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Mordomo tenta reconhecer vínculo empregatício

Da Redação

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Atualizado às 08:53


Acórdão

Mordomo tenta reconhecer vínculo empregatício com a empresa do patrão. Veja abaixo na íntegra o acórdão.

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PROCESSO TRT/SP nº 03044.2003.044.02.00-6

RECURSO ORDINÁRIO

ORIGEM: 44 ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO

RECORRENTES: MONTEPINO LTDA.

JOÃO BATISTA PEREIRA DOS SANTOS

Inconformados com a r. sentença de origem cujo relatório adoto e que julgou procedente em parte o pedido, complementada pela r. decisão de embargos de declaração, recorrem ordinariamente as partes. A reclamada pretendendo a reforma do julgado para que seja reconhecida a condição de empregado doméstico do reclamante e absolvida da condenação em horas extras e demais verbas que constam da sentença e o reclamante pretendendo a condenação da reclamada em horas extras decorrentes de trabalho no intervalo entre jornadas inferior a 11 horas. Contra razões vieram aos autos.

É o relatório.

V O T O

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interpostos pelas partes. Quanto ao depósito recursal e recolhimento de custas por cada uma das duas reclamadas, correto o procedimento adotado pelas reclamadas vez que o segundo reclamado, pessoa física, pugna por sua exclusão da lide.

RECURSO DA RECLAMADA

A preliminar de ilegitimidade de parte deve ser apreciada em conjunto com o mérito da ação e a argüição de prescrição se subordina à eventual confirmação de procedência do reconhecimento do vínculo e será apreciada ao final, se for o caso.

Mantém-se a r. sentença de origem que afastou as preliminares de extinção do feito por ausência de comprovação de pagamento das custas processuais em ação anterior, vez que em caso de ausência de quitação certamente o autor está sendo executado quanto a elas e de prevenção, vez que na Justiça do Trabalho não vige a exigência do juiz natural.

Rejeita-se a argüição de extinção do feito em face da aplicação da Súmula 330 do C. TST vez que em sua atual redação a quitação outorgada na rescisão somente atinge as verbas e valores discriminados no termos de rescisão, sendo que nos presentes autos são pleiteados títulos diversos dos que constam nesse documento.

Do vínculo empregatício com a empresa Montepino

Discute-se nos autos se o reclamante foi empregado doméstico, tendo exercido a função de mordomo do segundo reclamado, como alegado nas defesas das reclamadas ou se ele esteve a serviço da empresa, primeira reclamada, tendo sido anotada a função de empregado doméstico em fraude à lei.

A r. sentença de origem adotou as razões da petição inicial e condenou as reclamadas solidariamente no pagamento de horas extras, adicional noturno e FGTS.

Ocorre que o reexame da prova, "data venia" nos leva a concluir em sentido contrário. Vejamos:

O reclamante, em seu depoimento pessoal afirmou que trabalhava na residência do segundo reclamado (Sr. Alfredo Dannenberg) e também no escritório da primeira reclamada ( Montepino Ltda.) sendo que neste local, como copeiro, servia almoços em reuniões e fazia compras de produtos alimentícios de três a quatro vezes por semana.

A alegação de que realizava compras de alimentos para esse escritório foge completamente dos limites da lide, vez que não há alegação nesse sentido na petição inicial e o fato não foi confirmado pela única testemunha ouvida, trazida pelo próprio autor, nem reconhecido pela preposta ou nas contestações, de forma que não produz nenhum efeito nos autos.

Além disso, verifica-se no documento de fl. 55, contrato social da empresa Monte Carmelo, que o escritório da Av. Brig. Faria Lima, mencionado pelo reclamante não pertence à empresa reclamada Montepino mas à essa outra empresa, também de propriedade do segundo reclamado, Sr. Alfredo Dannemberg, como alegado na defesa, de forma que o fato do reclamante lá comparecer não implica em nenhuma responsabilidade da primeira reclamada nem de existência de vínculo com ela. Mas ainda que assim não fosse, a testemunha do reclamante esclareceu exatamente o que o reclamante fazia nessas ocasiões: ele acompanhava o Sr. Alfredo Dannemberg, pessoa de 86 anos, como se verifica na preposição de fl. 21 a esse local e lhe servia o almoço, assim como às pessoas que eventualmente estivessem com ele, tendo também esclarecido essa testemunha que o próprio Sr. Alfredo comparecia ao escritório da Av. Brig. Faria Lima uma vez por semana. Essa atividade portanto se encontra inserida dentre as atividades normais de um mordomo, no acompanhamento pessoal de seu empregador, sem que isso implique na prestação de serviços à empresa.

O reclamante declarou ainda que prestava serviços para a primeira reclamada recebendo, na residência do segundo reclamado, Sr. Alfredo Dannemberg, telefonemas, fax e recebendo clientes da empresa. Esse fato foi confirmado pela testemunha, que declarou expressamente que o reclamante exercia a função de mordomo e que Sr. Alfredo trabalhava em casa. Ora, se o reclamante era mordomo fazia parte de suas atribuições, na residência, o atendimento da porta, fosse qual fosse a visita, não existindo diferença para ele entre uma visita social e um cliente da empresa, que deveriam ser recebidos com a mesma civilidade e encaminhados para a pessoa de seu empregador. O mesmo ocorre com os telefonemas e faz, que deveriam todos ser recebidos pelo reclamante, não importando se fossem de caráter particular ou de trabalho, posto que o trabalho do mordomo é justamente o atendimento as pessoas que procuram os moradores da casa e a organização dos serviços domésticos.

Finalmente, o reclamante ao afirmar que recebia salários da empresa Montepino reconheceu como exemplo de seus recibos de pagamento o documento 60 acostado à defesa, que se trata de recibo emitido pela pessoa física do segundo reclamado, o que também invalida o depoimento da testemunha nesse sentido.

Também quando se examina o depoimento da preposta não se encontra a confissão mencionada na sentença, com exceção ao horário de trabalho.

A preposta negou tenha o reclamante trabalhado para a empresa Montepino, confirmou que o Sr. Alfredo Dannemberg comparecia no escritório da empresa Monte Carmelo, na Av. Brig. Faria Lima uma vez por semana e nessas ocasiões não trabalhava para a Montepino, que não sabe se o reclamante o acompanhava nessas ocasiões, afirmou que o reclamante era mordomo e residia na casa do Sr. Alfredo. Esse depoimento se afigura coerente com as defesas, com o próprio depoimento do reclamante, como visto acima e com o depoimento da testemunha.

Finalmente, temos que a testemunha, além das declarações já examinadas afirmou que o reclamante comprava flores no Ceasa par deixá-las no escritório, que o veículo com que ela própria trabalhava era de propriedade da primeira reclamada e que o reclamante pagava as peças de manutenção desse veículo com o dinheiro da empresa mas não soube dizer como teve essa informação.

Quanto às flores, trata-se de atividade típica de um mordomo, presumindo-se, pelo teor do depoimento, que a testemunha se referiu ao escritório que o segundo reclamado mantém em sua residência e quanto ao veículo, o fato de ser de propriedade da empresa nada altera o deslinde da matéria posta em juízo, sendo que a questão do pagamento também não se constitui em prova vez que a testemunha não sobre precisar a origem da informação.

Por todos esses elementos se conclui que na verdade o reclamante nunca prestou serviços para a primeira reclamada, empresa Montepino Ltda., mas foi empregado doméstico do Sr. Alfredo Dannemberg, estando correta a anotação que consta em sua CTPS, razão pela qual não tem direito ao recebimento de horas extras, adicional noturno e FGTS. A ação é improcedente.

Prejudicado o recurso do reclamante que pretendia a ampliação da condenação em horas extras.

Ante o exposto, REJEITO as preliminares argüidas no recurso das reclamadas e no mérito DOU-LHE PROVIMENTO para julgar a ação improcedente. Custas pelo reclamante, em reversão, calculadas sobre o valor dado à causa, de R$ 10.000,00, no valor de R$ 200,00, das quais é declarado isento.

Silvana Abramo Margherito Ariano

Juíza Relatora

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