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Censura

Justiça do DF é competente para julgar caso de censura ao Estadão

O ministro Raul Araújo, do STJ, deu provimento ao REsp do Estadão para asseverar que o TJ/DF é, sim, o competente para julgar o caso de censura imposta ao matutino por uma decisão do Tribunal brasiliense.

Da Redação

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Atualizado às 09:26

Censura

Justiça do DF é competente para julgar caso de censura ao Estadão

O ministro Raul Araújo, do STJ, deu provimento ao REsp do Estadão para asseverar que o TJ/DF é, sim, o competente para julgar o caso de censura imposta ao matutino por uma decisão do Tribunal brasiliense.

O Estadão está proibido, por censura judicial, de dar informações sobre o filho de Sarney e sobre a já falecida operação da PF que o investigou. A censura, a pedido de Sarney Filho, foi decretada por um desembargador do TJ/DF, mas a Corte brasiliense considerou-o suspeito. Ato contínuo, o próprio TJ/DF declarou-se incompetente, determinando a remessa do processo para o Maranhão.

E, mesmo sendo proferida por juiz suspeito e de Tribunal incompetente, a Corte brasiliense achou por bem manter a liminar até que fosse analisada por um juiz maranhense.

Antes, porém, o Estadão entrou com REsp questionando a declaração de incompetência. Este recurso foi distribuído no STJ em 30 de abril de 2010, e sopitou na mesa do relator, ministro Benedito Gonçalves, até agosto deste ano, quando ele entendeu que sua seção (Direito Público) era incompetente para julgar a matéria. O caso, então, foi redistribuído e caiu nas mãos do ministro Raul Araújo, que julgou o recurso no último dia 15.

__________

Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 1.189.247 - DF (2010/0067538-2)
RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO
RECORRENTE : S A O E DE S P
ADVOGADOS : MANUEL ALCEU AFFONSO FERREIRA E OUTRO(S)
ANTÔNIO AUGUSTO ALCKMIN NOGUEIRA E OUTRO(S)
AFRÂNIO AFFONSO FERREIRA NETO E OUTRO(S)
RECORRIDO : F J M S
ADVOGADO : EDUARDO ANTONIO LUCHO FERRÃO E OUTRO(S)

DECISÃO

Em 30.07.2009, por F.J.M.S foi proposta ação inibitória, com pedido de liminar, em face de S.A. O E. DE S.P., requerendo fosse determinado que o réu se abstivesse de publicar dados sigilosos sobre sua pessoa, colhidos em investigação policial, na qual foi deferida a quebra do sigilo telefônico do autor.

O pleito liminar foi indeferido pelo Juízo da 12ª Vara Cível da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília, em vista dos seguintes argumentos, verbis :

"(...) Observo que o bem que o requerente busca concretizar não é o afastamento da violação do segredo de justiça conferido à investigação criminal, porquanto essa tutela, pelo critério de repartição de competências, está atribuída à jurisdição penal. Contudo, seu intento é impedir a divulgação de conversas colhidas em interceptações telefônicas que poderão gerar conclusões ou convicções ofensivas à conduta ética do requerente ou até violar o direito de sua privacidade. Feitas estas considerações, passamos ao exame, pois, dos pressupostos básicos do pedido de antecipação de tutela formulado pelo autor.
Atento à exposição da inicial e aos documentos que a instruem, a despeito das possíveis publicações ou divulgações de gravações telefônicas oriundas do inquérito policial 2007.37.00.0001752-4 colocando em dúvida a reputação e a conduta ética do requerente, observo que nosso ordenamento jurídico estabelece, nas disposições do artigo 5º, incisos IV e IX, da Constituição Federal, que livre é a manifestação do pensamento e a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independente de censura ou licença. Normas às quais se subsume a regulamentação do exercício da comunicação e liberdade de imprensa, como é a hipótese questionadas nos autos.
(...)
A pretensão do autor de impedir de plano a circulação ou divulgação de matéria jornalística avulta-se como um sacrifício do direito constitucional de informação e liberdade de imprensa que nem mesmo a lei poderá, ao amparo da Constituição vigente, § 1º, do artigo 220 constituir.
(...)
Não há proporcionalidade razoável entre sacrifício do direito constitucional de informação e liberdade de imprensa e o direito individual que o Requerente quer assegurar com a obrigação de não publicar ou não informar.
Por outro lado, a divulgação das conversas telefônicas que o requerente pretende se acautelar tornou-se um fato notório amplamente divulgado por toda a imprensa adquirindo a configuração de um fato público, para o qual não se justifica a intromissão judicial para conter a exposição da mídia ou até do próprio conteúdo da informação sob o argumento da tutela do direito da personalidade.
Diante dessas considerações, não há como reconhecer verossimilhança da alegação e do direito invocado pelo autor, vez que a regra constitucional alberga plena liberdade de expressão, garantindo, por outro lado, o direito de resposta e a indenização por dano daí decorrente. Ante estas ponderações, indefiro o pedido de antecipação de tutela." (fls. 83/88)

Contra essa decisão é aviado agravo de instrumento pelo autor, com pedido de antecipação da tutela recursal, a qual é deferida pelo eminente Relator do recurso em decisão da qual transcrevo o seguinte trecho, verbis :

"Com efeito, dispõe a atual redação do art. 12, do Código Civil, quanto à possibilidade deferida ao que se sentir violado na esfera dos direitos da personalidade, de "exigir que cesse a ameaça, ou lesão".
De outro lado, não se pode olvidar a firme orientação jurisprudencial no sentido de que "a proteção aos sigilos bancário, telefônico e fiscal não é direito absoluto, podendo os mesmos serem quebrados quando houver a prevalência do direito público sobre o privado, na apuração de fatos delituosos ou na instrução dos processos criminais" (STJ, 5ª Turma, Resp 690.877/RJ, Rel. Min. Gilson Dipp, data de publicação, 30.05.2005).
Na hipótese em exame, contudo, não se põe em questão a prerrogativa do Estado quanto ao exercício das medidas de exceção em face dos direitos da personalidade, notadamente o da privacidade, na regular aplicação da lei penal, norteado tal proceder pelo inexorável interesse público. O que se traz a exame nesta instância jurisdicional, como visto, é a conduta de particulares, empresa jornalística, consistente na obtenção e ampla divulgação de dados obtidos por interceptação judicial de comunicações telefônicas, velados pelo segredo de justiça, em atividade privada de imprensa, desprovida de qualquer oficialidade investigatória, em detrimento de pessoa submetida a medida cautelar de quebra de sigilo telefônico.
(...)
Neste quadro, em juízo de summaria cognitio, a refletir, prima facie, a relevância dos fundamentos expendidos no presente recurso, evidenciando-se a possibilidade de ocorrência de lesão grave e de difícil reparação, cumpre conceder a medida liminarmente visada, consistente em obrigação de não fazer, até o pronunciamento definitivo da Colenda Turma, para determinar ao agravado, em antecipação de tutela recursal, que se abstenha quanto à utilização - de qualquer forma, direta ou indireta - ou publicação dos dados relativos ao agravante, eis que obtidos em sede de investigação criminal sob sigilo judicial.
Em caso de descumprimento da medida ora deferida, impõe-se a cominação da pena de multa, inicialmente fixada no valor de R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais), por cada ato de violação do presente comando judicial." (fls. 131/136)

Por S.A. O E. DE S.P é impetrado mandado de segurança, bem como oposta exceção de suspeição em face do Relator. O processo é, então, distribuído à Relatoria do eminente Desembargador Lecir Manoel Luz, que leva o agravo de instrumento a julgamento, no qual a eg. Quinta Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios declarando-se incompetente, reconhece a competência da Justiça Federal na Seção Judiciária do Estado do Maranhão para o julgamento do feito, tendo em vista o curso do inquérito policial nº 2007.37.00.001752-4, perante aquela Seção Judiciária. O acórdão guarda a seguinte ementa:

"CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL - DIREITO À INTIMIDADE - LIBERDADE DE IMPRENSA - INQUÉRITO POLICIAL - INSTAURAÇÃO PELA POLÍCIA FEDERAL - MATERIALIDADE E AUTORIA ATRIBUÍDAS À PESSOA RESIDENTE NO ESTADO DO MARANHÃO - QUEBRA DE SIGILO TELEFÔNICO - AUTORIZAÇÃO CONCEDIDA POR JUIZ FEDERAL - INTERCEPTAÇÕES REALIZADAS E DIFUNDIDAS POR ÓRGÃO DA IMPRENSA SEDIADO EM SÃO PAULO - RESPONSABILIDADE PELA VIOLAÇÃO DO SIGILO - MEDIDAS CAUTELARES INTENTADAS DESPACHADAS PELO JUÍZO FEDERAL - DEFINIÇÃO DA COMPETÊNCIA - APURAÇÃO DE FATO PRATICADO, EM TESE, EM DETRIMENTO DE BENS OU INTERESSES DA UNIÃO - COMPETÊNCIA "RATIONE MATERIAE" DA JUSTIÇA FEDERAL - LEI Nº 5.010, DE 1966 - AÇÃO INIBITÓRIA PROPOSTA EM VARA CÍVEL DO TJDFT - AGRAVO DE INSTRUMENTO - PRELIMINAR - INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA - ACOLHIMENTO - ARGÜIÇÃO ATEMPADA - REMESSA DOS AUTOS À JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU DO ESTADO DO MARANHÃO - DECISÃO UNÂNIME.
Havendo sido instaurado inquérito policial pela Polícia Federal do Estado do Maranhão, visando determinar a materialidade e autoria de fato, em tese, criminoso, praticado em detrimento de bens ou interesses da União e suas autarquias, e tendo sido autorizada a quebra de sigilo telefônico de pessoa residente e domiciliada naquele Estado, por Juiz Federal, que despachou, inclusive, três Medidas Cautelares, é evidente a competência exclusiva da Justiça Federal para conhecer e decidir de toda e qualquer questão que se relacione com esses Procedimentos, podendo e devendo ser declarada a incompetência "ratione materiae" da Justiça do Distrito Federal, que não é Órgão Revisor da Justiça Federal de Primeiro Grau.
Compete à autoridade judiciária fede al que autorizou a quebra do sigilo telefônico determinar a apuração da responsabilidade de autoridade ou servidor público pela violação do segredo de justiça mandado observar." (fls. 269/270)

Opostos embargos de declaração por S.A. O E. DE S.P, restaram rejeitados (fls. 292/298).

Vem, então, recurso especial de S.A. O E. DE S.P, com fundamento na línea "a" do permissivo constitucional, alegando violação ao art. 103 do Código de Processo Civil.

Afirma o recorrente que a conexão somente ocorre entre duas ou mais ações que tenham o mesmo objeto ou causa de pedir. Porém, segundo entende, não é esse o caso dos autos, pois, do que se pode apurar, as medidas cautelares apontadas no acórdão recorrido cuidam exclusivamente da questão da quebra de sigilo telefônico no curso do inquérito policial nº 2007.37.00.001752-4, enquanto na presente ação inibitória civil discute-se eventual existência de conflito entre o resguardo dos direitos de personalidade do Autor e o direito-dever de informar (liberdade de imprensa).

Assinala, ademais, que não há qualquer interesse da União Federal na presente demanda inibitória.

Entende, assim, que não se vislumbra na espécie qualquer das hipóteses indispensáveis ao amparo do fenômeno conectivo entre as medidas cautelares propostas no Juízo Federal criminal e a presente ação inibitória civil, seja do ponto de vista do objeto da ação, seja do ponto de vista da causa de pedir. Requer, em vista disso, seja reconhecida a competência do egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios para o julgamento do feito.

Contra-razões de fls. 397/405. Diz o recorrido que "a questão ora posta, em princípio, não tinha porque ser sujeita à Justiça Federal se a União não comporia - como não compôs, nem compõe - a presente relação processual" . No mais, pretende que a tutela recursal anteriormente deferida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios seja confirmada.

O recurso especial foi admitido por decisão do ilustre Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (fls. 512/516). Distribuídos os autos ao eminente Min. BENEDITO GONÇALVES, este suscitou questão de ordem perante a egrégia Primeira Seção desta Corte, ficando consignado ser da competência da Segunda Seção o julgamento do feito, em vista dos seguintes argumentos, verbis :

"De fato, a presente ação, travada entre particulares, na qual se busca inibir comportamento (obrigação de não fazer), não cuida de Direito Público. Lado outro, observa-se que a matéria de fundo refere-se à proteção de direito da personalidade, questão essa que vem ordinariamente sendo julgada no âmbito Segunda Seção. (...)" (fls. 547/548)

Vieram os autos, então, distribuídos a este Relator.

A d. Subprocuradoria-Geral da República opina pelo desprovimento do recurso, em parecer assim sintetizado:

" - Recurso especial em agravo de instrumento. Decisão que indefere medida liminar requerida em ação inibitória, consistente em determinar que o ora Recorrente se abstenha de publicar dados sigilosos sobre o ora Recorrido em matéria jornalística. Agravo de instrumento. Acórdão recorrido que, após acolher preliminar de incompetência absoluta, declara, de ofício, a competência do Juízo Federal Cível da Seção Judiciária do Maranhão para processar e julgar a causa principal.
- Recurso especial fundado no art. 105, inciso III, alínea "a" da Constituição, que aponta violação ao art. 103 do Código de Processo Civil. Inocorrência.
- Parecer pelo conhecimento e não provimento do presente recurso especial." (fls. 539)

É o relatório.

Passo a decidir.

Colhe-se dos autos que o egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios declarou sua incompetência absoluta para o julgamento do feito, por entender haver conexão entre a presente demanda inibitória e medida cautelar concedida em relação ao inquérito policial nº 2007.37.00.001752-4, ou mais especificamente às medidas cautelares a ele atreladas, em curso perante a Seção Judiciária Federal do Maranhão.

Transcreve-se trecho do voto condutor do acórdão recorrido para melhor delimitar a controvérsia, verbis :

"A situação delineada nos autos refere-se à divulgação de registros telefônicos que fazem parte do inquérito policial em curso perante a Justiça Federal, os quais se tornaram públicos em contrariedade à decisão judicial que decretou o sigilo.

Trata-se, claramente, de descumprimento de decisão proferida por Juiz Federal, o que atrai a hipótese contida no artigo 103 do Códigode Processo Civil, uma vez que o presente Agravo de Instrumento tem por objeto a proteção ao sigilo, já decretado por aquele Juízo.
Notadamente, a lei não permite que a Justiça do Distrito Federal, cuja jurisdição é restrita a esta unidade da Federação, interfira em decisão proferida por Juiz Federal, ainda que seja para mantê-la, sob pena de usurpação de função.
Desse modo, deve o Agravante manejar o feito perante a Seção Judiciária, onde tramitam os autos do Inquérito Policial nº 2007.37.00.001752-4." (fls. 272/273).

Nos termos do art. 103 do Código de Processo Civil:

"Reputam-se conexas duas ou mais ações, quando lhes for comum o objeto ou a causa de pedir".

No caso em apreço, data venia, não resta demonstrada a existência de conexão, por vários motivos.

Não se constata a existência de objeto ou causa de pedir comuns entre as ações apontadas.

Em medida cautelar em inquérito policial realizado pela Polícia Federal a causa de pedir remota é a necessidade de apuração da existência de crime contra bens, serviços ou interesses da Administração Pública Federal (CF, arts. 109, IV, e 144, § 1º, I), enquanto a causa de pedir próxima é a impossibilidade de apuração desses crimes sem a quebra do sigilo telefônico de pessoa investigada. O pedido ou objeto imediato é a expedição de autorização para a quebra do sigilo telefônico, enquanto o pedido ou objeto mediato é o de efetuar-se a escuta telefônica do investigado.

Já na ação inibitória proposta perante a Justiça comum do Distrito Federal, a causa de pedir remota é a necessidade de preservação da garantia constitucional de inviolabilidade da intimidade do autor (CF, art. 5º, X, XI e XII), enquanto a causa de pedir próxima é a publicação na mídia do teor de conversações telefônicas do promovente, ilegalmente "vazadas" de inquérito policial que tramita em segredo de justiça, realizado pela Polícia Federal. O pedido imediato é de natureza inibitória, sendo o pedido mediato a proibição de publicação das conversações que ilegalmente "vazaram" daquele inquérito policial.

Não há, assim, identidade entre referidos elementos das ações a sugerir a existência de conexão entre os feitos.

Cumpre assinalar, ainda, que de acordo com a teoria materialista, existe conexão entre duas ou mais ações quando as causas decidem a mesma relação jurídica de direito material, ainda que sob enfoques diversos.

Na hipótese em comento, também não se trata de mesma relação jurídica de direito material, já que a relação no inquérito policial e respectivas ações se dá entre o Estado (sociedade) e o particular, para apuração de ocorrência de crime e de sua autoria, enquanto na referida ação inibitória a relação se dá entre particulares, acerca da possibilidade de o promovido violar a esfera de intimidade do promovente, usando dados que deveriam estar sob sigilo, mas foram ilegalmente "vazados".

Admite-se também falar-se em conexão, quando duas ou mais ações tratem de relações jurídicas distintas, mas que estejam vinculadas por relação de prejudicialidade.

Não existe, também, relação de prejudicialidade nos casos mencionados. Com efeito, ainda que as medidas deferidas nas cautelares sejam revogadas, permanece o interesse do autor no julgamento da ação inibitória, evitando que o material que já foi obtido do inquérito seja publicado. Assim, também, se a ação inibitória for extinta, nenhum efeito incidirá sobre o inquérito policial ou as medidas cautelares a ele atreladas.

Vale ressaltar, nesse ponto, que no caso sequer é possível a existência de decisões conflitantes, pois seja ou não deferida a tutela inibitória, o inquérito policial no qual se investigam os crimes imputados ao autor segue em segredo de justiça, ao menos enquanto o Juízo criminal entender necessário. Ainda que fosse julgada improvida a ação inibitória, isso não representaria autorização para quebra do sigilo, em conflito com decisão da instância penal federal, pois o mero improvimento de uma ação não significa qualquer provimento judicial positivo. O deferimento ou não de tutela de índole negativa não tem, assim, qualquer influência direta sobre o procedimento criminal.

Deixo consignado, ademais, que não trata a ação inibitória, ao menos diretamente, de descumprimento de decisão proferida por Juiz Federal, pois o autor pretende justamente seja decretada a proibição de o réu publicar na mídia dados extraídos do inquérito policial, de modo a ver protegido seu direito à intimidade, independentemente de perquirir quem seria o responsável pelo vazamento de informações, ou da adoção de medidas administrativas para proteger os dados constantes do procedimento criminal.

Transcrevo, a propósito, os pedidos que constam da inicial da ação inibitória, verbis :

"a) concessão de medida liminar, sem oitiva da parte contrária, para determinar que o Réu e, por via oblíqua, os demais veículos de comunicação que estão utilizando do material disponibilizado por ele, se abstenham de publicar dados sigilosos sobre o Autor contidos na investigação policial em questão ;

b) a concessão de multa (§ 5º, do art. 461 do CPC), no valor diário de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) em caso de descumprimento da medida;

c) a total procedência do pedido para ratificar a liminar antecipatória concedida, tornando-a definitiva por sentença que reconheça e proteja o direito de personalidade do Autor;"

A esse respeito, vale transcrever também decisão do Juízo Federal da 1ª Vara da Seção Judiciária do Maranhão, proferida em 23.07.2009, inserida às fls. 121 dos autos, nos seguintes termos, verbis :

"Ainda que extremamente legítima a preocupação do requerente com a divulgação de dados que digam respeito à sua vida privada, tenho que a via utilizada para o exercício de sua pretensão é inadequada. É que embora caiba ao juiz penal zelar pela regularidade da investigação, no que se inclui obviamente a tutela do sigilo, a pretensão veiculada não se dirige aos atores processuais, mas sim a terceiros estranhos à jurisdição criminal (órgãos de imprensa). Por outro lado, também não questiona a prática de atos administrativos que possam malferir as garantias constitucionais, mas apenas atos praticados por particulares.
Desse modo, o pedido deve ser formulado na via processual adequada, no âmbito da jurisdição civil, cabendo à instância criminal tão somente, já nessa fase do desenrolar dos fatos, apurar as responsabilidades decorrentes da quebra do sigilo (art. 10, Lei nº 9.296/96).
Isto posto, indefiro o pedido formulado.
Ciência ao interessado e ao MPF, este, inclusive, para verificar eventual interesse na apuração do fato ilícito noticiado pelo requerente."

Assim, não existe conexão entre os feitos.

Vale lembrar, ainda, que a Justiça Federal é absolutamente incompetente para julgar demanda entre particulares, o que também impede se cogite, na hipótese, da prorrogação da competência por conexão.

Confira-se:

"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA COMUM ESTADUAL E JUSTIÇA FEDERAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROPOSITURA POR ENTE FEDERAL. AÇÃO DECLARATÓRIA. DEMANDA ENTRE PARTICULARES. COMPETÊNCIA ABSOLUTA. CONEXÃO.
- A competência da Justiça Federal é absoluta e não se prorroga por conexão para abranger causa onde não haja a presença de entes federais previstos no artigo 109, I, da Constituição Federal, em razão do fato de ser absolutamente incompetente para julgar demandas entre particulares. Precedentes. Agravo no conflito de competência não provido." (AgRg no CC 107.206/SE, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI , SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 25/08/2010, DJe 10/09/2010)

De todo modo, em face da conclusão de que a ação inibitória seria conexa com as medidas cautelares atreladas ao inquérito policial e, vislumbrando, ainda, interesse da União no julgamento do presente feito, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios determinou a remessa dos autos ao d. Juízo Federal Cível da Seção Judiciária do Maranhão.

Transcrevo, mais uma vez, trecho do acórdão recorrido, mais especificamente do voto da lavra do ilustre Desembargador LÉCIO RESENDE, verbis :

"A meu ver, a competência para examinar e decidir as questões emergentes a partir da instauração do inquérito policial (que envolve a quebra do sigilo, e, portanto, necessariamente matéria de ordem constitucional) aliada à existência de interesse da União (investigado por uma polícia criada, organizada e mantida pela União) é exclusiva da Justiça Federal do Estado do Maranhão.

(...)

Por outro lado, as três cautelares que tramitam no âmbito da Justiça Federal do Estado do Maranhão, sejam elas preparatórias ou incidentais, já despachadas, firmam preventivamente, a competência desse ramo do Judiciário brasileiro. (...)" (fls. 276/277)

Não se vislumbra, porém, interesse da União na presente demanda inibitória, instaurada, como dito alhures, entre particulares, com vistas a proteger o direito à intimidade do autor.

Não é por outra razão que o preclaro Min. BENEDITO GONÇALVES entendeu pela incompetência da egrégia Primeira Seção para o julgamento do presente recurso especial, consignando que "... a presente ação, travada entre particulares, na qual se busca inibir comportamento (obrigação de não fazer), não cuida de Direito Público. Lado outro, observa-se que a matéria de fundo refere-se à proteção de direito da personalidade..."

Ante o exposto, conheço do recurso e lhe dou provimento para declarar a competência da Justiça do Distrito Federal para o julgamento do feito, determinando a remessa dos autos ao egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios para que prossiga no julgamento do agravo de instrumento interposto por F.J.M.S como entender de direito.

Brasília (DF), 15 de dezembro de 2011.

MINISTRO RAUL ARAÚJO

Relator

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