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O papel e a lei 11.419

As placas de argila, os ossos, metais, as pedras, peles, o papiro, pergaminho e o papel serviram ao homem letrado, em tempos diferentes, para registrar suas memórias.

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

Atualizado em 15 de fevereiro de 2007 15:17


O papel e a lei 11.419

Antonio Pessoa Cardoso*

As placas de argila, os ossos, metais, as pedras, peles, o papiro, pergaminho e o papel serviram ao homem letrado, em tempos diferentes, para registrar suas memórias.

A carta de Pero Vaz de Caminha, em 1500, comunicando o descobrimento, marca a presença, pela primeira vez, do papel no Brasil; a fabricação do produto, entretanto, só aconteceu, em novembro de 1809, no Rio de Janeiro. Em 1848 aparece, na Bahia, a primeira fábrica que utilizava a fibra da bananeira como matéria prima do papel.

O uso do papel nos tempos atuais é tão abundante que passa a representar danos ao meio ambiente, face à necessidade da destruição de árvores para sua fabricação; sabe-se que cada tonelada de papel implica na demolição de quinze árvores, além da utilização de 100 mil litros de água.

A era do computador ainda não desestabilizou o reinado do papel, nem diminuiu seu consumo, mas, ao revés, aumentou, apesar da jovialidade da máquina pensante que começou a ocupar espaço em nosso meio na década de noventa.

O sistema judicial inicia nova fase, com a substituição do papel pela petição eletrônica, pela comunicação on line e pela informatização do processo; contribui com o meio ambiente, retira o cordão, o carbono e os clipes dos cartórios; imprime celeridade e eficiência aos serviços.

O Projeto de Lei n. 5.282/01 de autoria da Associação dos Juizes Federais percorreu longo caminho até tornar-se a Lei 11.419 de 19 de dezembro de 2006 (clique aqui). Recebeu no Senado sugestões importantes, a exemplo do Diário da Justiça eletrônico ou da citação e intimação encampada pela norma. A Lei 9.800/99 (clique aqui), que previa a utilização de sistemas de transmissão de dados para a prática de atos processuais, além de outras alterações ao CPC, deu início, ainda que timidamente, à informatização do Judiciário.

A Lei 11.419/06 que entrará em vigor no próximo mês de março permite ao Judiciário chegar ao século XXI, com nova roupagem ao conferir legalidade à Justiça sem Papel, substituindo os autos do processo, composto por uma catedral de papel, pelos autos eletrônicos, formados por um kit de informações, arquivados em CD, disco, etc.

Em outra oportunidade, já dissemos que a Justiça virtual além de trocar o papel pelo armazenamento dos autos em meio digital, evita uma série de derivações causadoras de morosidade na Justiça. É o caso da carga dos processos pelos advogados ou do extravio de documentos e dos próprios autos que reclamam procedimento especial para restauração.

A nova sistemática acaba com os arquivos, onde mofam os autos, democratiza o acesso à Justiça e facilita a consulta de informações.

Lamentavelmente, para aplicação da lei, torna-se necessária regulamentação pelos Tribunais e esta medida pode atrasar com a implantação do sistema; indispensável também vontade política para maciços investimentos exigidos pela tecnologia; evidente que o retorno é altamente compensador.

O cadastramento de todos os profissionais do direito é exigência legal indispensável para funcionamento da informatização nos serviços judiciários, mas não resta dúvida de que haverá interesse da classe no credenciamento.

A lei confere faculdade aos Tribunais para a criação do Diário da Justiça eletrônico, em substituição aos diários oficiais do Poder Judiciário, responsável pelos noticiários judiciais e administrativos, mas causador de desperdício de papel, artigo 4º da Lei 11.419. A distribuição da inicial, da contestação, recursos e petições em geral poderão ser "juntadas" aos autos eletrônicos pelos próprios advogados, sem participação dos serventuários, artigo 10. Os votos, acórdãos, decisões, enfim os autos do processo poderão deixar de ser registrados no papel, passando para arquivos eletrônicos, art. 12.

A lei foi um tanto evasiva quando não impõe um sistema eletrônico único em todo o território nacional, e para todas as justiças, federal, estaduais, trabalhista e militar. Deixa a opção para cada Tribunal, possibilitando desta forma eventual manutenção dos autos originais, art. 8º ou incompatibilidades de sistemas. E mais: a permissão ou não de uso da rede mundial de computadores não se mostra adequada para enfrentar as resistências que certamente aparecerão no seio do Judiciário. O termo "preferencialmente", possibilitará, no mínimo, atraso na implantação do novo sistema.

As experiências vitoriosas da Justiça sem Papel, desenvolvidas em vários estados, constituem alívio para os descrentes da nova realidade. O espaço já não pertence ao papel, porque o computador chegou.

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*Desembargador do TJ/BA

 

 

 

 

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