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Desenha-se, enfim, o futuro do futebol

quarta-feira, 4 de setembro de 2019

Atualizado às 08:34

Unir é verbo transitivo direto, que denota o ato de unificar, reunir, aderir. Trata-se de atitude que, nos últimos tempos, vem sendo pouco praticada na sociedade brasileira.

A união em torno de um tema ou de um ideal não implica, necessariamente, transigência sobre valores fundamentais, formadores de uma corrente de pensamento ou de uma determinada ideologia. Em ambientes plurais, esse caminho é o único que evita o absolutismo.

O país está dividido como nunca esteve. Eventos e certezas pessoais (ou grupais) dificultam, neste momento, a necessária união em torno do que realmente importa: o bem-estar do povo brasileiro.

Há uma atividade, porém, que, como nenhuma outra, tem essa característica. Mais do que isso, aliás. Além da vocação unificante, revela-se poderoso instrumento de desenvolvimento econômico e social: o futebol.

O futebol não é uma manifestação autóctone. O brasileiro não o concebeu, mas o aperfeiçoou. O aperfeiçoamento não esteve vinculado a ações planejadas, de estado, de governos ou de agentes privados; decorreu da espontaneidade com que se praticou, no século passado, o jogo de bola.

Naquele ambiente, ainda romantizado, o Brasil e os seus jogadores transformaram o futebol na mais globalizada das manifestações humanas. Esse feito gerou, porém, uma reação (ou contrarreação) que se tardou a identificar: países concorrentes impuseram, local e regionalmente, a revisão do modelo amadorístico e a concepção de uma prática construída sobre pilares empresariais. O futebol passou a ser negócio, de natureza econômica.

A partir da nova modelagem, o jogador brasileiro se converte, paulatinamente, em coisa: no plano interno, vira commodity; no externo, matéria-prima para transformação.

Sob qualquer ângulo, cria-se uma indústria destrutiva da riqueza nacional.

Nenhum Governo, desde a Constituição de 1988, ateve-se à destruição. O tema não parecia à altura das grandes preocupações que embalavam Brasília, apesar dos constantes apelos públicos oriundos dos distintos setores que integram o sistema futebolístico.

Eis que, enfim, acordou-se para relevância do futebol: Executivo e Legislativo deram-se conta dos inevitáveis impactos políticos, econômicos e sociais. Em termos práticos, o que isso significa?

Significa que, nos próximos dias, o futuro do futebol brasileiro será redesenhado. Não se trata de frase de efeito; é a realidade.

Isso é bom ou ruim? Poderá ser excelente, se o modelo for adequado; ou dramático, se a escolha do modelo se revelar equivocada.

Na formulação do novo marco regulatório, a história dos mercados europeus serve como boa fonte de ensinamentos, e as iniciativas locais, desde a Constituição de 1988 - sobretudo os desacertos das Leis Zico, Pelé e do Profut -, também devem ser compreendidas, para que os seus erros sejam evitados.

Naquelas oportunidades, adotaram-se soluções formalistas. Ora se pretendia obrigar o clube a transformar-se em empresa, ora se oferecia a faculdade. Depois, tentou-se um modelo baseado na punição. Em nenhum deles se propôs a construção de um sistema sustentável, em que os agentes formadores e de prática do futebol se desenvolvessem como empresas dissociadas dos clubes, mediante a captação de recursos privados, detidos por agentes que se dispusessem a empregá-los no futebol, por conta da segurança jurídica oferecida pelo próprio sistema.

Não há mais tempo para testes ou equívocos. Não se trata de salvar um time ou viabilizar o ingresso de investidor em outro. O futebol clama por uma solução que, enfim, crie um sistema crível, seguro e transparente; que reconheça os problemas estruturais e ofereça respostas igualmente estruturais; e que compreenda e enderece as necessidades dos verdadeiros agentes que dele farão parte.