes, que, se agraciado com seus votos me tornar o prefeito desta cidade, farei uma mudança de verdade. Não só resolverei o problema da falta de água, como farei também o tratamento de todo o esgoto do município, construirei uma escola técnica e um novo hospital! A massa caçoava do coitado e de sua mulher. Foi em frente: - Vou melhorar o salário dos professores, a merenda das crianças e ainda vou instituir o Bolsa Cidadão. Agora, prestem bem atenção. Se os amigos acharem que não podem votar em mim porque tenho duas mulheres, votem no meu adversário. Mas saibam que a mulher dele tem dois maridos. A galera veio abaixo. O pau comeu. Brigalhada geral. Urnas abertas. O candidato chamado de corno perdeu. O adúltero ganhou com 76% dos votos. I Parte Panorama Bolsonaro está morto? Não. Ao contrário da opinião de alguns analistas, Jair ainda levanta a tocha do messias para milhares de pessoas que apostam em sua caminhada em direção à terra prometida. Por quê? Porque veste o manto do antipetismo. Impregna-se dessa imagem. E com ela, desfraldará a bandeira oposicionista nas eleições para prefeito e vereadores no próximo ano. Um presente ao PL Sua inelegibilidade, decidida pelo TSE, foi um presente ao PL, o maior partido da Câmara, com 99 deputados. A razão é que seu cacife para dominar o partido se arrefece. Ou seja, ele está politicamente fraco. Repito: politicamente. Porém, sob o prisma eleitoral, está forte. Não tem poder de mando no partido, mas conserva influência eleitoral. O PL continuará sob o domínio de Valdemar da Costa Neto, o boy, que usará Bolsonaro como isca para pescar votos em todo o país. A visão dos eleitores Existe um sentimento geral de que o PT é uma ameaça. Que o partido dos trabalhadores é contra as liberdades, contra propriedade, defensor de regimes como os da Venezuela, Cuba e Nicarágua. Lula tem ajudado a manter essa percepção, referindo-se a eles com certa constância. O presidente, ao que se constata, não tem papas na língua. Mais solto e tão verborrágico quanto se apresentava em mandatos anteriores. Lula tem pressa. E o PT poderá, mais uma vez, contar com o contexto internacional, favorável ao Brasil. Limites do bolsonarismo Mas o bolsonarismo raiz tem limites. Não ganhará tanta força se a situação da economia mundial favorecer o Brasil. Por bolsonarismo raiz devemos entender os eleitores que se identificam profundamente com a extrema direita. Pois há muitos simpatizantes de Bolsonaro que tomam posição apenas porque são antipetistas. Não gostam do PT. E optam por um protagonista que possa vencer a pretensão hegemônica do petismo. Sorte do PT e do Brasil Dito isto, vamos aos fatos: um panorama recessivo ameaça as economias europeias e a norte-americana. A China projeta um crescimento menor e depende de commodities, a partir dos nossos grãos. O Brasil registra uma das maiores safras de sua história. E a política liberal gestada pelo ministro Fernando Haddad recebe aplausos. A economia sob Haddad tem sido um azougue no apoio do mercado. Com as reformas na frente econômica, pode puxar o governo Lula para a liderança no conjunto das nações em desenvolvimento. Portanto, peço atenção dos leitores. Minha análise sobre o bolsonarismo tem a ver com o sucesso e/ou insucesso do governo Lula III. Guerra A guerra da Ucrânia x Rússia, por sua vez, tem levado substanciais recursos dos países da OTAN e dos EUA. Suas economias também sofrem impactos da guerra. E a posição do Brasil, nem lá nem cá, fazendo certa intermediação, é um fator de impulso às exportações, a par de uma articulação equidistante. Todos esses componentes precisam ser considerados. Até a posição do Brasil para alavancar sua indústria bélica - fabricação de blindados, principalmente - está sendo negociada com a Alemanha, produtora de peças. Empecilho tem sido a proibição do país em exportar armas/tanques velhos para a Ucrânia. Haddad Voltemos ao ministro Haddad. Pode ser o trunfo de Lula para 2026. Claro, se o governo der certo. Haddad ganhou a confiança do mercado, tem sido um grande articulador do governo, tem uma cara jovial. Lula se depara com a questão da idade e da perspectiva de viver momentos mais tranquilos com sua mulher, Janja. Mas o presidente deixará essa decisão para o último momento. Não quer acirrar as querelas partidárias que um anúncio antecipado provocaria. Sua intenção é a de fazer o maior governo da história. É matreiro e sabe esperar. Uma raposa. Haddad, por sua vez, é o traço de união que liga o PT do passado ao futuro. Índices de intenção de votos Os institutos de pesquisa começam a nos mandar pesquisas de intenção de voto para as Prefeituras no pleito do próximo ano. Donde sai a pergunta: é para considerar? Não servem? Aqui, vai a resposta: índice de intenção de voto é igual ao desenho do elefante visto nos céus. Dentro de pouco tempo, o que era elefante se esgarça e se transforma em gafanhoto; e o que era uma nesga de nuvem, parecendo um gafanhoto, se agiganta, mais parecendo o incrível Hulk. Durante uma exposição massiva, de semanas seguidas, qualquer desconhecido se transforma em astro, celebridade. As campanhas eleitorais fazem esse milagre. II Parte Raspando o tacho - A escolha do senador Eduardo Braga, do MDB, para relator do projeto de Reforma Tributária, no Senado, é uma jogada inteligente do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, sob a confiança de que o parlamentar amazonense vai acolher os pontos defendidos pelo governo. - Quem está se saindo bem no fichário político é o senador piauiense, ex-ministro de Bolsonaro, Ciro Nogueira. Defende Bolsonaro e se mostra fiel. Sem açodamentos. - Ciro se prepara para apitar alto no próximo capítulo eleitoral. - O bate-boca no PL continua. O grupo de 20 deputados que votaram a favor da reforma partidária foi alijado da rede de mensagens. A dissensão pode acabar em saída de parlamentares em momento oportuno. - Tarcísio de Freitas, governador de SP, pensa na reeleição em 2026 e não na candidatura presidencial. Que seria seu alvo em 2030. Conta a esse analista fonte séria do Palácio dos Bandeirantes. - O PT pensa em ter entre 6 e 89 candidatos fortes para a prefeitura de capitais em 2024. Mas as parcerias com os partidos que formam a bancada de apoio ao governo atrapalham sua meta. - Calado, de boca fechada na CPI dos Atos Golpistas, Mauro Cid, o ex-ajudante e ordens de Bolsonaro, diz muita coisa. Acoberta situações. É uma confissão. - Há um grupo nas Forças Armadas que ainda não digeriu o governo Lula. Os bastidores estão infestados de conversas de tom negativista. - Os setores de alimentação, bebidas e combustíveis são responsáveis pela deflação de preços em junho. A população aplaude com o pequeno aumento no poder de compra. - A nomeação de novos ministros para o STJ forma um imenso rolo compressor a querer influenciar o processo junto a Lula. Que vai agir de maneira política. - Aliás, a intenção do presidente é fazer alianças com viventes do céu e do inferno. Pretende organizar imensa fortaleza de defesa no Congresso. Na área ministerial, isso implica a mudança de nomes em boa parte da Esplanada dos Ministérios. - Putin acabou chamando o comandante do Grupo Wagner, Prigozhin, para uma conversa. O comandante levou seus principais chefes. O grupo, ao que se diz, está de volta à Rússia. Estava em Belarus. Pragmatismo. Grana e poder. - Lula teria perguntado a Biden: você será candidato à reeleição? O presidente dos EUA teria respondido: sim. Lula deve ter pensado: minha idade em 2026 não será problema. - Lições de Napoleão e Sherman - É bom recordar as lições de Napoleão. Que dizia: faire som thème em deux façons (fazer as coisas de dois modos). O general William Sherman, que comandou a campanha de devastação durante a guerra da secessão norte-americana, também lembrava: "Ponha o inimigo nos cornos de um dilema." Nunca um político deve trabalhar com uma única hipótese. Um candidato precisa dispor de algumas alternativas. Fecho a coluna com Tenório Cavalcanti, na verve de Sebastião Nery Armado de admiração Tenório Cavalcanti, udenista e adversário político de Vargas, foi ao Catete numa comissão de deputados. Andava nas manchetes dos jornais por causa de suas estripulias em Caxias, na base da "Lourdinha" (metralhadora) e da capa preta. Getúlio o cumprimentou, olhou bem para o volume do revólver embaixo do braço esquerdo, sob o paletó: - Deputado, o senhor está armado? Tenório ficou vermelho, mas não perdeu o bote: - Sim, presidente, armado de admiração por Vossa Excelência.
quarta-feira, 5 de julho de 2023

Porandubas nº 811

Abro com o Largo da Carioca Precisamos trabalhar O brigadeiro Eduardo Gomes fazia, no largo da Carioca (Rio de Janeiro), seu primeiro comício da campanha presidencial de 1945. A multidão o ouvia em silêncio: - Brasileiros, precisamos trabalhar! Do meio do povo, uma voz poderosa gritou: - Já começou a perseguição! Bagunça geral. O comício quase acabou. Tratados são papéis Simon Bolívar lapidou o conceito; "não há boa fé na América, nem entre os homens nem entre as nações. Os tratados são papéis, as constituições não passam de livros, as eleições são batalhas, a liberdade é anarquia e a vida um tormento". Puxando para nós o pensamento. A vida nacional está se tornando cada vez mais um tormento e parcela desse sofrimento tem muita coisa a ver com a desordem institucional que nos cerca. Não há boa fé A boa fé foge de nosso alcance. Basta verificar a política de emboscadas que inspira o relacionamento entre os partidos nacionais. Na base governista, as dissensões se acentuam a cada dia. O Centrão quer o maior naco. O PT quer conservar os seus. O arco ideológico está esgarçado. Os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário vivem às turras, energizados por visões que parecem inconciliáveis a respeito de temas polêmicos. Critica-se o Judiciário por judicializar a política. CF, fonte de litígios A Constituição brasileira é um livro cheio de detalhes. Quando foi produzida, refletia o caldeirão de pressões da sociedade. Por ser uma Carta muito descritiva, propicia polêmica em demasia e abre espaços para uma infinidade de litígios. Hoje, é criticada pelo fato de muitos de seus artigos e incisos não serem obedecidos. E uma lei maior que deixa de ser cumprida acaba plasmando uma cultura de perniciosidade, impunidade e desorganização. Dessa forma, os tratados constitucionais perdem razoável parcela de força, transformando-se em letra morta. As eleições já estão nas ruas Nem bem termina uma eleição, a próxima ganha as ruas. As eleições constituem uma batalha acirrada, onde não faltam os impropérios, denúncias contra adversários, calúnia e difamação, a compra de votos, cooptação pelo empreguismo e pela distribuição de benesses. A política, como exercício democrático da defesa de um ideário social, como missão para salvaguarda dos interesses coletivos, está cada vez mais assemelhada ao empreendimento negocial, voltado para o enriquecimento de indivíduos e grupos. Improvisação O conceito de liberdade confunde-se com liberalidade, a baderna gerada pela permissividade extrema, tocada pela improvisação, pela irresponsabilidade, pela invasão dos espaços privados e até pelo denuncismo exacerbado da mídia. Quando o escopo libertário foi esculpido, no bojo da Revolução Francesa, carregava consigo o eixo da promoção dos valores do homem, da defesa dos direitos individuais e sociais, da dignidade e da Cidadania. O inimigo que se combatia era o Estado opressor, o absolutismo monárquico e a escravização que fazia do ser humano. Erigiu-se o altar das liberdades que, ao longo da história, tem sido conspurcado por outras formas de vilania e torpeza. Desigualdade As pesquisas evidenciam: as desigualdades entre classes são um abismo. A opressão econômica, a subordinação dos valores e princípios espirituais ao prazer das coisas materiais, a miséria absoluta que maltrata parcelas significativas da sociedade, a desigualdade de classes, o descompromisso de governos e representantes do povo para com os destinos da coletividade, entre outros elementos, contribuem para corroer o sentido da liberdade e da dignidade do Homem. As reformas, como a tributária, são gestadas para atender a grandes interesses. Governantes inescrupulosos Os governantes fazem sua agenda com um olho nas próximas eleições. Começam prometendo mundos e fundos. Parecem ter pressa. Vejam Lula pedindo aceleração na ferrovia leste-oeste, que ligará a Bahia ao centro-oeste. A construtora prometeu para 2027. Lula quer inaugurá-la em 2026. O saneamento do Estado tem muito dribles. O compromisso maior é com a gastança. No terceiro ano de governo, a ordem é cumprir uma agenda de obras aceleradas. Queimam-se etapas. Elefantes brancos são deixados ao próximo governante. Tinta na caneta Fruem as delícias do poder da caneta. Surpreendendo-se com a força do cargo, vai testando as capacidades de mandar, solicitar, nomear, desnomear, receber atenção. Mil e um cargos. É assessor por todos os lados em 37 ministérios e uma batelada de autarquias e empresas. Devem dormir contando carneirinhos, aliás, pedintes que entram e saem pela porta do curral, ou melhor, salão de despachos. A onda publicitária Saem do confinamento dos palácios e prefeituras, correm para canteiros de obras, lambuzam-se de poeira, visitam cidades, compram super-aviões, fazem um périplo pelo mundo, visitam obras, alguns chegam a despachar nas ruas, com as massas aplaudindo as obras. O governo é um território delimitado por placas, frases de efeito e logomarcas. As fotos de um governante suorento e trabalhador (símbolo do obreirismo faraônico) inundam redações para transmitir a imagem de uma administração transformada em canteiro de obras. A arrogância As caras dos mandatários expressam o próprio ciclo de vida da administração. Da simplicidade, da primeira fase de governo, à arrogância, da última fase, eles retratam a incultura política do país. Entram como inquilinos dos espaços públicos e saem como proprietários de feudos. Impregnam-se de onisciência e onipotência. Em muitos Estados, vestem-se de deus. A coisa pública (res publica), para muitos deles, se transforma em fazenda particular. Muitas vezes, a falta de preparo do governante torna-o refém de um grupo de donatários, que faz a partilha do governo, distribuindo cargos, benesses e posições. Este escriba, perplexo, ouviu de um alto empresário: malas de dinheiro voltaram a frequentar gabinetes e esconderijos. A corrupção voltou multiplicada. ??? II Parte Raspando o tacho - A reforma tributária, nos termos em que está escrita, é um golpe de morte no setor de serviços - Lula tem pressa. Quer obras, reformas, arcabouço fiscal, conquistar a simpatia de países que se afastaram do Brasil, ter grande base de apoio. Parece voar nas asas da autossuficiência. - Lira não conseguirá domar os apetites do centrão. - Tarcísio e Zema correm na dianteira na direção de 2026. - Importante secretário de Tarcísio confessa a este analista. O governador de SP vai, primeiro, disputar a reeleição em 2026 e, em 2030, a presidência. - Geraldo Alckmin cresce no escurinho dos contatos e articulação. - Nunes, MDB, prefeito de São Paulo, trabalha para ser conhecido como o "fiscal da cidade". - A CPMI do 8 de janeiro vai arrefecer sua força. - José Paulo Cavalcanti Filho, o grande jurista pernambucano, membro da Academia de Letras, tomará posse, em novembro na Academia Portuguesa de Letras. Viva! - Nos últimos tempos, os jornais passaram a manchetar sobre mortes misteriosas de jovens e casais em suas residências. A violência entrando nos lares. - Aumenta a quantidade de crimes com o uso de ferramentas tecnológicas. - Preparem-se para aguentar intenso calor no próximo verão, provocado pelo fenômeno El Nino. Segunda foi o dia mais quente na história da temperatura do planeta. - Perguntinha marota: os órgãos de controle conseguem apurar e descobrir onde estão as torneiras mais abertas da corrupção? - Os irmãos Gomes travam uma batalha no Ceará: o senador Cid trabalha para ser parceiro do PT; o ex-candidato à presidente quer levantar a bandeira do PDT, ficando longe do PT. Não é jogo de aparências. Os irmãos estão brigados. - Ser grande e forte nem sempre significa ser todo-poderoso. Pescadores acabam de flagrar piranhas atacando e comendo um jacaré no rio Javaés. Um grupo de abelhas atacam e matam. Fecho com as Minas Gerais Desde que o dinheiro venha Mais uma da matreirice mineira. Benedito Valadares chegou a Curvelo/MG, para visitar a exposição de gado do município. Na hora do discurso, atrapalhou-se: - Quero dizer aos fazendeiros aqui reunidos que já determinei à Caixa Econômica e aos bancos do Estado a concessão de empréstimos agrícolas a prazos curtos e juros longos. Lá do povo, alguém corrigiu: - É o contrário, governador! Empréstimo a prazo longo e juro curto. - Desde que o dinheiro venha, os pronomes não têm importância.