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Literatura

A grande personagem de Camilo, a língua portuguesa

Autor tomou partido na celeuma que entraria para a história literária de Portugal como Questão Coimbrã.

Da Redação

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Atualizado em 19 de dezembro de 2012 11:43

Camilo Castelo Branco cultuava a língua portuguesa clássica, reverenciava as lições dos quinhentistas e seiscentistas, nas quais se lastreava para "desbancar desapiedadamente as modas literárias estrangeiradas." Inseriu-se no Romantismo à sua maneira: trabalhou arduamente a exacerbação das paixões, a loucura, os amores tornados tragédias, mas não foi medievalista, tampouco liberal-constitucionalista. Temia o ideal burguês, a "corrupção do dinheiro", os que trabalham e "entesouram". Bateu-se pelas tradições, pela História de Portugal - na linha de seus predecessores ilustres, Herculano e Garrett - pela vida "provinciana e aristocrática" que conheceu no norte do país.

Camilo tomou partido na celeuma que entraria para a história literária de Portugal como Questão Coimbrã, postando-se ao lado do grupo de Castilho, representante da literatura conservadora em oposição aos jovens realistas de então. Ainda assim, seu apurado senso crítico não permitiu que suas obras da maturidade ficassem insensíveis a algumas das propostas do novo movimento. É comum os críticos apontarem recortes do ideário do Realismo em suas Novelas do Minho, publicadas entre 1875-1877.

Além dos romances, Camilo vai dedicar-se à historiografia, ao teatro, e à crônica jornalística (gênero em que fazia crítica de costumes, comentários políticos, crítica literária e artística) e o relato memorialístico de personalidades e fatos. Será também um grande tradutor.

Camilo foi um grande cultor da língua. É comum gramáticos e outros estudiosos buscarem em seus escritos os parâmetros para o bom português. Ao longo da leitura de Amor de Perdição não são raras as vezes em que o leitor surpreende-se com frases belas, seja pela sonoridade, seja pela exatidão da imagem que invocam, seja enfim pelo fato de serem construções divertidíssimas, em que o talento de observador mordaz do autor leva o leitor ao riso.

No segundo capítulo do romance, no momento em que explica a alteração de humor e comportamento do herói ("Simão Botelho amava."), salta aos olhos - e fica por muito tempo nos ouvidos do leitor - a belíssima versão de Camilo para o "amor à primeira vista", tão caro ao ideário romântico:

"Da janela do seu quarto é que ele a vira a primeira vez, para amá-la sempre."

Mas como alertam seus críticos, não foi simples a adesão de Camilo a tal escola literária. No início do capítulo IV, já em andamento a oposição das famílias ao romance dos jovens, vai rir - e fazer rir o leitor, é claro - dos arroubos artificiosos da ficção sob tais moldes, em saboroso retrato de sua personagem:

"...Teresa advinha que a lealdade tropeça a cada passo na estrada real da vida, e que os melhores fins se atingem por atalhos, onde não cabem a franqueza e a sinceridade. Estes ardis são raros na idade inexperta de Teresa; mas a mulher do romance quase nunca é trivial, e esta de que rezam os meus apontamentos era distintíssima. A mim me basta, para crer em sua distinção, a celebridade que ela veio a ganhar à conta da desgraça."

Bem mais andada a história, já no capítulo XIX das desventuras dos heróis, no momento em que é dado a Simão livrar-se da forca, outra preciosidade:

"Ao deslaçar da garganta a corda da justiça, Simão Botelho teve uma hora de desafogo, como que sentia o patíbulo lascar entre os seus braços, e então convidou o coração da mulher que o perdera a assistir às segundas núpcias da sua vida com a esperança."

Poder-se-ia garimpar o romance todo, folha a folha. E assim, nessa toada, ler Camilo Castelo Branco é descobrir potencialidades da língua portuguesa, valorizá-la, prestigiá-la.

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