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Ministro Marco Aurélio critica Estado omisso ao receber prêmio de direitos humanos na OAB/SP

Da Redação

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Atualizado às 12:11


Discurso

Ministro Marco Aurélio critica Estado omisso ao receber prêmio de direitos humanos na OAB/SP

Em seu discurso de agradecimento pelo prêmio de Direitos Humanos Franz de Castro Holzwarth - 2007, o ministro Marco Aurélio Mello criticou duramente o Estado brasileiro. "Quando se cuida de acusados por algum delito - por menor que seja, não importa - , ao Estado brasileiro parece justificar-se um tratamento penoso, declinando de atenção mais curada aos direitos humanos, numa lógica das mais perversas, a do 'bem feito'", afirmou. Além da principal homenagem ao ministro do STF, a OAB SP laureou com Menção Honrosa o desembargador Antonio Carlos Malheiros, do TJ/SP, e o Corpo de Bombeiros do Estado de São Paulo. A cerimônia ocorreu nesta segunda-feira, às 10h, no Salão Nobre da Ordem.

"Nesta data em que o mundo comemora o Dia Internacional dos Direitos Humanos, entrego ao ministro Marco Aurélio Mendes de Farias Mello, do Supremo Tribunal Federal, a mais alta condecoração de Direitos Humanos da OAB/SP". Com esse depoimento, o presidente da Ordem paulista - Luiz Flávio Borges D'Urso - abriu a solenidade de premiação do Prêmio de Castro Holzwarth de Direitos Humanos da OAB/SP de 2007.

Em sua saudação aos homenageados, Mário de Oliveira Filho, coordenador da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP, também destacou a sobreposição da premiação como o Dia Internacional dos Direitos Humanos pela importância que esse tema vem adquirindo em todas as partes do mundo. "Esse dia, na verdade, deve ser comemorado e preservado todos os dias do ano e cada ação do nosso dia-a-dia, porque vivemos um momento conturbado no mundo nas questões dos direitos humanos, não só no Brasil ou especificamente na cidade de São Paulo. A entrega do Prêmio Franz de Castro, um advogado que, em nome de um ideal, foi sacrificado no momento em que tentava preservar a vida de alguém", diz Oliveira Filho.

"Sempre ouvimos a história que direitos humanos servem para passar a mão na cabeça de bandido. Não é verdade. Franz de Castro, naquele momento que sucumbiu, tentava preservar a vida não de bandidos, mas seres humanos alcançado de alguma maneira ou por algum motivo pelos braços da lei. Tentava resgatar a dignidade daqueles seres humanos. A defesa dessa dignidade e desse respeito, pela qual muitas vezes somos criticados, nada mais é que o respeito a cada um de nós, ao direito individual de cada cidadão", ressalta Oliveira Filho, lembrando que "o Brasil vive um Estado Democrático de Direito, mas o Estado policialesco começa a avançar e a se entranhar na sociedade".

Diante dessa constatação, Oliveira Filho destaca a importância de um "momento como esse em que OAB/SP homenageia alguém que tem uma história de vida em pró dos direitos humanos, demonstrada pela sua independência, seu amor à dignidade e à liberdade de cada um". Conforme Oliveira Filho, decisões emanadas pelo ministro da Suprema Corte, muito além da profícua lição de Direito que reflete cada uma das suas decisões, deixa transparecer e se elevar o respeito à cidadania e ao cidadão pouco importando a sua classe social, a sua etnia ou sua origem. "Muitas vezes é criticado por isso, mas o ministro Marco Aurélio Mello vem demonstrando, com a sua atuação, ao longo desses anos que, acima de tudo, deve-se preservar a dignidade de cada cidadão".

O presidente da Comissão de Direito Humanos da Ordem paulista destacou a homenagem com a Menção Honrosa ao desembargador Antonio Carlos Malheiros pelas suas "decisões onde - intransigentemente - mantém a dignidade do ser humano acima de tudo; que desenvolve um trabalho particular, como homem e ser humano, em pró daqueles menos favorecidos e isso, sem dúvida nenhuma, torna-se um motivo de júbilo para todos que vivem da dignidade, da credibilidade e da justiça". Oliveira Filho não deixou de externar "a gratidão eterna" aos homens do Corpo de Bombeiros do Estado de São Paulo que têm como arma a água e um infinito amor ao próximo, que os faz entrar um prédio em chama ou se lançar em águas revoltas para salvar um ser humano, que naquele determinado momento depende única e exclusivamente desta corporação.

Com sua característica crítica, o grande homenageado da cerimônia, lembrou que, há bem pouco tempo, manchetes veicularam, com estardalhaço ufanista, a notícia de que o País fora promovido pela ONU ao patamar dos países com alto índice de desenvolvimento humano. "Ainda no calor das comemorações, foram revelados dados de estudo que mostrando que 52% dos menores presos ou são mortos nos cárceres disfarçados de centros de ressocialização ou quando são soltos retornam à prática do crimes", disse o ministro Marco Aurélio de Mello.

Marco Aurélio de Mello também abordou temas delicados, como sevícias, torturas, execuções, abuso de autoridades, extorsão, policiais corruptos, autoridades negligentes, servidores envolvidos com criminalidade. Para ele, "o que causa perplexidade é que o próprio Estado aparece cada vez mais como partícipe, por ação ou omissão, por desconhecimento ou despreparo, por negligência, comodidade ou conformismo".

Para o ministro, esse País de contrastes evidentes, a população se mostra acostumada com os paradoxos, quando não os cultua, sob a rubrica muito em voga da diversidade, que em tempo algum viabiliza o benefício das classes mais pobres. "Na base da pirâmide, grassa o racismo, a discriminação, os depoimentos extorquidos", avalia Marco Aurélio de Mello, lembrando que "as leis são feitas para os homens e não o contrário, os homens para as leis e que na atuação judicante, é preciso sempre potencializar o lado humanístico e buscando para o caso concreto a solução mais justa. É preciso que acordemos para o princípio básico da República e da preservação da dignidade do homem de forma linear, especialmente aqueles que são menos afortunados nesta vida impiedosa".

Laureado com a Menção Honrosa por sua atuação na Comissão de Justiça e Paz e na ONG Viva e Deixe-me Viver, entidade que cuida da humanização hospitalar trabalhando com crianças, o desembargador Antonio Carlos Malheiros disse que dividiria o prêmio. "Não posso levar esse prêmio só para mim. Aliás, vou ficar com uma pequena parte e o restante vai para muita gente que tem me ajudado nesta caminhada: moradores de rua, principalmente, as crianças que desde a época da faculdade convivo; as pequenas prostitutas de 10, 12 anos; os pequenos reis de rua que me ensinaram coisas que não aprendi na escola". Há dez anos, Malheiros criou o Viva e Deixe-me Viver para levar alegria para crianças hospitalizadas, na época com quatro companheiros, hoje conta com mais de mil voluntários espalhados por 70 hospitais em todo o Brasil.

O coronel PM Manuel Antonio da Silva Araújo, comandante do Corpo de Bombeiros do Estado de Sã Paulo, declarou a emoção por receber o prêmio uma vez que conheceu pessoalmente o advogado Franz de Castro. "Na época, eu era o comandante do posto do Corpo de Bombeiros de Jacareí e quis o destino que eu estivesse aqui recebendo o Prêmio Franz de Castro", disse o coronel. "Naquele dia, ele deu o exemplo de como defender os direitos humanos, oferecendo aquilo que tinha de maior valor, a própria vida em defesa daquelas pessoas que ali estavam encurraladas como animais, que procuram se defender a qualquer custo".

"É com imensa satisfação que o Corpo de Bombeiros recebe essa Menção Honrosa, inédita em sua história centenária e exatamente quando se comemora o Dia o Dia Internacional dos Direitos Humanos, que são direitos fundamentais do cidadão, porque sem eles a pessoa não é capaz de se desenvolver e participar plenamente da vida em sociedade. Respeitar os direitos humanos é promover a vida em sociedade, sem discriminação de classe social, de cultura, de religião, orientação sexual. É preciso respeito às diferenças. Esse prêmio é um estímulo para que continuemos na busca contínua do aperfeiçoamento em pró do melhor atendimento possível à população", avalia Silva Araújo.

O secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo, Ronaldo Bretas Marzagão, destacou a importância do prêmio para o Corpo de Bombeiros, a corporação mais confiável e a mais querida do serviço público para 96% da população, da honraria ao ministro do STF e ao desembargador do TJ/SP. "Além de expoente da Suprema Corte e presidente do TSE, Marco Aurélio de Mello brilha nos tribunais como garantidor dos direitos fundamentais do cidadão e a todo o momento, como grande juiz, afirma e sustenta os direitos básicos com a coragem que o caracteriza, e com o brilhantismo que norteia sua vida profissional e pessoal".

Conforme o conselheiro federal e secretário-adjunto da OAB, Alberto Zacharias Toron, "para botar a pessoa de joelho, aquém da dignidade humana, as prisões, muitas delas desnecessárias, ignora a presunção de inocência, que é jogada pelo ralo. Quando o direito ao devido processo legal se esvai é que aparece a grande figura do ministro Marco Aurélio, que faz a diferença", destaca Toron. "Estamos ao seu lado na defesa de direitos fundamentais que corporificam o devido processo legal, na defesa da presunção de inocência, na defesa do Estado que trate com dignidade as pessoas, sejam elas suspeitas, acusadas ou mesmo condenadas", diz Toron, lembrando que o Prêmio Franz de Castro "é testemunho dessa profissão de compromisso da Ordem que acredita na construção de uma sociedade fraterna e justa".

Além dos homenageados (o ministro Marco Aurélio de Mello, o desembargador Antonio Carlos Malheiros e o coronel PM Manoel Antonio da Silva Araújo, comandante do Corpo de Bombeiros do Estado de São Paulo), participaram da mesa de trabalhos da cerimônia de entrega do Prêmio Franz de Castro, o presidente da Ordem paulista, Luiz Flávio Borges D'Urso; o coordenador da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP, Mário de Oliveira Filho; conselheiro federal e secretário-adjunto da OAB, Alberto Zacharias Toron; Luiz Antonio Guimarães Marrey, secretário da Justiça e Defesa da Cidadania de SP; o secretário de Segurança Pública, Ronaldo Augusto Bretas Mazargão; o secretário de Transporte do Município de São Paulo, Alexandre de Moraes; o vice-presidente eleito do Tribunal de Justiça de SP; o presidente eleito do Apamagis (Associação Paulista da Magistratura), desembargador Henrique Nelson Calandra; Etevaldo Silva, da FMU; Maria Odete Duque Bertasi, presidente do IASP; Márcio Kayath, da AASP; e Carlos Cardoso, do Ministério Público.

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