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Service Level Agreements - Por que e como fazê-los?

Rodrigo Moura A. Faria

Já há vários anos, setores como tecnologia da informação, logística e atendimento ao cliente têm-se valido de uma ferramenta contratual especialmente desenhada para gerenciar suas relações com fornecedores, sobretudo em processos de terceirização: os Service Level Agreements, ou "SLAs", contratos que estabelecem níveis de serviços mínimos a serem mantidos e penalidades aplicáveis no caso de descumprimento desses níveis.

terça-feira, 6 de julho de 2004

Atualizado em 5 de julho de 2004 11:11

Service Level Agreements

 

Por que e como fazê-los?


Rodrigo Moura A. Faria*

Já há vários anos, setores como tecnologia da informação, logística e atendimento ao cliente têm-se valido de uma ferramenta contratual especialmente desenhada para gerenciar suas relações com fornecedores, sobretudo em processos de terceirização: os Service Level Agreements, ou "SLAs", contratos que estabelecem níveis de serviços mínimos a serem mantidos e penalidades aplicáveis no caso de descumprimento desses níveis.

Se, do ponto jurídico, não há grandes novidades - obrigações do fornecedor de serviços, reforçadas por cláusulas penais -, a experiência prática demonstra que redigir e implementar um SLA pode ser mais complexo do que se imagina. Abordamos, a seguir, alguns cuidados básicos que se deve ter em mente ao negociar e elaborar um SLA, seja pela parte do tomador, seja pela parte do fornecedor de serviços.

Riscos inerentes à terceirização

Há riscos comuns em qualquer projeto de outsourcing de serviços. Dentre os principais estão os riscos trabalhistas, tributários e previdenciários.

O art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho define empregado como "toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário". Assim, há quatro elementos que configuram a relação de trabalho, ou vínculo empregatício: a pessoalidade, a subordinação, a habitualidade e a dependência econômica. Se todos esses elementos estiverem presentes, e, independentemente do nome que se der à relação, estará caracterizado o contrato de trabalho.

Ao examinar a terceirização de serviços, o Tribunal Superior do Trabalho firmou entendimento no sentido de que é ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, mas não caracterizou como vínculo de emprego com o tomador de serviços a contratação de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistentes a pessoalidade e a subordinação direta (Enunciado TST nº 331).

Assim, as seguintes precauções devem ser tomadas por uma empresa que terceiriza serviços, a fim de minimizar os riscos trabalhistas:

(a) terceirizar atividades-meio, nunca as atividades-fim da empresa;

(b) exigir do prestador de serviços o cumprimento das suas obrigações trabalhistas, previdenciárias, tributárias e fundiárias, obrigando-o a apresentar, inclusive, documentos comprobatórios do cumprimento dessas obrigações, guias de recolhimento de encargos etc.;

(c) reservar-se, contratualmente, o direito de inspecionar os livros, documentos e demonstrações contábeis do prestador de serviços;

(d) como último recurso, contar com mecanismo de indenização apropriado por eventuais condenações que venha a sofrer em razão da não-observância das obrigações pelo prestador.

Além dos riscos trabalhistas, há aqueles de natureza tributária e previdenciária, que devem ser considerados ao se examinar a possibilidade de terceirização. No pagamento das faturas de serviços, é importante que o tomador atente para as retenções que possam ser aplicáveis, como as da contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, do Imposto de Renda na Fonte, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, da COFINS e da contribuição ao PIS.

Níveis de serviços e penalidades

Os elementos que caracterizam um SLA são, por definição, níveis de desempenho nos serviços prestados e penalidades aplicáveis nos casos de deterioração desses níveis.

Para o bom funcionamento da mecânica contratual, é extremamente importante que os níveis de serviço ajustados pelas partes sejam:

(a) definidos objetivamente, de maneira clara e precisa; e

b) apoiados em métricas razoáveis, que ao mesmo tempo garantam qualidade para o tomador e que sejam atingíveis pelo prestador de serviços.

É no estabelecimento de métricas realistas que reside um das maiores dificuldades em elaborar um SLA. Muitas organizações não medem os níveis de serviços prestados por unidades internas (como, por exemplo, nas áreas de tecnologia da informação, jurídica ou logística) e não sabem estabelecer critérios de exigência razoáveis para seus novos fornecedores.

Como solução, recomenda-se o estudo cuidadoso das melhores práticas de mercado no ramo que se pretende terceirizar, antes mesmo de serem iniciadas as negociações com o futuro prestador de serviços. E contratualmente, deve-se buscar a compatibilização de métricas médias, genéricas ou agregadas (por exemplo: na terceirização da administração de rede de computadores, exigir 99,5% de uptime) com outras mais específicas, para os pontos que forem críticos para o negócio da organização (no exemplo, 100% de uptime para os servidores X, Y e Z, em que rodem aplicativos de cujo desempenho permanente a empresa dependa).

Além disso, deve-se ter em mente que a tecnologia e a produtividade tendem a evoluir; assim, um nível de desempenho que é aceitável hoje em dia pode não o ser daqui a alguns anos. Como os SLAs normalmente são celebrados por um longo prazo, recomenda-se que seja adotado um sistema de métricas flexíveis, que acompanhe a evolução do estado da técnica. Uma solução implantada por algumas empresas é a criação de um comitê que, eventualmente amparado por consultores externos, renegocia periodicamente os níveis de serviço.

Da mesma forma, as penalidades impostas ao prestador de serviços devem ser:

(a) vinculadas aos pontos críticos do negócio tomador;

(b) razoáveis, para evitar o risco de questionamento judicial frente ao disposto no art. 412 do Código Civil (normalmente as penalidades são estabelecidas como percentuais do calor do contrato ou da fatura mensal); mas, ao mesmo tempo

(c) intimidadoras o suficiente para estimular o cumprimento dos níveis de serviço acordados.

É importante ter em conta que o atual Código Civil, consolidando entendimento anteriormente pacificado na jurisprudência, passou a dispor claramente que "ainda que o prejuízo exceda ao previsto na cláusula penal, não pode o credor exigir indenização suplementar se assim não foi convencionado. Se o tiver sido, a pena vale como mínimo da indenização, competindo ao credor provar o prejuízo excedente" (art. 416, parágrafo único). Assim, há que se atentar para a necessidade de ressalvar as perdas e danos efetivamente sofridas, sob pena de ver-se a parte prejudicada limitada ao montante da cláusula penal.

E quando o pior acontece?

Como qualquer contrato, um bom SLA deve aspirar ao melhor (níveis ótimos de serviços), sem deixar de prever o pior (fracasso do projeto de terceirização). Assim, é fundamental contar com cláusulas de rescisão e de solução de controvérsias bem redigidas. Além de prever as hipóteses de rescisão, cure periods (prazos para cumprimento de obrigações que tenham sido inadimplidas) e multas rescisórias, o SLA deve contemplar como o tomador voltará a absorver as atividades que foram terceirizadas. Esse mecanismo, que se pode chamar de "plano de transição reversa", deve assegurar que processos, pessoas, documentos e infra-estrutura preciosos para a continuidade dos negócios do tomador permanecerão disponíveis.

Conclusão

Service Level Agreements podem ser instrumentais para garantir qualidade de serviço consistente em um processo de terceirização, mas o seu sucesso dependerá da boa negociação prévia - o que consome tempo e recursos - e da efetividade dos mecanismos que vierem a ser contratualmente ajustados.
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*Advogado do escritório Pinheiro Neto Advogados

* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

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