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Porandubas nº 579

quarta-feira, 27 de junho de 2018

Atualizado às 07:44

Abro a coluna com as Minas Gerais e seu rico folclore político.

A Santíssima Trindade

No confessionário, Monsenhor era rápido. Não gostava de ouvir muita lengalenga. Ia logo perguntando o suficiente e sapecava a penitência que, sempre, era rezar umas ave-marias em louvor à N. S. do Rosário. Fugindo ao seu estilo, certa feita ele resolve perguntar ao confessando quantos eram os mandamentos da lei de Deus.

- São 10, Monsenhor.

- E quantos são os sacramentos da Santa Madre Igreja?

- São 7, Monsenhor.

- E as pessoas da Santíssima Trindade, quantas são?

- São 3, Monsenhor.

Monsenhor, notando que o confessando só sabia a quantidade, pergunta rápido:

- E quais são essas pessoas?

A resposta encerrou a confissão:

- As três pessoas são o senhor, o dr. Didico e o dr. Zé Augusto.

(Historinha contada por José Abelha em A Mineirice).

Pleito de outubro

Os debates este ano terão mais importância que em campanhas anteriores. Alguns protagonistas terão dificuldades, a partir de Bolsonaro, que não domina temáticas centrais. Os marqueteiros baixaram seus preços. As redes sociais vão tentar suprir os vazios de comunicação. Dinheiro faltará para muitos, enquanto outros financiarão a própria campanha, caso de Meirelles. O maior desafio de todos: desenvolver e lapidar a identidade - o escopo do perfil. A coluna de hoje tenta apresentar um roteiro para o desenvolvimento de uma campanha.

O marketing eleitoral

Ante o volume de dúvidas e interrogações que se fazem a respeito da viabilidade eleitoral dos protagonistas do pleito deste ano, este consultor dedica a maior parte da coluna ao marketing eleitoral. Muita gente - candidatos e assessores, dentre muitos - crê que o marketing fará as correções sobre os perfis eleitorais, melhorando performances verbais e atos dos candidatos. Tentarei repor conceitos e comentar situações vividas ao longo de quatro décadas atuando em campanhas.

1ª questão: Marketing não elege

O marketing eleitoral não elege um candidato. Ajuda-o a ajustar fatores que integram a estratégia de visibilidade dos competidores, atenuando aspectos negativos e reforçando aspectos positivos. Quem ganha campanha é o candidato com a força de suas crenças e convicções. Mas se o marketing for um desastre, também contribuirá para a derrota do candidato. Farei observações sobre campanhas majoritárias, mais complexas.

2ª questão: Crença

O candidato deve acreditar em seus potenciais, mesmo que entre numa campanha apenas para ser conhecido para barganhar posição no segundo turno e até negociar posições e cargos, caso faça coligação com candidatos com condições de vir a ganhar. "Somente aqueles que conseguem ir longe saberão até podem chegar" (Elliot). Se o candidato acredita mesmo em suas condições, ele passará energia positiva para sua equipe de assessores, motivando cada um a trabalhar com mais vontade, ímpeto e motivação.

3ª questão: Identidade

O candidato precisa construir e lapidar o edifício de sua identidade, que abriga sua vida, sua história, seu pensamento, seus laços, enfim, o composto conceitual que o identifica. Essa é a coluna vertebral da campanha. O eixo, a mola propulsora, o vértice de uma pessoa. Se não construir forte identidade, será uma lesma. Uma pitada de sal sobre ela a faz morrer, derretendo-se em gosma. A identidade o distinguirá de outros candidatos, permitindo que o eleitor faça sua escolha pelo critério de identificação entre os valores (dos eleitores) e os valores dos candidatos. A psicologia arremata esse conceito com dois fenômenos com os quais trabalha: identificação e projeção. É como se uma cola unisse os perfis, por meio da projeção - as pessoas atribuem a outras seus pensamentos, emoções, valores - , transferindo a outro (o candidato) sua teia de sentimentos (identificando-se, assim, com ele), com quem desenvolve empatia.

4ª questão: Construção do discurso

Para se produzir o liame entre eleitor e candidato, de modo que possa haver projeção e identificação, se faz necessária a construção do discurso: ideário, programas, projetos, ações, maneiras como o candidato irá realizar sua gestão, etc. Ou seja, o discurso é peça central de uma campanha. Se não tiver ideias próprias e fortes, o candidato tende a ser abandonado pelo sistema cognitivo do eleitor. Será posto de lado. Outra precaução: formar o discurso com propostas que sejam criativas, factíveis (urge demonstrar como serão adotadas) e objetivas. Platitudes, promessas genéricas, projetos abstratos serão jogados na cesta do blá blá blá.

5ª questão: Pesquisa

A pesquisa é instrumento central no processo de construção do discurso. Trata-se de aferir o sistema cognitivo do eleitor: o que ele pensa, que linguagem usa, sua visão de cada candidato. Urge descobrir como pensa nesse momento o eleitor. Conferir as imagem que ele tem de cada protagonista. A pesquisa qualitativa é o caminho para esta descoberta. Ocorre que candidatos e assessores só emprestam ênfase às pesquisas quantitativas, essas que apuram intenção de voto que, nesse momento, flagram o pensamento popular, mas não refletem circunstâncias da primeira semana de outubro.

6ª questão: O diferencial

Nem sempre candidatos e assessores possuem conhecimento real das demandas populares. Daí a necessidade de construir algo no campo do discurso que traduza fielmente os desejos, as expectativas, os anseios da população. Nesse momento, o discurso tende a cair na vala comum das velhas promessas: áreas da saúde, educação, segurança, habitação, mobilidade urbana, etc. Os candidatos agregam projetos nessas áreas em seus discursos. Ora, o desafio é o de apresentar propostas usando criatividade, inovação, avanço. Urge sair do baú das velhas lembranças. Há, ainda, os projetos de infraetrutura técnica, setores estratégicos - que passam longe do conhecimento de fatias maiores do eleitorado- e aos quais se deve dedicar parte volumosa do discurso do candidato. Essas áreas menos conhecidas pedem muito poder criativo.

7ª questão: Comunicação

A essência do que se produz no campo do discurso - particularmente no campo das demandas mais urgentes - precisa chegar ao conhecimento do eleitor. Por meio da bateria de comunicação, a identidade do candidato bate no eleitor, formando-se, a partir do conhecimento dos conteúdos, uma imagem. Esta imagem precisa corresponder efetivamente à identidade de um candidato. Se a mensagem que transmite oralmente no programa eleitoral não corresponder ao que foi produzido como discurso-proposta, a mídia tende a denunciar e o candidato terá dificuldades para explicar "o que escreveu e o que disse". O "pega na mentira" poderá jogar o candidato no buraco dos mortos eleitorais.

8ª questão: Abrangência

A comunicação se ampara em vasto arsenal de meios: espaços eleitorais em rádios e TVs, encontro de candidatos com grupos (exposição oral), andanças dos candidatos pelas ruas, folhetos de campanha em linguagem popular (e ilustrados), uso de uma rede de promotores do discurso - cabos eleitorais preparados para traduzir o discurso do candidato junto aos eleitores, uso (parcimonioso) de redes sociais (cuidado para não usar as redes de forma burocrática, materiais de cunho propagandístico) (cartazes, santinhos. etc.).

9ª questão: Articulação

A sociedade está de costas para a política. Cria-se um vácuo entre a representação política e a sociedade. Quem preenche esse vácuo é o imenso conjunto de entidades organizadas, como associações, movimentos, grupos, núcleos setores, a par da estrutura sindical/corporativista como se vê hoje: sindicatos, federações, confederações, etc. Essa rede de organizações intermediárias forma a opinião pública. Portanto, constitui um espaço mais arejado e forte para que os candidatos possam ocupá-lo com ideias e propostas. A articulação com a sociedade organizada é um dos fatores mais importantes no planejamento de uma campanha política.

10ª questão: Mobilização

Por último, os atores políticos devem procurar manter ativo o eixo da mobilização. Trata-se, agora, de ir ao encontro do povo, onde ele se encontra, nos aglomerados urbanos, como feiras, estações de passageiros, praças públicas ou mesmo encontros com os setores produtivos. Aí, os candidatos poderão expor seu pensamento e recolher abordagens e sugestões.

A campanha deste ano

Teremos uma campanha de 45 dias de rua e 35 dias de mídia eleitoral. Portanto, será uma campanha mais curta, razão pela qual alguns candidatos já estão fazendo visitas às regiões. Será ainda uma campanha franciscana: os candidatos recorrerão aos fundos eleitoral e partidário. O teto do custo de uma campanha presidencial foi fixado em R$ 70 milhões, no primeiro turno, e R$ 35 milhões no segundo turno. Teto bem menor que o pleito presidencial de 2014.

Estilo publicitário

Os baianos Duda Mendonça e João Santana foram artífices das campanhas com forte viés publicitário. Uma embalagem cinematográfica, recursos e edições de grande encanto, Lula, como salvador da Pátria, sob a aclamação da plebe; Dilma como a grande gestora capaz de consolidar a felicidade construída no paraíso petista. Tudo isso veio por águas abaixo. Teremos uma campanha sob prisão de importantes lideranças. Nessa moldura de paisagem destroçada, será difícil ao PT dizer que não é responsável por 13 milhões de desempregados, a maior recessão econômica de nossa história ou, ainda, que mensalão e Lava Jato são criações de outros governos. O fato é que versões estapafúrdias, mentiras e verborragia terão, este ano, uma audiência crítica. E que poderá haver polarização em algumas regiões.

Fecho a coluna também com Minas Gerais.

Idôneo, o comandante

Em certa cidade fluminense, o chefe local era um monumento de ignorância. A política era feita de batalhas diárias. Um dia, o chefe político recebeu um telegrama de Feliciano Sodré, que presidia o Estado:

- Conforme seu pedido, segue força comandada por oficial idôneo. O coronelão relaxou e gritou para a galera que o ouvia:

- Agora, sim, quero ver a oposição não pagar imposto: a força que eu pedi vem aí. E quem vem com ela é o comandante Idôneo.

(Historinha contada por Leonardo Mota, em seu livro Sertão Alegre)