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O advogado e seu ofício

Francisco de Assis Leite Campos

Para enaltecer o ofício do advogado, o causídico vale-se do exemplo de grandes expoentes brasileiros na profissão como Rui Barbosa e Heráclito Fontoura Sobral Pinto.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Atualizado em 6 de outubro de 2011 12:09

Francisco de Assis Leite Campos

O advogado e seu ofício

A advocacia, nobre e não raro incompreendido ofício, remonta aos primórdios da história. Péricles, político ateniense (495-429 a.C.), teria sido, segundo alguns, o primeiro advogado. Outros afirmam que foi Antifonte, orador ateniense no período de 479-411 a.C. Quando se fala de grandes oradores, entre gregos e romanos, não se pode deixar de referir Cícero (Marcus Tullius Cícero), uma das grandes inteligências da Roma antiga. Dele se pode dizer que, além de um orador extraordinário, foi o introdutor, em Roma, da escola filosófica grega, sendo mais um dos precursores da advocacia.

Na Roma antiga, existia a figura dos "Advocati". Os litígios eram resolvidos ante o Senado ou na presença do Imperador. Nestes casos, surgiram os primeiros grandes oradores, quando a fala tinha que ecoar, quase que a fazer tremer as paredes dos palácios, sem microfones ou equipamentos para ampliar a voz.

Sabemos todos que as origens da advocacia vêm de longe, com uma fantástica história e oradores que marcaram época. Em nosso país, nos dias de hoje, existem inúmeros advogados de alto nível, que atuam em todos os Tribunais do país, produzindo defesas brilhantes e proporcionando momentos únicos.

Certamente o maior expoente em nosso país foi o baiano Rui Barbosa, que enalteceu e honrou, como poucos, nossa árdua, porém sublime, profissão. Dono de grande inteligência, além de destemido, sagaz e eloquente, dominava a língua portuguesa e se manifestava, com profundidade, em outros idiomas.

Outro grande e inesquecível advogado - ofício que fazia questão de reafirmar -, também de bravura sem igual, foi Heráclito Fontoura Sobral Pinto. Intransigente na defesa da liberdade e dos ideais democráticos, chegou certa vez a invocar a aplicação da Lei de Proteção aos Animais em defesa de um constituinte, ninguém menos do que Luis Carlos Prestes, marxista e ateu, com posições político-ideológicas inteiramente opostas às suas.

Incondicional defensor dos direitos humanos, Sobral Pinto iniciou sua carreira como advogado na área do Direito Privado e acabou se notabilizando um brilhante criminalista quando, apesar de católico fervoroso, aceitou defender o líder comunista, preso após o que se convencionou chamar de "intentona", em 1935.

Em reconhecimento à sua irrepreensível atuação profissional, foi convidado pelo então presidente Juscelino Kubitschek, de quem foi advogado, a ocupar uma cadeira no STF. Recusou a honraria em respeito à ética, conduta que foi característica em sua longa vida.

A correção do velho Sobral ainda se mostraria num outro episódio, revelado pelo notável Técio Lins e Silva, exemplo vivo de advogado e de homem público, que acumulou, entre os anos de 1987 e 1990, os cargos de Secretário de Estado de Justiça e de Procurador Geral da Defensoria Pública.

À época, Sobral passava necessidades, pois não sabia nem queria cobrar pelo trabalho que desenvolvia. Já estava idoso e com a capacidade de trabalho e clientela muito reduzidas. Técio, com sua inigualável sensibilidade e em justa gratidão a tudo quanto aquele velho advogado havia feito ao longo de sua vida, imaginou então conceder-lhe, por lei estadual, o honroso título de Defensor Público Honorário, com os proventos da carreira que estava sendo implantada, após a EC que transformou a Defensoria Pública em Secretaria de Estado, com vida e chefia próprias.

Quando Sobral foi informado do projeto ficou indignado. Afirmou que não aceitaria a honraria nem receberia dinheiro dos cofres públicos por não merecer o benefício. Morreu pobre.

No tempo da ditadura militar, oficiou junto aos Juízos e Tribunais um verdadeiro "escrete" de causídicos, como costumava dizer o professor Heleno Cláudio Fragoso, com quem tivemos o prazer e a honra de trabalhar.

Os tempos mudaram, contudo. Nos dias atuais, além de enfrentarem a incompreensão de alguns, que não alcançam a grandeza da dimensão da atividade, os advogados são vistos como espécie de "estorvo" por alguns juízes e representantes do Ministério Público. Tais profissionais, em especial os mais inexperientes, não enxergam nos advogados o respeito que merecem.

No dia a dia, audiências são marcadas de cambulhada, o que leva ao inevitável atraso, desrespeitando-se, consequentemente, os compromissos profissionais dos advogados e de seus constituintes, os quais, muitas vezes, aguardam por horas nos corredores do fórum o início das assentadas.

Infelizmente, hoje em dia, parece existir uma separação entre os profissionais do Direito, esquecendo-se alguns que são todos auxiliares na administração da Justiça, por expressa dicção constitucional.

No específico caso dos advogados, a formação dos profissionais se abastardou, com a descontrolada multiplicação das faculdades, que produzem bacharéis sem a mínima condição de ingressar no mercado de trabalho.

Mas, apesar dos exames de Ordem, fundamental é a vocação, uma vez que não basta ser brilhante na faculdade, com boas notas, mas sem o coração e a alma voltados à causa da Justiça, principalmente aos que pretendem se dedicar à advocacia criminal, que lida com a liberdade, bem maior de qualquer pessoa. Além de preparo técnico, nos parece fundamental que o advogado criminal seja, como Rui, Sobral, Heleno e tantos outros, um humanista.

Por isso, a cada 11 de agosto, data que, além de marcar a criação dos cursos jurídicos no país, é também o Dia do Advogado, devemos enaltecer este ofício tão nobre, que há de ser sempre exercido em perfeita harmonia com a ética e é tão essencial a todos aqueles que anseiam por Justiça.

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*Francisco de Assis Leite Campos é advogado do escritório Nelio Machado, Maronna, Stein e Mendes Advogados

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