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Comentários ao PL 140/09 da Câmara - avanços nas relações locatíciais em shopping centers

Ricardo Gesteira Ramos

Em que pese não se poder atribuir à Lei nº. 8.245/91 o adjetivo de "velha" para os padrões brasileiros - afinal de contas, o que são 18 anos para um sistema jurídico que conviveu, relativamente bem, com um Código Civil por longos 86? - o fato é que, pela relevância das relações locatícias no desenvolvimento da atividade empresarial no Brasil, alguns aspectos já clamavam por mudança há considerável tempo.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Atualizado em 5 de novembro de 2009 11:01


Comentários ao PL 140/09 da Câmara - avanços nas relações locatíciais em shopping centers

Ricardo Gesteira Ramos*

Em que pese não se poder atribuir à Lei nº. 8.245/91 (clique aqui) o adjetivo de "velha" para os padrões brasileiros - afinal de contas, o que são 18 anos para um sistema jurídico que conviveu, relativamente bem, com um Código Civil por longos 86 ? - o fato é que, pela relevância das relações locatícias no desenvolvimento da atividade empresarial no Brasil, alguns aspectos já clamavam por mudança há considerável tempo.

Para se ter uma ideia, só no setor de Shopping Centers, segundo dados da ABRASCE - Associação Brasileira de Shopping Centers -, até junho do corrente ano o país registrou um total de 385 empreendimentos do tipo, implicando a disponibilização de impressionantes 8,9 milhões de metros quadrados (m²) de Área Bruta Locável - ABL1.

Fácil deduzir, portanto, que, quem se dedica à advocacia especializada no atendimento ao mercado de Shopping Centers encontra na Lei do Inquilinato um dos seus principais instrumentos de trabalho e no manuseio adequado dos dispositivos do citado diploma legal, especialmente os de ordem processual, um grande trunfo profissional.

Nesse cenário, é de se ver com grande satisfação algumas das mudanças que, ao que tudo indica, serão introduzidas após a provável sanção presidencial ao PL 140/09 (clique aqui), da Câmara (PL Original 71/2007 do Dep. José Carlos Araújo).

Sem qualquer pretensão acadêmica ou mesmo de esgotamento do tema, que certamente merecerá a abordagem mais detalhada da doutrina, destacarei exclusivamente alguns pontos que, numa visão geral e sob a ótica das relações locatícias não residenciais, mais especificamente em relação às locações em shopping center, pareceram mais relevantes.

O primeiro ponto a ser abordado diz respeito à alteração decorrente da inclusão do §3º no art. 13 da lei 8.245/91. Embora a prática demonstre que a grande maioria dos contratos de locação em shopping já preveja expressamente que, no caso de locatário pessoa jurídica, a cessão, para terceiros, de cotas ou ações representativas de 30% (trinta por cento) ou mais do capital social implique nos mesmos efeitos da cessão da locação, não se pode deixar de ver como avanço a taxativa inclusão na lei de dispositivo que equipara "à cessão da locação qualquer negócio jurídico que importe na transferência do controle societário do locatário pessoa jurídica".

Caminha-se em direção a uma maior efetividade do Princípio da Boa-fé, ao vedar-se a utilização de alterações sociais como burla à necessária anuência do locador a qualquer mudança subjetiva de locatário.

Relevante avanço se vislumbra, ainda, na alteração introduzida no art. 39 da Lei do Inquilinato, ao taxativamente estender as garantias da locação até a efetiva devolução do imóvel.

Cumpre salientar o zelo técnico do legislador que, ao ressalvar as hipóteses de existência de disposição contratual em sentido contrário à extensão da garantia, salvaguarda a natureza gratuita da fiança - modo mais usual de garantia da locação. A natureza jurídica do contrato de fiança impõe que se preservem meios de evitar-se ônus excessivo ao fiador, o que, no caso em análise, se dará pela possibilidade de inclusão de cláusula com limitação expressa da garantia - até o termo do contrato, por exemplo. Somente no caso de omissão é que se estenderá a responsabilidade do fiador até a efetiva devolução do imóvel.

Há que se destacar, ademais, a possibilidade de desoneração do fiador na forma do art. 40, X que o projeto pretende introduzir.

Lamentando a supressão integral das alterações propostas pelo Projeto Original no art. 54 da lei 8.245/91, que visavam criar uma disciplina própria - material e processual - para os contratos de locação em shopping centers2, temos, ao menos, como comemorar a ampliação das hipóteses de despejo liminar, por meio da introdução dos incisos VII e, em especial, dos incisos VIII (despejo por denúncia vazia, quando ajuizada em até 30 dias do termo ou do cumprimento de notificação comunicando o intento de retomada) e IX (despejo por falta de pagamento nas hipóteses em que o contrato encontra-se desprovido de garantias) do art. 59, § 1º da Lei de Locações.

Merecem destaque, também, os esclarecimentos apostos ao art. 62, caput. Por força da alteração proposta, equiparam-se à falta de pagamento dos alugueis, para fins de despejo, o não pagamento dos alugueis provisórios e mesmo de diferenças de alugueis.

A dispensa de caução para execução provisória de despejo para as ações fundadas em quaisquer dos incisos do art. 9º3 constitui correção de claro equívoco técnico do legislador anterior que, ao excluir o inciso III das hipóteses de dispensa de garantia deu à principal infração contratual - a falta de pagamento - tratamento mais ameno que para infrações menos prejudiciais ao locador.

Outro ponto que introduzirá relevante segurança jurídica às relações locatícias consiste na explicitação dos limites de fixação do aluguel provisório nas ações revisionais de acordo com critérios que tomam por base o autor da demanda (locador ou locatário). A lei imporá, assim, o tratamento isonômico que, muitas vezes, na prática, vem sendo esquecido pelo judiciário.

De acordo com o novo critério, nas ações revisionais propostas pelo locador, o aluguel provisório "não poderá ser excedente a 80% (oitenta por cento) do pedido". Nas ações ajuizadas pelo locatário, "não poderá ser inferior a 80% (oitenta por cento) do aluguel vigente".

Outras mudanças relevantes serão introduzidas também na disciplina das ações renovatórias.

Consoante se percebe por meio da leitura das apressadas linhas precedentes, embora não represente solução integral para alguns gargalos já conhecidos pelos operadores do direito que manuseiam com frequência a lei 8.245/91, o fato é que, na forma em que fora encaminhada à sanção presidencial, o projeto de alteração ora comentado representa claro avanço, contribuindo, certamente, para o rompimento do engessamento que envolve atualmente os mecanismos de retomada do imóvel.

Espera-se, com ansiedade, que nessa reta final não se perca de vistas que a introdução no sistema de um instrumento legal com tais características pode, por certo, contribuir para o fomento de um mercado que, especificamente em relação aos shopping centers, somente no ano de 2008, foi responsável pela movimentação de R$ 64,9 bilhões em faturamento.

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1 Dados disponíveis no sítio da Abrasce - www.portaldoshopping.com.br

2 O Projeto original, dentre outros temas certamente polêmicos, pretendia tratar a retomada do imóvel por meio de reintegração de posse; permitir a retomada por meio de antecipação de tutela (art. 273 do CPC); retomada do imóvel independentemente de autorização judicial nas hipóteses de abandono pelo locatário, exigindo somente a presença de um tabelião de notas, etc.

3 "I - por mútuo acordo; II - em decorrência da prática de infração legal ou contratual; III - em decorrência da falta de pagamento do aluguel e demais encargos; IV - para a realização de reparações urgentes determinadas pelo Poder Público, que não possam ser normalmente executadas com a permanência do locatário no imóvel ou, podendo, ele se recuse a consenti - las".

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*Sócio do escritório Deda & Gordilho Advogados Associados










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