Depósitos judiciais

16/8/2019
Milton Cordova Junior

"O teratológico "entendimento" (equivalente à sua mera opinião pessoal) de um conselheiro do CNJ não tem o condão de afastar a aplicação da lei, muito menos de afastar a Constituição Federal, na questão da exclusividade das instituições financeiras oficiais em relação aos depósitos judiciais (Migalhas quentes – 16/8/19). Ao contrário do que ele afirma, a própria Carta Magna estabelece essa exclusividade, em seu art. 164, § 3º, nestes termos: 'as disponibilidades de caixa da União serão depositadas no banco central; as dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e dos órgãos ou entidades do Poder Público e das empresas por ele controladas, em instituições financeiras oficiais, ressalvados os casos previstos em lei'. Destacamos o que diz o comando constitucional: depositadas em 'instituições financeiras oficiais'. Ora, a lei atacada pelo conselheiro é o art. 840, I, do CPC, que tem a seguinte redação: 'Serão preferencialmente depositados: as quantias em dinheiro, os papéis de crédito e as pedras e os metais preciosos, no Banco do Brasil, na Caixa Econômica Federal ou em banco do qual o Estado ou o Distrito Federal possua mais da metade do capital social integralizado, ou, na falta desses estabelecimentos, em qualquer instituição de crédito designada pelo juiz'. Perceba-se que no texto constitucional (art. 164, § 3º) sequer existe a palavra 'preferencialmente' inserida capciosamente na lei, consistindo-se, ao nosso ver, em mero erro de redação. Apenas por amor ao debate, ainda que possamos admitir a constitucionalidade da palavra 'preferencialmente' na lei infraconstitucional, isso em nada alteraria a determinação constitucional (bancos públicos administram depósitos judiciais). Nem mesmo altera a determinação do próprio art. 840, I, do CPC, que acompanha a Constituição (depósitos judiciais são administrados por bancos públicos). Verifica-se que a lei ressalvou que não será qualquer instituição financeira oficial que poderá receber esses depósitos (além da Caixa e do Banco do Brasil), mas aquela que o Estado ou o Distrito Federal possuir mais da metade do capital social integralizado. Ou seja, o Legislador, no exercício de sua competência legislativa, adentrou, inclusive, na exigência de '...mais da metade do capital social integralizado'. Por outro lado, a parte final do referido artigo do CPC ('ou, na falta desses estabelecimentos, em qualquer instituição de crédito designada pelo juiz') procurou apenas suprimir o vácuo deixado para a hipótese de em determinada localidade não existir instituição financeira oficial, nos termos do art. 164, § 3º, CF/88. Nesse caso – e apenas nesse caso - seria possível admitir o ingresso do Banco do Nordeste (BNB) e do Banco da Amazônia (BASA) nos depósitos judiciais, pois são instituições financeiras oficiais não enumeradas no comando constitucional. Ou seja, a teor da Constituição, nem mesmo nesse caso (inexistência na localidade de instituição financeira oficial) o juiz poderá designar um banco privado para receber depósitos judiciais. A propósito, não se tem notícia de alguma comarca que não tenha pelo menos uma instituição financeira oficial (bancos oficiais federais, incluindo BNB e BASA) e bancos estaduais. Sempre foi dito que a Constituição e a Lei não contém palavras inúteis. Se o Legislador não quisesse fazer qualquer ressalva nessa matéria (depósitos em bancos públicos), simplesmente não haveria a necessidade da existência do próprio art. 840, I, no CPC. O Congresso Nacional teria despendido recursos e tempo - envolvendo mais de 80 senadores e mais de 500 deputados federais - com a tramitação, durante anos, de uma matéria legislativa. Isso é por demais óbvio. Dessa forma, compete exclusivamente ao Congresso Nacional mudar esse entendimento (no sentido de que as instituições financeiras oficiais têm a exclusividade dos depósitos judiciais), que sequer pode ser revisto pelo Judiciário (ativismo do judiciário?), muito menos pelo CNJ."

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