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A MP 70/02 regulamentou a participação do capital estrangeiro na mídia ?

José Carlos Junqueira S. Meirelles, Rachel Bejla Mejlachowicz e Bruno Dalarossa Amatuzzi

A MP 70/02 de fato regulamentou a entrada do capital estrangeiro nas Empresas de Mídia. Porém, o assunto é de extrema relevância e mereceria ter sido objeto de maiores discussões.

quarta-feira, 9 de outubro de 2002

Atualizado em 1 de abril de 2003 11:49

 

A Medida Provisória 70/02 regulamentou a participação do capital estrangeiro em empresas de mídia ?

José Carlos Junqueira S. Meirelles

Rachel Bejla Mejlachowicz

Bruno Enrico Dalarossa Amatuzzi*

1. - O Poder Executivo editou, em 1o de outubro de 2002, a Medida Provisória nº 70 ("MP 70/02"), que dispõe sobre a participação de capital estrangeiro nas empresas jornalísticas, de radiodifusão sonora (emissoras de rádio) e de sons e imagens (TVs), referidas no presente trabalho, em conjunto, como "Empresas de Mídia". (v. Abaixo)

2. - Com a edição da MP 70/02, o Poder Executivo pretendeu regulamentar, conforme previa o § 4o do artigo 222 da Constituição Federal, o tão aguardado ingresso de capital estrangeiro nas Empresas de Mídia, razão pela qual nos cabe tecer alguns breves comentários a respeito.

I. - A REGULAMENTAÇÃO DO INGRESSO DO CAPITAL ESTRANGEIRO EM EMPRESAS DE MÍDIA POR MEDIDA PROVISÓRIA

3. - Em um primeiro momento, era de se imaginar que o tema da participação de capital estrangeiro em Empresas de Mídia suscitaria ampla discussão, tendo em vista não apenas a sua importância para a indústria da mídia, mas também o seu impacto social e a existência de pontos controversos e polêmicos desde o início do processo legislativo da Emenda Constitucional no 36, de 28 de maio de 2002, que conferiu nova redação ao artigo 222 da Constituição Federal.

4. - Essa impressão tornou-se ainda mais presente quando o Ministério das Comunicações, em 26 de julho de 2002, editou a Portaria no 1.360, colocando em audiência pública, ainda que por prazo exíguo, um Projeto de Lei cujo objeto era a regulamentação da participação do capital estrangeiro em Empresas de Mídia.

5. - Entretanto, o Poder Executivo decidiu regulamentar o artigo 222 da Constituição Federal por meio de Medida Provisória, deixando as importantes discussões sobre o tema para um momento posterior. Isso porque, apesar de possuir eficácia imediata, para que se torne lei, a MP 70/02 dependerá de aprovação do Congresso Nacional, devendo ser submetida a processo legislativo na Câmara e no Senado, oportunidade em que o assunto, em tese, será melhor debatido.

6. - Vale ressaltar, porém, que as Medidas Provisórias possuem um processo legislativo peculiar. Toda Medida Provisória editada deve ser submetida imediatamente ao Congresso Nacional. Não sendo a Medida Provisória apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subseqüentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando a Medida Provisória.

7. - De acordo com as modificações introduzidas pela Emenda Constitucional nº 32, de 11 de setembro de 2001, uma Medida Provisória perderá eficácia, desde a sua edição, se não for convertida em lei no prazo de 60 dias, prorrogável uma vez por igual período. Tal prazo de 60 dias, no presente caso, deve ser contado da publicação da MP 70/02, sendo suspenso durante eventuais períodos de recesso do Congresso.

8. - Se a Medida Provisória perder a sua eficácia ou for rejeitada, deverá então o Congresso Nacional disciplinar, por Decreto Legislativo, as relações jurídicas decorrentes do período de vigência da Medida Provisória. Se o Congresso não o fizer no prazo de 60 dias após a rejeição ou perda da eficácia, tais relações jurídicas continuarão a ser regidas pelo teor da Medida Provisória quando de sua edição.

9. - Diante do exposto acima, pode-se depreender que o Poder Executivo, ao editar a MP 70/02, pretendeu não só regulamentar o artigo 222 da Constituição Federal, como também acelerar o processo de discussão do tema, na Câmara e no Senado, talvez para possibilitar que a MP 70/02 seja convertida em lei ainda no atual mandato.

10. - Contudo, indagamos se uma Medida Provisória seria a forma legislativa mais adequada para regular definitivamente assunto de tamanha importância. Nesse sentido, há que se dizer que a simples possibilidade de a MP 70/02 não ser convertida em lei no futuro, por si só, já leva ao entendimento de que não está sendo dado o tratamento legal conveniente ao tema. Some-se a isto a carência de discussões acerca do assunto e o atual momento de transição política que o País atravessa, devido às eleições, e ter-se-á como resultado uma boa dose de insegurança para os investidores estrangeiros.

II. - AS PRINCIPAIS DISPOSIÇÕES DA MP 70/02

11. - Um primeiro comentário que pode ser feito é que a MP 70/02, em vários casos, apenas dispôs de forma expressa sobre o que já estava previsto, muitas vezes de forma implícita, no artigo 222 da Constituição Federal. Assim o fez, por exemplo, ao equiparar, para fins de participação em Empresas de Mídia, os estrangeiros aos brasileiros naturalizados há menos de 10 anos, ao prever a necessidade de a participação estrangeira se dar de forma indireta (ou seja, através de pessoa jurídica constituída sob as leis brasileiras e com sede no País), e ao estabelecer que, em havendo participação estrangeira em empresa que participe indiretamente ou esteja de alguma forma ligada à Empresa de Mídia, o limite de 30% deverá ser respeitado em todos os níveis de participação societária até à Empresa de Mídia.

12. - Também vale dizer que de acordo com a redação do artigo 6o da MP 70/02, será nulo qualquer ato ou acordo que pretenda conferir a estrangeiros ou brasileiros naturalizados há menos de dez anos participação acima do limite legal, bem como a responsabilidade editorial, a seleção e direção da programação veiculada e a gestão das atividades da Empresa de Mídia.

13. - A MP 70/02 estabelece, ainda, que o controle da participação estrangeira será feito de várias formas, quais sejam: (i) a alteração de controle societário das Empresas de Mídia deverá ser comunicada ao Congresso Nacional (conforme § 5o do artigo 222 da Constituição Federal); (ii) as Empresas de Mídia devem apresentar declaração anual aos órgãos de registro comercial ou de registro civil das pessoas jurídicas, contendo a composição de seu capital social, inclusive com a nomeação dos brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos que detenham, direta ou indiretamente, pelo menos 70% do capital total e votante; e (iii) o Poder Executivo pode requisitar às Empresas de Mídia, a qualquer momento, as informações e os documentos considerados necessários para a verificação do cumprimento do limite de 30% na participação do capital estrangeiro em Empresas de Mídia.

14. - A MP 70/02 também alterou alguns dispositivos específicos de outras normas, como o Código Brasileiro de Telecomunicações, criado pela Lei no 4.117, de 27 de agosto de 1962, adaptando seus dispositivos às alterações do artigo 222 da Constituição Federal. O mesmo ocorreu com o Decreto-Lei no 236, de 28 de fevereiro de 1967, que complementa e modifica o Código Brasileiro de Telecomunicações, onde novas disposições estabelecendo limites quantitativos à concessão ou permissão para executar serviço de radiodifusão (participação cruzada) foram inseridos pela MP 70/02.

15. - Entretanto, há que ressaltar que o Poder Executivo não deu a merecida atenção aos dispositivos legais relativos às empresas jornalísticas, já que não modificou nenhum dos artigos da Lei 5.250, de 9 de fevereiro de 1967 (Lei de Imprensa) para adaptá-los, como fez no caso da legislação de radiodifusão, à nova realidade do artigo 222 da Constituição Federal.

III. - CONCLUSÃO

16. - A conclusão a que se pode chegar é que a MP 70/02 de fato regulamentou a entrada do capital estrangeiro nas Empresas de Mídia. Porém, o assunto é de extrema relevância e mereceria ter sido objeto de maiores discussões.

17. - Ademais, é preciso lembrar que as Empresas de Mídia esperavam ansiosamente pela regulamentação do ingresso do capital estrangeiro nesse setor, com o que teriam mais uma alternativa para melhor competir nesse mercado. Entretanto, o fato de a regulamentação ter sido feita por meio de uma Medida Provisória, especialmente no momento que nosso País atravessa, pode significar mais incertezas do que certezas.

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* sócio, associada e assistente do escritório Pinheiro Neto Advogados, integrantes da Área Empresarial.

Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

Ó

2002. Direitos Autorais reservados a Pinheiro Neto Advogados.

 

 

 

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MEDIDA PROVISÓRIA Nº 70, DE 1º DE OUTUBRO 2002.

Dispõe sobre a participação de capital estrangeiro nas empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens, conforme o § 4o do art. 222 da Constituição, altera os arts. 38 e 64 da Lei no 4.117, de 27 de agosto de 1962, o § 3o do art. 12 do Decreto-Lei no 236, de 28 de fevereiro de 1967, e dá outras providências.

Art. 1o Esta Medida Provisória disciplina a participação de capital estrangeiro nas empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens de que trata o § 4o do art. 222 da Constituição.

Art. 2o A participação de estrangeiros ou de brasileiros naturalizados há menos de dez anos no capital social de empresas jornalísticas e de radiodifusão não poderá exceder a trinta por cento do capital total e do capital votante dessas empresas e somente se dará de forma indireta, por intermédio de pessoa jurídica constituída sob as leis brasileiras e que tenha sede no País.

§ 1o As empresas efetivamente controladas, mediante encadeamento de outras empresas ou por qualquer outro meio indireto, por estrangeiros ou por brasileiros naturalizados há menos de dez anos não poderão ter participação total superior a trinta por cento no capital social, total e votante, das empresas jornalísticas e de radiodifusão.

§ 2o É facultado ao Poder Executivo requisitar das empresas jornalísticas e das de radiodifusão, dos órgãos de registro comercial ou de registro civil das pessoas jurídicas as informações e os documentos necessários para a verificação do cumprimento do disposto neste artigo.

Art. 3o As alterações de controle societário de empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens serão comunicadas ao Congresso Nacional.

Parágrafo único. A comunicação ao Congresso Nacional de alteração de controle societário de empresas de radiodifusão será de responsabilidade do órgão competente do Poder Executivo e a comunicação de alterações de controle societário de empresas jornalísticas será de responsabilidade destas empresas.

Art. 4o As empresas jornalísticas deverão apresentar, até o último dia útil de cada ano, aos órgãos de registro comercial ou de registro civil das pessoas jurídicas, declaração com a composição de seu capital social, incluindo a nomeação dos brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos titulares, direta ou indiretamente, de pelo menos setenta por cento do capital total e do capital votante.

Art. 5o Os órgãos de registro comercial ou de registro civil das pessoas jurídicas não procederão ao registro ou arquivamento dos atos societários de empresas jornalísticas e de radiodifusão, caso seja constatada infração aos limites percentuais de participação previstos no art. 2o, sendo nulo o ato de registro ou arquivamento baseado em declaração que omita informação ou contenha informação falsa.

Art. 6o Será nulo de pleno direito qualquer acordo entre sócios, acionistas ou cotistas, ou qualquer ato, contrato ou outra forma de avença que, direta ou indiretamente, confira ou objetive conferir, a estrangeiros ou a brasileiros naturalizados há menos de dez anos, participação no capital total e no capital votante de empresas jornalísticas e de radiodifusão, em percentual acima do previsto no art. 2o, ou que tenha por objeto o estabelecimento, de direito ou de fato, de igualdade ou superioridade de poderes desses sócios em relação aos sócios brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos.

Parágrafo único. Será também nulo qualquer acordo, ato, contrato ou outra forma de avença que, direta ou indiretamente, de direito ou de fato, confira ou objetive conferir aos sócios estrangeiros ou brasileiros naturalizados há menos de dez anos a responsabilidade editorial, a seleção e direção da programação veiculada e a gestão das atividades das empresas referidas neste artigo.

Art. 7o Os arts. 38 e 64 da Lei no 4.117, de 27 de agosto de 1962, passam a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 38. Nas concessões, permissões ou autorizações para explorar serviços de radiodifusão, serão observados, além de outros requisitos, os seguintes preceitos e cláusulas:

a) os administradores ou gerentes que detenham poder de gestão e de representação civil e judicial serão brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos. Os técnicos encarregados da operação dos equipamentos transmissores serão brasileiros ou estrangeiros com residência exclusiva no País, permitida, porém, em caráter excepcional e com autorização expressa do órgão competente do Poder Executivo, a admissão de especialistas estrangeiros, mediante contrato;

b) as alterações contratuais ou estatutárias que não impliquem alteração dos objetivos sociais ou modificação do quadro diretivo e as cessões de cotas ou ações ou aumento de capital social que não resultem em alteração de controle societário deverão ser informadas ao órgão competente do Poder Executivo, no prazo de sessenta dias a contar da realização do ato;

c) a alteração dos objetivos sociais, a modificação do quadro diretivo, a alteração do controle societário das empresas e a transferência da concessão, da permissão ou da autorização dependem, para sua validade, de prévia anuência do órgão competente do Poder Executivo;

.....................................................................................................

g) a mesma pessoa não poderá participar da administração ou da gerência de mais de uma concessionária, permissionária ou autorizada do mesmo tipo de serviço de radiodifusão, na mesma localidade;

.....................................................................................................

i) as concessionárias e permissionárias de serviços de radiodifusão deverão apresentar, até o último dia útil de cada ano, ao órgão competente do Poder Executivo e aos órgãos de registro comercial ou de registro civil de pessoas jurídicas, declaração com a composição de seu capital social, incluindo a nomeação dos brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos titulares, direta ou indiretamente, de pelo menos setenta por cento do capital total e do capital votante.

Parágrafo único. Não poderá exercer a função de diretor ou gerente de concessionária, permissionária ou autorizada de serviço de radiodifusão quem esteja no gozo de imunidade parlamentar ou de foro especial." (NR)

"Art. 64. ........................................................................................

.....................................................................................................

g) não-observância, pela concessionária ou permissionária, das disposições contidas no art. 222, caput e seus §§ 1o e 2o, da Constituição." (NR)

Art. 8o Na aplicação desta Medida Provisória, deverá ser obedecido o disposto no art. 12 do Decreto-Lei no 236, de 28 de fevereiro de 1967.

Art. 9o O § 3o do art. 12 do Decreto-Lei no 236, de 1967, passa a vigorar com a seguinte redação:

"§ 3o O disposto no caput aplica-se a sócio, acionista ou cotista que, direta ou indiretamente, detenha percentual igual ou superior a vinte por cento das ações ou cotas representativas do capital social, total e votante, de outras concessionárias ou permissionárias de serviços de radiodifusão." (NR)

Art. 10. Não se aplica a limitação estabelecida no caput do art. 12 do Decreto-Lei no 236, de 1967, aos investimentos de carteira de ações, desde que o seu titular não indique administrador em mais de uma empresa executante de serviço de radiodifusão, ou em suas respectivas controladoras, nem detenha mais de uma participação societária que configure controle ou coligação em tais empresas.

§ 1o Entende-se como coligação, para fins deste artigo, a participação, direta ou indireta, em pelo menos vinte por cento do capital de uma pessoa jurídica, ou se o capital de duas pessoas jurídicas for detido, em pelo menos vinte por cento, direta ou indiretamente, pelo mesmo titular de investimento financeiro.

§ 2o Consideram-se investimentos de carteira de ações, para os fins do caput deste artigo, os recursos aplicados em ações de companhias abertas, por investidores individuais e institucionais, estes últimos entendidos como os investidores, com sede ou domicílio no Brasil ou no exterior, que apliquem, de forma diversificada, por força de disposição legal, regulamentar ou de seus atos constitutivos, recursos no mercado de valores mobiliários, devendo cada ação ser nominalmente identificada.

Art. 11. Esta Medida Provisória entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 1º de outubro de 2002; 181o da Independência e 114o da República.

Fernando Henrique Cardoso

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