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Política & Economia NA REAL n° 94

terça-feira, 30 de março de 2010

Atualizado em 29 de março de 2010 16:01

 

Sinais de estabilização e calma

Na semana passada, tivemos duas boas notícias que aliviaram as tensões mais recentes na economia mundial. A primeira foi o reforço na liderança política do presidente Obama com a vitória na reforma do sistema de saúde por estreita margem de votação na Câmara dos Representantes. Isto ocorreu no exato momento em que o declínio da popularidade do presidente estava em marcha e já causava desconfianças na execução da política econômica. A segunda notícia foi o apoio da União Européia à Grécia que pôde assim emitir títulos novos no mercado e rolar sua dívida. Neste caso, foi um apoio tardio devido à teimosia da Alemanha que, apesar de ter um governo dito progressista, mostrou-se uma aliada da especulação em relação à economia helênica.

Calma nos mercados

As duas notícias mencionadas na nota acima foram suficientes para acalmar os ânimos especulativos, sobretudo no mercado de moedas e no mercado de ouro. Adicionalmente, os mercados acionários mais importantes do mundo se valorizaram e reforçaram a percepção de que há mais fundamentos positivos que negativos neste momento. A demanda nos EUA continua a se recuperar, mesmo que o ritmo ainda seja lento. De toda a forma é muito provável que os resultados do primeiro trimestre do ano das maiores empresas com cotações em bolsa sejam bons e corroborem as boas-novas.

Brasil, também em ritmo lento

Há sinais inequívocos de que os fluxos de capital para o Brasil, sobretudo no mercado financeiro e de capital, estão se reduzindo. Os investidores acreditam que o crescimento de 2010 está "garantido", mas de outro lado, não há nenhuma política nova que indique que a sustentação do crescimento a partir de 2011 seja sólida. De pouquinho em pouquinho os investidores querem saber mais sobre o processo eleitoral e a influência sobre a economia.

Sonho meu...

A China mantém desde o final dos anos 80 uma política cambial francamente favorável às exportações do país. Foi este um dos principais componentes para favorecer a ampla industrialização do país nestas últimas décadas. O governo Obama teme que a continuidade da fortaleza do dólar perante o Yuan, a moeda chinesa, dificulte a recuperação da economia norte-americana. Assim sendo, a questão cambial é a prioritária na relação entre os dois países. Na última quinta-feira, o secretário do Tesouro dos EUA, Timothy Geithner, disse perante o Senado que há sinais de que a China valorize a sua moeda nos próximos meses. O detalhe monstruoso da fala é que a opinião de Geithner não tem absolutamente nenhum amparo na realidade. O governo chinês continua mudo e mouco quando o assunto é câmbio. Só não é cego...

Política monetária política I

A leitura da última ata do Copom, referente a reunião de duas semanas atrás, que optou pela manutenção da taxa básica de juros em 8,75%, não deixa a menor dúvida - a manutenção da Selic foi uma decisão meramente política. E não de política monetária. Ou foi isto ou o BC está precisando contratar um redator para seus textos com melhores relações com a língua pátria.

Política monetária política II

Aventam-se três razões para esta decisão :

1. A diretoria do BC não suportou as sugestões de Lula e as pressões do ministério da Fazenda;

2. Deu-se um presente do presidente do BC, Henrique Meirelles, às vésperas de seu retorno à política eleitoral e partidária. Não ficou nas suas costas a mancha (tida como impopular eleitoralmente) de ter iniciada a nova escalada dos juros brasileiros;

3. Deu-se um presente ao futuro presidente da instituição, Alexandre Tombini : como ele é funcionário da carreira (tido, portanto, como mais influenciável por seus sucessores) e é apontado como um adversário duro dos monetaristas radicais que ocupavam algumas diretorias do BC, ganho a oportunidade de comandar a ascensão da Selic para mostrar externamente independência e firmeza de convicções quanto ao papel da política monetária.

Qualquer que tenha sido a motivação do BC, as três acima ou outras, a verdade é que gerou uma desconfiança quanto ao poder da influência eleitoral nas decisões econômicas neste momento. O Relatório Trimestral da Inflação, do BC, a ser divulgado esta semana, poderá dar indicações cruciais sobre o que o BC está pensando da situação econômica. É o último redigido sob a égide e sob a orientação do diretor Mário Mesquita, o último diretor do BC nesta fase egresso do mercado financeiro.

Radar NA REAL

Continuamos recomendando aos nossos leitores que mantenham as suas posições de risco. Nas duas últimas semanas houve uma boa recuperação dos mercados acionários mundiais e menores inquietações no mercado de renda fixa e de moedas (por causa do plano de resgate da Grécia) e no de metais (tranquilidade maior em relação aos riscos e à inflação). Manter as posições é a melhor estratégia, mas é muito pouco provável que existam mudanças bruscas no cenário. Assim sendo, a sensação de marasmo pode voltar. É preciso olhar para um horizonte de mais longo prazo neste momento em que a renda fixa não rende muito, sobretudo lá fora, e os mercados acionários continuam de olho no perfil dos fundamentos macroeconômicos. Paciência é a palavra do momento.

30/3/10  

TENDÊNCIA

SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo
Juros ¹
- Pré-fixados NA alta alta
- Pós-Fixados NA alta alta
Câmbio ²
- EURO 1,3451 estável/queda estável/baixa
- REAL 1,8090 estável/baixa estável/baixa
Mercado Acionário
- Ibovespa 68.682,66 estável/queda estável/alta
- S&P 500 1.159,99 estável alta
- NASDAQ 2.403,77 estável alta

(1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais).
(2) Em relação ao dólar norte-americano
NA - Não aplicável

A eleição ainda não fez morada no coração brasileiro

O dado mais expressivo da pesquisa DataFolha que surpreendeu agradavelmente uma oposição cabisbaixa e tirou a paz dos eufóricos governistas - José Serra obteve 9% de frente sobre Dilma Roussef, contra 4 pontos do levantamento de um mês atrás - está sendo negligenciado nas análises do novo cenário constatado pelo instituto : quase 60% dos eleitores (59% para ser bem exato) não sabem ainda em quem vão votar se não se lhes apresenta a lista com os prováveis candidatos. A principal tradução disto é que o retrato que as pesquisas estão revelando até agora é extremamente precário e nada é definitivo. O coração do brasileiro "médio" ainda não assimilou a disputa eleitoral, tem outras preocupações, tais como seus afazeres do dia a dia e, em pouco tempo, a Copa do Mundo. A política eleitoral vai ficar mesmo para agosto. No momento, ela é preocupação apenas dos participantes do jogo e de parte da sociedade mais bem informada. Não chegou ainda ao que o experiente Tancredo Neves chamava de "grotões". O que, pelos sinais disponíveis, conta mais pontos para Dilma (na verdade para Lula). Todas as pesquisas dos últimos meses mostram que quanto menor o grau de escolaridade e quanto menor o nível de renda do eleitor mais seu voto tende para o governismo. Este o grande desafio de Serra e da oposição : furar a barreira do programa Bolsa-Família.

Dilma, o reverso da medalha

Na outra ponta, o maior desafio de Dilma e Lula é mesmo empolgar - ou pelo menos invadir um pouco mais os corações - das regiões mais ricas - Sul e Sudeste - e dos setores mais escolarizados e de melhor nível de renda. A classe média, negligenciada há algum tempo nas análises sobre influências eleitorais, vai fazer a diferença em outubro. Por ironia, incluindo a chamada "nova classe média do Lula", os emergentes que nos últimos anos deixaram a classe D.

PT, o problema

O partido do presidente Lula não parece nem um pouco interessado em facilitar a vida de seu líder e da candidata que ele lhe impôs. Está querendo mostrar que não é tão submisso assim. Só deste modo pode-se entender a decisão do PT do Maranhão - de, por escassos dois votos (87 a 85), apoiar a candidatura ao governo do Estado do deputado Flávio Dino, de outro aliado, o PC do B, contra a atual governadora Roseana Sarney. Logo na terra de José, o patriarca do clã, a quem Lula estendeu todos os salamaleques e que tem peso nas decisões do PMDB governista. Até parece provocação.

PT, o problema - II

Não foi também ao gosto do governador Sérgio Cabral, o emotivo peemedebista fluminense, homem capaz de chorar lágrimas de pré-sal por qualquer coisa, a definição do PT/RJ pela candidatura de Lindberg Farias ao Senado em detrimento da ex-ministra Benedita Silva, secretária de estadual de Assistência Social. A vitória do prefeito de Nova Iguaçu foi ampla. Só pode ser provocação.

Minas na mira

Com essas pequenas articulações petistas, mas significativas do ponto de vista simbólico, o governo terá de redobrar suas atenções em Minas Gerais, onde a disputa entre PMDB e PT para ver quem dá o candidato a governador da chapa governista está longe de uma solução amigável. Apesar de Lula já ter avisado aos dois contendores petistas, o ministro Patrus Ananias e o ex-prefeito Fernando Pimentel, que a preferência é do ministro Hélio Costa, do PMDB, os peemedebistas ainda não se deram por achado. E, segundo as surdas vozes políticas, que sopram das montanhas das Gerais, não vai se conformar tão cedo - e talvez nunca. Os ventos mineiros até já reentronizaram na política local uma expressão dos anos 1950, nascida a partir da frustrada candidatura do mineiro Cristiano Machado à presidência da República, pelo velho PSD, contra Getúlio Vargas - cristianização. O PSB entregou seu candidato aos leões e foi aninhar-se nos braços do ex-ditador. Cristianizar virou sinônimo de traição política. Diz um maldoso que o verbete pode ganhar um sinônimo no dicionário da política brasileira : helizar ou costear.

A paz tucana

Os serristas ganharam um fôlego para tentar celebrar uma paz total com seus companheiros de plumagem e contornar as insatisfações crescentes no DEM. O DEM está para o PSDB assim como o PMDB está para Lula, guardadas um pouco as proporções.

Rojões peemedebistas

Tanto quanto os tucanos e companhia, quem está comemorando o resultado da pesquisa DataFolha é, por paradoxal que seja, o PMDB governista de Michel Temer, José Sarney e outros abnegados de mesma estirpe. Como comentamos neste espaço outras vezes, o PT e Dilma, dada a impressionante arrancada da ministra nos últimos meses, estavam sentindo-se respaldados o suficiente para desdenhar a importância eleitoral do PMDB. Lula e os seus vão ter de rever esta posição e tomar, além de um caldinho de galinha, uma boa mezinha caseira para a ansiedade : com novo cacife, o PMDB vai voltar a ser uma noiva menos ofertada.

Opacidade - I

Quem conhece a ministra Dilma, para além das aparências que ela exibe, e desfruta de informações de dentro de seu esquema eleitoral, garante que é menor que zero a possibilidade de o ex-ministro José Dirceu ocupar posição de influência e destaque na campanha da preferida de Lula. E depois do tiroteio do caso Telebrás/Eletronet, que pegou o antecessor de Dilma na Casa Civil em pleno salto para voltar a dar cartas no PT, o conselho dado ao agora empresário é que ele se recolha aos bastidores, em silêncio obsequioso.

Opacidade - II

Apagaram-se mais algumas velinhas que iluminavam a vacilante candidatura presidencial do deputado Ciro Gomes. Não deve passar de meados de abril.

Chantagem

A Petrobras está ameaçando cortar parte dos seus investimentos este ano, de R$ 88 bilhões, se o Congresso (o projeto já está no Senado, mas volta à Câmara se for modificado pelos senadores) não aprovar definitivamente até meados do ano a proposta de capitalização da empresa. Candidamente seus dirigentes dizem que não estão pressionando os parlamentares. E não estão mesmo, estão indo um pouco mais longe - para o perigoso terreno da chantagem. Pode colher efeitos exatamente contrários ao visado. Congressistas gostam demais desse tipo de desafio : aumentar o poder de barganha deles.

O Congresso ameaça ?

A semana de feriado, com a Brasília do Congresso naturalmente mais vazia, não trará descanso para os operadores políticos do governo no legislativo. Eles precisarão costurar um acordo para a votação da MP do aumento dos aposentados que ganham acima do salário mínimo para evitar que os deputados aprovem um reajuste muito superior ao que ele julgar razoável no momento. O texto original prevê um reajuste real 50% daquele pretendido pelos deputados, inclusive boa parte dos governistas. Há ainda a possibilidade de se aprovar uma emenda equiparando daqui para frente o aumento de todas as aposentadorias ao reajuste do salário mínimo. Se for a votação sem acordo, passa. E o acordo tem de ser muito bem acertado para não haver surpresas. Tudo o que Lula não quer é ter de vetar uma coisa dessas no auge da campanha eleitoral.

Rebelião no Congresso ?

Se se confirmar a informação de que o contigenciamento (suspensão que pode ser temporária ou definitiva) de mais de R$ 21 bilhões determinado pelo Ministério do Planejamento no Orçamento deste ano atingirá R$ 10 bilhões dos R$ 15 bilhões previstos para as chamadas emendas parlamentares, o governo pode se preparar para alguma "falseta" por parte dos deputados e senadores. Um corte desses, em um ano em que a maioria está envolvida em árdua guerra pela reeleição ou por um novo cargo político, é considerado uma traição. E costuma ser vingado quando menos se espera, numa dessas votações que o Executivo considera cruciais. Como, por exemplo, a questão dos aposentados. Ou, do pré-sal.