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"Penhora" na distribuição de lucros

Guilherme Costa Val Vieira Machado

Recentemente os contribuintes foram surpreendidos com a edição da Lei Federal nº 11.051/2004 a qual, mediante seu artigo 17, introduziu os parágrafos 1º e 2º ao artigo 32 da Lei nº 4.357/64.

quarta-feira, 13 de abril de 2005

Atualizado em 12 de abril de 2005 12:06

"Penhora" na distribuição de lucros


Guilherme Costa Val Vieira Machado*

Recentemente os contribuintes foram surpreendidos com a edição da Lei Federal nº 11.051/2004 a qual, mediante seu artigo 17, introduziu os parágrafos 1º e 2º ao artigo 32 da Lei nº 4.357/64.

De acordo com a nova redação do dispositivo de 1964, verifica-se, com clareza meridiana, que a distribuição de bônus ou lucro de empresas em débito com a União, além de ser considerada ato ilícito, implicará em multa de 50% (cinqüenta por cento) sobre o valor do(s) respectivo(s) débito(s) não garantido(s).

A artimanha, contudo, vai muito além da simples introdução dos parágrafos descritos. A bem da verdade, a intenção do legislador foi revitalizar dispositivo em desuso, vez que, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, o artigo 32 da Lei nº 4.357/64 tem sido letra morta em nosso ordenamento.

O dispositivo de 1964 revela, primeiramente, nítida afronta à Lei de Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/80), eis que institui verdadeira penhora dos dividendos das empresas para a garantia de "débitos em aberto" para com a União, em total incompatibilidade com o procedimento executivo traçado pela Lei nº 6.830/80, o que é inaceitável.

Como cediço, a Fazenda Pública possui métodos próprios para a cobrança de seus créditos, sendo que - repise-se - todo o procedimento para tanto se encontra minuciosamente discriminado na Lei de Execuções Fiscais, bastando sua superficial análise para a constatação de que a tentativa de "penhora" dos dividendos das pessoas jurídicas, como descrita na Lei nº 4.357/64, destrói, aniquila por completo o referido procedimento executivo.

Ademais, há que se esclarecer que não se sabe qual será a interpretação dada pelo Fisco à expressão "débito não garantido".

É possível e bem provável, que o Fisco compreenda como "débito não garantido" a simples intempestividade no recolhimento tributário (sem que o débito sequer tenha sido lançado ou inscrito em Dívida Ativa), sujeitando empresas nesta situação ao tipo previsto no artigo em apreço.

Neste caso, a disposição violaria os Princípios da "Ampla Defesa", do "Contraditório" e do "Devido Processo Legal", eis que não se pode privar o cidadão de seus bens sem a observância de processo administrativo prévio, constitucionalmente garantido aos contribuintes.

De toda forma, a nosso ver, a aplicação do artigo em apreço bem como a imposição da questionada multa só seria possível com a citação válida do devedor em processo de Execução Fiscal e, mesmo assim, após a tentativa frustrada de penhora de bens suficientes à garantia do juízo.

Isto porque a penhora de bens para a garantia do juízo somente se demonstra viável após a citação válida do devedor no processo de Execução Fiscal. Até então, o contribuinte que não concorda com a exigência e pretende discutir a questão em juízo em sede de Embargos, encontra-se - por ausência de previsão legal - de mãos atadas. Daí a incoerência de se pretender bloquear a distribuição de dividendos de sociedade "devedora" antes da insuficiência ou frustração da penhora.

Além disso, o Código de Processo Civil - CPC, cuja aplicação se dá subsidiariamente ao Código Tributário Nacional, bem como à Lei de Execuções Fiscais, deixa claro o preceito de que a execução sempre deve se dar pela forma menos gravosa ao devedor (CPC art. 620), desautorizando, portanto, a aplicação do artigo 32 da Lei 4.357/64 até a comprovação de insuficiência de bens necessários à garantia da Execução Fiscal.

Cumpre salientar, por outro lado, que a atividade administrativa, no que tange à exigência de tributos e de suas obrigações acessórias, é vinculada e obrigatória e que, mesmo diante de norma ilegal e inconstitucional, a autoridade administrativa competente deverá proceder à cobrança da multa descrita no artigo 32 da Lei nº 4.357/64.

Sendo assim, tirante a hipótese de insuficiência da penhora de bens necessários à garantia da Execução Fiscal, todo ato administrativo que objete a aplicação da multa descrita no artigo 32 manifestar-se-á ilegal, sendo passível de questionamento judicial.
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*Advogado do escritório
Siqueira Castro Advogados - MG










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