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Indenizações miseráveis

Elias Mattar Assad

Afirmei que as indenizações no direito brasileiro são incertas, miseráveis e demoradas ("mártires das ilegalidades") e, quando demandada a máquina estatal por seus erros, são pagas, muitos anos após, em precatórios divididos em doze parcelas anuais. Longe de repararmos, apenas maximizamos prejuízos e dores morais em dupla ilegalidade e dupla injustiça.

terça-feira, 17 de julho de 2007

Atualizado em 16 de julho de 2007 14:30


Indenizações miseráveis

Elias Mattar Assad*

Afirmei que as indenizações no direito brasileiro são incertas, miseráveis e demoradas ("mártires das ilegalidades") e, quando demandada a máquina estatal por seus erros, são pagas, muitos anos após, em precatórios divididos em doze parcelas anuais. Longe de repararmos, apenas maximizamos prejuízos e dores morais em dupla ilegalidade e dupla injustiça. Isto está ligado diretamente à falta de preocupação que se tem com o outro.

Penso que o juiz estadunidense tem como bússola o "sonho americano". Assim, quando alguém - principalmente a máquina estatal - lesiona a liberdade, a vida, a integridade moral e projetos de outrem, assegura indenizações que são pagas em dinheiro com o bater do martelo. Lá, o juiz tem também a chave do cofre. Toma por base um cidadão que realizou esse sonho e a indenização vai aproximar o lesado desse patamar. Aquele povo se interessa pelas desgraças alheias, tanto que livros e filmes alusivos são produzidos, com régios pagamentos aos protagonistas da vida real, em autêntica e complementar reparação moral e econômica.

Embora a nossa mitológica Constituição Federal (clique aqui) e legislação inferior enunciem esses direitos, não temos um "sonho brasileiro". Na falta dele, os referenciais são nossas equivocadas teorias que no fundo se voltam mais para a proteção dos ofensores que dos ofendidos. Nosso "estado juiz" não ousa pronunciar imoral a imposição de pagamentos em precatórios (proporcionalidade pró-moralidade), mormente agora que atingimos a estabilidade econômica, nem está preocupado em não terem lhe confiado a "chave do cofre", onde sentenças pudessem ser compensadas como cheques em bancos.

Os desgraçados e injustiçados da nossa república, na esmagadora maioria, rumam ao esquecimento (somos do tipo: "Ria e todos rirão com você. Chore e chorarás sozinho..."). Quando atrevem-se a escrever um livro com suas desditas, arcam com os custos da editoração e descobrem que ninguém os lê, nem de graça! "Vá procurar teus direitos", ao invés de sábio conselho, em nosso meio, é sinônimo de xingamento. Os cavaleiros desse apocalipse civil afirmam que a dor não tem preço e que não há como avaliá-la.

Portanto, nossas indenizações são miseráveis porque somos miseráveis... E quando um juiz iluminado resolve romper com tais barreiras culturais, no fundo tem certeza de que sua decisão será miserabilizada em grau de recurso. Portanto, o assalariado que ficou cego ou mutilado que se contente apenas com a aposentadoria precoce. A mulher que foi monstrificada pela cirurgia plástica que se conforme com cem salários mínimos. A viúva e os filhos do pai morto por engano pela polícia que levantem as mãos para o céu e agradeçam, depois de alguns anos de jejum e batalhas judiciais, o mero salário paterno como se vivo estivesse por mais alguns anos. O aprisionado inocentemente que comemore apenas a devolução de sua liberdade...

Viva o paraíso do básico - o sonho brasileiro!

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*Presidente da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas






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