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Sobrenome da esposa

A mulher é obrigada a adotar o sobrenome de seu esposo? Tem ela o direito de transmitir para seus descendentes o seu sobrenome? Pode assim inserir seu sobrenome nos nomes de seus filhos em lugar do sobrenome do seu esposo? Caso tenha adotado o nome da família do esposo, perde o direito de usá-lo se dele se separar?

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Atualizado em 24 de setembro de 2008 14:16


Sobrenome da esposa

Sérgio Roxo da Fonseca*

Feres Sabino**

A mulher é obrigada a adotar o sobrenome de seu esposo? Tem ela o direito de transmitir para seus descendentes o seu sobrenome? Pode assim inserir seu sobrenome nos nomes de seus filhos em lugar do sobrenome do seu esposo? Caso tenha adotado o nome da família do esposo, perde o direito de usá-lo se dele se separar?

As respostas a essas perguntas dependem de se compreender o modelo de família adotado no Brasil e a sua transformação nos dias de hoje. Para o direito nome é a soma do prenome com o sobrenome. José é prenome. Silva é sobrenome. José Silva é nome.

O modelo da família brasileira é a soma da tradição judaica com a romana, passando-se pelo filtro do Direito Canônico, ou seja, do direito da Igreja Católica.

Trata-se da família monogâmica ligada por vínculo indissolúvel, proibido o divórcio, até bem pouco tempo. O homem detinha o pátrio poder que, na antiga Roma, representava o direito de vida e morte sobre todos os membros de sua tribo. O ranço desse antigo poder percebe-se nas nossas relações conjugais.

O Código Civil de 1916 (clique aqui), que vigorou até 2003, traz vestígios dessa antiga família:

1) a esposa e os filhos residiam no local indicado pelo marido mesmo quando preso e condenado;

2) a mulher tinha apenas o poder de administrar os retratos da família;

3) a mulher deveria casar-se virgem sob pena de anulabilidade matrimonial;

4) o homem, não.

Em 1962 foram colocados em vigor os Estatutos da Mulher Casada, uma das poucas leis promulgadas pelo Presidente João Goulart. Os Estatutos deram decisiva contribuição para a modernização das relações familiares, especialmente quanto à administração do patrimônio do casal.

A Constituição de 1988 (clique aqui), por norma expressa, igualou os direitos e deveres dos cônjuges no casamento, impedindo qualquer espécie de discriminação, estendendo, portanto, às relações familiares o princípio da igualdade. Mito embora o princípio isonômico valesse no Brasil desde antigamente não era aplicado, no entanto, nas relações familiares. Vestígios do pátrio-poder romano.

Nos dias de hoje, a mulher não pode ser obrigada a adotar o sobrenome de seu esposo, podendo assim continuar sendo conhecida pelo seu nome de solteira, mesmo depois das núpcias.

Caso tenha adotado o nome de família do esposo, poderá continuar sendo por ele conhecida, mesmo depois da separação, se não foi responsável pela dissolução por desvio de conduta. Há alguns anos atrás, uma famosa jornalista buscou na justiça, com sucesso, o reconhecimento desse direito, já que, com o seu trabalho, havia consagrado o nome de família do esposo como se fosse a sua marca registrada.

A última questão apresenta-se como novidade. Pode a família, inclusive o esposo, adotar o sobrenome da esposa? Se os cônjuges são iguais perante a lei, se a esposa tem o direito de adotar o sobrenome do marido, segue-se que o marido pode adotar o sobrenome da esposa, aplicando-se o princípio da transitividade do condicional. A resposta, pois, mais singela seria afirmativa porque marido e mulher são iguais perante a Constituição. Mas não são perante a lei. Pode a lei discriminar onde a Constituição iguala? Não.

O tema foi recentemente apreciado pela Corte Constitucional alemã que mantém, atualmente, muitos pontos em contato com o Judiciário brasileiro. Foi decidido naquele país que o esposo e os filhos podem adotar com o casamento o sobrenome da esposa e mãe em substituição ao modelo antigo.

Os juízes alemães entenderam que a evolução da sociedade não mais está fincada na família paterlinear, reconhecendo assim a igualdade plena de direitos e deveres dos cônjuges tanto nas relações familiares como nas relações de parentesco, que são diversas entre si.

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*Advogado, Procurador de Justiça aposentado do Ministério Público de São Paulo, professor da Faculdade de Direito COC








**Advogado





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