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Regulação e a modernidade: como atuar?

terça-feira, 27 de junho de 2017

Atualizado às 08:41

Vitor Frederico Kümpel e Ana Laura Pongeluppi

A interface direito e tecnologia é um desafio atual. Isto porque as normas que regulam a sociedade se apresentam, via de regra, após determinadas demandas sociais, regulando situações pré-existentes. Ainda, o processo legislativo pode ser demorado, dentre tantos fatores, especialmente pela discricionariedade e subjetividade do sistema político sobre o qual está assentado.

Nesse sentido, regular especificamente os serviços públicos apresenta-se como um desafio ainda maior. Garantir direitos e certa segurança jurídica e, ao mesmo tempo, atualizar a regulação perante as novidades tecnológicas que permeiam as relações sociais e trazer novas necessidades é tarefa dos diversos entes públicos, mas principalmente, do Poder Legislativo.

A Administração Pública, deve-se salientar, tem por escopo assegurar uma miríade de necessidades coletivas com vistas ao bem-estar da população. Para tanto, é composta por um conjunto de órgãos, serviços, agentes do Estado e pessoas coletivas. É também o conjunto funcional e normativo que organiza as funções e administração do próprio Estado, regulando os serviços públicos.

Como equilibrar, portanto, a atuação administrativa regulatória frente às novidades e necessidades tecnológicas que surgem sem qualquer previsão legal? Qual a função da Administração e quais suas limitações? Ilustra-se o caso com as novas tecnologias disruptivas, os aplicativos de serviços, sejam de transporte, domésticos ou assistenciais. Regulamentá-las, identificando o que já é positivado e aplicando a norma já posta, bem como analisar aquilo que sobressai a esfera de competência administrativa e merece um regime jurídico distinto, revela-se como principal desafio. Ademais, a regulação é matéria sensível, na medida que precisa garantir direitos sem subtrair circulação de riqueza.

Há uma solução? Cabe à Administração legislar? Aplicar o aparato normativo extensivamente, identificando toda inovação na seara dos serviços como serviços públicos? Se assim for, deve atuar como regulador geral? De que forma?

Não há uma resposta objetiva. O que há, contudo, são as limitações da atuação administrativa. Estando sujeita à legalidade e à proporcionalidade, deve (i) analisar o aparato legal existente com cautela, identificando se de fato é um serviço público; (ii) em sendo essa espécie de serviço, cabe aplicação da norma ou, na falta desta - o que tende a acontecer - pode e deve apresentar um regime jurídico distinto com vistas a uma atuação dos novos agentes em consonância com os preceitos econômicos e concorrenciais; (iii) tanto a aplicação normativa como a regulação que porventura deva ocorrer opera-se por meio de agências e agentes específicos para cada área, consoante sua competência técnica e jurídica, averiguando os impactos sistêmicos de sua atuação.

Com o fenômeno da globalização, as tecnologias multiplicam-se e são mundialmente utilizadas de forma indistinta, cabendo a cada Estado estabelecer um modelo de recepção dos novos aparatos tecnológicos a fim de garantir o uso adequado por suas populações sem descurar de tutela protetiva, como já mencionado.

No campo da atividade notarial e registral não é diferente. O sistema financeiro exige uma nova postura por parte de tabeliães e registradores sob pena de criar um sistema em paralelo a fim de atender às necessidades da lex mercatoria.

Grande é o dilema, na medida em que o aparato burocrático "cartorial" está assentado sob o prisma da segurança jurídica que tem por sustentáculo procedimentalização e técnica própria. As novas tecnologias, por sua vez, têm por fundamento desburocratização, mitigação de procedimento, extrema celeridade e simplicidade e que nem por isso garantem, por si só, os melhores direitos e efeitos para o cidadão.

Não há como falar que burocracia é sempre sinônimo de retardo e desburocratização é sempre sinônimo de modernidade. Precisa haver um equilíbrio nesse processo. Oportunamente, em outra coluna, discutiremos o chamado blockchain e os bitcoins para a atividade notarial e registral.

Dilema para notários e registradores que por um lado sabem que precisam se reinventar sob pena de perda de mercado e por outro lado sabem que podem mecanizar as atividades de tal sorte a tornarem-se prescindíveis, passando a constituir uma mera plataforma de dados operados por sistema autônomo.