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Patrimônio ético

Membro do ICET comenta nota divulgada em 5/3/04 pelo PT

Da Redação

segunda-feira, 8 de março de 2004

Atualizado às 08:41

 

Patrimônio ético

 


Raquel Cavalcanti Ramos Machado*

 

A nota à sociedade divulgada em 5/3/04 pelo PT (v. abaixo), na qual o partido tenta se defender e defender o Governo das acusações que vêm sofrendo por conta do caso Waldomiro Diniz, representa, mais uma vez, o mau uso da retórica, ou, em outros termos, o uso da retórica vazia. São palavras que não coincidem com o que, na prática, o Governo e o partido vêm promovendo.

 

Sim, porque apesar de estar afirmado na nota que se busca "um novo modelo de gestão pública onde a transparência e a participação popular sejam estimuladas e garantidas na busca do aprimoramento dos gastos públicos", a realidade revela todo um empenho do Governo, com inconfessáveis trocas de favores, para impedir a realização da CPI que investigaria o caso. Com isso, os gastos públicos, longe de serem aprimorados, são desviados de sua real finalidade de realização do interesse público para atender os interesses daqueles com quem o Governo se comprometeu, num jogo de gastos sem qualquer lógica a não ser a do mais esperto, dotado de maior aptidão para "negociatas". Isso sem contar, evidentemente, com a completa ausência de transparência em tais gastos e com a impossibilidade de participação popular no processo de controle.

 

Mas não só. Se o argumento para não instaurar a CPI era uma possível perda de governabilidade, já que a investigação poderia virar palco de falsas acusações e chantagens, observa-se que o grande medo do Governo de que tal CPI fosse instalada já propiciou, por si só, a montagem desse palco tão temido, em grande espetáculo.

 

Ademais, de que modo, ao assim agir, o Governo pretende, como anunciado na nota, manter seu patrimônio ético? Ética é antes de tudo coerência com os próprios atos e ideais. E, até pouco tempo, o PT era um dos partidos mais interessado em instaurar CPI's para investigar possíveis casos de corrupção na política.

 

Se, por outro lado, os atuais membros do Governo não têm maiores envolvimentos com Waldomiro Diniz, que se trataria apenas, como afirmado na nota, de assessor que agiu por conta própria, seria melhor a realização da CPI, porque tal ausência de relação seria, desde logo, demonstrada. Se, ao revés, esse envolvimento houver efetivamente ocorrido, e tendo em vista que a maior preocupação do Governo é manter seu patrimônio ético, também nesse caso, não existiriam motivos para a não realização da CPI. Afinal, reconhecer erros e procurar superá-los é ato extremamente ético.

 

Por fim, não se pode admitir que o Partido queira manter íntegro seu patrimônio ético, já que, ao mesmo tempo em que se esquiva de ser investigado, prega o controle externo do Poder Judiciário e do Ministério Público, o que inclusive reforça expressamente na citada "nota à sociedade". Ora, aplicar dois pesos e duas medidas para resolver situações semelhantes (acusações de desvio de poder), longe de ser ético, é rigorosamente imoral.

 

No presente momento, portanto, se o Governo e o Partido querem assegurar a integridade moral de seu patrimônio, devem, antes de tudo, parar de fazer jogo político a fim de impedir a realização da CPI e manter uma postura coerente com as idéias políticas sustentadas até a assunção do poder e, ainda, com os demais Poderes e órgãos que acusa e pretende investigar.

 

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Advogada e membro do Instituto Cearense de Estudos Tributários

 

 

 

 

 

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"Em defesa do patrimônio ético do PT

 

1. Desde sua fundação, o Partido dos Trabalhadores tem se destacado no cenário político nacional pela firmeza com que atua na luta em defesa dos direitos sociais e pela afirmação de uma cidadania plena para todos os brasileiros. Ao longo destes 24 anos, nosso partido construiu um sólido patrimônio por dedicar-se em especial à construção de um novo patamar político onde a ética e a moralidade no trato da coisa pública sejam princípios basilares das instituições brasileiras. A atuação do partido à frente das centenas de administrações públicas nos mais variados níveis de poder comprova nossa orientação de construir um novo modelo de gestão pública onde a transparência e a participação popular sejam estimuladas e garantidas na busca do aprimoramento dos gastos públicos.

2. A partir de um fato real e condenável sob todos os aspectos, ocorrido em 2002 o caso Waldomiro Diniz o PT, o companheiro Zé Dirceu, dirigentes do partido e o governo Lula se tornaram alvos de uma campanha sistemática, orquestrada por setores da oposição e da mídia, visando desconstituir o capital ético e político do PT e enfraquecer o governo. Essa campanha se traduz através de uma onda de denúncias vazias, de boatos infundados e de insinuações incomprovadas, por isso inaceitável. O principal objetivo destes setores da oposição, ao atacarem o governo e o PT, é encontrar atalhos fáceis para o êxito eleitoral nas próximas eleições. Na verdade, o que estamos presenciando é a precipitação da disputa eleitoral de 2004. Para conseguir mais votos, os partidos oposicionistas tentam tirar proveito do momento político para macular a imagem do PT no campo da moral e da ética, justamente onde, reconhecidamente, estamos credenciados por uma longa trajetória de combate sem trégua à corrupção. O PT entende que as eleições municipais deste ano são estratégicas e por isso conclama seus militantes e filiados para este enfrentamento.

 

3. O governo Lula agiu de forma rápida demitindo Waldomiro Diniz e adotando todas as medidas para que os fatos sejam investigados e esclarecidos com a transparência que a opinião pública exige e merece. O governo do PT encaminhou o caso para investigação pela Polícia Federal e para o Ministério Público, além de abrir uma sindicância interna para averiguar os atos do ex-assessor. Como em outras ocasiões, onde nos encontramos diante de irregularidades no trato da coisa pública, não iremos tergiversar ante o interesse maior de defender uma conduta adequada e proba para todos os que ocupam postos no aparato estatal. O que não aceitamos é ficar passivos frente à campanha sistemática e orquestrada por setores da oposição e da mídia que pretendem atingir o PT e o governo Lula, usando para tanto os desvios de conduta de um indivíduo que nunca foi filiado ao partido.

 

4. O episódio deve servir para valorizarmos ainda mais o nosso rigor ético, no sentido de que ele deve servir sempre de critério para as nossas atitudes e ações. Este rigor deve nos levar a ter também mais cuidado na escolha de assessores, até para que não tenhamos de responder por atitudes que não são as nossas. Por isso, coerentes com a resolução do Diretório Nacional, aprovada em dezembro último, que adverte o governo e o próprio Partido sobre os perigos implícitos da corrupção e de possíveis desvios de procedimento no exercício do poder, reiteramos para que todos os petistas mantenham vigilância. Estamos seguros que do ponto de vista político, moral ou jurídico nosso partido não tem nada a temer. Consideramos inaceitável e repudiamos qualquer tentativa de manipular os fatos com a torpe finalidade de transferir os desvios de conduta de um indivíduo, para o governo, o Ministro José Dirceu e o PT. É público o compromisso do PT por uma profunda reforma política, com financiamento público de campanha e fidelidade partidária. Lutamos pela sua viabilização como uma das nossas prioridades. Assim como lutamos pela reforma com controle externo da administração do Poder Judiciário e do Ministério Público, tendo como um dos objetivos exatamente maior eficiência no combate à corrupção.

 

5. O PT, coerente com o mandato e a determinação que recebeu povo, defenderá o governo Lula lutando para realizar os compromissos assumidos na campanha: promover o desenvolvimento econômico e social com geração de emprego e distribuição de renda, aprofundar o caráter democrático das instituições políticas e das relações sociais promovendo a justiça e a equidade e patrocinar a inserção soberana do Brasil no contexto das relações internacionais. O PT é o partido do crescimento econômico, da distribuição de renda, da geração de emprego e da inclusão social. Vamos trabalhar com afinco para que o governo implemente as medidas necessárias para que 2004 marque o início de um novo e sustentado ciclo de desenvolvimento econômico e social do país, através de mudanças na política econômica necessárias à implantação e consolidação de todos os nossos programas sociais, econômicos e administrativos e de desenvolvimento, visando sempre conquistar melhores condições de vida para todos os brasileiros, enfrentando com eficiência os problemas conjunturais e estruturais que afetam nosso país e nosso povo.

 

6. Finalizando, conclamamos todos os filiados e militantes do Partido para que defendam nosso patrimônio ético e político. Os dirigentes, militantes e simpatizantes do Partido devem ter noção das dificuldades e das resistências que o governo Lula, o PT e seus aliados enfrentarão para mudar o Brasil. As mudanças não virão sem lutas e sem batalhas. Devemos estar preparados para enfrentá-las. Os cenários desses embates assumirão várias configurações. No cenário atual, os opositores das mudanças visam macular o patrimônio ético do PT. Ele é um patrimônio público, da sociedade brasileira, constituído pelas suas lutas. Por isso, o PT deve se orgulhar de sua história. Somos um Partido constituído por milhares de pessoas que dedicaram parte de suas vidas para defender aquilo que acreditaram e acreditam ser o bem do povo. Dedicaram parte de suas vidas para construir um Brasil melhor. As renúncias, sacrifícios e conquistas de milhares de militantes e simpatizantes e as esperanças do povo brasileiro nos alimentam nesta caminhada.

 

São Paulo, 05 de março de 2004."

 

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