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Lei nº 11 445/ 2007 - Marco regulatório do saneamento básico

Raphael de Cunto e Julia Peixoto de A. Arruda

Em 22.2.2007, entrou oficialmente em vigor a Lei nº. 11.445/2007, que estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico no Brasil ("Lei"). Após longo período de debates, a Lei veio regular um setor que, apesar da indiscutível relevância, permanecia sem regulação específica.

segunda-feira, 9 de abril de 2007

Atualizado em 5 de abril de 2007 08:17


Lei nº 11.445/2007 - Marco regulatório do saneamento básico

Raphael de Cunto*

Julia Peixoto de A. Arruda*

Introdução

Em 22.2.2007, entrou oficialmente em vigor a Lei nº. 11.445/2007 (clique aqui), que estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico no Brasil ("Lei"). Após longo período de debates, a Lei veio regular um setor que, apesar da indiscutível relevância, permanecia sem regulação específica.

Dentre os diversos setores de infra-estrutura, o saneamento básico possui características que ajudam a explicar a demora no estabelecimento de um marco regulatório, tanto no campo jurídico quanto no econômico. Para que se possa entendê-las, contudo, é interessante considerar o histórico da prestação de serviços de saneamento básico no Brasil.

Breve Histórico

A atual configuração do setor teve início na década de 1970 com a instituição do Plano Nacional de Saneamento Básico - PLANASA pelo Governo Federal. Até então, os serviços eram prestados individualmente pelos municípios. Contudo, os benefícios concedidos pelo PLANASA incentivaram a criação de companhias estaduais de saneamento básico ("CESBs"), que passaram a ser responsáveis pelos serviços de saneamento básico na maior parte do País. As CESBs tinham a possibilidade de atuar em diversas localidades, como as regiões metropolitanas, e para tanto firmaram contratos de concessão com os municípios envolvidos1.

Entretanto, a Constituição Federal de 1988 (clique aqui) trouxe dúvidas quanto à real titularidade dos serviços de saneamento básico ao atribuir aos municípios a competência para organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local2. Tal dispositivo constitucional deu origem a discussões entre municípios e estados acerca da titularidade e competência para prestação dos serviços de saneamento básico; discussão essa que passou a ser um dos maiores entraves para a aprovação de qualquer projeto de lei que almejasse tornar-se o marco regulatório do setor.

A questão da titularidade dos serviços ainda não foi decidida definitivamente e aguarda um posicionamento do Supremo Tribunal Federal - STF em ações diretas de inconstitucionalidade contra determinadas leis estaduais. Por essa razão, como se verá adiante, a Lei não tratou diretamente do assunto.

Aspectos Relevantes da Lei

Apesar da indefinição quanto à titularidade, a Lei cria as diretrizes básicas para a organização dos serviços de saneamento básico no Brasil, dentre as quais destacamos:

(a) Definição

A Lei define saneamento básico como o conjunto de serviços, infra-estruturas e instalações operacionais de3: (i) abastecimento de água potável, compreendendo desde a captação até as ligações prediais e respectivos instrumentos de medição; (ii) esgotamento sanitário, compreendendo a coleta, o transporte, o tratamento e a disposição final adequados dos esgotos sanitários, desde as ligações prediais até o seu lançamento final no meio ambiente; (iii) limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, compreendendo a coleta, o transporte, o transbordo, o tratamento e o destino final do lixo doméstico e do lixo originário da varrição e limpeza de logradouros e vias públicas; e (iv) drenagem e manejo das águas pluviais urbanas, compreendendo o transporte, a detenção ou a retenção para o amortecimento de vazões de cheias, tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas nas áreas urbanas.

Nesse ponto, a Lei sofreu críticas no sentido de que os serviços de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário (saneamento básico puro) têm características muito diferentes dos serviços de limpeza urbana e drenagem e manejo de águas pluviais (serviços acessórios ao saneamento básico), e por isso não deveriam ter sido regulados em conjunto. Dentre essas diferenças, destaca-se que os serviços de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário (ao contrário dos serviços de limpeza urbana e drenagem de águas) exigem a implantação de redes físicas complexas e de alto custo fixo, o que geralmente inviabiliza a coexistência de diferentes prestadores de serviços, e, conseqüentemente, torna os serviços menos atrativos ao investidor privado.

(b) Titularidade

Como mencionado acima, a Lei não aborda diretamente a questão da titularidade dos serviços de saneamento básico. A esse respeito, determina apenas que o titular deve prestar os serviços diretamente ou (i) delegar a organização, a regulação, a fiscalização destes a outros entes da federação através de consórcios públicos e convênios de cooperação entre os entes federados4; ou (ii) delegar a prestação destes a ente que não integre a administração do titular através de contrato, sendo vedada a disciplina mediante convênios, termos de parceria ou outros instrumentos de natureza precária5.

Vale destacar, ainda, que os serviços de saneamento básico são considerados divisíveis, razão pela qual diferentes agentes podem ser responsáveis por etapas distintas dos serviços, ressalvada, contudo, a exigência de contrato entre os agentes no caso de etapas interdependentes dos serviços.

(c) Entidade Reguladora

A Lei prevê, ainda, a criação de uma entidade reguladora, que deve editar normas sobre as dimensões técnicas, econômicas e sociais de prestação dos serviços6. A entidade reguladora deve possuir autonomia administrativa, orçamentária e financeira para que possa atuar com independência decisória e transparência.

Considerações Finais

Como visto acima, ainda há questões em aberto e um longo caminho a ser percorrido para o estabelecimento de uma política sólida para o setor do saneamento básico no Brasil. Nesse sentido, parece-nos que o principal mérito da Lei é ter enfim criado as bases para essa política e as diretrizes que deverão ser seguidas no processo de regulação do setor. Ademais, espera-se que a Lei propicie a segurança jurídica necessária para que sejam realizados novos investimentos públicos e privados nos serviços de saneamento básico.

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1Sabe-se que em alguns municípios, os contratos de concessão não chegaram a ser firmados. É o caso do Município de São Paulo, que até hoje não possui contrato formal com a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo - SABESP.

2 Art. 30, I, CF/1988

3Art. 3º, I da Lei

4Art. 8º da Lei; refere-se à Lei nº. 11.107/2005 (clique aqui), que dispõe sobre as normas gerais de contratação dos consórcios públicos.

5 Art. 10 da Lei.

6Art. 23 da Lei.

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*Advogados do escritório
Pinheiro Neto Advogados

* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.


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