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ATA NOTARIAL e a sua eficácia na produção de provas com fé pública do tabelião no ambiente físico

O conceito talvez mais completo de ata notarial seja o formulado por José Antonio Escartin Ipiens. Para ele, a ata notarial é o instrumento público autorizado por notário competente, a requerimento de uma pessoa com interesse legítimo e que, fundamentada nos princípios da função imparcial e independente, pública e responsável, tem por objeto constatar a realidade ou verdade de um fato que o notário vê, ouve ou percebe por seus sentidos, cuja finalidade precípua é a de ser um instrumento de prova em processo judicial, mas que pode ter outros fins na esfera privada, administrativa, registral, e, inclusive, integradores de uma atuação jurídica não negocial ou de um processo negocial complexo, para sua preparação, constatação ou execução.

sexta-feira, 29 de julho de 2005

Atualizado em 13 de julho de 2005 14:47


ATA NOTARIAL e a sua eficácia na produção de provas com fé pública do tabelião no ambiente físico e eletrônico

Felipe Leonardo Rodrigues*

I - Ata Notarial

O conceito talvez mais completo de ata notarial seja o formulado por José Antonio Escartin Ipiens. Para ele, a ata notarial é o instrumento público autorizado por notário competente, a requerimento de uma pessoa com interesse legítimo e que, fundamentada nos princípios da função imparcial e independente, pública e responsável, tem por objeto constatar a realidade ou verdade de um fato que o notário vê, ouve ou percebe por seus sentidos, cuja finalidade precípua é a de ser um instrumento de prova em processo judicial, mas que pode ter outros fins na esfera privada, administrativa, registral, e, inclusive, integradores de uma atuação jurídica não negocial ou de um processo negocial complexo, para sua preparação, constatação ou execução.

O instrumento em tela é pouco conhecido e utilizado pelos operadores do direito e clientes mais habituados aos serviços notariais, prevista em legislação infraconstitucional, a normatização se deu primeiramente no Rio Grande do Sul, através de provimentos da Corregedoria Geral de Justiça, em 1990. E a partir de 1994, passou a integrar o capítulo II, seção II, da Lei Federal 8.935, que rege as atividades dos notários e registradores, atribuindo ao notário a exclusividade de lavratura da ata notarial.

II - Escritura Pública x Ata Notarial

As comparações entre escritura pública e ata notarial são inevitáveis; naquela, o tabelião é responsável pela elaboração de um documento contendo a manifestação de vontade, constituindo um negócio jurídico. Na ata notarial, o tabelião faz a narrativa dos fatos ou a materialização de algo em forma narrativa do que presencia ou presenciou, vendo e ouvindo com seus próprios sentidos e lavrando um documento qualificado com a mesma força probante da escritura pública e fé pública inerente do tabelião.

É de ressaltar que o tabelião, na elaboração da ata notarial, deverá cumprir a objetividade dos fatos, vedada sua apreciação ou emissão de opinião pessoal a respeito dos fatos presenciados.

III - Uso equivocado da ata notarial para retificação de erros essenciais e evidenciais na escritura pública

Tenho lido alguns pareceres a respeito da ata notarial no sentido de que seja o remédio para suprir erros na escritura pública.

Dizem que a ata notarial seria o remédio, pois supriria erros evidenciais na escritura pública, devido sua força probante, e também de certificar fatos. A nosso ver, esta exposição não é feliz, há meios específicos para a retificação da escritura pública. Na eventualidade de erros essenciais (como ex: o preço, o objeto e a manifestação de vontade) se fará à escritura pública de retificação e ratificação, onde se chamará às partes para assinarem a devida escritura. Quanto aos erros evidentes, será lavrada a escritura de aditamento retificativo, sem o chamamento das partes.

Assim, a escritura pública só poderá ser retificada ou ratificada por outra escritura pública. Desejamos que estes pareceres não se disseminem, pois seria perigo para o instituto em tela.

IV - Ata Notarial como meio de prova

Como expõe Alberto Bittencourt Cotrim Netto, em trabalho publicado nos Anais do 3º Congresso Notarial Brasileiro, em 1974, citando a lição de Oscar Vallejo Yañez (2), que trata da ata notarial e explica a natureza do poder notarial certificante, destacando-se o seguinte trecho: "O poder certificante do notário é uma faculdade que a lei lhe dá para, com sua intervenção, evitar o desaparecimento de um fato antes que as partes o possam utilizar em proveito de suas expectativas. A fé pública é, em todo o momento do negócio jurídico, o caminho mais efetivo para a evidência (...). Tudo se reduz à intervenção notarial que, com sua presença ou sua atuação, soleniza, formaliza e dá eficácia jurídica ao que ele manifesta ou exterioriza no instrumento público, seja este escriturado ou não. Isto se relaciona, também, com o poder certificante do notário, o que permite às partes em forma voluntária, escolher a forma e o modo de resolver seus negócios (...); neste caso, como afirma Gatán, a função notarial pode considerar-se como jurisdicional. O notário, dentro de sua ampla gama de faculdades, logrará, com sua intervenção, estabelecer a prova pré-constituída, que há de servir de pauta legal, no momento em que seja necessário solicitá-la".

O mesmo autor peruano (3), quando menciona a natureza da ata notarial, afirma que, quando o notário "constata, verifica, escuta, vê, observa", salva futuros vazios e fotografa a verdade, constituindo, sua afirmação traduzida em um papel, um documento público perfeito: "Quero dar a maior importância às atas notariais, como instrumento público em sua mais alta validez; têm mais simplicidade que o instrumento formal, vale como a escritura propriamente dita, e há de servir em juízo, na oportunidade de se estabelecerem os direitos, de se abreviarem procedimentos de peritagem, e de outros trâmites relacionados com as pretensões de quem tem o justo direito, muitas vezes, aliás, turvado no seu aspecto de verdade. As atas notariais, conforme o direito espanhol tem por objeto a comprovação e fixação de fatos notórios, sobre os quais poderão ser fundados e declarados direitos e qualidades com transcendência jurídica".

V - Ata Notarial como meio de prova no ambiente eletrônico

Com o avanço da tecnologia e o crescimento da internet, há uma enorme quantidade de documentos e contratos realizados por via digital. Quando houver necessidade de comprovar a integridade e veracidade destes documentos, ou atribuir autenticidade, os operadores do direito e a sociedade poderão se valer da ata notarial. Vejamos alguns casos:

- Pré constitui prova sobre páginas eletrônicas ou outros documentos eletrônicos

- Fixa a data e existência do arquivo eletrônico

- Prova de fatos caluniosos

- Prova de fatos contendo injurias e difamações

- Prova de fatos contendo uso indevido de imagens, textos e logótipos

- Prova de infração ao direito autoral, entre outros

A ata notarial de verificação de fatos na rede de comunicação de computadores internet é um instrumento desconhecido pela maioria dos operadores do direito. Nela, o tabelião ou preposto relata os fatos que presenciou, comprovando a existência e todo o conteúdo do site ou página da internet, arquivando os endereços (www) acessados e imprimindo as imagens no próprio instrumento notarial, a pedido da parte.

A ata notarial é um excelente instrumento como meio de prova, pois contém a segurança inerente da fé pública notarial. Também opera como prevenção de litígios futuros - essa é sua essência.

Casos exemplares não faltam. Num dos primeiros, um cliente necessitando da conversão do conteúdo digital para o meio físico de um determinado sítio (página ou site), onde havia filmes de sua autoria, utilizado sem sua devida autorização, pediu a materialização do conteúdo digital em forma transcrita no instrumento público. Mais tarde soubemos pelo cliente que a ata notarial foi um excelente instrumento para prova de seu direito, sendo muito bem aceito pelo judiciário.

A ata notarial, cujo objeto é a verificação de um site ou página da rede comunicação de computadores Internet pelo tabelião com transcrição do conteúdo, é prova evidente de sua existência.

VI - Lavratura da Ata Notarial "de ofício" (sem solicitação da parte)

A nosso ver, seria possível somente nos interesses coletivos - são aqueles que concernem às coisas de uso comum da sociedade (res communis omnium) e aos bens fora do comércio, como o meio ambiente, ecologia, a flora, e a fauna, o ar atmosférico, o patrimônio histórico e artístico da comunidade, proteção ao direito do consumidor, a honestidade da propaganda comercial e dos medicamentos (4). Também há a possibilidade de lavratura da ata notarial por desistência do solicitante, nos fatos de extrema relevância à sociedade.

VII - Valor legal da Ata Notarial no ordenamento jurídico brasileiro

Como vimos acima, a ata notarial se presta para materialização de algo com intuito de resguardar o direito do detentor na sua mais alta validez. Apesar de sua enorme força probante, são poucos os operadores do direito que se utilizam desta ferramenta poderosa. Dispõe, com efeito, o art. 6º e 7º da Lei Federal 8935/94, com o manto do art. 236 da Constituição Federal, dispõe, verbis:

Art. 6º Aos notários compete:

.
..

II - intervir nos atos e negócios jurídicos a que as partes devam ou queiram dar forma legal ou autenticidade, autorizando a redação ou redigindo os instrumentos adequados, conservando os originais e expedindo cópias fidedignas de seu conteúdo;
III - autenticar fatos.

Art. 7º Aos tabeliães de notas compete com exclusividade:
I - lavrar escrituras e procurações, públicas;
II - lavrar testamentos públicos e aprovar os cerrados;
III - lavrar atas notariais;

...

Da mesma forma, implicitamente, antes da promulgação da Lei 8.935/94 o art. 364 do Código de Processo Civil Brasileiro, já autorizava sua lavratura. O qual aduz que o documento público faz prova não só da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão ou o tabelião, ou o funcionário (escrevente autorizado) declarar que ocorreram em sua presença. (grifo nosso).

VIII - Os limites da Ata Notarial

No tocante aos limites da ata notarial, se dá apenas pela competência territorial e atribuições de outros delegados pelo poder público (como ex: ata de protesto de títulos, atribuída ao tabelião de protesto). No remanescente, o instrumento pode ser usado irrestritamente, até mesmo em fatos ilícitos (exceto nos crimes penais, tais como: homicídios, estelionatos, lesões corporais ect), pois o papel primordial da ata notarial é materializar o fato e, se o fato é ilícito, será transcrito como foi presenciado pelo tabelião e, a toda evidência, não poderá contribuir para propagar o fato ilícito.

IX - Modalidades de Atas Notariais

Dentre as diversas modalidades, vejamos somente algumas:

ATA NOTARIAL

Objeto: presença e declaração.

Neste instrumento o tabelião narrará fielmente em linguagem jurídica a declaração do interessado. Essas declarações são aquelas puras e simples que atingem direitos próprios (sentido de se manifestar, fazer valer o direito). Exemplo prático seria quando o consulado exige o instrumento público (escrituras, atas notariais e procurações) para satisfazer a exigência de determinada norma interna. Nesta ata, a declaração poderá ser absolutamente só ou com testemunhas. Alguns cartórios denominam este instrumento como "Escritura Pública de Declaração" ou "Escritura de Declaração" denominações equivocadas, pois, a declaração é simples fato narrativo sem o intuito do "negócio jurídico".

ATA NOTARIAL

Objeto: verificação de fatos na rede de comunicação de computadores Internet.

Nesta modalidade o tabelião acessa o endereço (www) e verifica o conteúdo de um determinado sítio (página ou site) materializando tudo aquilo presenciou e certificando não só o conteúdo existente, mas também a data e horário de acesso; à imagem da página acessada poderá a pedido do solicitante ser impressa no próprio instrumento notarial.

ATA NOTARIAL

Objeto: verificação de fatos em diligência.

Há diversas hipóteses, dentre as quais destacamos duas: a primeira hipótese seria quando o interessado solicita ao tabelião que em diligência respeitando a área de competência territorial presencia e verifica um fato em alguma parte da cidade. A segunda seria quando o interessado solicita ao tabelião que presencie e verifique um diálogo telefônico que o mesmo fará a um determinado número telefônico e em sistema viva-voz, o qual será transcrito fielmente para o instrumento notarial.

ATA NOTARIAL

Objeto: notoriedade.

O interessado solicita ao tabelião que verifique a existência e a capacidade de determinada pessoa; desta forma, o tabelião atestará que reconhece a pessoa e, que esta aparenta boas condições físicas e mentais, tendo ela declarado a ele, ora tabelião que não se encontra interdita ou em processo para tanto, o que a capacita para todos os atos da vida civil, conforme a lei brasileira.

X - conclusão

Expomos neste modesto artigo que a ata notarial é um importante instrumento público que deve ser amplamente divulgado entre os operadores do direito e a sociedade, de modo a se tornar útil no sistema jurídico brasileiro, possibilitando o uso da força probante como importante aliado para resguardar direitos futuros.

Estas informações visam, contribuir e apresentar aos operadores do direito e usuários a necessidade de promover mais discussões, palestras, seminários sobre o assunto, interagindo os Tabelionatos, através dos seus órgãos representativos, a sociedade civil, com participação dos profissionais da área jurídica (Magistratura, Ordem dos Advogados do Brasil, entre outros) de modo a apresentar os benefícios deste instrumento notarial em prol de toda a sociedade.

Referências Bibliográficas

El Acta Notarial de Presencia en el Proceso. Revista del Notariado nº 399, p. 176 apud Tratado de Derecho Notarial, Registral e Inmobiliario, Cristina Noemí Armela, p. 957.

Revista Notarial, vol. 808, 1973, p. 639 e ss. Órgão do Colégio de Escrivães da Província de Buenos Aires. In Anais do 3º Congresso Notaria Brasileiro, p. 69 e ss.

Anais do 3º Congresso Notarial Brasileiro, p. 70.

Resumo de Processo Civil, Maximilianus Cláudio Américo Führer, p. 75.
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*Escrevente





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